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Processo nº 671/2006
3ª Secção
Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção
do Tribunal Constitucional:
1. A. interpôs recurso contencioso de anulação da decisão de 29 de Setembro de
1998 do Presidente da Câmara de Murtosa que ordenou o embargo administrativo de
uma obra, devidamente identificada nos autos.
Por sentença do Tribunal Administrativo do Círculo de Coimbra de 8 de Novembro
de 1999, de fls. 108, foi negado provimento ao recurso.
Inconformado, A. recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo. Nas alegações
de recurso então apresentadas, veio sustentar, nomeadamente, que 'quando
considera suficiente fundamentação do embargo, a mera indicação de conceitos,
como os que constam do auto de embargo – sem a indicação de qualquer facto
concreto susceptível de constituir desvio no cumprimento do projecto aprovado,
que revele, acessível ao conhecimento do embargado a razão do embargo – a douta
sentença dá interpretação do artº 57º n.º 3 do DL. nº 445/91, de 20/11, na
redacção do DL. n.º 259/94, e arts. 124º n.º 1 e 125º do CPA, aprovado pelo DL.
n.º 442/91, de 15/11 – que se desvia do preceito do artº 268º n.º 3 da CRP.'
Por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 6 de Junho de 2000, de fls.
181, foi confirmada a sentença e negado provimento ao recurso, nestes termos:
«Tendo por base estes factos, o tribunal “a quo” negou provimento ao recurso
contencioso por não se verificarem os vícios que o recorrente diz ser o acto
impugnado portador.
Nas extensas conclusões das alegações o recorrente veio, além do mais, por um
lado, pedir a reforma da decisão e, por outro, suscitar várias nulidades de que
a mesma enfermaria.
A M.ma Juiz “a quo” entendeu que as invocadas nulidades não se verificavam e,
resultando implicitamente ter entendido não haver lugar a reforma por lhe
“parecer resultar das mesmas alegações... são razões determinantes da sua
revogação” (fls. 171 v.).
(…)
Improcedem, por estas razões, as conclusões em análise [relativas às alegadas
nulidades e à reforma da sentença].
Passamos, agora, a conhecer do vício de violação de lei imputado ao acto que
ordenou o embargo administrativo e que a sentença deu como não existente e daí
esta ter violado tais preceitos (arts. 54° e 57°, ambos do DL. Nº 445/91).
Refere-se no art° 54° n°1 al. a) do DL. n° 445/91 que “De acordo com o disposto
no presente diploma, constituem contra-ordenações a execução de obras de
construção civil, designadamente novos edifícios ou reconstrução, ampliação,
alteração, reparação ou demolição de edificações, e ainda os trabalhos que, não
possuindo natureza exclusivamente agrícola, impliquem alteração da topografia
local, efectuados sem alvará de licença de construção”.
Por sua vez, diz o n° 3 do art° 57° do mesmo diploma legal, que o recorrente
indica como violado, que “Após o embargo, é de imediato lavrado o respectivo
auto, que contém, obrigatória e expressamente, a identificação do funcionário
municipal, das testemunhas e do notificado, a data, hora e local da diligência e
razões de facto e de direito que a justificam, o estado da obra e a
identificação da ordem de suspensão e proibição de prosseguir a obra, bem como
das comunicações legais do seu cumprimento”.
Resulta da matéria de facto dada como provada que por deliberação 26/5/98 da
Câmara Municipal da Murtosa foi aprovado um projecto de arquitectura apresentado
pelo recorrente referente “a obras de remodelação e ampliação de moradia...,
onde todas as paredes a manter serão picadas até ao adobe” “ (pontos 2°, 4° e
5º).
Igualmente consta da matéria de facto dada como provada que “o técnico camarário
responsável pela obra, em 17/9/98, verificou ter o recorrente demolido as
referidas paredes” (ponto 7°) e na realidade “tratar-se de uma construção nova
de raiz e não de remodelação” (ponto 8°).
Estava, pois, o recorrente a executar obras de construção civil sem o
alvará de licença de construção, dado que o projecto aprovado era distinto, não
dizendo o mesmo alvará respeito às obras que o recorrente estava a levar a cabo.
