Imprimir acórdão
Processo n.º 726/06
3ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. Por decisão proferida no Tribunal Judicial da Comarca de Cantenhede, de 21 de
Novembro de 2005, foi o ora recorrente, A., condenado, juntamente com outra,
pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, na forma continuada, a
uma pena de um ano e três meses de prisão, suspensa na sua aplicação por um
período de quatro anos e meio, na condição de no prazo de suspensão acima
referido os arguidos efectuarem o pagamento ao Estado da prestação tributária em
falta e respectivos acréscimos legais. Na mesma decisão foram os arguidos
absolvidos da prática de um crime de fraude fiscal, na forma continuada, de que
também tinham sido acusados.
2. Notificados dessa decisão, dela recorreram o Ministério Público e o ora
recorrente, tendo este último concluído a sua motivação de recurso da seguinte
forma:
“1 - A sentença de que ora se recorre, violou o artigo 13.° da Lei fundamental
do País - Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio
constitucional da igualdade de tratamento do cidadão perante a Lei.
Na verdade,
Sem justificação bastante, a Meritíssima Juíza “a quo” valorou, deu um
tratamento diferente, aos depoimentos prestados em julgamento pelas testemunhas
de Acusação e aos prestados em julgamento pelas testemunhas de Defesa, apesar de
estes estarem em conformidade com a prova documental junta em sede de
julgamento, pela ora recorrente.
Além disso, nos depoimentos das testemunhas de Acusação, houve discrepâncias e
contradições, enquanto que os da Defesa, foram prestados de uma forma coerente e
somente não mereceram créditos a Meritíssima Juíza “a quo” conforme
expressamente exarado na sentença, por serem empregados da sociedade arguida e
igualmente já terem sido empregados de outras firmas, em que o arguido, ora
recorrente, igualmente trabalhou, motivo este que, com todo o respeito por
melhor opinião, não é suficiente, nem bastante, para que tais depoimentos não
tenham sido considerados isentos e credíveis, e, consequentemente, devidamente
valorados. Tratou as testemunhas com pesos e medidas diferentes.
2 - Na sentença, em referência, violou o disposto no artigo 410.° n.° 2 al. c)
do C.P.Penal - pois, verifica-se erro notório na apreciação da prova. Pois, foi
dado como provado que o arguido, ora recorrente, foi o representante da
sociedade arguida, e responsável de facto pela condução dos destinos da empresa,
nomeadamente pela observância do pagamento do imposto ao Estado, tudo conforme
exarado na sentença a fls. 5 desta sob o n° 5, da sua fundamentação de facto.
Porém,
No decurso das diversas sessões de julgamento, nenhuma prova foi feita, em como
ele fosse o responsável pela observância do pagamento dos impostos ao Estado ou
do cumprimento das demais obrigações fiscais da sociedade arguida.
É verdade que,
Algumas testemunhas afirmaram que ele foi gerente da sociedade arguida, mas
outras testemunhas afirmaram que não e indicaram como gerente da sociedade
arguida outras pessoas, nomeadamente nomeação esta até efectuada pelas próprias
testemunhas de Acusação - os Senhores inspectores da Fiscalização Tributária,
conforme seu relatório junto aos autos. Assim sendo,
Face às contradições, incoerências, dos depoimentos das testemunhas de Acusação
e à coerência dos depoimentos das testemunhas de Defesa prestados em julgamento,
na apreciação e julgamento dos factos no máximo, face à prova produzida e
carreada para os autos deveria ter dúvidas e in dubio pro reo, pelo que o
arguido ora recorrente deveria ter sido Absolvido e não condenado.
Assim, não fazendo,
A Meritíssima Juíza “a quo” além da violação da citada disposição legal, violou
igualmente o já citado principio constitucional que consagra igual tratamento
perante a lei de todos os cidadãos — art.13.° da C.R.Portuguesa, Pois,
Apesar de prova também produzida que o gerente da sociedade arguida não foi o
ora recorrente, mas outro devidamente identificado, quer nos autos, quer em sede
de julgamento, foi o ora recorrente indevidamente considerado. Por, embora,
indevidamente, não terem sido considerados os depoimentos das testemunhas de
defesa, pelo que, além da errada apreciação da prova, também,
3 - A sentença igualmente violou o disposto no art.410.° n° 2 al. a), pois
verifica-se insuficiência para a decisão da matéria de facto dada como provada,
face ao atrás e a seguir referido.
