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Processo nº 747/2005
3ª Secção.
Relator: Conselheiro Bravo Serra
(Conselheira Maria dos Prazeres Couceiro Pizarro Beleza)
1. Na acção declarativa com processo comum emergente de
contrato individual de trabalho a que foi dado o valor de € 3.740,993, acção
essa que A. propôs no 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa contra B.,
S.A., foi, a dada altura, junto aos autos requerimento formulado pelos autor e
ré e por via do qual intentavam pôr termo ao litígio mediante transacção,
estipulando-se, no que agora interessa “custas em dívida a juízo serão
suportadas em partes iguais pelo Autor e pela Ré”.
Em 9 de Fevereiro de 2005 foi, pela Juíza daquele Juízo,
proferida decisão que homologou a transacção efectuada e determinou a condenação
das “partes a cumpri-la nos seus precisos termos”.
Remetidos os autos à conta e elaborada esta, da mesma
reclamou o autor, sendo, por despacho de 14 de Junho de 2005, determinada a sua
reforma.
Nesse despacho, foi dito, no que ora releva, disse: –
“(…)
Analisando e decidindo.
Diz o artº 13° nº 2 do CCJ vigente que ‘a taxa de justiça do processo
corresponde ao somatório das taxas de justiça inicial e subsequente de cada
parte.’
Ora para se compreender este preceito legal e o espírito subjacente ao novo
CCJ é preciso recorrer ao Exórdio do DL nº 324/2003 de 27-12 o qual diz, entre
outras, o seguinte:
Nº 3, 2° parágrafo:
‘é adoptada uma tabela mais perceptível e abrangente, caracterizada pela
redução do número de escalões relevantes para efeitos de determinação da taxa de
justiça do processo. Paralelamente, com a adopção de uma tabela única – por
contra posição às duas tabelas (a da taxa de justiça final e a dos pagamentos
prévios) actualmente existentes –, restabelece-se a coincidência entre os
montantes da taxa de justiça inicial e subsequente pagas durante o processo e a
taxa de justiça global devida a final.’
Nº 3, 4° parágrafo:
‘De igual forma, põe-se termo à multiplicidade de reduções de taxa de Justiça
existente, consagrando-se, como regra geral, um único grau de redução da taxa de
justiça (redução a metade) a operar mediante dispensa do pagamento da taxa de
Justiça subsequente (...)’
Nº 4, 1º, 2° e 3° parágrafos:
‘Por força das modificações operadas, e tendo presente os objectivos visados,
a tabela da taxa de Justiça do processo sofre uma profunda revisão. Introduz-se
um novo conceito – o de taxa de justiça de parte – a partir do qual se obtém o
valor da taxa de justiça do processo, correspondendo este último ao somatório
das taxas de Justiça inicial e subsequente de cada uma das partes. (...)
No entanto, e porque o conceito de parte é distinto do de sujeito processual,
consagra-se a regra de que, em caso de pluralidade activa ou passiva, o
respectivo conjunto de sujeitos processuais é considerado, para efeitos de
cálculo da taxa de justiça, como um[a] única parte. Por essa mesma razão, e de
forma a evitar pagamentos em excesso e as consequentes devoluções, consagra-se a
regra da dispensa do pagamento de taxa de justiça subsequente, designadamente
nos casos em que a taxa de justiça inicial paga pelos sujeitos processuais se
revele suficiente para assegurar o pagamento da totalidade da respectiva taxa de
justiça de parte.
No entanto, sempre que, quer neste, quer noutros casos, exista dispensa do
pagamento prévio de taxa de justiça, caberá à parte vencida suportar, a final e
na medida do seu decaimento, a totalidade da taxa de justiça do processo, ou
seja, a sua taxa de justiça de parte e a taxa de justiça da parte contra quem
litigou.’[1]
É com base neste último parágrafo acabado de citar que o respectivo programa
informática fora, ao que nos é dado compreender, elaborado.
O sistema informático ‘pega’ no valor depositado nos autos, e ignorando se o
mesmo fora depositado por uma ou ambas as partes, assume esse valor e divide-o,
no caso de uma transacção, ao meio, imputando metade a cada parte.
O que significa que, tendo o A. pago a totalidade da taxa de justiça da sua
responsabilidade, o sistema assume que tenha pago apenas metade, imputando-lhe o
pagamento da outra metade, que foi o que claramente ocorreu nos presentes autos.
Neste sentido, e em termos técnicos, a conta não foi incorrectamente
elaborada pelo Exmº Sr. Escrivão da secção que se limitou a cumprir
escrupulosamente a elaboração da conta, tendo introduzido correctamente todos os
dados os quais foram processados pelo respectivo programa informático.
É o sistema informático que assume o pagamento da taxa de justiça pelo A.
como sendo a taxa de justiça do processo e o divide, imputando automaticamente
metade na esfera da Ré que, em boa verdade, nada pagou.
Mas, em última análise, o sistema informático não pode ser directamente
responsabilizado uma vez que ele fora criado para seguir a lei.
Assim, em nosso modesto entendimento, o problema reside com a lei.
Afigur[a]-se-nos óbvio e de elementar bom senso que a norma em apreço, e em
especial, o parágrafo 3° do nº 4 do exórdio do DL nº 324/2003, é manifestamente
injusto e mesmo, em nosso modesto entendimento e salvo o devido respeito,
imoral.
