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Processo nº 620/2006.
3ª Secção.
Relator: Conselheiro Bravo Serra.
1. Em 25 de Setembro de 2006 o relator proferiu a seguinte
decisão: –
“1. Da deliberação tomada em 30 de Junho de 2005 pelo
plenário do Conselho Superior da Magistratura que lhe aplicou a pena disciplinar
de aposentação compulsiva recorreu para o Supremo Tribunal de Justiça o Juiz de
Direito Licº A., tendo, na alegação adrede produzida, formulado as seguintes
«conclusões»: –
‘1. Prescrição por três causas.
O procedimento disciplinar por infracções
disciplinares que tivessem sido cometidas pelo arguido entre 23 de Setembro de
1996 e 20 de Março de 2000 – período abarcado pelo Processo de Inspecção
extraordinária n.º 111/2000 –, prescreve por:
– a instauração do procedimento disciplinar contra o recorrente ter ocorrido
mais de três meses após o conhecimento por parte do Conselho Superior da
Magistratura dos factos ou omissões em causa e da autoria deles;
– terem[ ] passado mais de três anos sem a prática de ‘actos instrutórios com
efectiva incidência na marcha do processo’ (não valendo como tal as 2ª e 3ª
audições do arguido – folhas 262 a 265,do Processo disciplinar n.º 36/2001, em
22.3.2001, e folhas 451 e 452, do mesmo Processo, em 17.4.2002,
respectivamente);
– terem passado mais de quatro anos e meio (passaram mais de cinco anos e três
meses!) entre a ocorrência dos factos, reportados, por último, a 20.3.2000, e a
condenação – 30.6.2005.
Viola, pois, por isso que dissemos neste n.º 1, o
acórdão, salvo melhor opinião, o disposto nos artigos 4º, n.ºs 2, 5, 1 e 4 do
Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da Administração Central,
Regional e Local, (aprovado pelo Decreto-Lei n.º 24/84, de 16.1), 119º, n.º 1 e
121º, n.º 3 do Código Penal, todos aplicáveis por força do artigo 131º do
Estatuto dos Magistrados Judiciais.
2. Falta de apensação de processos disciplinares.
O recorrente tem direito à apensação dos
dois Processos disciplinares em que é arguido não só para que, sendo caso disso,
lhe seja aplicada uma pena única, mas também para que sejam aproveitados os
meios de prova produzidos em cada um num julgamento conjunto.
Viola, pois, por isso que dissemos neste n.º 2, o
acórdão, salvo melhor opinião, o disposto nos artigos 99º do Estatuto dos
Magistrados Judiciais, 14º, n.ºs 1 e 2, 42º, n.º 2 e 48º do Estatuto Disciplinar
dos Funcionários e Agentes da Administração Central, Regional e Local, estes
aplicáveis por força do artigo 131º do Estatuto dos Magistrados Judiciais.
3. Contradições e ofensa do caso julgado, mesmo com
violação da proibição de duplo julgamento (‘non bis in idem’).
O Conselho Permanente do Conselho Superior
da Magistratura deliberou, em 20 de Fevereiro de 2001, aprovar o relatório
elaborado por Excelentíssimo Senhor Desembargador Inspector, datado de
14.2.2001, no âmbito do processo de Inquérito, instaurado conforme o artigo 34º,
n.º 2 do Estatuto dos Magistrados Judiciais, no qual se concluiu pela
inexistência de inaptidão para o exercício de funções de magistrado judicial. O
acórdão recorrido, com base nos mesmos factos, veio dizer e decidir o contrário.
Viola, pois, por isso que dissemos neste n.º 3, o acórdão, salvo melhor opinião,
o disposto nos artigos 1º, 2º, n.ºs 1, 3º, n.º 1, 5º, n.ºs 1 e 2 e 6º-A, n.ºs 1
e 2. 133º, n.ºs 1 e 2, h) do Código do Procedimento Administrativo (aprovado
pelo artigo 1º do Decreto-Lei nº 442/91, de 15.11; e alterado pelo Decreto-Lei
nº 6/96, de 31.1), 29º, n.º 5 e 266, n.ºs 1 e 2 da Constituição da República
Portuguesa.
4. Inadmissibilidade da aplicação de pena expulsiva, por haver alteração de
penas aplicáveis (artigo 359º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal).
Tendo o recorrente manifestado expressamente, na
defesa complementar apresentada no Processo disciplinar n.º 36/2001. a sua
oposição a que lhe fosse aplicada uma pena expulsiva, muito mais gravosa do que
as que o Ex.mo Senhor Desembargador Inspector propusera na acusação e no
relatório, não lhe poderia ter sido aplicada pena expulsiva.
Viola, pois, por isso que dissemos neste n.º 4, o
acórdão, salvo melhor opinião, o disposto nos artigos 1º, f). 358º, n.ºs 1 e 3,
359º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal, 10º e 11º do Código Civil.
5. Inexistência de infracções disciplinares e manifesta desproporcionalidade da
pena aplicada.
Houve, salvo o devido respeito, erros de facto e
omissões de factos relevantes no acórdão recorrido, designadamente nos números e
decisões finais, de ‘decisões de mérito’ proferidas pelo recorrente, nos números
de processos que tinha a seu cargo, designadamente no período inicial do seu
trabalho em Sintra.
Não foi dado o devido relevo aos meios de prova
– testemunhas, e documentos oferecidos pelo recorrente –, não se fazendo análise
crítica deles, Atribuiu-se erradamente ao recorrente ausência de auto-crítica.
Concedeu o Conselho Superior da Magistratura à
produtividade e à celeridade processual, enfocadas sobre as decisões de mérito,
uma primazia absoluta, escapando-lhe uma visão global dos deveres profissionais
em causa, que também recaem sobre todo o restante trabalho a cargo dos Juízes.