4 - Os montantes dos impostos referidos na sentença, não foram concretamente
determinados em julgamento e, menos quais as importâncias de tais impostos
apropriadas pelo arguido. Pois,
No presente caso para se verificar o crime de Abuso de Confiança Fiscal,
imputado ao arguido, tem obrigatoriamente de haver apropriação por parte deste,
conforme redacção do respectivo preceito legal, à data dos factos em vigor,
artigo 24.° do REGIFNA - conforme mui doutamente decidido em igual sentido pelo
Acórdão da Relação de Coimbra de 27/06/2001, publicado in site wwwdgsi.pt. pg.
Web 1 de 1. Assim,
5 - A sentença também errou na qualificação jurídica dos factos imputados ao
arguido. Os factos imputados ao arguido, ora recorrente, quanto à falta de
cumprimento das obrigações fiscais e entregas dos impostos referidos no mui
douto Despacho de Pronuncia e na própria sentença, não consubstanciam os crimes
de Abuso de Confiança Fiscal, mas, unicamente, ilícitos fiscais contra-
ordenacionais.
6 - A sentença além das disposições legais já atrás citadas, violou ainda os
artigos 23.°, 24.° do REGIFNA e 21.° n.°4 do RGIT. [...]”.
3. O Tribunal da Relação de Coimbra, por acórdão de 14 de Junho de 2006, decidiu
conceder parcial provimento aos recursos do Ministério Público e do ora
recorrente e, no que se refere a este “- condenar o arguido A. pela prática de
um crime de fraude fiscal, sob a forma continuada, p.p. pelo art. 103º, nº 1,
al.b) do RGIT, na pena de 14 meses de prisão e pela prática de um crime de abuso
de confiança fiscal, sob a forma continuada, p.p. pelo art. 105º, nº 1, do RGIT,
na pena de 12 meses de prisão; - operar o cúmulo jurídico destas penas de prisão
e condenar o arguido A. na pena única de 1 (um) ano e 9 (nove) meses de prisão,
suspensa na execução nos termos referidos”.
4. Desta decisão foi interposto o seguinte recurso para este Tribunal:
“[...], não se conformando com a mui douta decisão que lhe foi notificada, vem
dela interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do
nº 1 do art.º 70 da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na sua redacção actual que
lhe foi introduzida pela Lei nº 13 - A/98 de 26 de Fevereiro. Assim, por estar
em tempo, ter legitimidade e a questão de inconstitucionalidade ter sido
suscitada nos supracitados autos, requer a V. Exa. que se digne adquirir o
presente recurso, que tem efeitos suspensivos, a subir nos próprios autos,
seguindo-se os ulteriores trâmites legais”.
5. Na sequência, foi proferida pelo Relator, ao abrigo do disposto no n.º 1 do
artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada
pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não
conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na parte relevante, o seu
teor:
“[...] Cumpre, antes de mais, decidir se pode conhecer-se do objecto do presente
recurso uma vez que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal
Constitucional (cfr. art. 76º, n.º 3 da LTC).
Invoca o recorrente a alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal
Constitucional como norma ao abrigo da qual recorre. O recurso previsto nessa
alínea só pode, contudo, ser interposto “pela parte que haja suscitado a questão
de inconstitucionalidade [...] de modo processualmente adequado perante o
tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a
dela conhecer” (artigo 72°, n.º 2, da LTC). O que, nos presentes autos, é
manifesto que não aconteceu.