Com a preocupação de simplificar ao máximo o processamento das custas de modo
a, como se diz no próprio exórdio, tomar mais acessível ‘a matéria de custas
judiciais (que) está actualmente regulada de forma complexa, sendo reconhecida a
sua difícil acessibilidade à generalidade dos cidadãos, bem como grande maioria
dos operadores judiciais, com evidentes prejuízos para todos os
interessados’[2], o legislador acabou por criar, ao arrepio dos mais elementares
princípios de justiça, boa fé e bom senso, um sistema profundamente injusto,
apto a criar desigualdades no tratamento das partes processuais.
É certo que o artº 8° do Código Civil diz que ‘o dever de obediência à lei
não pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do
preceito legislativo’[3]
No entanto, apesar de, em nosso modesto entendimento, a supra citada norma
ser de questionável conformidade com a Constituição da República Portuguesa
(CRP), a qual ainda é a lei máxima do País e, portanto, prevalece sobre as
restantes (artºs 204° e 277° do CRP) ela não traduz a plenitude da ciência
jurídica ou seja, do Direito.
E, assim, conforme refere Menezes Cordeiro[4] ‘o controlo, com referência a
critérios superiores, das normas legisladas, imperfeitas porque humanas, é tão
velho como o Direito. (…) A lei não se confunde com o Direito. Uma dogmática
jurídica, radicada na cultura que a suporte e na segurança das convicções
científicas dos juristas que a sirvam, coloca, entre a fonte e a solução do caso
concreto, um percurso que nenhuma lei pode dispensar e que o legislador não pode
corromper. Reside aqui, o «Direito natural» dos finais do nosso século: suprindo
a inactividade legislativa, harmonizando as soluções desavindas ou disfuncionais
dentro do espaço jurídico, complementando as mensagens apenas esboçadas pelo
legislador e limando, no concreto, as saídas injustas, inconvenientes ou
paradoxais, a Ciência do Direito afirma-se (…) o motor fundamental de qualquer
evolução jurídica.’
Ora, aplicando a ciência de direito em toda a sua plenitude, e considerando
os princípios consagrados na mais alta lei na Nação, constata-se, em nosso
modesto entendimento, que os princípios orientadores do novo CCJ, nos quais
assentam o sistema informático, que produziu as contas de fls.77 a 79, são, para
além de injustos e imorais, manifestamente inconstitucionais, porquanto violam
um dos mais básicos e essenciais princípios do nosso direito: o princípio da
igualdade, plasmado no artº 13° da CRP.
Se o A. já pagou ‘à cabeça’ a taxa de justiça que é de sua responsabilidade
porque motivo é responsabilizado por uma dívida da outra parte que nada pagou,
acabando, desta forma por ser tratado de forma igual perante uma situação
desigual.
Ou se preferirem, o A, é tratado de forma desigual em relação à Ré quando não
há motivos objectivos ou sequer legais que permitam essa distinção.
Porque motivo deve a Ré pagar menos do que o A. se as custas são suportadas
em partes iguais?
Aonde está a igualdade das custas conforme acordado e homologado por
sentença?
Repare-se que o sistema de cálculo da taxa de justiça da responsabilidade das
partes processuais do novo CCJ, ao fim e ao cabo, permite a violação da sentença
homologatória pois não respeita o que ficou decidido: custas em partes iguais.
Pelo que se nos afigure que o sistema em si mesmo é duplamente ilegal,
porquanto acaba por violar outras normas jurídicas, para além das
constitucionais.
E ao transferir o ónus de recuperar as custas de parte – entenda-se a taxa de
justiça que era da responsabilidade do outro e que o A. pagou – precisamente
para a parte processual que as pagou, com o intuito de ‘simplificar’ a conta não
é, em nosso modesto entendimento, uma solução adequada aos princípios
constitucionais pelos mesmos motivos: onera uma das partes de forma desigual.
Aliás, conforme manda o artº 9° do Código Civil a interpretação de qualquer
norma tem de fazer-se com respeito pela letra da mesma, mas principalmente
através de elementos históricos, teleológicos e sistemáticos.
Em termos históricos não se encontra qualquer fundamento para o tratamento
desigual das partes nas custas.
Havendo acordo quanto à responsabilidade das mesmas, a conta era pura e
simplesmente dividida ao meio imputando-se a cada parte a sua respectiva
responsabilidade, abatendo-se o que já pudesse ter sido depositado nos autos.
Aliás, no referido exórdio, é assumido pelo legislador que o conceito
subjacente ao CCJ, e principalmente à taxa de justiça, é completamente novo,
resultando o novo CCJ de ‘uma profunda, mas ponderada (?), revisão’[5]
Pelo que, historicamente, não temos qualquer base para a solução ora
propugnada pelo legislador.
Em termos teleológicos, também, se regista uma total ausência de elementos
aptos a justificar a orientação do actual CCJ.
Os elementos teleológicos traduzem a ratio da norma ou do sistema legal onde
uma série de normas se inserem.