Mesmo que tivesse que haver condenação, jamais a
pena de aposentação compulsiva se apresentava como proporcional e necessária,
não havendo inaptidão do recorrente para o exer[c]ício de funções judiciais.
Viola, pois, por isso que dissemos neste n.º 5, o acórdão, salvo melhor opinião,
o disposto nos artigos 82º, 96º, 97º, 122º do Estatuto dos Magistrados
Judiciais, 47º, n.ºs 1 e 2, 53º 202º, n.º 1, 203º da Constituição da República
Portuguesa, 3º, n.º 1, 4º, 5º, n.º 2 e 6º, 133º, n.ºs 1 e 2, d) do Código do
Procedimento Administrativo, 1º, n.ºs 1 e 3, 14º, n.ºs 1 a 3 do Código Penal
(aplicáveis por força do artigo 131º do Estatuto dos Magistrados Judiciais), 3º,
n.º 3, n.ºs 4, b) e 28º do Estatuto Disciplinar dos Funcionários e Agentes da
Administração Central, Regional e Local (aplicáveis por força do artigo 131º do
Estatuto dos Magistrados Judiciais.’.
Anote-se, de outro lado, que, no «teor» daquela motivação,
não se surpreende qualquer asserção da qual decorra, directa ou indirectamente,
expressa ou implicitamente, o assacar, a qualquer normativo ínsito no
ordenamento jurídico ordinário, [d]o vício de contraditoriedade com a Lei
Fundamental, outrotanto, aliás, sucedendo tocantemente ao petitório
consubstanciador do recurso contencioso.
Tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 6 de
Abril de 2006, concedido provimento ao recurso, anulando a deliberação
impugnada, a fim de se proceder à apensação dos dois processos disciplinares
instaurados relativamente ao recorrente, veio este arguir a nulidade de tal
aresto, invocando não ter o mesmo decidido questões que foram colocadas no
recurso.
No requerimento corporizador da arguição, em dados passos,
pode ler-se, no que ora releva: –
‘(…)
Todas estas questões ficaram por tratar e o seu
conhecimento não está, salvo o devido respeito, prejudicado pela procedência do
fundamento reconhecido por Vossas Excelências. Aliás, salvo o devido respeito,
falta no acórdão de 6.4.2006 a fundamentação da afirmação (último parágrafo da
página 5) de que o conhecimento daquelas questões ficava prejudicado – artigo
205º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa e 158º, n.º 1 do Código de
Processo Civil.
(…)
É que esse Venerando Supremo Tribunal deverá
pronunciar-se sobre [ ] ‘a pretensão material do interessado’ – artigos 66º,
n.º 2 e 71º, n.º 1 do mesmo Código de Processo nos Tribunais Administrativos,
devidamente adaptados.
Está em causa o princípio da tutela
jurisdicional efectiva. Salvo o devido respeito, a falta de pronúncia sobre as
apontadas questões que Vossas Excelências deveriam ter apreciado, desrespeita
esse princípio, assim como as normas que a seguir transcreveremos, sendo as do
Código de Processo nos Tribunais Administrativos aplicáveis por força dos
referidos artigos 1º, 191º, 192º desse Código e 178º do Estatuto dos Magistrados
Judiciais.
(…)’
Tendo o Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 25 de
Maio de 2006, desatendido a arguida nulidade, fez o recorrente juntar aos autos
requerimento com o seguinte teor: –
‘A., juiz de direito, com domicílio particular na Rua …, n.º.. (…), Murches,
2755-238 Alcabideche, vem muito respeitosamente, nos termos dos artigos 223º,
n.º 1, 280º, números 1, b), 4 e 6 da Constituição da República Portuguesa,
6º,70º, números 1, b) e 2, 71º, n.º 1, 72º, números1, b) e 2, 75º, n.º 1, 75º-A
números 1 e 2 e 79º-C da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e
Processo do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15.11), recorrer para o
Tribunal Constitucional dos acórdãos de 6.4.2006 e de 25.5.2006 do Venerando
Supremo Tribunal de Justiça, proferidos no Processo n.º 3108/2005, da 7ª Secção.
Este recurso é interposto ao abrigo da alínea b) do
n.º 1 do artigo 70º daquela Lei Orgânica.
As normas cuja inconstitucionalidade, na interpretação
dada pelo Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente pretende que o Tribunal
Constitucional aprecie são: os artigos 2º, n.ºs 1 e 2, a), c) e d) e i), 71º,
n.ºs 1 e 2 e 95º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos (aprovado pelo artigo 1º da Lei n.º 15/2002, de 22.2 e alterado
pela Lei n.º 4-A/2003, de 19.2), 668º, n.º 1, d), 1ª parte, e 158º, n.º 1 do
Código de Processo Civil, aplicáveis por força dos artigos 178º do Estatuto dos
Magistrados Judiciais (Lei nº 21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram
feitas, designadamente, pela Lei nº 143/99, de 31.8), 1º, 191º e 192º do mesmo
Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Aqueles acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça
violaram, salvo o devido respeito, dado que não conheceram de causas de
invalidade do acto administrativo recorrido, considerando prejudicado, sem
fundamentação, o seu conhecimento, os artigos 202º, n.º 2, 205º, n.º 1 e 268°,
n.º 4 da Constituição da República Portuguesa. Foi especialmente violado, salvo
o devido respeito, o princípio da tutela jurisdicional efectiva.
O recorrente suscitou as questões de
inconstitucionalidade que vem invocar na reclamação ao referido acórdão de
6.4.2006, arguindo nulidades por omissão de pronúncia.
