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Processo n.º 414/06
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Mário Torres
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal
Constitucional,
1. Relatório
A. interpôs recurso para o Tribunal da Relação
de Coimbra contra o despacho do juiz do Tribunal Judicial de Cantanhede, de 12
de Outubro de 2005, que indeferiu requerimento de suspensão da contagem do prazo
de interposição de recurso da sentença condenatória (proferida em 19 de Julho de
2005 e depositada na mesma data), entre 15 de Setembro de 2005 e a data da
notificação da disponibilização das cópias das cassetes com a gravação dos
depoimentos prestados em sede de audiência de julgamento (cópias pelo recorrente
requeridas em 12 de Setembro de 2005, o que fora deferido por despacho do
subsequente dia 19).
Na motivação desse recurso, o recorrente
suscitou, além do mais, a questão da inconstitucionalidade da “norma do artigo
411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de
determinar a contagem do prazo de interposição do recurso da data do depósito da
sentença, e não da data em que o defensor do arguido é notificado da entrega dos
suportes magnéticos da gravação (cassetes) dos depoimentos das testemunhas em
sede de julgamento, para efeitos de prova da matéria de facto, mediante a prova
gravada, tempestivamente requerida”.
Ao recurso foi negado provimento por acórdão do
Tribunal da Relação de Coimbra, de 15 de Março de 2006, com a seguinte
fundamentação:
“Relativamente a esta questão verifica‑se que a norma ínsita no n.º 1 do artigo
411.º do Código de Processo Penal define o prazo para a interposição de recurso
e determina o momento a partir do qual se conta este prazo.
Por outro lado, adianta‑se já, a ausência de uma disposição que possibilite um
acréscimo do prazo resulta de uma opção legislativa, já que não contraria o fim
visado pelo legislador.
No preâmbulo da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto, refere‑se que se procurou uma
maior celeridade e eficiência na administração da justiça penal, reduzindo‑se ao
mínimo a duração dos processos penais.
Ora, a redacção do artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil foi
introduzida pela revisão realizada (anteriormente àquela data) pelo Decreto‑Lei
n.º 180/96, de 25 de Setembro, não cuidando o legislador de introduzir uma norma
equivalente, pelo simples facto de, intencionalmente, dar possibilidade de maior
celeridade à justiça penal.
Assim que o preceituado no artigo 412.º do Código de Processo Penal refere
apenas e tão‑só os registos efectuados e apontados pelo recorrente para efeito
das especificações que tiver concretizado, e ocorrerá sempre após a interposição
do recurso, ou seja, o recorrente, nas suas alegações de recurso terá apenas de
referir os suportes técnicos, os quais são indicados nas actas das diligências
em que tiver sido produzida a prova gravada, tendo, pois, o recorrente a
indicação destes suportes nas referidas actas que constam dos autos.
A forma como se processa a documentação e registo da audiência final e a prova
nela produzida está regulamentada no Decreto‑Lei n.º 39/95, de 15 de Setembro,
sendo, nos termos do artigo 70.º do referido diploma legal, gravadas durante a
audiência simultaneamente uma fita magnética destinada ao tribunal e outra
destinada às partes, incumbindo ao tribunal que efectuou o registo facultar, no
prazo máximo de 8 dias após a realização da respectiva diligência, cópia a cada
um dos mandatários ou das partes que a requeiram, devendo estes fornecer ao
tribunal as fitas magnéticas necessárias.
Por outro lado, o n.º 6 do artigo 107.º do Código de Processo Penal consagra a
possibilidade de prorrogação do prazo para a prática de determinados actos,
quando o procedimento se revelar de excepcional complexidade e a requerimento,
não se tendo contemplado tal possibilidade para o caso do recurso versar sobre a
matéria de facto, aquando de pretendida reapreciação das provas gravadas.
Por sua vez, o n.º 6 do artigo 698.º do Código de Processo Civil prevê o
acréscimo de 10 dias nos prazos para alegações e contra‑alegações quando o
recurso tiver por objecto a reapreciação da prova gravada.
Para se saber se é aplicável ao processo penal o disposto no referido artigo
698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil cumpre saber se o facto da não
previsão pelo legislador no processo penal de tal acréscimo configura ou não uma
lacuna, a qual seria integrada pela forma prevista no artigo 4.º do Código de
Processo Penal.
Destarte que a norma do n.º 1 do artigo 411.º do Código de Processo Penal não
carece de qualquer integração, uma vez que define o prazo para a interposição de
recurso e determina o momento a partir do qual se conta este prazo.
A não ser assim, o simples pedido de acesso a cópia dos suportes técnicos de
gravação teria sempre a virtualidade de suspender, indefinida e aleatoriamente,
o prazo de interposição do recurso até que a mesma fosse colocada à sua (do
recorrente) disposição.