Ora, em nosso modesto entendimento, e salvo o devido respeito, não há uma
qualquer razão lógica, um fundamento científico, social, económico, cultural ou
outro que possa explicar a dupla imputação de taxa de justiça, num fundo uma
dupla tributação, em desfavor de uma das partes enquanto se beneficia a outra.
Qual o motivo que possa levar a que se impute ao A., que tenha pago a sua
taxa de justiça por completo, o pagamento da taxa de justiça da outra parte, que
nada pagou, fundamentando essa acção com uma aparente, e artificial, falta de
pagamento da taxa de justiça do processo, da total responsabilidade da Ré?
Se o sistema pode assumir um valor a favor da Ré porque não o assume a favor
do A.?
Não há um único argumento lógico e são que nos leve a concluir que, só
através do pagamento por uma das partes da taxa de justiça, que é da sua
responsabilidade, e da taxa de justiça da parte contrária, é que se consegue
assegurar um sistema eficaz e célere das custas.
Antes, pelo contrário: se uma das partes já liquidou a totalidade das custas
da sua responsabilidade apenas há que exigir o pagamento à outra parte, a qual,
se não pagar voluntariamente, implicará uma única execução; o que, em termos de
esforços processuais, tempo e dinheiro é mais vantajoso do que duas execuções
por custas.
Por fim, também através de uma interpretação sistemática não se vislumbra a
justeza e correição da norma em referência.
Vejamos.
Estamos no âmbito do direito laboral onde a esmagadora maioria de acções
declarativas de condenação são propostas pelo trabalhador.
No direito laboral substantivo existe o princípio basilar e orientador do
tratamento mais favorável do trabalhador, o qual, inclusive, pode socorrer-se do
patrocínio gratuito e qualificado do Ministério Público.
Como, então, se justifica onerar precisamente a parte mais fraca, esse
trabalhador, no momento das custas, deixando entrar pela janela o que o
legislador laboral não quis que entrasse pela porta?
Pois, sendo a esmagadora maioria das acções propostas por trabalhadores, e
sendo que a taxa de justiça é por estes logo paga, havendo um acordo na
audiência de partes ou antes da junção aos autos da respectiva contestação, como
tanta vezes acontece, o processo vai à conta com apenas uma única taxa de
justiça depositada nos autos: precisamente a taxa de justiça do trabalhador.
Pegar nessa taxa de justiça e ficcionar um pagamento de metade pela Ré é não
só defraudar o trabalhador, e todo e qualquer cidadão no mesmo lugar, como é
violar um dos princípios mais basilares do direito laboral substancial.
Sendo, inclusive, altamente nocivo para a promoção de acordos pois, uma vez
que os trabalhadores começarem a compreender como o novo sistema de custas
funciona, não vão, de certeza, fazer um acordo, ou, pelo menos, não o farão
enquanto o processo não estiver mais adiantado e já com uma taxa de justiça paga
pela Ré.
Tudo isto levando a um maior esforço por parte do Tribunal que vê, assim,
menos processos a terminarem com acordos e, menos processos a terminarem com
acordos logo no início do processamento[6].
O que até gera uma situação paradoxal pois, por um lado, premeia-se o acordo
com a redução da taxa de justiça mas, por outro lado, onera-se injustamente uma
das partes que acaba por pagar a taxa de justiça na totalidade.
Em flagrante violação do princípio da igualdade.
Assim, constatando-se a existência de norma inconstitucional, e no caso em
apreço, materialmente inconstitucional, deve o juiz recusar a aplicação da
respectiva norma (artºs 277° e 280° CRP).
No entanto, embora de momento, e enquanto o programa informático não for
alterado, não é possível reformar a conta nem recompilá-la.
Todavia, recusa-se a aplicação dos princípios constantes do DL nº 324/2004
por manifestamente inconstitucionais e, assim, dando razão ao A. e deferindo à
douta reclamação, determina-se a inexigibilidade da parte das custas que não são
da responsabilidade do mesmo.
Assim tendo o A. pago já a totalidade da taxa de justiça da
sua responsabilidade, no valor de € 44,50, e considerando que pagou, até a mais,
deve considerar-se incluída em tal verba o valor referente à sua quota-parte de
procuradoria, no valor de € 8,90, pelo que nada mais lhe é exigido.
(…)”
Do despacho de que parte se encontra extractada recorreu para
o Tribunal Constitucional a Representante do Ministério Público junta daquele
Tribunal do Trabalho, o que fez mediante requerimento em que escreveu: –
“A Magistrada do Ministério Público junto deste Juízo e
secção, vem nos autos em epígrafe, interpor recurso para o Tribunal
Constitucional do douto despacho que incidiu sobre a reclamação da conta de
07/04/2005 proferido no processo supra referenciado, o que faz por dever de
of[í]cio e por ter legitimidade – artº 280º, nº 1 alínea a), nº 3 e 6 da
Constituição da República portuguesa e artº 70º, nº 1 alínea a), 71º, e 72º, nº
1 alínea a) e nº 3, ambos da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro.
O recurso é tempestivo e admissível e à tramitação do mesmo
são subsidiariamente aplicáveis as normas do Código de processo Civil.