Foram, salvo o devido respeito, especialmente violados
os seguintes segmentos das seguintes normas constitucionais:
– artigo 268º, n.º 4: ‘É garantido aos administrados tutela jurisdicional
efectiva dos seus direitos ou interesses legalmente protegidos, incluindo,
nomeadamente, o reconhecimento desses direitos ou interesses, a impugnação de
quaisquer actos administrativos que os lesem, (...), a determinação da prática
de actos administrativos legalmente devidos...’; pois não foram sequer tratadas
as questões conducentes à extinção do procedimento disciplinar, como pedido pelo
recorrente, havendo falta de decisão sobre a ‘a pretensão material do
interessado’ artigos 66º, n.º 2 e 71º, n.º 1 do Código de Processo nos
Tribunais Administrativos, devidamente adaptados; interpretação do Supremo
Tribunal de Justiça quanto aos artigos 2º, n.ºs 1 e 2, a), c) e d) e i), 71º,
n.ºs 1 e 2 e 95º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos ou falta de aplicação desses artigos;
– artigo 202º, n.º 2: ‘Na administração da justiça incumbe aos tribunais
assegurar a defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos dos cidadãos,
(…) e dirimir os conflitos de interesses públicos e privados.’; pois não foram
sequer tratadas as questões conducentes à extinção do procedimento disciplinar,
como pedido pelo recorrente, havendo falta de decisão sobre a ‘a pretensão
material do interessado’ – artigos 66º, n.º 2 e 71º, n.º 1 do Código de Processo
nos Tribunais Administrativos, devidamente adaptados; interpretação do Supremo
Tribunal de Justiça quanto aos artigos 2º, n.ºs 1 e 2, a), c) e d) e i), 71º,
n.ºs 1 e 2 e 95º, n.ºs 1, 2 e 3 do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos ou falta de aplicação desses artigos;
– artigo 205º, n.º 1: ‘As decisões dos tribunais que não sejam de mero
expediente são fundamentadas na forma prevista na lei’; por não haver
fundamentação de se ter considerando prejudicado o conhecimento de causas de
invalidade do acto administrativo recorrido; interpretação do Supremo Tribunal
de Justiça quanto aos artigos 668º, n.º 1, d), 1ª parte, e 158º, n.º 1, do
Código de Processo Civil.
Neste Processo n.º 3108/2005, da 7ª Secção do Supremo
Tribunal de Justiça, o recorrente pediu ‘que seja declarado nulo o acto
administrativo de que recorre, isto é, o acórdão do Conselho Plenário do
Conselho Superior da Magistratura de 30 de Junho de 2005, proferido no Processo
disciplinar n.º 36/2001, ou caso assim não se entenda, seja anulado, e ainda
que, conforme os artigos 4º, nº 2, a) e c) e 47º, nº 2, a) do Código de Processo
nos Tribunais Administrativos, aplicáveis por força dos referidos artigos 191º,
192º desse Código e 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, seja declarado,
ou caso assim não se entenda, seja o Conselho Superior da Magistratura condenado
a declarar, extinto o procedimento disciplinar relativo ao período entre 23 de
Setembro de 1996 e 20 de Março de 2000, designadamente por prescrição, sendo o
arguido absolvido, sem prejuízo da apensação dos autos do Processo disciplinar
n.º 36/2001 aos autos do Processo disciplinar n.º 91/2005’.
Naquele acórdão de 6.4.2006, na parte decisória,
embora ‘concedendo provimento ao recurso contencioso interposto pelo’
recorrente, o Supremo Tribunal de Justiça limitou-se a ‘anular a deliberação
impugnada para que se proceda à apensação processual nos termos supra referidos,
tendo em vista uma subsequente apreciação global da actividade funcional do
recorrente’.
O recorrente invocou fundamentos para a extinção do
processo disciplinar, os quais são também, assim como a decidida apensação de
processos, salvo melhor opinião, de fácil verificação: prescrição e inexistência
de infracções disciplinares. Todavia, no limite, ainda que o Supremo Tribunal de
Justiça entendesse não atender a esses fundamentos, teria o recorrente interesse
em que neste Processo fosse declarada a inadmissibilidade de aplicação de pena
expulsiva, de aposentação compulsiva. E para isto também o recorrente apresentou
fundamentos: contradições e ofensa do caso julgado, mesmo com violação da
proibição de duplo julgamento (‘non bis in idem’), inadmissibilidade da
aplicação de pena expulsiva, por haver alteração de penas aplicáveis (artigo
359º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Penal) e manifesta desproporcionalidade
da pena aplicada. Todas estas questões ficaram por tratar e o seu conhecimento
não está, salvo o devido respeito, prejudicado pela procedência do fundamento
reconhecido pelo Supremo Tribunal de Justiça.
Salvo o devido respeito, o Supremo Tribunal de
Justiça, no referido acórdão de 6.4.2006, além de não ter tratado da questão
(ofensa do caso julgado) que conduziria à afirmação da existência do vício mais
grave de nulidade, não deu qualquer resposta ao pedido, também ele principal
(não subsidiário ou alternativo), de que ‘seja declarado, ou caso assim não se
entenda, seja o Conselho Superior da Magistratura condenado a declarar, extinto
o procedimento disciplinar relativo ao período entre 23 de Setembro de 1996 e 20
de Março de 2000, designadamente por prescrição, sendo o arguido absolvido’.
Decidindo sobre a reclamação apresentada pelo
recorrente relativamente ao acórdão de 6.4.2006, o Supremo Tribunal de Justiça,
no seu acórdão de 25.5.2006, indeferiu essa reclamação, entendendo que se tinha
pronunciado sobre todas as questões, mesmo sobre aquelas cujo conhecimento
considerara prejudicado.