E se sobre a questão – objecto primacial do presente recurso – foram proferidos
inúmeros acórdãos pelos tribunais superiores, com decisões em sentido
contrário, veio a ser prolatado, pelo Supremo Tribunal de Justiça, um Acórdão de
fixação de jurisprudência, no qual se fixou jurisprudência no sentido de
«quando o recorrente impugne a decisão em matéria de facto e as provas tenham
sido gravadas, o recurso deve ser interposto no prazo de quinze dias, fixado no
artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, não sendo subsidiariamente
aplicável em processo penal o disposto no artigo 698.º, n.º 6, do Código de
Processo Civil».
Aí se pode ler, no domínio sindicado, que «no caso de impugnação da decisão
proferida em matéria de facto, o recorrente deve especificar nas conclusões os
pontos de facto que considera incorrectamente julgados, as provas que impõem
decisão diversa da recorrida, e as provas que devem ser renovadas – artigo
412.º, n.º 3, alíneas a), b) e c), do CPP. Quando as provas tenham sido
gravadas, dispõe o n.º 4 do artigo 412.º [que] as especificações previstas nas
alíneas b) e c) do n.º 3 fazem‑se por referência aos suportes técnicos, havendo
lugar a transcrição. Esta disposição, que descreve um iter procedimental para
quando seja impugnada a decisão sobre a matéria de facto, separa inteiramente
dois momentos, partindo do pressuposto e da função da gravação da prova e dos
respectivos suportes técnicos e da função e finalidade da transcrição das provas
gravadas. A gravação da prova, enquanto meio que permite a constituição de uma
base para a reapreciação da decisão em matéria de facto pelo tribunal de
recurso, obedece a modos regulamentados de execução constantes dos artigos 3.º
a 9.º do Decreto‑Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro. Deste modo, é a tais
suportes técnicos (fitas gravadas ou outros) que a lei se refere no artigo
412.º, n.º 4, do CPP, e não a quaisquer transcrições da prova gravada; a
especificação das provas que no entender do recorrente impõem decisão diversa e
das provas que devem ser renovadas não é feita por referência à transcrição, mas
por referência aos suportes técnicos donde consta a gravação das provas, (...)
Com efeito, como dispõe o artigo 7.º do Decreto‑Lei n.º 39/95, de 15 de
Fevereiro, o tribunal facultará cópia das gravações, devendo o mandatário, com
a solicitação da cópia, fornecer as fitas magnéticas necessárias: a resposta do
tribunal, no prazo máximo que a lei impõe (oito dias), harmoniza‑se por modo
adequado com o exercício do direito ao recurso nos prazos fixados, sendo que, em
caso de demora na disponibilidade das cópias, o interessado sempre disporá da
faculdade de invocar justo impedimento. No rigor das coisas, os elementos
necessários à impugnação da matéria de facto – suportes materiais da prova
gravada – podem estar à disposição do recorrente desde o início do prazo para
interposição do recurso. (...) o regime estabelecido em processo penal relativo
aos procedimentos da impugnação da decisão em matéria de facto revela‑se
coerente, com inteira autonomia, e não apresenta qualquer espaço vazio; é um
sistema que, nos termos descritos, funciona completamente por si, na previsão,
nos procedimentos e nos resultados da sua execução. Apresentando‑se como regime
completo, que funciona com autonomia, e que permite realizar, por inteiro, e de
modo razoável e constitucionalmente capaz (sublinhado nosso), a função para que
foi concebido, não há espaços não regulados que necessitem de complemento; não
deixando espaço de regulamentação em aberto que importe preencher, não existe,
pois, lacuna de regulamentação.»
Por tudo quanto ficou expresso cai pela base a inconstitucionalidade invocada
pelo recorrente da norma do artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal,
quando interpretada no sentido de determinar a contagem do prazo de interposição
do recurso da data do depósito da sentença, e não da data em que o defensor do
arguido é notificado da entrega dos suportes magnéticos da gravação (cassetes)
dos depoimentos das testemunhas, em sede de julgamento, quando o recurso visa a
reapreciação de prova gravada e aqueles foram tempestivamente requeridos.
«Não é inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, que manda contar
o prazo de interposição de recurso, de 15 dias, a partir do depósito da
sentença na secretaria, pois esse sistema não implica encurtamento inadmissível
das possibilidades de defesa» (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 75/99, de
3 de Fevereiro, processo n.º 747/98, Diário da República, II Série, de 6 de
Abril de 1999).
Nos termos e com os fundamentos expostos, acorda‑se em negar provimento ao
recurso, mantendo‑se inalterado o impugnado despacho.”