A douta decisão proferida recusou a aplicação do artº 13º nº
2 do C.Custas Judiciais atento o disposto no Exórdio do Dec, Lei nº 324/2003 de
27/12, mais precisamente o nº 3 e 4 parágrafos, com o fundamento da sua
inconstitucionalidade. Pretende-se que o tribunal constitucional
aprecia a constitucionalidade de tal norma.”
Por despacho de 5 de Julho de 2005 da aludida Juíza, foi o
recurso admitido, vindo os autos a ser remetidos ao Tribunal Constitucional.
Em 13 de Fevereiro de 2006, neste órgão de administração de
justiça, a após ter sido determinada a feitura de alegações, a primitiva
Conselheira Relatora exarou o seguinte despacho: –
“Sendo plausível a aplicação, ao caso dos autos, do regime
constante do n.º 1 do artigo 66º da Lei n.º 60-A/2005, de 30 de Dezembro, e
tendo em conta as eventuais repercussões quanto ao conhecimento do recurso de
constitucionalidade pendente neste Tribunal, remeta os autos à primeira
instância, a título devolutiva, para os devidos efeitos”
No 1º Juízo do Tribunal do Trabalho de Lisboa, foi o processo
«continuado com vista» ao Ministério Público, que exarou promoção no sentido de
ser “aplicável ao caso em apreço o disposto no nº 1 do art. 66 da Lei 60-A/2005
(Orçamento do Estado) razão porque o reclamante da conta está dispensado do
pagamento das custas, subsistindo no entanto salvo o devido respeito por melhor
opinião, a questão suscitada de eventual inconstitucionalidade de uma norma cuja
aplicação foi recusada nestes autos”.
A Juíza daquele Juízo, por despacho de 13 de Março de 2006,
determinou a remessa do processo ao Tribunal Constitucional “a fim de tomar
conhecimento do recurso em apreço ou determinar o que houver por conveniente”.
Para assim decidir, exarou em tal despacho: –
“Salvo o muito devido respeito, em nosso muito
modesto entendimento, [o] recurso em apreço deve ser objecto de análise e
decisão uma vez que a eventual aplicação do artº 66° nº 1 da Lei 60-A/2005 de
30-12 não implica, em nosso ver, a inutilidade superveniente da lide.
Isto porque, e por um lado, nunca esteve em
causa a exigência de pagamento de mais custas face ao nosso despacho alvo de
recurso.
Nem a Digna Magistrada do Mº Pº discordou dessa
decisão na sua essência, tendo apenas e tão só recorrido por tal lhe ser
legalmente imposto, isto é, por o recurso em causa ser obrigatório para o
Ministério Público.
Ou seja, quer se aplique o disposto no artº 66°
nº 1 da referida lei, quer se vá pelo decidido no nosso despacho, ao A. já nada
mais é exigível a nível de custas.
Sendo certo que nos termos do disposto no
referido artº 66° nº 1 nem sequer haveria lugar à elaboração da conta.
Ora, no caso em apreço essa conta foi, de facto,
elaborada, e daí ter surgido a dúvida a nível de custas judiciais que despoletou
toda a questão ora sob análise.
Pelo que, por este motivo, não se vislumbra como
a aplicação do referido artº 66º pode afastar a utilidade da presente lide pois
continua de pé o problema no tocante à elaboração da conta.
Isto por um lado.
Por outro lado – e permitam-nos a seguinte
comparação – o facto de existir uma amnistia não significa que deixa de haver
crime. Ou seja, o facto de ter surgido um instrumento legislativo que visa
descongestionar os tribunais promovendo a desistência, confissão ou acordo nos
processos[7], não significa que questões relativas à inconstitucionalidade de
determinada norma ou corpo de normas, quando declarado pela 1ª instância, não
devam ser analisadas porquanto a declaração de inconstitucionalidade mantém-se e
quem tem legitimidade para dela decidir em termos definitivos e vinculativos é o
Tribunal Constitucional e não a 1ª instância que se limita a emitir um juízo sem
contudo fazer desse juízo jurisprudência obrigatória.
Em terceiro lugar, o nosso despacho ainda não
transitou em julgado e não pode transitar sem que o Tribunal Constitucional se
pronuncie de uma forma ou de outra, rejeitando o nosso juízo de
inconstitucionalidade ou acolhendo-o.
Até porque, nos termos do disposto no artº 666°
nº 1 CPC, aplicável por força do nº 3 do mesmo preceito legal ao nosso despacho,
o nosso poder jurisdicional esgotou-se com a elaboração do mesmo necessitando,
por isso, de transitar o que só depende do Tribunal Constitucional.
Por fim, afigur[a]-se-nos muito modestamente,
que não estamos perante um direito disponível, em que se possa, por aplicação de
uma mera norma de gestão, evitar que se decida de mérito num recurso cuja
interposição foi obrigatória.
É que a Digna Magistrada do Mº Pº não pode
desistir do recurso e por esse mesmo motivo não pode o mesmo cair na inutilidade
sob pena de se subverter as regras que o tomaram obrigatório.
Até porque não se revoga, com a aplicação do artº 66°, nem o
juízo, nem a decisão de inconstitucionalidade por nós emitida, sendo que só ao
Tribunal Constitucional cabe decidir.