Salvo o devido respeito, como já salientámos na
referida reclamação, falta, no acórdão de 6.4.2006 a fundamentação da afirmação
(último parágrafo da página 5) de que o conhecimento daquelas questões ficava
prejudicado, fundamentação que também não foi dada no acórdão de 25.5.2006 e que
tão necessária era em face da clareza, em sentido contrário, das referidas
normas dos artigos 2º, n.ºs 1 e 2, a), c) e d) e i), 71º, n.ºs 1 e 2 e 95º, n.ºs
1, 2 e 3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, aplicáveis – e o
Supremo Tribunal de Justiça não sustentou que o não fossem –, por força dos
artigos 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, 1º, 191º e 192º do mesmo
Código de Processo nos Tribunais Administrativos.
Está em causa a falta de aplicação dessas normas, sem
a indicação de fundamento para essa omissão, continuando o recorrente a pensar
que, com essas omissões, houve, salvo o devido respeito, em violação das normas
aplicáveis, a nulidade de omissão de pronúncia sobre questões que se devem
apreciar – artigo 668º, n.º 1, d), 1ª parte, do Código de Processo Civil.
A omissão da decisão sobre aquelas questões, a omissão
da aplicação dessas normas do Código de Processo nos Tribunais Administrativos e
a omissão da fundamentação da afirmação de que o conhecimento daquelas questões
ficava prejudicado, violam, salvo o devido respeito, os artigos 202º, n.º 2,
205º, n.º 1 e 268º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa, em especial,
o princípio da tutela jurisdicional efectiva, consagrado nesta última norma.
Se bem que os dois processos disciplinares devessem
ter sido apensados na fase administrativa, como sustentámos em ambos – no
Processo disciplinar n.º 36/2001, na defesa complementar –, o Conselho Superior
da Magistratura, apesar da clareza, como foi salientado pelos Excelentíssimos
Senhores Juízes Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça, das normas
aplicáveis, decidiu não o fazer, cometendo, salvo o devido respeito, erro
grosseiro. Mas, sendo-lhe este exclusivamente imputável – ‘sibi imputet’ –, não
deve o recorrente sofrer quaisquer consequências nefastas dele advenientes, como
seria a de que neste Processo não ficasse já decidida a relação fundamental em
causa. O recorrente, como resultado deste Processo, deve ficar defendido da
pretensão punitiva do recorrido, no que respeita àquele período de tempo,
importando que o procedimento disciplinar, no Processo disciplinar n.º 36/2001,
seja, neste Processo n.º 3108/2005, da 7 Secção do Supremo Tribunal de Justiça,
declarado extinto.
Esta é a maior ou ao menos uma das maiores inovações
do Código de Processo nos Tribunais Administrativos, ligada aos referidos
artigos 202º, n.º 2 e 268º, n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
Não pode o recorrente ficar sujeito a padecer novo
acto administrativo ilegal do Conselho Superior da Magistratura sobre a mesma
matéria, voltando a ter que recorrer ao Supremo Tribunal de Justiça, em
detrimento da economia processual, com enorme dispêndio de energias, com
exaustão intelectual, psíquica e física, com prejuízos económicos, na elaboração
das peças processuais, extracção de cópias, etc..
Como também já dissemos na reclamação ao acórdão de
6.4.2006, deve pôr-se em relevo que a procedência, que esperamos, do recurso no
Processo n.º 584/05, da 2° Secção do Supremo Tribunal de Justiça, relativo à
classificação de ‘medíocre’ que esteve na origem do Processo disciplinar n.º
91/2005, levará à extinção do procedimento disciplinar nesse Processo
disciplinar – já aconteceu situação semelhante no Processo disciplinar n.º
36/2001 (por deliberação de 8.5.2001, o Conselho Plenário do Conselho Superior
da Magistratura decidiu o arquivamento desse Processo disciplinar por
impossibilidade superveniente da lide) –, pelo que perderá objecto a parte final
da decisão do mesmo acórdão de 6.4.2006, pois não haverá que fazer ‘uma
subsequente apreciação global da actividade funcional do recorrente’. Aliás, na
folha 5 desse acórdão, os Excelentíssimos Senhores Juízes Conselheiros do
Supremo Tribunal de Justiça dizem que por despacho (não fomos dele notificados)
do Ex.mo Relator a quem foi distribuído, aquele Processo disciplinar n.º 91/2005
aguarda o resultado daquele Recurso.
Deve, pois, ficar decidido neste Processo n.º
3108/2005, da 7ª Secção do Supremo Tribunal de Justiça, o mérito da causa, como
mandam os artigos 202º, n.º 2 e 268º, n.º 4 da Constituição da República
Portuguesa e o princípio da tutela jurisdicional efectiva.
***********
Pelo exposto, Excelentíssimos Senhores Juízes do Tribunal
Constitucional, requer o recorrente que, considerado procedente este recurso,
por o Supremo Tribunal de Justiça ter feito, salvo o devido respeito,
interpretação inconstitucional de normas, como atrás dissemos, nos acórdãos de 6
de Abril de 2006 e de 25 de Maio de 2006, seja mandado reformar esses acórdãos
em conformidade com o julgamento de Vossas Excelências sobre as questões de
inconstitucionalidade.’
Por despacho prolatado em 22 de Junho de 2006 pelo
Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, foi admitido o recurso
interposto mediante o transcrito requerimento.
Tendo os autos sido remetidos ao Tribunal Constitucional e
tendo aqui a primitiva Conselheira Relatora suscitado o seu impedimento, este
órgão de administração de justiça, por via do seu Acórdão nº 422/2006, veio a
declarar verificado aquele impedimento, o que consequenciou a «redistribuição»
dos autos, vindo eles a ser afectos ao ora relator.