É contra este acórdão que pelo arguido vem
interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da
Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional,
aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela
Lei n.º 13‑A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), visando a apreciação da
inconstitucionalidade, por violação dos artigos 20.º, n.º 1, e 32.º, n.º 1, da
Constituição da República Portuguesa (CRP), da norma do artigo 411.º, n.º 1, do
CPP, interpretado no sentido de o prazo para a interposição de recurso visando a
reapreciação da decisão da matéria de facto, quando tenha sido tempestivamente
requerido o fornecimento de cópias dos suportes magnéticos (cassetes) contendo a
gravação dos depoimentos prestados em sede de julgamento, ser de 15 dias
contados a partir do depósito da sentença na secretaria, e não da data em que o
arguido é notificado para o levantamento das referidas cópias.
No Tribunal Constitucional, o recorrente
apresentou alegações, no termo das quais formulou as seguintes conclusões:
“I. Recurso interposto do Acórdão da Relação de Coimbra, de 17 de Março de 2005,
que decidiu negar provimento ao recurso interposto do despacho do Tribunal a
quo que indeferiu a suspensão do prazo, para efeitos do disposto no n.º 1 do
artigo 411.º do CPP até à entrega ao arguido das cassetes gravadas
atempadamente requeridas, e não entregues no decorrer daquele prazo.
II. O Tribunal de 1.ª Instância procedeu à leitura da sentença no dia 19 de
Julho de 2005 na presença do arguido e do mandatário, e a sentença foi
depositada no mesmo dia.
III. Em 12 de Setembro de 2005, o arguido requereu que lhe fossem processadas
cópias das gravações efectuadas na audiência de julgamento, para efeitos de
recurso tendo por objecto a reapreciação da prova gravada, comprometendo‑se a
apresentar os suportes magnéticos (cassetes) para o efeito.
IV. Naquele requerimento, em 19 de Setembro de 2005, a Meritíssima Doutora Juiz
proferiu o despacho de «Satisfaça», o qual foi notificado ao arguido (artigo
113.º, n.º 2, do CPP) em 23 de Setembro de 2005.
V. Tendo no mesmo dia 23 de Setembro de 2005 o recorrente entregue duas cassetes
com vista à gravação, e requereu a notificação para o levantamento das mesmas
logo que estivessem gravadas, e a sustação da contagem do prazo previsto no n.º
1 do artigo 411.º do CPP dado aquele prazo esgotar‑se sem que o tribunal
colocasse os requeridos suportes magnéticos à disposição do recorrente para,
tempestivamente, exercer o direito de defesa mediante o recurso.
VI. Já que o recorrente pretendia impugnar a decisão proferida sobre a matéria
de facto, implicitamente, estava obrigado ao cumprimento do disposto nos n.ºs 3
e 4 do artigo 412.º do CPP, sob pena de rejeição do recurso.
VII. O prazo previsto no artigo 411.º, n.º 1, esgotou‑se sem que o recorrente
fosse notificado da transcrição da gravação da prova para as cassetes entregues
no dia 23 de Junho de 2005.
VIII. Apesar de o arguido, tempestivamente, ter requerido e entregue os suportes
magnéticos para gravação,
IX. Pelo facto foi o arguido impedido de recorrer da sentença.
X. O Tribunal não assegurou ao arguido todas as garantias de defesa, incluindo o
recurso, consignado no artigo 32.º, n.º 1, da CRP.
XI. Pelo que foi manifestamente impossível ao arguido recorrer da douta
sentença.
XII. O impedimento resultou da acção directa do Tribunal em não disponibilizar
as requeridas transcrições.
XIII. O arguido ficou refém do Tribunal de 1.ª Instância para exercer o seu
direito de defesa e por isso não pode ser prejudicado ao seu direito de defesa.
XIV. Pelo que, in casu, a contagem do prazo de interposição do recurso deve ser
feita a partir da data da notificação ao arguido, na pessoa do mandatário, da
disponibilização das cassetes, devidamente gravadas da prova produzida na
audiência de julgamento.
XV. Visto que na sentença proferida em 19 de Julho de 2005 e depositada na
mesma data não estão escritos, tal como foram proferidos, os depoimentos das
testemunhas com vista à reapreciação da prova gravada.
XVI. Já que as cassetes gravadas requeridas é o elemento orientador, fulcral,
essencial e constitui o cerne da defesa do arguido, e não a sentença, visto que
o recurso visa impugnar a decisão proferida da prova da matéria de facto [sic],
mediante a reapreciação de prova gravada.
XVII. O recorrente não requereu um acréscimo de tempo ao prazo previsto no n.º
1 do artigo 411.º do CPP, o que requereu foi que a contagem daquele prazo se
iniciasse a partir da notificação ao arguido ou ao mandatário para a entrega dos
suportes de gravação requeridos e não entregues pelo Tribunal naquele prazo
para o recurso, para efeitos de se cumprir o disposto no n.º 1 do artigo 32.º da
CRP.
XVIII. O direito de defesa do arguido é um direito constitucionalmente protegido
e, por isso, não pode o Tribunal impossibilitar ao arguido aquele direito.
