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Processo nº 35/2007
3ª Secção
Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção
do Tribunal Constitucional:
1. Por despacho de 12 de Setembro de 2007, de fls. 11, não foi admitido o
recurso que A. interpusera para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do
Tribunal da Relação do Porto 'que considerou não haver nulidades (…); arts.
432º, al. b) e 420º, n.º 1, f), ambos do CPPenal' no acórdão da mesma Relação
que negara provimento ao recurso interposto no acórdão da 2ª Vara Criminal do
Porto, proferido no processo n.º 735/03.6PUPRT, e que o condenara na pena de
prisão de dois anos e três meses pela prática de um crime de furto qualificado,
p. e p. pelos artigos 203º, n.º 1 e 204º, n.º 2, e), do Código Penal.
O arguido reclamou para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, mas a
reclamação foi indeferida a fls. 15, nestes termos (para o que agora releva):
'O acórdão de 12.07.2006 da Relação, ora recorrido, conheceu das nulidades
imputadas a acórdão anterior da mesma Relação. E essas nulidades foram
correctamente arguidas perante a Relação, atento o disposto no art. 668º, n.º 3,
do CPC, aplicável ex vi do art. 4º do CPP, porque do acórdão da Relação não
podia haver recurso, nos termos do art. 400º, n.º 1, alínea f), do CPP (…).
E, respeitando a arguição de nulidades a um acórdão irrecorrível, não passa a
ser recorrível a decisão que as apreciou, porque se trata de um processo por
crime a que é aplicável pena de prisão não superior a 8 anos.
Quanto ao direito ao recurso, cabe dizer que o princípio da tutela jurisdicional
efectiva a que alude o art. 20º, n.º 1, da CRP se concretiza através da
instância única, só se impondo o direito ao recurso em processo criminal, nos
termos do n.º 1 do artº 32º da CRP.
E, mesmo nesse caso, segundo o Acórdão do T.C. n.º 209/90 (…), '…o princípio
constitucional das garantias de defesa apenas impõe ao legislador que consagre a
faculdade de os arguidos recorrerem das sentenças condenatórias, e bem assim o
direito de recorrerem de quaisquer actos judiciais que, no decurso do processo,
tenham como efeito a privação ou restrição da liberdade ou de quaisquer outros
direitos fundamentais'.
Ora, não é desse tipo a decisão que se pretende seja apreciada por este S.T.J.,
uma vez que se reporta a um problema de nulidades de acórdão'.
A. recorreu então para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na
alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, pretendendo
'a apreciação da constitucionalidade da norma constante do art. 432º, alínea b)
e 400º, n.º 1, alínea f) do Código de Processo Penal, na interpretação que o
Tribunal recorrido lhe dá, no sentido de não ser inconstitucional a não
admissão do recurso para o Supremo de um Acórdão proferido pela Relação, em
conferência, quanto às nulidades exclusivamente invocadas e verificadas no
Acórdão por si proferido', por violação do n.º 1 do artigo 32º da Constituição.
2. Pelo despacho de fls. 20, de 5 de Dezembro de 2006, o recurso de
constitucionalidade não foi admitido, nestes termos:
'O recorrente diz no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal
Constitucional que invocou' a referida inconstitucionalidade 'na reclamação que
nos foi dirigida.
(…) Na reclamação diz-se, na parte relevante, que '(…) os motivos que levaram o
Tribunal da Relação do Porto a rejeitar o recurso, não estão compreendidos nos
invocados arts. 432º alínea b) e 400º n.º 1 alínea f), já que o objecto de
recurso era o acórdão que deliberou da rejeição da reclamação e não do primitivo
acórdão que negou provimento ao recurso interposto da decisão proferida pela 2ª
Vara Criminal do Porto.
Ora, a atitude adoptada pelo Tribunal da Relação do Porto na não admissão do
recurso para esse Venerando Tribunal é um flagrante caso de denegação de justiça
e violação das garantias do processo criminal, ou seja em clara violação do
disposto no art. 32º da C.R.P.'.
No Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 421/2001 – DR, II Série de 14.11.2001
entendeu-se 'que uma questão de constitucionalidade normativa só se pode
considerar suscitada de modo processualmente adequado quando o recorrente
identifica a norma que considera inconstitucional, indica o princípio ou a norma
constitucional que considera violados e apresenta uma fundamentação, ainda que
sucinta, da inconstitucionalidade arguida. Não se considera assim suscitada uma
questão de constitucionalidade normativa quando o recorrente se limita a
afirmar, em abstracto, que uma dada interpretação é inconstitucional, sem
indicar a norma que enferma desse vício, ou quando imputa a
inconstitucionalidade a uma decisão ou a um acto administrativo'.
Segundo estes ensinamentos, não se considera suscitada qualquer questão de
inconstitucionalidade'.
3. A. veio então reclamar para o Tribunal Constitucional, nos termos do n.º 4 do
artigo 76º da Lei nº 28/82, sustentando ter suscitado devidamente a
inconstitucionalidade da 'interpretação dada pelo Tribunal da Relação do Porto
aos artigos 432º al. b) e 400º, n.º 1, al. f) do CPP' na reclamação que dirigira
ao Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, justamente na parte transcrita
pelo despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade.
Notificado para o efeito, o Ministério Público pronunciou-se no sentido do
indeferimento da reclamação, já que 'a argumentação que [o reclamante] deduziu
no âmbito da reclamação não traduz obviamente a colocação à sua apreciação de
uma verdadeira questão de inconstitucionalidade de normas, pelo que se não
verificam efectivamente os pressupostos do recurso'.
4. Com efeito, a reclamação não pode ser deferida.
O recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade de normas
interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, como é o caso, destina-se a que este Tribunal aprecie
a conformidade constitucional de normas, ou de interpretações normativas, que
foram efectivamente aplicadas na decisão recorrida, não obstante ter sido
suscitada a sua inconstitucionalidade “durante o processo” (al. b) citada), e
não das próprias decisões que as apliquem. Assim resulta da Constituição e da
lei, e assim tem sido repetidamente afirmado pelo Tribunal (cfr. a título de
exemplo, os acórdãos nºs 612/94, 634/94 e 20/96, publicados no Diário da
República, II Série, respectivamente, de 11 de Janeiro de 1995, 31 de Janeiro de
1995 e 16 de Maio de 1996).
Ora, como se pode verificar pela transcrição feita do despacho de fls. 20, o ora
reclamante não suscitou na reclamação dirigida ao Presidente do Supremo Tribunal
de Justiça (como é exigido pelo n.º 2 do artigo 72º da Lei nº 28/82) a
inconstitucionalidade de nenhuma norma contida, nem na alínea b) do artigo 432º
do Código de Processo Penal, nem na alínea f) do n.º 1 do artigo 400º do mesmo
Código. Diferentemente, considerou que o Tribunal da Relação do Porto, ao não
admitir o recurso que pretendia interpor para o Supremo Tribunal de Justiça, se
fundou num motivo não compreendido em nenhum desses preceitos; e, assim, acusa o
mesmo Tribunal de 'denegação de justiça e de violação das garantias de processo
criminal, ou seja, em clara violação do disposto no art. 32º da C.R.P.'.
Ou seja: acusou de inconstitucionalidade a própria decisão da Relação,
resultante de má aplicação de normas de direito ordinário, o que é insusceptível
de ser apreciado pelo Tribunal Constitucional no âmbito do recurso de
fiscalização concreta da constitucionalidade.
5. Nestes termos, indefere-se a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ucs.
Lisboa, 30 de Janeiro de 2007
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Vítor Gomes
Artur Maurício