(…)”
2. A entidade recorrente rematou a alegação por si formulada
com as seguintes «conclusões»: –
“1º – Constitui interpretação normativa desproporcionada – e, consequentemente,
violadora do princípio do processo equitativo – do conceito de taxa de justiça
do processo, prevista no artigo 13°, nº 2, do Código das Custas Judiciais, a que
se traduz em colocar a cargo da parte – que já liquidou inteiramente a taxa de
justiça por ela devida – a garantia do pagamento de uma parcela da taxa de
justiça que, em termos definitivos, é devida pela parte contrária, com o
consequente ónus de reclamar a respectiva restituição a título de custas de
parte, suportando o risco da possível insolvabilidade do devedor das custas.
2º – Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade
formulado pela decisão recorrida.”
O recorrido não produziu alegação.
Em 12 de Julho de 2006, a primitiva Conselheira Relatora,
considerando a plausibilidade de se não tomar conhecimento do objecto do
recurso, determinou a audição das «partes» para se pronunciarem sobre tal
eventualidade.
A entidade recorrente, na sequência, veio dizer: –
“1 - Como se deu conta na alegação apresentada, é discutível que a solução
acolhida na decisão recorrida pode considerar-se consagrada, numa interpretação
correcta e adequada, na norma desaplicada e que constitui objecto do recurso.
2 - O que é facto, porém, é que a decisão recorrida precipitou efectivamente na
dita norma, constante do nº 2 do artigo 13° do CCJ, os reflexos e consequências
que extraiu dos ‘princípios orientadores’” do novo CCJ, constantes do ‘exórdio
do Decreto-Lei nº 324/03’ (cfr., o afirmado a fls. 68).
3 - Ora, tendo em conta que, conforme jurisprudência uniforme e reiterada, não
compete a este Tribunal Constitucional sindicar a interpretação que os tribunais
judiciais fazem do direito infraconstitucional (salvo na medida em que isso se
revele absolutamente indispensável à dirimição da questão de
inconstitucionalidade normativa suscitada) não parece possível – salvo melhor
opinião – concluir que (bem ou mal) a ‘ratio decidendi’ do despacho recorrido
assentou numa dada interpretação do nº 2 do artigo 13º do CCJ.
4 - Pelo que se afigura estarem preenchidos os pressupostos de admissibilidade
do recurso interposto pelo Ministério Público.
Cumpre decidir.
3. Não se comentará aqui o teor do despacho proferido em 13
de Março de 2006 pela Juíza do Tribunal a quo, à excepção de se vincar que o
despacho do relator a determinar a remessa dos autos a título devolutivo àquele
Tribunal nunca poderia ter por desiderato saber qual a posição da indicada Juíza
sobre a utilidade ou não utilidade do recurso, já que essa questão é exclusiva
da competência do Tribunal Constitucional e, por isso, ultrapassa os poderes
cognitivos do Tribunal recorrido.
Isto significa, pois, que, a entender-se que, com base do que
ficou escrito nota de rodapé 1 daquele despacho, a Juíza do 1º Juízo do Tribunal
do Trabalho de Lisboa não aplicaria ao caso dos autos o que se contem no nº 1 do
artº 66º da Lei nº 60-A/2005, de 30 de Dezembro, então o recurso em apreço não
seria, por essa circunstância, inútil e, tão só com fundamento nesse
entendimento (e não com esteio nas demais considerações carreadas ao despacho de
13 e Março de 2006), se adopta a perspectiva de que a impugnação em causa se não
apresenta, em face disso, como inútil, o que não implica, contudo, que do
objecto dela se venha a tomar conhecimento.
3.1. Como se alcança do relatório acima efectuado, o despacho
agora sob impugnação operou a «recusa» de “aplicação dos princípios constantes
do DL nº 324/2004 por manifestamente inconstitucionais”. E, por muito que se
leia e releia tal despacho, o único ponto em que, no mesmo, se refere um
preceito legal é justamente aquele em que se escreveu: “Diz o artº 13º nº 2 do
CCJ vigente que ‘a taxa de justiça do processo corresponde ao somatório das
taxas de justiça inicial e subsequente de cada parte’.
Por outro lado, no dito despacho não se surpreende uma
qualquer outra asserção da qual decorra, directa e especificamente, a recusa de
aplicação daquele preceito.
É que, mesmo quando nele se diz que “em nosso modesto
entendimento, o problema reside com a lei” e que “Afigur[a]-se-nos óbvio e de
elementar bom sendo que a norma em apreço, e em especial, o parágrafo 3º do nº 4
do exórdio do DL nº 324/2003, é manifestamente injusto e mesmo, em nosso modesto
entender e salvo o devido respeito, imoral”, daí não resulta que se esteja a
fazer uma referência específica ao artº 13º, nº 2, do Código das Custas
Judiciais, já que, segundo a decisão em crise, seria com fundamento no parágrafo
do preâmbulo do diploma que aprovou aquele corpo de leis (e em que é referido
que “No entanto, sempre que, quer neste, quer noutros casos, exista dispensa do
pagamento prévio de taxa de justiça, caberá à parte vencida suportar, a final e
na medida do seu decaimento, a totalidade da taxa de justiça do processo, ou
seja, a sua taxa de justiça de parte e a taxa de justiça da parte contra quem
litigou”) que foi criado o programa informático com base no qual a conta dos
autos fora elaborada, programa esse que «assume que» quem tenha pago a
totalidade da taxa de justiça da sua responsabilidade e verificando-se, a final,
ter sido paga metade da taxa do processo, é imputada a quem já efectuou o
pagamento da taxa de justiça inicial a responsabilidade pelo pagamento da metade
em falta.