XIX. Porque, na verdade, o prazo de 15 dias consignado no artigo 411.º, n.º 1,
do CPP para o arguido interpor recurso foi ultrapassado pelo Tribunal de 1.ª
Instância para se pronunciar sobre os requerimentos da gravação e da transcrição
para as cassetes entregues da prova em sede de julgamento, cuja transcrição
ainda não foi notificada ao arguido para proceder ao seu levantamento.
XX. Todas as garantias de defesa devem ser asseguradas ao arguido pelo Tribunal,
o que não aconteceu.
XXI. «Todas as garantias de defesa engloba indubitavelmente todos os direitos e
instrumentos necessários e adequados para o arguido defender a sua posição e
contrariar a acusação» (in Constituição da República Portuguesa Anotada, de J.
J. Gomes Canotilho e Vital Moreira, Coimbra Editora, 1993, p. 202).
XXII. Com vista ao exercício do direito à defesa pelo arguido e de todos os
cidadãos colocados perante a mesma eventualidade, e no âmbito dos autos, o prazo
previsto no artigo 411.º, n.º 1, do CPP, e quando a obrigação do recurso decorre
da obrigatoriedade do disposto no artigo 412.º, n.ºs 1 e 3, alíneas a), b) e
c), do CPP, deve ser interpretado no sentido de determinar a contagem do prazo
de interposição do recurso a partir da data da notificação da transcrição da
gravação, pelo Tribunal, da prova da audiência e julgamento, quando
tempestivamente requerida.
XXIII. O despacho recorrido é inconstitucional, por violação do artigo 32.º, n.º
1, da Constituição da República Portuguesa, o que se invoca para todos os
efeitos legais.
XXIV. O despacho recorrido é inconstitucional por violação do artigo 32.º, n.º
1, da Constituição da República Portuguesa, a norma do artigo 411.º, n.º 1, do
CPP, quando interpretada no sentido de determinar a contagem do prazo de
interposição do recurso da data do depósito da sentença, e não da data em que ao
defensor do arguido é notificado da entrega dos suportes magnéticos da gravação
(cassetes) dos depoimentos das testemunhas, em sede de julgamento, para efeitos
da prova da matéria de facto, mediante a reapreciação de prova gravada,
tempestivamente requerida [sic].
XXV. O recorrente invocou perante o Tribunal da Relação a inconstitucionalidade
do despacho recorrido.
Termos em que pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do artigo
411.º, n.º 1, do CPP, interpretada no sentido de o prazo para a interposição é
de 15 dias contados a partir do depósito da sentença na secretaria, e não da
data em que o arguido é notificado para o levantamento na secretaria dos
suportes magnéticos da gravação (cassetes) do julgamento, para efeitos da
reapreciação da prova gravada à matéria de facto [sic], tempestivamente
requerida, e não notificada a realização das gravações e entrega dentro do prazo
para a interposição do recurso, por violação dos artigos 20.º, n.º 1, e 32.º,
n.º 1, da Constituição da República Portuguesa.”
O representante do Ministério Público no
Tribunal Constitucional apresentou contra‑alegações, concluindo:
“1 – A formação esclarecida da vontade de recorrer, por parte do arguido
condenado, e o adequado cumprimento por este dos ónus que a lei de processo
penal impõe ao recorrente que pretenda impugnar a decisão proferida sobre a
matéria de facto, no caso da gravação da audiência, implicam, em regra, o acesso
aos suportes técnicos que corporizam a gravação da audiência e das provas nela
produzidas.
2 – Constitui invocação de justo impedimento, susceptível de
diferir no tempo o início do prazo para o arguido interpor e motivar o recurso
em que questione a matéria de facto, a invocação, perante o tribunal que
proferiu a decisão condenatória, da essencialidade no acesso às ditas gravações
para estruturar adequadamente a motivação do recurso.
3 – É inconstitucional, por violação do direito ao recurso
ínsito no artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, a
interpretação normativa do artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal que
implica que o prazo para interpor e motivar o recurso se conta inexoravelmente
do depósito da sentença na secretaria, mesmo nos casos em que o
arguido/recorrente – actuando com a diligência devida – haja requerido o acesso
à gravação da audiência e manifestado a essencialidade de obtenção de cópia de
tal gravação para o exercício do direito ao recurso.
4 – Termos em que deverá proceder o presente recurso.”