2. Porque o despacho de admissão do recurso não vincula este
Tribunal (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), e porque se
entende que tal recurso não deveria ter sido admitido, elabora-se, ex vi do nº 1
do artº 78º-A da mesma lei, a vertente decisão, por intermédio da qual se não
toma conhecimento do objecto da presente impugnação.
Como deflui do relato supra efectuado, intenta o recorrente
colocar sob a censura deste órgão de fiscalização concentrada da
constitucionalidade os arestos lavrados em 6 de Abril e 25 de Maio de 2006 pelo
mais Alto Tribunal da ordem dos tribunais judiciais, ancorando o seu recurso na
alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82.
Esta sorte de impugnação, como sabido é, está, inter alia,
condicionada pelo requisito de suscitação, precedentemente ao proferimento da
decisão judicial querida impugnar perante este Tribunal, da desarmonia
constitucional por banda de norma ou normas (ainda que alcançadas mediante um
processo interpretativo) do ordenamento jurídico ordinário.
E isso, justamente, porque o objecto do recurso de
fiscalização concreta da constitucionalidade é constituído por normas do
ordenamento infra-constitucional e não por outros actos do poder público tais
como, verbi gratia, as decisões judiciais qua tale consideradas.
Assim sendo, mister é que, antes de ser proferida a decisão
judicial, se impute a um dado normativo o vício de desconformidade com a Lei
Fundamental.
Ora, como se extrai do já assinalado relato, anteriormente,
quer ao acórdão de 6 de Abril de 2006, quer ao subsequente acórdão de 25 de
Maio, o ora impugnante não assacou a qualquer normativo infra-constitucional
(repete-se, ainda que alcançado por via de uma interpretação conferida a dado
preceito da lei ordinária) uma enfermidade à face do Diploma Básico. Antes optou
por imputar violação de normas ou princípios constitucionais, seja à deliberação
tomada pelo Conselho Superior da Magistratura (no recurso atinente a essa
deliberação), seja àquele acórdão proferido em 6 de Abril de 2006 (na arguição
da respectiva nulidade).
Uma tal imputação, porém, atento o objecto dos recursos de
fiscalização concreta da constitucionalidade a que acima já se fez referência,
não tem a virtualidade de abrir uma tal via de impugnação.
Neste contexto, à míngua do pressuposto consistente na
suscitação da questão de inconstitucionalidade normativa, não se toma
conhecimento do objecto do recurso em apreço, condenando-se o impugnante nas
custas processuais, fixando-se a taxa de justiça em seis unidades de conta.
Da decisão supra transcrita reclamou o Licº A., dizendo no
requerimento consubstanciador da reclamação: –
“(…)
1. A questão de inconstitucionalidade em causa.
Escreveu o Ex.mo Sr. Professor Jorge Miranda, na página 378 do ‘Manual de
Direito Constitucional’, tomo II, ‘Introdução à Teoria da Constituição’, 2
edição, 1983, Coimbra, Coimbra Editora, que ‘a questão de inconstitucionalidade
objecto do recurso é a questão efectivamente objecto da decisão recorrida, não
qualquer outra: nem a questão principal, nem outra questão de
inconstitucionalidade (conquanto interligada), nem a questão de
inconstitucionalidade em tese ou em abstracto. É sobre a concreta questão de
inconstitucionalidade sobre a qual já se pronunciou um tribunal que tem de se
pronunciar, agora, o Tribunal Constitucional’.
A questão de inconstitucionalidade objecto deste recurso não respeita aos vícios
do acto administrativo do Conselho Superior da Magistratura de 30.6.2005, mas
sim à falta de conhecimento desses vícios por parte do Supremo Tribunal de
Justiça.
O Ex.mo Sr. Juiz Conselheiro reproduziu nas 1ª e 2ª páginas (folhas 899 e
900) da decisão sumária de que se reclama, as conclusões das alegações que o
recorrente apresentou no Supremo Tribunal de Justiça, concluindo (1º parágrafo
da folha 900) que ‘no ‘teor’ daquela motivação, não se surpreende qualquer
asserção da qual decorra, directa ou indirectamente, expressa ou implicitamente,
o assacar, a qualquer normativo ínsito no ordenamento jurídico ordinário, o
vício de contrariedade com a Lei Fundamental, outrotanto, aliás, sucedendo
tocantemente ao petitório consubstanciador do recurso contencioso’.
Salvo o devido respeito, quer no requerimento de interposição da impugnação
judicial do acto administrativo (página 44), quer nas alegações (página 52) –
embora isso não se reflicta nas conclusões dessas alegações –, estão colocadas
questões de inconstitucionalidade, designadamente por violações dos artigos
202º, n.º 1 e 203º da Constituição da República Portuguesa por parte de normas
do Estatuto dos Magistrados Judiciais e do Regulamento das Inspecções Judiciais,
na interpretação feita pelo recorrido Conselho Superior da Magistratura.
Mas essas violações não são o principal fito dessa acção administrativa
especial (artigo 191º do Código de Processo nos Tribunais Administrativos), em
cujo requerimento de interposição, conforme o artigo 172º, n.º 1 do Estatuto dos
Magistrados Judiciais (Lei n.º 21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram
feitas, designadamente, pela Lei n.º 143/99, de 31.8), devem constar ‘os
fundamentos de facto ou de direito’ do recurso. É normal, pois, que, quer nesse
requerimento, quer nas alegações e conclusões destas – artigos 176º, 178º do
Estatuto dos Magistrados Judiciais, 690º, nºs 1 e 2, a) e b) do Código de
Processo Civil, 1º, 191º e 192º do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos –, em cumprimento das normas aplicáveis, o enfoque seja posto
nas normas jurídicas violadas pelo acto administrativo de que se recorre, não
resultando isso de uma opção do recorrente (como refere o Ex.mo Sr. Juiz
Conselheiro no 1º parágrafo da folha 906). Exigem mesmo esses n.º 1 e a alínea
a) do n.º 2 desse artigo 690º do Código de Processo Civil que, nas conclusões da
alegação, o recorrente indique, respectivamente, os ‘fundamentos por que pede a
alteração ou anulação da decisão’ e, ‘versando o recurso sobre matéria de
direito’, ‘as normas jurídicas violadas’.