Com efeito, compulsados os autos, nomeadamente as vinte e duas folhas da
motivação de recurso para o Tribunal da Relação de Coimbra - única peça para o
efeito relevante -‚ incluindo as sete conclusões, que supra já transcrevemos
integralmente, verifica-se que o recorrente nunca formulou, perante o tribunal
que proferiu a decisão recorrida, como exige o n.º 2 do artigo 72° da Lei do
Tribunal Constitucional, qualquer questão de constitucionalidade normativa
susceptível de integrar o recurso que agora interpôs. Quanto muito, nessa peça
processual, o recorrente terá alegado que a decisão judicial de que então
recorreu padeceria de inconstitucionalidades, nunca imputando estas, porém -
como podia e devia, se pretendia ter aberta uma via de recurso para este
Tribunal -‚ a uma qualquer norma. Para o demonstrar basta recordar aqui o teor
de todas as conclusões em que o recorrente se refere a uma alegada vio1açäo da
Constituição:
“1 - A sentença de que ora se recorre, violou o artigo 13.° da Lei fundamental
do País - Constituição da República Portuguesa, que consagra o princípio
constitucional da igualdade de tratamento do cidadão perante a Lei.
[...]
A Meritíssima Juíza “a quo” além da violação da citada disposição legal, violou
igualmente o já citado principio constitucional que consagra igual tratamento
perante a lei de todos os cidadãos — art.13.° da C.R.Portuguesa, [...]”.
(Sublinhados acrescentados).
Ora, é jurisprudência pacífica e sucessivamente reiterada que, estando em causa
a própria decisão em si mesma considerada, não há lugar ao recurso de
fiscalização concreta de constitucionalidade vigente em Portugal. Assim resulta
do disposto no artigo 280º da Constituição e no artigo 70° da Lei n.º 28/82 e
assim tem sido afirmado pelo Tribunal Constitucional em inúmeras ocasiões.
Por outro lado, não estando, ostensivamente, preenchidos os pressupostos de
admissibilidade do recurso interposto, irrelevante se torna a igualmente
existente falta de preenchimento de todos os requisitos constantes do artigo
75°-A, da Lei do Tribunal Constitucional no próprio requerimento de interposição
do recurso para este Tribunal, estando vedada, por força do principio da
1imitação dos actos processuais, contido no artigo 137° do Código de Processo
Civil - que não considera lícito “realizar no processo actos inúteis” -‚ a
eventual aplicação do disposto no n.º 6 do artigo 75°-A da Lei do Tribunal
Constitucional.
6. Em face do exposto, e sem necessidade de maiores considerações, inteiramente
inúteis no presente contexto, torna-se evidente que se não pode conhecer do
recurso que o recorrente interpôs, por manifesta falta dos seus pressupostos
legais de admissibilidade, nomeadamente por não ter o recorrente suscitado, de
modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão
recorrida, uma questão de constitucionalidade normativa que por este Tribunal
pudesse ser apreciada em recurso.[...]”
6. Notificado desta decisão, veio o recorrente aos autos com o seguinte
requerimento:
“[...], notificado da, aliás, mui douta decisão, nestes proferida, vem mui
respeitosamente requer[er] a sua ACLARAÇAO, porquanto:
Pese, embora o máximo respeito que nos merece a mui douta decisão proferida,
parece-nos que esta, no mínimo é pouco clara e prematura.
Com efeito,
O recorrente, ora Requerente, quando interpôs o seu recurso para este Tribunal
Superior, verifica agora que, não o fez correctamente , uma vez que do seu
requerimento efectuado para o efeito não fez constar 'a indicação da norma ou
princípio constitucional ou legal que considera violado, bem como da peça
processual em que suscitou a questão da inconstitucionalidade ...” tudo conforme
disposto no artigo 75° - A da Lei do Tribunal Constitucional. Porém, Apesar de
tal omissão, o mesmo foi admitido pelo Tribunal da Relação de Coimbra. Ora,
Nos termos do no 6 do citado artigo 75° - A, deveria o Venerando Juiz
Conselheiro Relator deste Tribunal Constitucional ter convidado o recorrente, a
suprir tal falta ou omissão, o que não aconteceu no presente caso. Mas,
Com todo o respeito por melhor opinião, em obediência ao legalmente estabelecido
deveria ter ocorrido, isto é, deveria ter sido convidado o recorrente a indicar
os elementos em falta no seu requerimento interposição de recurso previstos no
artigo 75° da Lei do Tribunal Constitucional de acordo com o estatuído no seu nº
2,5 e 6. E,
Ao contrário, do mui doutamente decidido, se o recorrente, ora Requerente, não
respondesse ao aludido convite, o recurso, conforme igualmente previsto no nº 7
do citado dispositivo legal, deveria de imediato ser considerado deserto.