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
2. Fundamentação
2.1. Antes de entrarmos na apreciação do mérito
do recurso, cumpre consignar duas notas preliminares: a primeira, para salientar
que, ao contrário do que parece ter sido entendido pelo tribunal recorrido, a
questão colocada pelo recorrente não foi a da extensão aos recursos penais do
regime do alargamento do prazo de interposição de recurso previsto no artigo
698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil [no sentido da não
inconstitucionalidade desse não alargamento já decidiram os Acórdãos n.ºs
542/2004, 30/2006, 109/2006 e 343/2006], mas antes a da suspensão desse prazo
enquanto não lhe forem disponibilizadas as cópias das cassetes contendo a
gravação da prova produzida em audiência de julgamento, cópias por ele
tempestivamente requeridas; a outra, para esclarecer que, como resulta do
respectivo contexto, quando, nas alegações apresentadas neste Tribunal, o
recorrente por vezes utiliza as expressões “transcrição da gravação da prova” ou
“transcrições” (cf. conclusões VII, XII, XIX e XXII), não se está a referir,
como é usual, à transcrição para suporte de papel das partes das gravações
indicadas como relevantes para demonstrar que se impunha uma decisão da matéria
de facto diversa da decidida, mas antes à transcrição, cópia ou duplicação das
cassetes detidas pelo tribunal para as cassetes disponibilizadas pelo
recorrente.
2.2. O Tribunal Constitucional já foi, por
diversas vezes, chamado a pronunciar‑se sobre a constitucionalidade de normas
relativas ao início do prazo para apresentação do requerimento de interposição
de recurso em processo penal, que deve, por regra, conter a respectiva motivação
(ou ao início do prazo para apresentação da motivação do recurso, no único caso
em que esta pode ser posterior à interposição: interposição, por simples
declaração na acta, de recurso de decisão proferida em audiência – artigo
411.º, n.º 3, do CPP).
O critério seguido nessa jurisprudência tem
sido o de que tal prazo só se pode iniciar quando o arguido (assistido pelo seu
defensor), actuando com a diligência devida, ficou em condições de ter acesso
ao teor, completo e inteligível, da decisão impugnanda, e, nos casos em que
pretenda recorrer também da decisão da matéria de facto e tenha havido registo
da prova produzida em audiência, a partir do momento em que teve (ou podia ter
tido, actuando diligentemente) acesso aos respectivos suportes, consoante o
método de registo utilizado (escrita comum, meios estenográficos ou
estenotípicos, gravação magnetofónica ou audio‑visual).
2.2.1. Quanto ao primeiro aspecto (acesso ao
teor da decisão condenatória que se pretende impugnar), há a registar:
– o Acórdão n.º 75/99, que não julgou
inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, interpretado no sentido
de que o prazo de interposição de recurso se conta a partir da data em que a
sentença foi proferida na presença do arguido e do seu defensor, tendo nesse
mesmo dia sido depositada na secretaria, e não apenas da data em que
posteriormente foi notificada por via postal, pois desde aquela primeira data o
arguido ficou em posição de conhecer integralmente a sentença;
– o Acórdão n.º 109/99, que não julgou
inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, lido em conjugação com o artigo
113.º, n.º 5, do CPP, na interpretação segundo a qual, com o depósito da
sentença na secretaria do tribunal, o arguido que, justificadamente, não esteve
presente na audiência em que se procedeu à leitura pública da mesma, deve
considerar-se notificado do seu teor, para o efeito de, a partir desse momento,
se contar o prazo para recorrer da sentença, se, nessa audiência, esteve
presente o seu mandatário;
– os Acórdãos n.ºs 148/2001 e 202/2001, que
julgaram inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, quando
interpretado no sentido de determinar a contagem do prazo de interposição do
recurso da data do depósito na secretaria da sentença manuscrita de modo
ilegível, e não da data em que o defensor do arguido é notificado da cópia da
sentença dactilografada, tempestivamente requerida, juízos de
inconstitucionalidade que se fundaram no entendimento de que “o direito ao
recurso implica, naturalmente, que o recorrente tenha a possibilidade de
analisar e avaliar os fundamentos da decisão recorrida, com vista ao exercício
consciente, fundado e eficaz do seu direito”, o que “pressupõe a plena
estabilidade e inteligibilidade da decisão recorrida”;
– o Acórdão n.º 87/2003, que julgou
inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, na interpretação
segundo a qual o prazo para interpor recurso de acórdão de Tribunal da Relação,
proferido em conferência, nos termos do artigo 419.º, n.º 4, do CPP, e não em
audiência (com prévia convocação, para além de outros intervenientes, do
defensor, de acordo com o artigo 421.º, n.º 2, do mesmo Código), se conta a
partir do depósito do acórdão na secretaria, e não da respectiva notificação,
tendo o Tribunal Constitucional sublinhado que, uma vez que “nem o recorrente
nem o seu defensor tinham sequer conhecimento da data de realização da
conferência, que não lhes foi comunicada”, não lhes era exigível uma diligência
que se traduziria no “controlo cego do hipotético dia da tomada de decisão por
parte do Tribunal da Relação”;
– o Acórdão n.º 36/2004, que não julgou
inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, interpretado no sentido
