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Processo n.º 669/06
3ª Secção
Relator: Conselheiro Vítor Gomes
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
1. O relator proferiu a seguinte decisão, nos termos do n.º 1 do artigo 78.º-A
da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro:
“1. Por acórdão de 25 de Maio de 2006, o Tribunal dos Conflitos julgou os
tribunais comuns incompetentes em razão da matéria para conhecer de acção em que
os autores (o recorrente e outros) pedem, a título principal, que os Réus sejam
condenados a reconhecer que desapareceu a necessidade que determinou a referida
expropriação e o seu direito à reversão do prédio expropriado e,
consequentemente, que sejam condenados a absterem-se de o alienar, onerar ou
transformar e, a título subsidiário, que se condene os Réus a restituir-lhes o
valor correspondente ao seu enriquecimento e a indemnizá-lo por todos os
prejuízos sofridos em resultado do não reconhecimento dos seus direitos.
O recorrente interpôs recurso deste acórdão para o Tribunal Constitucional,
mediante requerimento do seguinte teor:
“(…) vem, nos termos do disposto nos artºs. 69.º e seguintes da Lei nº 28/82, de
15 de Novembro, na sua redacção actual, interpor recurso para o Tribunal
Constitucional, o qual é interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º
70.º daquele diploma.
O presente recurso fundamenta-se na violação dos artºs. 20.º nº 1, 4 e 5 da
Constituição da República Portuguesa e dos artºs. 66º do CPC e 18º nº 1 da Lei
nº 3/99, de 13 de Janeiro, tal como expressamente suscitada nas alegações do
recurso de agravo em 2ª instância para o Supremo Tribunal de Justiça.”
2. O despacho que, com oposição da recorrida A., admitiu o recurso não vincula
este Tribunal (n.º 3 do artigo 76.º da LTC).
E, embora se verifique que o requerimento de interposição do recurso não
satisfaz as exigências do artigo 75.º-A da LTC designadamente, a de indicar a
norma cuja constitucionalidade (ou ilegalidade por violação de lei de valor
reforçado) se pretende que o Tribunal aprecie, não se justifica convidar o
recorrente a completá-lo (n.º 6 do artigo 75.º-A), porque isso se traduziria num
acto inútil, uma vez que é imediatamente evidente não estão reunidos os
pressupostos para que o Tribunal Constitucional possa conhecer do recurso
interposto.
3. Cabe recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1
do artigo 70.º da LTC das decisões dos demais tribunais que apliquem norma cuja
inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. A colocação da
questão de constitucionalidade de modo processualmente adequado perante o
tribunal que proferiu a decisão em termos de este estar obrigado a dela conhecer
(n.º 2 do artigo 72.º da LTC) constitui, assim, ónus do recorrente.
Ora é manifesto que este ónus não foi cumprido.
A decisão foi proferida em recurso de que o Tribunal de Conflitos conheceu ao
abrigo do n.º 2 do artigo 107.º do Código de Processo Civil (o chamado
pré-conflito), remetido pelo Supremo Tribunal de Justiça, para onde fora
interposto recurso de acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa que julgara os
tribunais comuns incompetentes com fundamento em que a competência para conhecer
da acção pertence aos tribunais administrativos. Sucede que, seja no corpo, seja
nas conclusões das alegações que então apresentou, o recorrente não colocou em
crise qualquer norma por violação de regras ou princípios constitucionais.
Com efeito, a única referência que faz a desconformidade com a Constituição é a
de que “o douto acórdão recorrido violou, entre outros, os artigos 20.º, n.ºs 1,
4 e 5 da Constituição, 2.º e 66.º do Código de Processo Civil e 18.º n.º 1, da
Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro. Além disso, ficaram desamparados os direitos
patrimoniais do Recorrente, genericamente assegurados pelo artigo 62.º n.º 1 da
Constituição”, a que corresponde a conclusão de que apenas “assunção da
competência necessária para as apontadas apreciações permitirá evitar a
violação, entre outros, dos artigos 20.º n.º 1, 4 e 5 da Constituição 2.º e 66.º
do Código de Processo Civil e 18.º n.º 1 da Lei n.º 3/99, de 13 de Janeiro,
violação em que, com o devido respeito, incorreu o douto acórdão recorrido”.
Assim, foi ao acórdão da Relação que o recorrente imputou a violação do acesso
ao direito e aos tribunais e do direito à tutela judicial efectiva e da garantia
do direito de propriedade privada. Não a qualquer norma implicada na decisão
cuja desaplicação, com fundamento em inconstitucionalidade, se pretendesse, nos
termos do artigo 204.º da Constituição.
Ora, como constitui entendimento pacífico, o controlo de constitucionalidade que
a lei e a Constituição cometem ao Tribunal Constitucional apenas pode ter por
objecto normas (ou seja actos do poder normativo público) e não actos do poder
público de outro tipo, como são as decisões judiciais. De modo que só a
colocação de uma questão de constitucionalidade normativa perante o tribunal que
proferiu a decisão recorrida abre a via do recurso de constitucionalidade ao
abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
Tanto basta para que, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da LTC, se decida não
tomar conhecimento do objecto do recurso.
4. Decisão
Pelo exposto, decide-se não conhecer do objecto do recurso e condenar o
recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em 8 (oito) unidades de conta.”
2. O recorrente reclama nos seguintes termos:
“B., Recorrente nos autos supra identificados, tendo sido notificado da douta
decisão sumária proferida por V. Exa. nos termos do n.º 1 do art. 78º-A da LTC,
pela qual decidiu não conhecer do objecto do recurso, vem, nos termos do n.º 3
da mesma norma legal, respeitosamente reclamar para a conferência de tal
decisão, invocando o Recorrente, a seu favor, a douta decisão proferida pelo
Tribunal dos Conflitos que decidiu admitir o presente recurso.”
Os recorridos não responderam.
3. Não estando o Tribunal Constitucional vinculado pela decisão que admitiu o
recurso, como expressamente dispõe o n.º 3 do artigo 76.º da LTC (aliás, já
invocado na decisão reclamada) e não aduzindo o recorrente quaisquer razões
contra o entendimento que conduziu ao não conhecimento do objecto do recurso, só
resta confirmar a decisão reclamada, pelos seus fundamentos.
4. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o recorrente nas
custas, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 9 de Outubro de 2006
Vítor Gomes
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Artur Maurício