Todavia, o que sobretudo importa pôr em relevo é que a questão de
inconstitucionalidade objecto deste recurso só surgiu com a prolação do acórdão
do Supremo Tribunal de Justiça de 6.4.2006, por ter havido, salvo o devido
respeito, omissão injustificada de pronúncia sobre vícios que o recorrente
atribuiu ao acto administrativo recorrido, tendentes designadamente à declaração
da extinção do procedimento disciplinar. Por conseguinte, ao contrário do que
parece exigir a decisão sumária reclamada de 25.9.2006 (1ºs parágrafos das
folhas 900 e 906), não teria o recorrente que, prevenindo a omissão, aliás
inesperada, do Supremo Tribunal de Justiça, assacar, antes (no requerimento de
interposição do recurso e nas alegações) desse acórdão do Supremo Tribunal de
Justiça de 6.4.2006, a interpretação de normas que aí viesse a ser feita, o
vício de inconstitucionalidade. Deve salientar-se que na parte IV das alegações
(página 69), logo o recorrente defendeu, citando as normas que isso justificam,
que o Supremo Tribunal de Justiça havia de declarar ou, caso assim não se
entendesse, de condenar o Conselho Superior da Magistratura a declarar, extinto
o procedimento disciplinar relativo ao período entre 23 de Setembro de 1996 e 20
de Março de 2000, como pedido na acção administrativa especial.
Como já dissemos no requerimento de interposição deste recurso de
inconstitucionalidade, as normas cuja inconstitucionalidade, na interpretação
dada pelo Supremo Tribunal de Justiça, o recorrente pretende que o Tribunal
Constitucional aprecie são: os artigos 2º, nºs 1 e 2, a), c) e d) e i), 71º, nºs
1 e 2 e 95º, nºs 1, 2 e 3 do Código de Processo nos Tribunais Administrativos
(aprovado pelo artigo 1º da Lei n.º 15/ 2002, de 22.2 e alterado pela Lei n.º
4-A/2003, de 19.2), 668º, n.º 1, d), 1ª parte, e 158º, n.º 1, do Código de
Processo Civil, aplicáveis por força dos artigos 178º do Estatuto dos
Magistrados Judiciais (Lei nº 21/85, de 30.7, com as alterações que lhe foram
feitas, designadamente, pela Lei nº 143/99, de 31.8), 1º, 191º e 192º do mesmo
Código de Processo nos Tribunais Administrativos. No mesmo requerimento
especificámos quais os segmentos dos artigos 202º, n.º 2,205º, n.º 1 e 268º, n.º
4 da Constituição da República Portuguesa violados e sublinhámos que foi
especialmente violado, salvo o devido respeito, o princípio da tutela
jurisdicional efectiva. E isto por, em síntese, o Supremo Tribunal de Justiça
não ter conhecido de causas de invalidade do acto administrativo recorrido,
considerando prejudicado, sem fundamentação, o seu conhecimento.
Devemos salientar a especificidade da questão de inconstitucionalidade em
causa. Houve, salvo o devido respeito, falta de aplicação dessas normas e falta
de fundamentação dessa omissão; essas normas foram absolutamente inconsideradas
pelo Supremo Tribunal de Justiça.
2. A suscitação prévia da questão de inconstitucionalidade.
Em rigor, só surgindo a questão de constitucionalidade com a prolação do
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.4.2006, poderia defender-se que a
suscitação dela só teria que ter lugar no requerimento de interposição deste
recurso para o Tribunal Constitucional (Ex.mo Sr. Professor Jorge Miranda,
‘Manual de Direito Constitucional’, tomo II, ‘Constituição e
Inconstitucionalidade’, 3 edição, 1991, Coimbra, Coimbra Editora, página 449).
Mas o recorrente suscitou a questão de inconstitucionalidade que está aqui em
causa na reclamação ao referido acórdão de 6.4.2006, arguindo nulidades por
omissão de pronúncia.
O cumprimento do ónus de suscitação da questão de constitucionalidade –
artigos 280º, n.º 1, a) e 4 da Constituição da República Portuguesa, 70º, n.º 1,
b) e 72º, n.º 2 da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional –, basta-se ‘com a produção de afirmações das quais se
deduza que o recorrente imputa a inconstitucionalidade’ ‘a certa norma’ – Ex.ma
Sr.ª Dr.ª Isabel Alexandre, ‘A norma ou princípio constitucional ou legal
violado como elemento do objecto dos recursos de fiscalização concreta da
constitucionalidade ou da legalidade’, inserto em ‘Jurisprudência
Constitucional’, n.º 6, página 40. Ou a certa interpretação de normas, ou, como
é, em rigor, o caso, a desaplicação delas.
‘O que interessa, na verdade, é que o tribunal recorrido se tenha podido
aperceber da necessidade de resolução de uma questão de inconstitucionalidade ou
de ilegalidade’ (mesma página 40).