de que, quando os arguidos e um defensor oficioso nomeado estão presentes à
leitura da sentença, mas o advogado constituído falta e é posteriormente
notificado dela, o prazo de interposição de recurso se conta a partir do
depósito da sentença na secretaria, efectuada no próprio dia da sua leitura,
pois, em tal hipótese, os arguidos tomaram conhecimento directo da decisão e
tiveram oportunidade de, actuando com a diligência exigível, esclarecer de
imediato quaisquer dúvidas com o advogado nomeado para o acto, tendo disposto de
15 dias para exame da sentença com o seu advogado constituído, com quem lhes
incumbia entrar em contacto;
– o Acórdão n.º 186/2004, que julgou
inconstitucional a norma do artigo 411.º, n.º 1, do CPP, interpretado no sentido
de que o prazo para apresentação da motivação de recurso interposto por
declaração na acta da audiência onde foi proferida a sentença se conta a partir
da data dessa interposição, mesmo que a sentença só posteriormente haja sido
depositada na secretaria, tendo o Tribunal Constitucional considerado que “há
que reconhecer que «a mera leitura da sentença na presença do arguido e do seu
defensor oficioso no mínimo pode não permitir uma completa apreensão do teor da
sentença para efeito de motivação do recurso», pois «a interposição de um
recurso pressupõe uma análise minuciosa da decisão que se pretende impugnar,
análise essa que não é de todo possível realizar por mero apelo à memória da
leitura do texto da sentença», antes exige o acesso ao texto da sentença, o que
apenas se torna possível com o seu depósito na secretaria”; e
– o Acórdão n.º 312/2005, que, ao abrigo do
disposto no artigo 80.º, n.º 3, da LTC, determinou que a norma do artigo 411.º,
n.º 1, do CPP fosse interpretada no sentido de que o prazo para interposição do
recurso da decisão condenatória do arguido ausente se conta a partir da
notificação pessoal e não a partir do depósito na secretaria, independentemente
dos motivos que determinaram tal ausência e se os mesmos são ou não
justificáveis.
2.2.2. Com mais directa relevância para o caso
ora em apreço surgem as decisões deste Tribunal relativas ao prazo de
interposição de recurso penal que vise (exclusiva ou cumulativamente) a
impugnação da decisão da matéria de facto. Embora nenhuma dessas decisões tenha
incidido sobre a concreta dimensão normativa que constitui objecto do presente
recurso, delas se colhe, reiteradamente, o entendimento de que o acesso à
documentação da prova produzida em audiência de julgamento, designadamente às
cassetes contendo a gravação da prova – mas já não o acesso à posterior
transcrição das partes das gravações seleccionadas para sustentar a impugnação
de tal decisão – é essencial para assegurar um consciente e eficiente direito
ao recurso nessa sede.
Num caso em as declarações orais prestadas em
audiência não haviam sido objecto de gravação magnetofónica, mas sim de
documentação em acta, o Acórdão n.º 363/2000 julgou inconstitucionais as normas
dos artigos 107.º, n.º 2, do CPP e 146.º, n.º 1, do CPC, interpretados no
sentido de a impossibilidade de consulta das actas de julgamento, por as mesmas
não estarem ainda disponíveis, não constitui justo impedimento para a
interposição do recurso da decisão final condenatória em processo penal, juízo
de inconstitucionalidade que se fundou no entendimento de que o acesso a essas
actas constitui “um elemento importante para a preparação da defesa do arguido,
concretamente para a elaboração da alegação do recurso”.
Versando situações em que ocorrera gravação
magnetofónica da prova produzida em audiência, mas em que os recorrentes
pretendiam que o prazo de interposição de recurso se iniciasse apenas a partir
da disponibilização da transcrição (em suporte de papel) das referidas
gravações, os Acórdãos n.ºs 433/2002 e 17/2006, não tendo julgado
inconstitucionais as interpretações atacadas pelos recorrentes, desenvolveram
fundamentação que evidencia a essencialidade do acesso às gravações (que não às
posteriores transcrições das mesmas).
O primeiro acórdão citado (Acórdão n.º
433/2002) decidiu não julgar inconstitucional a interpretação do artigo 107.º,
n.º 2, do CPP, segundo a qual, havendo possibilidade de acesso ao suporte
material da prova gravada, a impossibilidade de acesso às transcrições das
declarações prestadas em audiência (quando tenha sido requerida a respectiva
gravação), por as mesmas ainda não estarem disponíveis, não constitui justo
impedimento para a interposição do recurso da decisão final condenatória em
processo penal. Esse acórdão salientou a diferença da situação então em apreço
com aquela sobre que incidiu o Acórdão n.º 363/2000 (em que o único suporte de
registo das declarações prestadas em audiência eram as actas escritas, que
ainda não estavam elaboradas), pois agora, em que existia gravação
magnetofónica, embora ainda não transcrita, «a impugnação do julgamento da
matéria de facto pode perfeitamente basear‑se no próprio suporte material da
prova gravada (que é, afinal, o registo originário da prova), à disposição do
arguido desde o início do prazo para a interposição do competente recurso»,
pelo que «não tem razão o recorrente quando alega (...) que, não lhe sendo
facultada a transcrição da prova gravada em tempo útil, lhe é cerceada a
possibilidade de interpor recurso, resultando violada a norma do artigo 32.º,
n.º 1, da Constituição».