Aliás, e como se disse acima, a recusa, com base num juízo de
inconstitucionalidade por si formulado, da Juíza a quo, incidiu somente sobre os
princípios constantes do Decreto-Lei nº 324/2004.
É por demais sabido que o objecto dos recursos visando a
fiscalização concreta da constitucionalidade normativa é constituído por normas
precipitadas no ordenamento jurídico infra-constitucional.
Não obstante o que é dito nos relatórios preambulares dos
diplomas legislativos, e ainda que, no entendimento de uma dada decisão
judicial, o desiderato que aí se colhe se poste como contrário à Lei
Fundamental, para que se possa abrir o recurso de constitucionalidade, haverá
nela de ser realizado um juízo que repouse ou tenha directo reflexo num
determinado preceito desse diploma, preceito esse que, em abstracto, seria
convocável para reger o decidido.
Ora, não foi isso que sucedeu na situação em espécie.
Aduz a entidade impugnante que a decisão em causa “precipitou
na dita norma, constante do nº 2 do artigo 13º do CCJ, os reflexos e
consequências que extraiu dos ‘princípios orientadores’ do novo CCJ, constantes
do ‘exórdio do Decreto-Lei nº 324/03’ – o que, na óptica de tal entidade, se
retiraria do que é escrito naquele despacho a fls. 133 (crê-se que, por lapso se
refere “fls.68”) –, motivo pelo qual a razão do decidido repousou numa dada
interpretação daquele preceito.
Supondo-se que o Ex.mo Representante do Ministério Público se
quer reportar à asserção ínsita nesse despacho que refere “Ora para se
compreender este preceito legal e o espírito subjacente ao novo CCJ é preciso
recorrer ao Exórdio do DL nº 324/2003 de 27-12 o qual diz, entre outras, o
seguinte:”, e sendo certo que este Tribunal tem seguido uma jurisprudência
uniforme e reiterada segundo a qual não compete a ele sindicar a interpretação
que os tribunais das várias ordens fazem do direito ordinário, o que é facto é
que, como se referiu já, não se lobriga naquele despacho o mínimo «rasto» de
intento desaplicativo do preceito em questão, não defluindo, por outra banda,
que seria dele mesmo que se extrairia um sentido interpretativo conducente a uma
solução normativa de onde resultasse que, tendo ocorrido uma transacção
devidamente homologada, em que ficou acordado que as custas seriam suportadas a
meias, e, não tendo uma «parte» procedido ao pagamento da taxa de justiça
inicial (ou das taxas de justiça inicial e subsequentes), recai sobre outra
«parte», que já procedeu ao pagamento daquela taxa (ou daquelas taxas) o encargo
de pagar o restante quantitativo de taxa de justiça do processo que ainda se
encontre por saldar.
Neste contexto, e por não se verificar o pressuposto o
recurso ancorado a alínea a) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82, não se toma
conhecimento do objecto do vertente recurso.
Sem custas por não serem elas devidas.
Lisboa, 31 de Outubro de 2006
Bravo Serra
Gil Galvão
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza (Vencida, nos termos da declaração junta)
Vítor Gomes (Vencido, nos termos da declaração da Ex.ma Cons. Maria dos Prazeres
Beleza, para que remeto)
Artur Maurício
Declaração de voto
1. Votei vencida quanto à decisão de não conhecimento do objecto do recurso
porque considero que o despacho recorrido, devidamente interpretado, reconduz ao
n.º 2 do artigo 13º do Código das Custas Judiciais, na redacção que lhe foi dada
pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, a inconstitucionalidade que o leva a rejeitar o
regime que entende resultar 'dos princípios constantes do DL n.º 324/2003', e
cuja aplicação recusa por serem os mesmos 'manifestamente inconstitucionais'.
É certo que o Ministério Público, quer nas alegações apresentadas no presente
recurso, quer na resposta ao despacho de 12 de Julho de 2006, reconheceu que é
'discutível' que se possa considerar consagrada no n.º 2 do referido artigo 13º
a norma cuja aplicação o despacho recorrido recusou.
É, todavia, igualmente certo que o Tribunal Constitucional não se pode
substituir, nem ao tribunal que proferiu o despacho recorrido, para julgar a
reclamação do ponto de vista do direito ordinário, nem ao recorrente, para
definir o objecto do recurso que interpôs.
Assim, considero que o Tribunal deveria ter conhecido o objecto do presente
recurso, tal como o recorrente o configurou, nos termos constantes do acórdão.
Naturalmente que se não poderia considerar, a não ser para efeitos de
interpretação do regime vigente, o preâmbulo do Decreto-Lei n.º 324/2003; e que
as considerações expendidas no despacho recorrido a propósito do sistema
informático nada têm a ver com o recurso de constitucionalidade.