Na reclamação ao acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 6.4.2006, com
arguição de nulidades, designadamente nas suas páginas 4 a 6, está, salvo o
devido respeito, colocada a questão de inconstitucionalidade ‘de modo
processualmente adequado’ – artigo 72º, n.º 2 da Lei Orgânica sobre Organização,
Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional –, havendo que atender à
aludida especificidade de que está em causa a falta de aplicação e a
desconsideração de normas. Salientamos as seguintes palavras (apesar de
transcritas na decisão sumária, a folhas 900), escrevendo agora algumas em
negrito:
– ‘Todas estas questões ficaram por tratar e o seu conhecimento não está,
salvo o devido respeito, prejudicado pela procedência do fundamento reconhecido
por Vossas Excelências. Aliás, salvo o devido respeito, falta no acórdão de
6.4.2006 a fundamentação da afirmação (último parágrafo da página 5) de que o
conhecimento daquelas questões ficava prejudicado - artigos 205°, n.º 1 da
Constituição da República Portuguesa e 158°, n.º 1 do Código de Processo Civil’.
– É que esse Venerando Supremo Tribunal deverá pronunciar-se sobre a ‘a
pretensão material do interessado’ - artigos 66º, n.º 2 e 71º, n.º 1 do mesmo
Código de Processo nos Tribunais Administrativos, devidamente adaptados.
Está em causa o princípio da tutela jurisdicional efectiva. Salvo o devido
respeito, a falta de pronúncia sobre as apontadas questões que Vossas
Excelências deveriam ter apreciado, desrespeita esse princípio, assim como as
normas que a seguir trancreveremos, sendo as do Código de Processo nos Tribunais
Administrativos aplicáveis por força dos referidos artigos 1º, 191º, 192º desse
Código e 178º do Estatuto dos Magistrados Judiciais’.
E as primeiras normas aí transcritas são os artigos 202º, n.º 2 e 268º, n.º 4
da Constituição da República Portuguesa.
O Supremo Tribunal de Justiça soube, pois, que tinha uma determinada questão de
inconstitucionalidade para decidir, aquela que está em causa neste recurso.
Sucede é que a interpretação das normas, ou melhor, a falta de aplicação e a
desconsideração delas, integradas nos acórdãos do Supremo Tribunal de Justiça,
constituem a própria ofensa às normas e princípio constitucionais.
3. Recusa de aplicação de normas.
Ainda que não se entenda como acabamos de expor, considerando sempre a
especificidade da situação em causa – não aplicação e até desconsideração de
normas, não estando expressa qualquer interpretação delas por parte do Supremo
Tribunal de Justiça –, não devendo deixar-se desprotegidas as situações mais
graves, o recurso de inconstitucionalidade deverá ser admitido ao abrigo dos
artigos 280º, n.º 1, a) da Constituição da República Portuguesa e 70º, n.º 1, a)
da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal
Constitucional. Tal modalidade de recurso não está sujeito ao requisito de
suscitação prévia perante o Tribunal recorrido (artigos 280º, n.º 4 da
Constituição e 72°, n.º 2 daquela Lei Orgânica, ambos ‘a contrario’).
Embora o Supremo Tribunal de Justiça não tenha expressamente declarado a
recusa da aplicação das normas em causa com fundamento na sua
inconstitucionalidade (e por isso não invocámos a alínea a) do n.º 1 do artigo
70º daquela Lei Orgânica no requerimento de interposição deste recurso) – não
tratou sequer da questão da sua aplicação –, conforme ensina o Ex.mo Sr.
Professor Jorge Miranda, na página 374 do referido ‘Manual de Direito
Constitucional’, tomo II, ‘Introdução à Teoria da Constituição’, 2ª edição,
1983, Coimbra, Coimbra Editora, ‘a recusa de aplicação relevante não tem de ser
apenas a expressa, pode ser a simples recusa implícita, como se ‘verifica quando
a decisão do tribunal extrai consequências correspondentes à declaração de
inconstitucionalidade ou de ilegalidade’. Na 3ª edição (de 1991) do mesmo tomo
II, com o subtítulo ‘Constituição e Inconstitucionalidade’, diz na página 443 o
mesmo Ex.mo Sr. Professor que recusa de aplicação relevante não tem de ser
sempre expressa; pode ser a recusa implícita, como ocorre quando a decisão do
tribunal extrai consequências correspondentes ao julgamento da norma como
inconstitucional ou ilegal’.
Em ambas as edições desse tomo II, em notas de rodapé cita acórdãos nesse
sentido da Comissão Constitucional (de 19.1.1982 e de 31.3.1982, publicados no
Boletim do Ministério da Justiça n.º 317, a páginas 98 e 103, respectivamente).
Devemos salientar que, embora isso não vincule o Tribunal Constitucional –
artigo 76º, n.º 3 da Lei Orgânica sobre Organização, Funcionamento e Processo do
Tribunal Constitucional –, o Supremo Tribunal de Justiça admitiu este recurso; e
isto, no caso, parece ser significativo.
Mas devemos, sobretudo, pôr em relevo que, conforme explicámos, deverá ser
conhecido integralmente o objecto deste recurso, por haver, mais que
interpretação inconstitucional de normas, inconstitucional desaplicação e até
desconsideração de normas, em violação designadamente do princípio da tutela
jurisdicional efectiva – artigo 78º-A, nºs 3,4 e 5 da mesma Lei.
Pelo exposto, Excelentíssimos Senhores Juízes do Tribunal
Constitucional requer o recorrente que se julgue procedente esta reclamação, se
substitua a decisão sumária de 25 de Setembro de 2006, se conheça do objecto
deste recurso, que, como se disse no requerimento de interposição, seja este
recurso julgado procedente, por o Supremo Tribunal de Justiça ter feito, salvo o
devido respeito, interpretação inconstitucional de normas, conducente mesmo à
não aplicação e desconsideração delas nos acórdãos de 6 de Abril de 2006 e de 25
de Maio de 2006, e que seja mandado reformar esses acórdãos em conformidade com
o julgamento de Vossas Excelências sobre as questões de inconstitucionalidade.”