Por último, o Acórdão n.º 17/2006 não julgou inconstitucionais
as normas constantes dos artigos 411.º, n.º 1, e 412.º, n.º 4, do CPP,
interpretados no sentido de que o prazo de interposição de recurso penal em que
se questione a decisão da matéria de facto e em que se procedeu a gravação da
prova produzida em audiência se conta da data em que o arguido, agindo com a
diligência devida, podia ter acesso ao suporte material da prova gravada, e
não da data em que foi disponibilizada a transcrição dessa gravação. Nesse
acórdão, começou por referenciar‑se o decidido no aludido Acórdão n.º 433/2002 e
bem assim no Acórdão n.º 542/2004, que não julgou inconstitucional a norma
constante do artigo 411.º, n.ºs 1 e 3, do CPP, na interpretação segundo a qual,
em caso de recurso que tenha por objecto a reapreciação da prova gravada, ao
prazo de 15 fixado no primeiro preceito não acresce o prazo de 10 dias a que se
refere o artigo 698.º, n.º 6, do CPC, por considerar que essa interpretação não
violava o direito de recurso, já que aquele prazo de 15 dias para apresentação
da motivação não se mostrava desrazoável ou inadequado, “mesmo tendo em conta
que o asseguramento efectivo dessas possibilidades de defesa passará pela
audição das cassetes e pela preparação, estudo e elaboração da alegação de
recurso, com as referidas especificações [as exigidas no artigo 412.º, n.ºs 3,
alíneas b) e c), e 4, do CPP]”, nem ofendia o princípio da igualdade, face ao
regime processual civil, por a celeridade processual, expressamente contemplada
no n.º 2 do art. 32.º da CRP, ter, no processo penal, “uma fonte e intensidade
constitucional diferente da que concerne à defesa de outros direitos, à qual
se refere o n.º 4 do artigo 20.º da CRP”. De seguida, procedeu‑se à transcrição
de parte da fundamentação do Acórdão n.º 9/2005, do plenário das Secções
Criminais do Supremo Tribunal de Justiça, de 11 de Outubro de 2005 – que fixou
a seguinte jurisprudência: “Quando o recorrente impugne a decisão em matéria
de facto e as provas tenham sido gravadas, o recurso deve ser interposto no
prazo de quinze dias, fixado no artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo
Penal, não sendo subsidiariamente aplicável em processo penal o disposto no
artigo 698.º, n.º 6, do Código de Processo Civil” –, onde se evidencia a
diversidade das finalidades específicas da motivação, da gravação da prova e
da sua subsequente transcrição, salientando, quanto a estas duas últimas, que as
especificações referidas nas alíneas b) e c) do n.º 3 do artigo 412.º do CPP,
têm de ser feitas, por força do subsequente n.º 4, relativamente aos suportes
técnicos da gravação da prova, e não relativamente à transcrição, que “é um acto
posterior que incumbe ao tribunal efectuar (…) nos termos e na medida
delimitada previamente pelo recorrente, e destina‑se a permitir (rectius, a
facilitar) ao tribunal superior a apreciação, nos limites do recurso, da
prova documentada”, para concluir que, face ao regime legal vigente, “os
elementos necessários à impugnação da matéria de facto – suportes materiais da
prova gravada – podem estar à disposição do recorrente desde o início do prazo
para a interposição do recurso” e que “em caso de demora na disponibilidade das
cópias, o interessado sempre disporá da faculdade de invocar justo impedimento”.
Após estas referências, o Acórdão n.º 17/2006 desenvolveu a seguinte
argumentação:
“Embora, em rigor, no presente recurso não esteja directamente
em causa a divergência interpretativa sobre que incidiu o Acórdão de fixação de
jurisprudência acabado de referir (isto é: a aplicabilidade aos recursos penais
da regra do acréscimo de 10 dias dos prazos para alegações estabelecidos no
artigo 698.º do CPC sempre que o recurso tenha por objecto a reapreciação da
prova gravada, mas antes a questão de saber se é constitucionalmente imposto que
o início do prazo de interposição e de motivação de recurso penal visando
(também) a matéria de facto, quando tenha havido gravação da prova, se conte
apenas a partir da data em que o tribunal disponibiliza ao recorrente a
transcrição dessa gravação), o certo é que as considerações nele tecidas sobre
a finalidade desta transcrição – facilitar ao tribunal superior a apreciação,
nos limites do recurso, da prova documentada, e já não habilitar o recorrente a
elaborar a sua motivação (que, bem compreendida, deve constituir tão‑só a
enunciação dos fundamentos do recurso, com a função de delimitar o respectivo
objecto, podendo o recorrente desenvolver a fundamentação nas alegações, orais
ou escritas, a produzir no tribunal ad quem – artigos 411.º, n.º 4, e 423.º, n.º
3, do CPP), pois para tal lhe basta, para lá da assistência e intervenção em
toda a audiência de julgamento e do conhecimento do teor integral da decisão
condenatória, o acesso às gravações da prova produzida (até porque é em relação
a estes suportes técnicos, e não à sua posterior transcrição, que devem ser
feitas as especificações exigidas nas alíneas b) e c) do n.º 3 do artigo 412.º
do CPP) – reforçam o juízo de razoabilidade do regime estabelecido que, na
sequência do Acórdão n.º 433/2002, se entende não poder ser reputado como
envolvendo uma limitação constitucionalmente intolerável do direito de recurso
em matéria penal.
