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Processo n.º 881/06
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. A., LDA, melhor identificada nos autos, não se conformando com a sentença do
Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, proferida em processo de
contra‑ordenação, interpôs recurso para o Tribunal Central Administrativo Sul.
O recurso não foi admitido, com o fundamento de que o valor da coima aplicada
não ultrapassa um quarto da alçada fixada para os tribunais judiciais de 1.ª
instância.
Deste despacho apresentou reclamação, ao abrigo do artigo 688.° do Código de
Processo Civil (CPC), para o Presidente do Tribunal Central Administrativo Sul,
que a desatendeu, confirmando na íntegra o despacho reclamado.
Desta decisão interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, recurso
que não foi admitido, por despacho que entendeu não ser admissível impugnação de
tal decisão, nos termos do artigo 689.º, n.º 2, do CPC.
Desse despacho deduziu nova reclamação, agora para o Presidente do Supremo
Tribunal Administrativo, que foi também indeferida, por decisão de 11.09.2006.
Inconformada com o assim decidido, a Reclamante apresentou requerimento onde
referiu que: “volta à presença de V. Exa. a expor, que na reclamação enviada a
esse Venerando Tribunal, embora tendo conhecimento do n.° 2 do artigo 689.º do
CPC, considera que esta norma não pode ser aplicada ao caso, por, como afirma na
referida reclamação e conforme dispõe o n.° 2 do artigo 690.º do CPC, saltar à
vista em todo o processo estarem a ser violadas as normas legais que passa a
mencionar:
- O n.º 2 do Artigo 107º da Constituição da República Portuguesa;
- O Decreto-Lei n.° 244/95, de 14/09, na sua alínea c) do artigo 27.º ;
- A Lei n.° 15/2001, de 24/12, no seu Artigo Único;
- O Artigo 7º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.”
Por despacho de 27 de Setembro de 2006 do Presidente do Supremo Tribunal
Administrativo, foi desatendida a pretensão da Reclamante, por não correr
qualquer nulidade, obscuridade, erro ou lapso da decisão proferida em 11.09.06.
2. A reclamante apresentou seguidamente reclamação para o Tribunal
Constitucional, por instrumento do seguinte teor:
“A., LDA, com sede e endereço no ………. - 8600-000 Lagos, tendo sido notificada do
douto despacho do Supremo Tribunal Administrativo, em que é desentendida a sua
reclamação, com o efeito da sua condenação em pagar coima por transgressão que
já provou não cometeu, vem perante esse Venerando e Superior Tribunal, porque
além de outras normas, no seu entender estar a ser violado o n°2 do artigo 107°.
da Constituição da República Portuguesa, reclamar da decisão constante no
refendo despacho, usando a faculdade concedida pelo Artigo 688°. do C.P.C. pelas
razões que passa a mencionar:
1°.
Além da norma constitucional mencionada, são violadas as seguintes normas:
O Decreto-Lei n°.244/95, de 14/09 na alínea c) do artigo 27°.
ALei n°.109/2001, de 24/12.
O Artigo 7°. da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
2°.
Na reclamação apresentada no Supremo Tribunal Administrativo, desenvolveu as
razões porque considera as normas violadas, que no despacho aqui reclamado, nem
sequer foram apreciadas, pois não se faz quaisquer referências, apenas se
fundamenta a decisão no artigo 689.° n.° 2 do CPC., referindo-se a norma que
condena e ignorando-se as mencionadas que defendem a arguida.
3°.
Em todas as reclamações sobre este caso, se expõe que essa norma não deve ser
aplicada, pois a não admissão do recurso, tem o efeito da condenação por
transgressão que não foi cometida, sendo assim violado o artigo 7°. da Convenção
Europeia dos Direitos do Homem, cuja redacção dispõe “que ninguém pode ser
condenado por uma acção que não foi cometida”.
4.º
E não foi cometida, pelas seguintes razões:
5 º
Estabelece o artigo 98°. do CIRC a obrigatoriedade de os sujeitos passivos,
efectuarem um pagamento especial por conta, estabelecido em 1% do volume de
negócios relativo ao exercício anterior, com o limite máximo de 1.250 euros.
6°.
No caso da reclamante o exercício seria do ano de 2003, ano em que não teve
qualquer rendimento, como consta na declaração do IRC em poder dos Serviços de
Finanças de Lagos, apresentando até um prejuízo 5.885,89 euros
7.º
E assim, de harmonia com o disposto no n°.2 do artigo 107°. da Constituição da
República Portuguesa, a empresa não pode ser tributada, visto não ter qualquer
rendimento real, assim entendeu a reclamante pela clara redacção desta norma
constitucional, e por isso não procedeu ao referido pagamento especial, até
ainda porque não foi notificado para esse efeito.