Julgando o recurso, o Tribunal Constitucional, em meu entender, deveria ter
concluído no sentido de que a norma recusada é inconstitucional, por violação do
princípio da proporcionalidade, enquanto princípio decorrente do Estado de
Direito (artigo 2º da Constituição) e, portanto, imposto, em geral, como limite
à liberdade de conformação do legislador ordinário, como se procurará
demonstrar.
2. Explica-se no preâmbulo do Decreto-Lei n.º 324/2003 que uma das inovações
trazidas com a aprovação do novo Código das Custas Judiciais se traduziu em
eliminar 'a restituição antecipada (independentemente de o vencido proceder ao
pagamento das custas de sua responsabilidade), pelo Cofre Geral dos Tribunais,
da taxa de justiça paga pelo vencedor no decurso da acção' (ponto 5.),
transferindo para o vencedor o ónus de reaver do vencido o que adiantou através
do mecanismo de custas de parte.
Este mecanismo, desenhado pelos artigos 31º, n.º 1, 32º, n.ºs 1 e 2, 33º, n.º 1
e 33º-A do Código das Custas Judiciais, e que começa por se traduzir numa
garantia de que a taxa é efectivamente paga, pode levar a que o vencedor, não
obstante ter ganho a lide, suporte o respectivo custo, por não conseguir o
respectivo pagamento pelo vencido, nem voluntariamente, nem em via de execução.
Diz-se no mesmo preâmbulo que com esta inovação no regime da taxa de justiça se
pretende, 'sem colocar em causa o princípio da tendencial gratuitidade da
justiça para o vencedor', que o 'custo efectivo' do processo 'não opere à custa
da comunidade e do Estado, mas sim de quem deu causa (em sentido amplo) à
acção', bem como 'introduzir um factor de racionalização e moralização no
recurso aos tribunais, desincentivando-o por parte de quem já saiba de antemão
que não irá obter quaisquer benefícios reais com o processo'.
Não vem agora ao caso uma apreciação global deste regime, que aliás se afasta do
'princípio da correspondência entre a responsabilidade pelo pagamento das custas
e o resultado da actividade processual dos sujeitos intervenientes no processo',
desenvolvido no acórdão n.º 303/2001 (Diário da República, II série, de 14 de
Novembro de 2001).
A verdade é que, seja como for, o mesmo regime só vale – só tem sentido, aliás,
e com esta afirmação não vai implícito qualquer juízo de conformidade ou
desconformidade constitucional das normas que o compõem – quando há reembolsos a
fazer, pois que a garantia de pagamento das custas em dívida consegue-se, nesta
lógica, retendo o que foi pago a mais pela parte vencedora e impondo-lhe o ónus
de, pelo mecanismo das custas de parte, o reaver da parte contrária.
De nenhum preceito do Código das Custas Judiciais resulta que, tendo uma das
partes pago a totalidade da quantia que, a título definitivo, lhe incumbiria
pagar, e não tendo a parte contrária pago ainda nada, se deva cobrar a quantia
que a esta última cabe determinando o pagamento de metade por cada uma.
Tal solução seria, aliás, desde logo, contraditória com as razões que levaram à
definição do novo regime.
Em primeiro lugar, porque, não havendo qualquer quantia paga a mais e, portanto,
a reter, não alcançaria o objectivo da garantia.
Em segundo lugar, porque, contrariando a simplificação proclamada igualmente no
preâmbulo do Decreto-Lei n.º 324/2003, conduziria a uma maior complexidade de
regime: em vez de notificar uma parte para pagar a taxa que (exclusivamente) lhe
competia, notificavam-se as duas, cada uma para pagar metade; se a que já pagou
viesse efectivamente adiantar a parte que cabia à outra, haveria depois que
desencadear o mecanismo conducente ao reembolso das custas de parte; se não
viesse, e para além de se tornar necessário julgar uma eventual reclamação da
parte – como sucedeu no caso presente –, ainda se abriria a eventualidade de uma
execução por falta de pagamento… para depois o executado ir reaver da outra
parte o que foi obrigado a desembolsar (?).
3. Como se sabe, o significado e as exigências decorrentes do princípio da
proporcionalidade, enquanto princípio decorrente do Estado de Direito (artigo 2º
da Constituição) e, assim, imposto, em geral, como limite à liberdade de
conformação do legislador ordinário, foi já objecto de inúmeras considerações
pelo Tribunal Constitucional.
Recorrendo, a título de exemplo, ao acórdão n.º 187/2001 (Diário da República,
II série, de 26 de Junho de 2001), cabe recordar que
«o princípio da proporcionalidade, em sentido lato, pode (...) desdobrar-se
analiticamente em três exigências da relação entre as medidas e os fins
prosseguidos: a adequação das medidas aos fins; a necessidade ou exigibilidade
das medidas e a proporcionalidade em sentido estrito, ou “justa medida”. Como se
escreveu no (...) Acórdão n.º 634/93, invocando a doutrina:
'o princípio da proporcionalidade desdobra-se em três subprincípios: princípio
da adequação (as medidas restritivas de direitos, liberdades e garantias devem
revelar-se como um meio para a prossecução dos fins visados, com salvaguarda de
outros direitos ou bens constitucionalmente protegidos); princípio da
exigibilidade (essas medidas restritivas têm de ser exigidas para alcançar os
fins em vista, por o legislador não dispor de outros meios menos restritivos
para alcançar o mesmo desiderato); princípio da justa medida, ou
proporcionalidade em sentido estrito (não poderão adoptar-se medidas excessivas,
desproporcionadas para alcançar os fins pretendidos).'»