(…)
Conclui‑se, assim, que, não tendo o recorrente solicitado,
podendo tê‑lo feito, o acesso à gravação da prova logo após a notificação da
sentença, e considerando‑se que com a possibilidade desse acesso o arguido
ficava em condições de exercitar – consciente, fundada e eficazmente – o seu
direito de recurso, nenhuma censura merece o juízo de não inconstitucionalidade
constante do acórdão recorrido.”
2.3. Da precedente descrição da jurisprudência
deste Tribunal resulta que, embora a específica dimensão normativa que constitui
objecto do presente recurso ainda não tenha sido alvo de qualquer juízo expresso
de inconstitucionalidade, já por diversas vezes o Tribunal considerou que,
quando se pretenda impugnar a decisão proferida sobre matéria de facto e as
provas produzidas em audiência tenham sido gravadas, o acesso aos respectivos
suportes de gravação é essencial para um consciente e eficiente exercício do
direito de recurso, constitucionalmente consagrado.
No presente caso, a audiência de julgamento
desenrolou‑se por sessões realizadas em 14 e 23 de Junho e 4 de Julho de 2005.
Apesar de inicialmente marcada para 14 de Julho, a leitura da sentença só veio a
ocorrer em 19 de Julho de 2005, perante o arguido e seu mandatário e com
imediato depósito da mesma na secretaria. Estando já em curso o período de
férias judiciais, o prazo de 15 dias para interposição do recurso só começou a
correr em 15 de Setembro de 2005, mas, antes dessa data, no dia 12 desse mês, o
arguido requereu cópias das cassetes, o que foi deferido por despacho do dia 19,
de que foi notificado no dia 23, tendo nesta mesma data apresentado as cassetes
para duplicação e requerido a suspensão do prazo de interposição do recurso
desde o dia 15 (data em que ele se teria iniciado) até à data da efectiva
disponibilização das cassetes duplicadas, por considerar essa disponibilidade
essencial para a elaboração da motivação do recurso. Depreende‑se dos autos,
designadamente do despacho de 12 de Outubro de 2005 e da motivação do recurso
dele interposto para o Tribunal da Relação de Coimbra, que as cassetes não
chegaram a ser disponibilizadas ao recorrentes antes de esgotado o prazo de
interposição do recurso, contado desde 15 de Setembro de 2005.
Impõe‑se, assim, a emissão de um juízo de
inconstitucionalidade, que, no fundo, se traduzirá na reprodução de idêntico
juízo proferido no Acórdão n.º 363/2000, com a única diferença de aí a
documentação da prova constar de acta e aqui de suportes magnéticos. Mas, em
ambos os casos, o acesso à documentação da prova, independentemente do
respectivo suporte, constitui um elemento importante não apenas para a
preparação e elaboração da motivação do recurso, mas até para a formação
esclarecida da vontade de recorrer.
4. Decisão
Em face do exposto, acordam em:
a) Julgar inconstitucional, por violação do
artigo 32.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, a norma constante
do artigo 411.º, n.º 1, do Código de Processo Penal, interpretado no sentido de
o prazo para a interposição de recurso em que se impugne a decisão da matéria de
facto e as provas produzidas em audiência tenham sido gravadas, se conta sempre
a partir da data do depósito da sentença na secretaria, e não da data da
disponibilização das cópias dos suportes magnéticos, tempestivamente requeridas
pelo arguido recorrente, por as considerar essenciais para o exercício do
direito de recurso; e, consequentemente,
b) Conceder provimento ao recurso, determinando
a reformulação da decisão recorrida, na parte impugnada, em conformidade com o
precedente juízo de inconstitucionalidade.
Sem custas.
Lisboa, 27 de Setembro de 2006.
Mário José de Araújo Torres
Maria Fernanda Palma
Paulo Mota Pinto
Benjamim Silva Rodrigues
Rui Manuel Moura Ramos