8º.
Assim não cometeu qualquer transgressão, mas sendo-lhe aplicada coima por esse
motivo, recorreu para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, que não
admitiu o recurso, por o valor a coima ser inferior a um quarto da alçada dos
tribunais da 1.ª.instância.
9.º
Como é que o reclamante pode concordar pagar uma coima, por transgressão que não
cometeu, é evidente que reclamou para Tribunal Central Administrativo Sul e
seguidamente para o Supremo Tribunal Administrativo, tudo desatendido, por uma
norma permitir tal facto por se considerar ser uma pequena coima.
10.º
Finalmente, sendo ignoradas todas as razões que expôs, mesmo no caso de
realmente ter existido transgressão, uma das razões ignoradas é o fcto da
violação do Decreto-Lei n°.244/95, de 14/09 na alínea c) do artigo 27°. e da Lei
no. 109/2001, pelo que a transgressão estaria abrangida pela lei da prescrição.
11.º
O Meritíssimo Juiz do Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, tendo admitido
o recurso (mais tarde negado por mal admissão), a que nas alegações apresentadas
se invocasse a prescrição, por estar ultrapassado o prazo de um ano, rejeita
esta alegação por o n°. 1 do artigo 33°. do Regulamento Geral de Infracções
Tributárias estabelecer o prazo de cinco anos.
12°.
Um regulamento não pode sobrepor-se a Decreto-Lei, nem a Lei e as normas
referidas no artigo 10°. desta peça, estabelecem o prazo de um ano
13°.
Se tivesse existido transgressão, teria sido praticada em 29-10-2004, data
limite da obrigação do pagamento especial por conta e o procedimento
verificou-se em em 03-11-2005, pelo que decorreu mais de um ano, como está
provado no processo.
Por todo o exposto, a reclamante chega às seguintes
CONCLUSÕES
-Não tendo rendimento real em 2003, não pode incidir sobre a empresa imposto
como dispõe o n°.2 do Artigo 107°. da Constituição da República Portuguesa.
-Não tendo cometido transgressão, não pode ser aplicada coima, como dispõe o
n°.7 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
-Mas presumindo que de facto houve transgressão, está abrangida pela lei da
prescrição, conforme dispõe o Decreto-lei n°.244/95, de 14/09 na alínea c) do
artigo 27°. e a Lei n°.109/2001, de 24/12 no seu Artigo Único.
POR TODO O EXPOSTO
Vêm pedir a esse Venerando e Superior Tribunal, com todo o respeito, análise da
presente petição, constando nos autos as provas do tudo o que é exposto, sendo
decretado a anulação da coima, sendo assim feita
3. O Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu o seguinte parecer:
“Como é evidente e controverso, não cabe no âmbito do procedimento da
“reclamação”, regulado na Lei n.º 28/82, a impugnação dirigida ao despacho,
proferido em procedimento de reclamação transitado no STA, em que se indeferiu o
pedido de nulidade ou reforma da decisão originariamente proferida pela
Presidente do STA: na verdade, tal “reclamação”, em processo constitucional,
apenas tem sentido quando haja sido anteriormente rejeitada a interposição de um
recurso de fiscalização concreta.
Deste modo, por manifesta inexistência no ordenamento jurídico do meio
impugnatório anomalamente utilizado, terá a “reclamação” de ser liminarmente
rejeitada.”
4. A presente reclamação constitui um uso manifestamente anómalo da reclamação
para o Tribunal Constitucional.
Só cabe reclamação para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do n.º 4 do artigo
76.º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (LTC) – e não do n.º 1 do artigo 688.º
do Código de Processo Civil – de decisão dos demais tribunais que não haja
admitido recurso interposto para o próprio Tribunal Constitucional ou que lhe
haja retido a subida. Este meio processual tem por pressuposto a interposição de
um (anterior) recurso para o Tribunal Constitucional, por objecto (imediato) um
despacho que o não tenha admitido ou lhe tenha fixado subida diferida e por
finalidade necessária a admissão do recurso ou a determinação da sua subida
imediata. Nada disto se verifica no caso presente, pelo que a reclamação tem de
ser rejeitada.
4. Decisão
Pelo exposto, rejeita-se a reclamação e condena-se a recorrente nas custas, com
20 (vinte) unidades de conta de taxa de justiça.
Lisboa, 22 de Novembro de 2006
Vítor Gomes
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Artur Maurício