Pese embora o mui doutamente na decisão aclaranda, sobre a inutilidade de tal
convite, com a devida vénia, discordamos, pois igualmente então tal inutilidade
se verifica 'a contrario' isto é, para quê convidar o recorrente a indicar norma
ou a peça processual em que o recorrente suscitou a questão da
inconstitucionalidade, quando oficiosamente tal, de imediato, se pode verificar
compulsando os .respectivos autos como aliás sucedeu no caso presente.
Assim,
E mais uma vez, com a devida vénia e como sempre com o maior respeito por melhor
opinião, parece-nos que, a, aliás mui douta decisão em análise, além de violar o
legalmente estabelecido quanto ao presente recurso, cerceou o direito que
assistia ao recorrente de suprir a sua alegada omissão no seu requerimento de
interposição de recurso, duma forma, no mínimo, pouco clara, sem uma prévia e
justificada audição do interessado, atento ao disposto nos nºs 2, 5 e 6 do art.º
75° -A da Lei do Tribunal Constitucional.
Razão primordial do presente pedido de ACLARAÇÃO [...]”
7. Após a entrega do requerimento referido em 6., o requerente apresentou novo
requerimento requerendo “a suspensão dos presentes autos, até ao trânsito em
julgado da respectiva sentença a proferir na oposição judicial que deduziu
quanto aos impostos considerados em falta, no processo penal em que é arguido e
que originou os presentes”.
8 Notificado o Ministério Público recorrido, sustentou, em relação ao
requerimento referido em 6. supra, que “o pedido deduzido é manifestamente
improcedente” e que “o reclamante confunde os planos dos pressupostos do
recurso, naturalmente insusceptíveis de suprimento, e dos requisitos formais do
requerimento de interposição”. E, em relação ao requerimento referido em 7., que
o mesmo deverá ser indeferido, já que “a pretensão deduzida carece
manifestamente de fundamento – não existindo a mínima conexão entre a dirimição
do presente recurso de constitucionalidade e a tramitação do processo de
oposição judicial, referido pelo reclamante”.
Cumprindo decidir, foram os presentes autos presentes à Conferência.
II. Fundamentação
9. Notificado da decisão sumária que não tomou conhecimento do objecto do
recurso, veio o recorrente aos autos com um requerimento em que requer
“Aclaração”.
O pedido de aclaração visa, porém, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo
669º do Código de Processo Civil, “o esclarecimento de alguma obscuridade ou
ambiguidade” que a decisão contenha. Ora, não deriva da referida decisão sumária
qualquer motivo para tal incompreensão, já que ela não contém nenhuma
obscuridade ou ambiguidade, sendo claríssima, não só acerca do que nela se
decidiu - “não tomar conhecimento do objecto do recurso” -, mas também em
relação aos motivos pelos quais assim se decidiu - “manifesta falta dos seus
pressupostos legais de admissibilidade, nomeadamente por não ter o recorrente
suscitado, de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a
decisão recorrida, uma questão de constitucionalidade normativa que por este
Tribunal pudesse ser apreciada em recurso”.
E isso mesmo compreendeu perfeitamente o recorrente, como resulta do seu
requerimento. Na verdade, aí, o que o recorrente entende é que “deveria ter sido
convidado [...] a indicar os elementos em falta no seu requerimento interposição
de recurso previstos no artigo 75° da Lei do Tribunal Constitucional de acordo
com o estatuído no seu nº 2 ,5 e 6”, discordando do facto de se ter considerado
inútil um tal convite – “Pese embora o mui doutamente na decisão aclaranda,
sobre a inutilidade de tal convite, com a devida vénia, discordamos [...]”. Ou
seja, o recorrente considera que, ao contrário do decidido, deveria ter sido
convidado a aperfeiçoar o seu requerimento de interposição do recurso, antes de
ser proferida a decisão sumária sobre o mesmo. Ao fazê-lo, porém, o recorrente,
representado que está por profissional do foro, não está, substancialmente, a
formular um pedido de esclarecimento, ainda que eventualmente infundado – pois
nada para ele está incompreendido -, mas antes a contestar, em concreto e
objectivamente, a forma como a decisão sumária foi proferida.
