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Processo nº 435/06
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é
recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso para o
Tribunal Constitucional com o seguinte teor:
“A., vem interpor recurso do acórdão de 16/02/2006 para o Tribunal
Constitucional”.
2. Por despacho da relatora, de 23 de Maio de 2006, o recorrente foi convidado,
ao abrigo do disposto no nº 6 do artigo 75º-A da LTC, a indicar os elementos
previstos neste artigo.
3. Notificado deste despacho, o recorrente veio dizer, em 9 de Junho de 2006, o
seguinte:
“O processo principal (velho de 16 anos) dos autos onde foi interposto o
recurso, foi arquivado, há dias, pela maioridade da filha mais nova do
recorrente, a qual fez dezoito anos em Janeiro deste ano (sem conhecer o pai !).
Por conseguinte, neste apenso de recurso consumou-se inutilidade superveniente
da lide.
Deve, portanto, ser proferido despacho de arquivamento sem responsabilidade
pelas custas do recorrente.
- Protesta juntar cópia do despacho de arquivamento em primeira instância.
4. Em 20 de Junho de 2006, a relatora proferiu despacho do seguinte teor:
“Atento o teor do requerimento que antecede, admito a desistência do recurso
interposto”.
5. Notificado deste despacho, o recorrente vem agora reclamar para a
conferência, nos termos e com os fundamentos seguintes:
“1 – Comunicou ao Tribunal que, na primeira instância, a causa principal foi
arquivado, por inutilidade superveniente da lide: todos os menores atingiram já
a maioridade.
2 – Por força desta circunstância, tratando-se aqui de recurso interposto de
decisão tomada num dos apensos, a inutilidade superveniente comunica-se.
3 – Mas não foi esse o entendimento da Exma. Juíza Conselheira Relatora: admitiu
a desistência do recurso interposto.
4 – Muito embora o recorrente não desistiu.
5 – A causa, na verdade, insubsiste, por inutilidade.., apenas.
6 – E para o comprovar deverá o Tribunal Constitucional oficiar ao Tribunal de
Família e Menores de Lisboa (P° n°. 201598, 1°. Juízo, lª. Secção) pedindo cópia
do despacho da extinção da instância, ou conceder dez dias de prazo ao
recorrente, para a juntar.
7 – Logo, será lavrado despacho de extinção do recurso, não por desistência, mas
por inutilidade superveniente a que não deu causa o recorrente: com efeito,
tendo lidado sob o pressuposto da menoridade dos filhos, a delonga de 16 anos do
processo, que os fez completar os 18 anos, agora a mais nova de todos, correu
irremissa por conta do Serviço de Justiça….
6. Notificado desta reclamação, o representante do Ministério Público junto
deste Tribunal, respondeu nos termos seguintes:
“1 – A conduta processual do reclamante – que peticionou expressamente ao
Tribunal que decretasse a inutilidade superveniente da lide por extinção da
instância no processo-base, que originou o recurso de constitucionalidade –
para, de seguida, impugnar a decisão que justificadamente concluiu que o mesmo
pretendia desistir de tal recurso, é susceptível de integrar litigância de má
fé.
2 – Na verdade, o sentido de tal requerimento não pode deixar de ser o de
manifestar desinteresse no prosseguimento do recurso interposto, correspondendo
objectivamente a uma desistência, motivada pelo ulterior desenvolver do processo
nas instâncias”.
7. Notificado desta resposta, o recorrente veio dizer o seguinte:
“1 – Não se percebe tamanha sanha do M°. P°..
2 – O pedido para ser decretada a inutilidade superveniente da lide por extinção
da instância no processo-base, que originou o recurso de inconstitucionalidade,
nada tem a ver com desistência do recurso, como aliás ficou bem explícito no
requerimento apresentado.
3 – O que se sabe e é verdade, é que o recorrente, tendo pedido no Tribunal de
menores para ter visita e notícia dos filhos há 12 anos, nunca as teve e, ironia
das coisas, só há pouco veio a saber que já era avô há dois anos, através de uma
notificação burocrática do processo.
4 – Se é má-fé o desespero de comunicar ao Tribunal Constitucional que o jogo
acabou pela batota da morosidade, parece que o Digno Procurador-Geral da
República terá de fazer um maior esforço argumentativo ou mais racional, para se
justificar.
5 – É que não há mesmo má-fé do reclamante, há apenas tristeza e o desespero de
não poder acreditar no Direito e nos Tribunais.
6 – Parece impossível que uma demora, que foi da Justiça, queira agora fazer-se
crer ter sido induzida pelo recorrente, que pretendia a coisa mais simples deste
mundo: ter visto os filhos durante a infância e adolescência destes.
V. Exas., Srs. Conselheiros, não poderão eximir-se a uma decisão que ignore a
violência de ter sido amputada ao recorrente mais de metade da vida”.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Face ao teor do requerimento reproduzido no ponto 3. do Relatório (fl. 372 dos
presentes autos), a relatora concluiu que se tratava de desistência do recurso
interposto, a qual foi admitida, ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 78º-B
da LTC (fl. 373 dos presentes autos).
Como bem conclui o representante do Ministério Público junto deste Tribunal, “na
verdade, o sentido de tal requerimento não pode deixar de ser o de manifestar
desinteresse no prosseguimento do recurso interposto, correspondendo
objectivamente a uma desistência, motivada pelo ulterior desenvolver do processo
nas instâncias”.
Por outro lado, abona no sentido de que o recorrente pretendia desistir do
recurso a circunstância de ter apresentado tal requerimento sem ter suprido as
indicações em falta no requerimento de interposição de recurso para este
Tribunal, o qual é absolutamente omisso quanto a tais indicações e, desde logo,
no que se refere à alínea ao abrigo da qual o recurso era interposto. A falta
destas indicações obstaria sempre a um juízo sobre a inutilidade do mesmo.
Resta, pois, confirmar o despacho reclamado.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar o despacho proferido.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ( vinte ) unidades
de conta.
Lisboa, 11 de Outubro de 2006
Maria João Antunes
Rui Manuel Moura Ramos
Artur Maurício