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Processo n.º 884/06
3ª Secção
Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo, A. e B.
recorreram, para o Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé, da decisão do
Chefe de Finanças de Lagos que aplicou uma coima de €251,75 à sociedade
irregular por eles formada. O recurso foi considerado improcedente e a decisão
mantida.
2. Inconformados, pretenderam recorrer. O recurso não foi admitido pelo juiz “a
quo”, pelo que reclamaram, nos termos do artigo 668º do Código de Processo
Civil, para o Presidente do Tribunal Central Administrativo. A reclamação foi
desatendida, confirmando-se na íntegra o despacho de não admissão.
3. Pretenderam, então, recorrer para o Supremo Tribunal Administrativo. Como tal
pretensão foi indeferida, tornaram a reclamar, desta vez para o Presidente do
Supremo Tribunal Administrativo, invocando, nomeadamente, que “nunca poderão
conformar-se, por saltar à vista a grave injustiça”. A reclamação foi
desatendida por só se poder “concluir pela inadmissibilidade legal do recurso em
causa”.
4. Invocando que “nunca se podem conformar com o que consideram uma injustiça”,
apresentaram requerimento onde referem que “voltam à presença de V. Exa. a
expor, que na reclamação enviada a esse Venerando Tribunal, embora tendo
conhecimento do n.° 2 do artigo 689° do CPC, consideram que esta norma não pode
ser aplicada ao caso, por, como afirma na referida reclamação e conforme dispõe
o n.° 2 do artigo 690° do CPC, saltar à vista em todo o processo estarem a ser
violadas as normas legais que passam a mencionar: O n.° 2 do Artigo 107° da
Constituição da República Portuguesa; O Decreto-Lei n.° 244/95, de 14/09, na sua
alínea c) do artigo 27°; A Lei n.° 15/200 1, de 24/12, no seu Artigo Único; O
Artigo 7° da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.” e requerem ao Presidente
do Supremo Tribunal Administrativo a análise da petição para que seja
“decretad[a] a anulação da coima”. Interpretando a pretensão dos reclamantes
como um pedido de reforma da decisão, aquele desatendeu a pretensão.
5. Na sequência, apresentaram novo requerimento, do seguinte teor:
“[...] tendo sido notificados do Douto despacho de 27 de Setembro de 2006, vêm
perante V.Exª. declarar que não podem concordar com a decisão, pelo que desejam
apresentar reclamação. para o Tribunal Constitucional que desde já anexa,
solicitando a Ex.ª o envio do processo para aquele Venerando e Superior
Tribunal, esperando decisão do Exm°.Juiz-Presidente do mesmo. Com todo o
respeito assinam,”
e anexaram um outro requerimento, agora dirigido ao Presidente do Tribunal
Constitucional, que concluíam do seguinte modo:
“CONCLUSÕES
-Não tendo rendimento real em 2003, não pode incidir sobre a empresa imposto
como dispõe o n°.2 do Artigo 107°. da Constituição da República Portuguesa.
-Não tendo cometido transgressão, não pode ser aplicada coima, como dispõe o
n°.7 da Convenção Europeia dos Direitos do Homem.
-Mas presumindo que de facto houve transgressão, está abrangida pela lei da
prescrição, conforme dispõe o Decreto-lei n°.244/95, de 14/09 na alínea c) do
artigo 27°. e a Lei n°. 109/2001, de 24/12 no seu Artigo Único.
POR TODO O EXPOSTO
Vêm pedir a esse Venerando e Superior Tribunal, com todo o respeito, análise da
presente petição, constando nos autos as provas do tudo o que é exposto, sendo
decretado a anulação da coima, sendo assim feita JUSTIÇA.”
6. Proferiu, então, em 11 de Outubro de 2006, o Presidente do Supremo Tribunal
Administrativo despacho em que, considerando que “é manifesto que os
interessados vêm apresentando sucessivos requerimentos e reclamações com o
intuito de retardar a baixa do processo e assim obstar ao trânsito em julgado da
sentença”, determinou “ao abrigo do artigo 720.° do CPC”, “que o incidente
suscitado pelo requerimento apresentado a fls. 63 se processe em separado,
devendo os autos baixar ao tribunal a quo, para cumprimento do julgado”. E, em
13 do mesmo mês, o seguinte despacho:
“[...], melhor identificados nos autos, vêm apresentando sucessivos
requerimentos e reclamações, culminando agora a “apresentar a reclamação para o
Tribunal Constitucional, (...) solicitando (...) o envio do processo para aquele
Venerando e Superior Tribunal”, “usando a faculdade concedida pelo Artigo 688°.
do CPC”.
Assim, e pese embora o instrumento utilizado não vir subscrito por advogado, não
nos competirá apreciar a pretensão ali formulada pela simples e decisiva razão
de que tal instrumento foi dirigido ao Exmo. Presidente do Tribunal
Constitucional, a quem deverá pois ser remetido todo o expediente.”
7. Já neste Tribunal foi determinada a constituição de mandatário, tendo os
“reclamantes” apresentado duas procurações. Foram, então, os autos com vista ao
Ministério Público, que se pronunciou nos seguintes termos:
“Como é evidente e incontroverso, não cabe no âmbito do procedimento de
“reclamação”, regulado na Lei 28/82, a impugnação dirigida ao despacho,
proferido em reclamação transitada no STA, em que se indeferiu o pedido de
nulidade ou reforma da decisão originariamente proferida: tal “reclamação”
apenas tem sentido quando haja sido anteriormente indeferida a interposição de
um recurso de fiscalização concreta.
Deste modo, por manifesta inexistência do meio impugnatório anomalamente
utilizado, terá a “reclamação” de ser liminarmente rejeitada.”
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação.
8. Como resulta do supra exposto, os requerentes pretendem reclamar para este
Tribunal do despacho do Presidente do Supremo Tribunal Administrativo que não
reformou uma sua anterior decisão que, considerando a “inadmissibilidade legal
do recurso em causa”, desatendeu uma reclamação de não admissão de um recurso
para o Supremo Tribunal Administrativo.
Ora, sendo manifesto que, nos termos da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro (Lei do
Tribunal Constitucional), só cabe reclamação para este Tribunal de despacho de
não admissão de recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade
oportunamente interposto para o Tribunal Constitucional e não admitido, a
“reclamação” para o Presidente do Tribunal Constitucional apresentada pelos
requerentes traduz um uso manifestamente anómalo dos instrumentos processuais,
não podendo deixar de ser liminarmente rejeitada.
III. Decisão.
Nestes termos, decide-se indeferir o peticionado.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 16 de Novembro de 2006
Gil Galvão
Bravo Serra
Artur Maurício