Ora a norma em causa não é compatível com nenhuma destas exigências, como
resulta do que se disse atrás: não é adequada a alcançar os objectivos de
garantia e de celeridade do novo regime, não é necessária para o mesmo efeito e
traduz-se na imposição ao autor que já pagou a totalidade da taxa de justiça
que, definitivamente, lhe competia, de um ónus de desembolsar parte do que cabe
ao réu e de, posteriormente, ter de lançar mão das vias previstas para obter o
reembolso.
Seria, portanto, inconstitucional, por infracção do princípio da
proporcionalidade.
4. Chegando a esta conclusão, e porque a norma analisada, bem vistas as coisas,
não decorre do n.º 2 do artigo 13º do Código das Custas Judiciais, entendo que o
Tribunal deveria ter recorrido ao mecanismo previsto no n.º 3 do artigo 80º da
Lei nº 28/82. É que não resulta manifestamente do n.º 2 deste artigo 13º,
interpretado, quer literalmente, quer no contexto de todo o artigo, primeiro, e
de todo o Código, depois, que, quando for aplicado a uma acção que terminou por
transacção, homologada antes de o réu ter procedido ao pagamento da taxa de
justiça inicial, nos termos do disposto nos artigos 22º, 23º e 24º, n.º 1, b),
ambas as partes devam ser notificadas, cada uma, para pagar metade da taxa de
justiça devida pelo réu.
Do n.º 2 do artigo 13º apenas decorre que para se obter o valor da taxa de
justiça do processo se somam as taxas de justiça inicial e subsequente de cada
parte.
Conjugado com o n.º seguinte, resulta ainda que 'parte', neste sentido, é o
autor, ou o réu, ou, em caso de pluralidade activa ou passiva, 'cada conjunto',
globalmente considerado. Assim, e para evitar pagamentos de taxa de justiça que
depois tenham de ser reembolsados, o n.º 2 do artigo 25º do Código prevê que, em
caso de pluralidade activa ou passiva, se o montante pago pela 'parte' se
revelar suficiente para cobrir o valor correspondente à taxa de justiça
subsequente, é dispensado o pagamento deste última.
Resulta ainda do disposto no n.º 1 do artigo 25º que são iguais os valores das
taxas de justiça inicial e subsequente; e da alínea b) do n.º 1 do artigo 14º
que, caso a acção termine'antes de oferecida a oposição', a taxa (do processo)
será reduzida a metade, razão pela qual não é devida a taxa de justiça
subsequente.
Assim sendo, em caso de transacção homologada antes de ser oferecida a
contestação e paga a taxa de justiça inicial do réu, mas, naturalmente, depois
de ter sido paga a taxa de justiça inicial do autor, falta para completar a taxa
de justiça do processo um valor igual ao que o autor já pagou; e, tendo sido
convencionado que as custas são suportadas em partes iguais, esse valor em falta
é da total e definitiva responsabilidade do réu, porque é a taxa de justiça (de
parte) que lhe incumbe suportar.
Nestes termos, fixaria para o n.º 2 do artigo 13º do Código das Custas
Judiciais, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 324/2003, quando
aplicado em caso de transacção homologada antes de o réu ter procedido ao
pagamento da taxa de justiça inicial, a seguinte interpretação:
Em caso de transacção homologada judicialmente antes de o réu ter pago a sua
taxa de justiça inicial, segundo a qual as custas em dívida são suportadas em
partes iguais, tendo o autor suportado integralmente a taxa de justiça que lhe
compete, por ter pago a sua taxa de justiça inicial, deverá o réu ser notificado
para pagar o remanescente da taxa de justiça do processo.
5. Concederia, pois, provimento ao recurso, determinando que o despacho
recorrido fosse reformulado de acordo com a interpretação fixada para o n.º 2 do
artigo 13º do Código das Custas Judiciais, na redacção resultante do artigo 1º
do Decreto-Lei n.º 324/2003 de 27 de Dezembro.
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
[1] Negrito nosso
[2] Nº 3, 1º parágrafo.
[3] Temos sérias dúvidas acerca da constitucionalidade desta norma uma vez que
ela permite, em abstracto, a aplicação de normas que podem lesar direitos
fundamentais constitucionalmente garantidos, como permite, caso viesse a existir
de novo em Portugal um ditador ou grupo dominante, a sujeição dos cidadãos a uma
qualquer lei tirânica criada por aqueles. A mesma norma também está em directa
contradição com a norma que permite a acção directa, a legítima defesa e ainda a
norma prevista no artº 2º d[a] CRP, entre muitas outras.
[4] In Estudos de Direito Civil, I, 1987, p. 236 e ss.
[5] Nº 2, 1º parágrafo.
[6] Pergunta-se, então, aonde fica a tão badalada celeridade processual?
1 E sendo esse o motivo subjacente ao artº 66º o mesmo então nem sequer tem
aplicação ao caso dos autos pois o acordo judicial foi realizado em momento em
que esse incentivo não existia.