Assim sendo, contudo, como indubitavelmente o é, tal requerimento não pode
deixar de ser entendido, ao contrário do que o recorrente pretende e à
semelhança do que aconteceu, por exemplo, nos acórdãos n.ºs 185/2005, 344/2005,
350/2005 e 479/2005, tirados nesta mesma Conferência (disponíveis na página
Internet do Tribunal, em http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos), como
configurando, materialmente, uma reclamação da decisão sumária, como tal tendo
de ser tratado, ao abrigo do disposto no artigo 78º - A, n.º 3, da Lei do
Tribunal Constitucional (LTC). Vejamos, então, se tem razão.
10. O primeiro requerimento apresentado assenta, por completo, num pressuposto
claramente errado: o de que, no caso concreto, deveria ter havido lugar à
prolação de despacho de aperfeiçoamento, nos termos do n.º 6 do artigo 75º-A da
LTC.
Na verdade, o recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, na
sequência do disposto no n.º 2 do artigo 280º da Constituição, visa submeter à
apreciação do Tribunal Constitucional a apreciação da constitucionalidade de
normas jurídicas e, como resulta expressamente do disposto no n.º 2 do artigo
72º da Lei n.º 28/82, só pode ser interposto pela parte que haja suscitado a
questão de constitucionalidade, de modo processualmente adequado perante o
tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar dela obrigado
a conhecer.
O convite previsto no n.º 6 do artigo 75º-A da LTC, por seu turno, como aliás
ressalta da jurisprudência deste Tribunal, visa permitir que um recorrente de
boa fé, não tendo dado cumprimento, desde logo, como devia, à exigência, contida
no artigo 75º-A da LTC, de indicação dos elementos previstos nos n.ºs 1 a 4 do
mesmo artigo, venha suprir tal falta. Ponto essencial - como facilmente se
compreenderá –, é, contudo, que o suprimento de tal falta seja essencial para
que se possa decidir sobre o conhecimento do recurso, não devendo nem podendo
ser utilizado quando, nos termos do artigo 137º do Código de Processo Civil,
configure um acto inútil.
Ora, como é patente, não é essa a situação dos autos, ao contrário do que o ora
reclamante pretende agora fazer crer. De facto, sendo o recurso interposto ao
abrigo da alínea b) do artigo 70º da LTC, e, ostensivamente, não tendo a parte
suscitado nenhuma questão de constitucionalidade normativa, de modo
processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em
termos de este estar dela obrigado a conhecer, como exige o n.º 2 do artigo 72º
daquela Lei, nunca poderia a resposta a um convite formulado nos termos do n.º 6
do artigo 75º-A da mesma Lei modificar a obrigatória decisão de não conhecimento
do recurso. E, sendo assim, nunca deixaria um tal convite de configurar acto
inútil, legalmente vedado.
Nestas circunstâncias, pelas razões já constantes da decisão reclamada, que
mantém inteira validade, é efectivamente de não conhecer do recurso que o
recorrente pretendeu interpor, carecendo inteiramente de suporte o requerimento
apresentado pelo recorrente e a sua manifestação de inconformismo com o
decidido.
11. Quanto ao segundo requerimento – pedido de suspensão dos presentes autos -,
é manifesta a sua falta de fundamento, uma vez que, não existe qualquer conexão
entre a resolução do presente recurso de constitucionalidade, aliás já objecto
de decisão de não conhecimento, e a tramitação do processo de oposição judicial
que o requerente refere.
III - Decisão
Nestes termos, decide-se desatender a reclamação corporizada no requerimento de
fls. 1560 e 1561 e indeferir o pedido de suspensão dos autos, entretanto
apresentado.
Custas pelo requerente, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 16 de Outubro de 2006
Gil Galvão
Bravo Serra
Artur Maurício