Ouvido sobre a reclamação, o Conselho Superior da
Magistratura pronunciou-se no sentido de, “face ao teor da argumentação” exarada
na decisão impugnada, nada ter “a acrescentar ao aí expendido”.
Cumpre decidir.
2. A reclamação ora sub iudicio não abala minimamente a
decisão em apreço.
Na verdade, tal como naquela peça processual se disse,
aquando do recurso contencioso interposto par o Supremo Tribunal de Justiça da
deliberação tomada pelo Conselho Superior da Magistratura, o então impugnante
não imputou a quaisquer normas do ordenamento jurídico infra-constitucional (e
ainda que esses normativos fossem alcançados por efeito de um processo
interpretativo incidente sobre determinados preceitos daquele ordenamento) a
enfermidade consistente numa contraditoriedade com o Diploma Básico.
O que brandiu na impugnação então em causa foi que a actuação
da entidade recorrida teria, ela mesma, na sua óptica, sido feridente da
Constituição.
Por muito que se leia e «releia» o petitório do recurso e a
alegação nele produzida, não se lobriga qualquer asserção de onde decorra que a
norma ou as normas que serviram de suporte jurídico ao decidido pelo Conselho
Superior da Magistratura padeciam do vício de desarmonia constitucional.
Desta sorte, uma só conclusão se impõe, qual seja,
justamente, a de a questão ou as questões de inconstitucionalidade suscitadas no
recurso contencioso se reportar ou se reportarem, não a normativos ordinários,
mas sim ao acto administrativo então impugnado.
Simplesmente, como se disse da decisão reclamada, o objecto
dos recursos de fiscalização concreta da constitucionalidade têm por objecto
normas jurídicas e não outros actos emanados do poder público, tais como, por
exemplo, os actos (administrativos) praticados pelas entidades públicas. Poderão
estes, se enfermarem de contraditoriedade com a Constituição, ser objecto de
impugnação, precisamente com fundamento nessa contraditoriedade; mas se, nessa
impugnação, a aludida contraditoriedade não for direccionada aos normativos à
sombra dos quais os actos administrativos foram praticados, não poderá ser
aberta a via de recurso de constitucionalidade a que alude a alínea b) do nº 1
do artº 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, após o proferimento da decisão
judicial que incidiu sobre o recurso contencioso. E isto porque constitui
pressuposto desta espécie de impugnação o ónus de, precedentemente à prolação
daquela decisão, se suscitar a questão de inconstitucionalidade normativa que,
posteriormente, se intenta ser apreciada pelo Tribunal Constitucional.
Sublinhe-se que, se, aquando de uma dada impugnação perante
os tribunais das várias ordens, se esgrime com o argumento segundo o qual as
decisões judiciais deveriam ser proferidas de um outro modo, porque, sendo-o da
forma como o foram, violaram determinados preceitos ordinários e, do mesmo
passo, a Lei Fundamental, isso não pode deixar de significar que o vício de
enfermidade constitucional é dirigido à decisão impugnada, e não às normas
ordinárias que também se têm por violadas.
Efectivamente, como disse este Tribunal por várias vezes, “se
se utiliza uma argumentação consubstanciada em vincar que foi violado um dado
preceito legal ordinário e, simultaneamente, violadas normas ou princípios
constitucionais, tem-se por certo que a questão de desarmonia constitucional é
imputada à decisão judicial, enquanto subsunção dos factos ao direito, e não ao
ordenamento jurídico infra-constitucional que se tem por violado com essa
decisão, pois que se posta como contraditório sustentar-se que há violação desse
ordenamento e este é desconforme com o Diploma Básico. Efectivamente, se um
preceito da lei ordinária é inconstitucional, não deverão os tribunais acatá-lo,
pelo que esgrimir com a violação desse preceito, representa uma óptica de acordo
com a qual ele se mostra consonante com a Constituição” (cfr., a título
exemplificativo, Acórdãos números 489/2004, 128/2005 e 710/2005, disponíveis em
www.tribunalconstitucional.pt).
Pelo que tange ao fundamento utilizado na reclamação e de
acordo com o qual a “questão de inconstitucionalidade objecto deste recurso só
surgiu com a prolação do acórdão do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de
6.4.2006, por ter havido, salvo o devido respeito, omissão injustificada de
pronúncia sobre vícios que o recorrente atribuiu ao acto administrativo
recorrido”, é também por demais evidente que, mesmo atendendo ao que foi escrito
no requerimento corporizador da arguição de nulidade assacada a esse aresto, não
foi imputada a qualquer normativo o vício de incompatibilidade com a
Constituição. Aí, até vincadamente, o que foi sustentado foi que o acórdão
arguido de nulo, pelos motivos que, na visão do arguente, se deparariam, teria,
ele mesmo, violado o princípio da tutela jurisdicional efectiva.
Finalmente, no que se prende com a alegada “Recusa de
aplicação de normas”, é de evidência que o acórdão desejado impugnar perante
este órgão de administração de justiça não recusou a aplicação de qualquer
normativo, seja implícita, seja explicitamente, com esteio na sua
desconformidade constitucional, motivo pelo qual nunca o recurso poderia ser
baseado na alínea a) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82.
Em face do exposto, indefere-se a vertente reclamação,
condenando-se o impugnante nas custas processuais, fixando-se a taxa de justiça
em vinte unidades de conta.
Lisboa, 31 de Outubro de 2006
Bravo Serra
Gil Galvão
Artur Maurício