Aliás, isto mesmo se concluiu na douta sentença revidenda quando se afirma na
matéria de facto que “as obras estão a ser levadas a efeito em desconformidade
com o projecto aprovado” e “na obra do recorrente nenhuma das paredes da casa
existente no prédio foi aproveitada para a nova construção” (pontos 10° e 11°)
Por outro lado, face ao auto de embargo da obra em causa (fls 121 do PA),
lavrado nos termos legais e donde consta o motivo de tal embargo, não se
vislumbra como é que foi violado o art° 57° n°3 do DL n° 445/91.
Não viola, em conclusão, a sentença tais preceitos.
Finalmente, alega, ainda, o recorrente que a sentença ao dar como fundamentado o
embargo viola o art° 125° do CPA
Há, assim, que apurar se o acto que ordenou o embargo está fundamentado ou não.
O art° 125° n°1 do CPA permite a fundamentação por remissão quando permite que a
mesma consista em mera declaração de concordância com os fundamentos de
anteriores pareceres, informações ou propostas.
O Sr. Presidente da Câmara Municipal da Murtosa, em 29/9/98, proferiu o seguinte
despacho: “Tendo-se em consideração a informação dos Serviços de Fiscalização,
proceda-se ao embargo das obras por estarem em desconformidade com o
licenciamento respectivo “.
Esta informação de 28/9/98 tem o seguinte teor: “Para os devidos efeitos e na
sequência de denúncia verbal da Sra. B., residente na Rua … Lisboa, contra o Sr.
A., residente na Av. …, da freguesia da Torreira, deste concelho, no passado dia
23 do corrente desloquei-me à Torreira nomeadamente à Beira-Ria-Norte para me
inteirar da veracidade da denúncia apresentada. Após consulta ao processo de
obras do já referido Sr. A., verifiquei que não estava a ser respeitado o
projecto de remodelação e ampliação de moradia que o arguido traz em execução no
seu terreno sito na Av. Eng. … da freguesia da freguesia da Torreira. Na
realidade trata-se de uma construção nova de raiz e não de remodelação conforme
plantas e req. N°121/98 de 98/01/28, aprovado em reunião de Câmara de 28/05/98”.
É jurisprudência uniforme e correcta a de que “o acto está devidamente
fundamentado se o destinatário respectivo ficou em condições
de saber porque se decidiu naquele sentido e não noutro qualquer” (Ac. do STA de
19/5/88-AD. 325°,38).
O acto que ordenou o embargo e a informação no qual se estriba e faz sua, contêm
as razões que explicam cabalmente porque assim foi decidido pela Administração,
pelo que o recorrente ficou a saber que tal se deveu por estar a proceder a uma
construção nova de raiz.
Encontra-se, pois, tal acto fundamentado e, ao assim ser decidido, não viola a
sentença o referido preceito.
Improcedem, deste modo, todas as conclusões das alegações do recorrente.
Em concordância com tudo o exposto, nega-se provimento ao recurso jurisdicional,
confirmando-se a sentença recorrida.
Taxa de justiça e procuradoria pelo recorrente que se fixam, respectivamente, em
50.000$00 e 25.000$00.»
2. Por requerimento de fls. 202, A. disse que 'vai arguir nulidades, em que
incorre o douto Acórdão' e, 'por cautela de patrocínio', interpor 'desde já (…)
recurso para o Tribunal Constitucional do douto Acórdão, na parte em que
considerou suficiente fundamentação do embargo a utilização de conceitos, que
jamais foram definidos – como são os que constam no auto de embargo – sem a
imputação de qualquer facto concreto.
Por forma a permitir ao recorrente tomar conhecimento de algum facto, que se
tivesse considerado como desvio ao projecto aprovado, e adoptar uma de duas
atitudes:
– ou corrigir o seu comportamento (…)
– ou impugnar contenciosamente esse considerado desvio.
Tal interpretação do artigo 57º n.º 3 do Decreto-Lei nº 445/91, de 20 de
Novembro, na redacção do Decreto-Lei. n.º 259/94, e artigos 124º n.º 1 e 125º do
CPA – aprovado pelo Decreto-Lei 442/91, de 15de Novembro – ofende o preceito do
artigo 268º n.º 3 da CR.'
Requereu ainda que, admitido o recurso de constitucionalidade, 'a sua subida
aguarde a decisão sobre as nulidades que vão ser arguidas, assim como das novas
inconstitucionalidades de interpretação da lei, em que cumulativamente o douto
Acórdão incorreu'.
3. A fls. 203, o recorrente arguiu diversas nulidades que atribuiu ao acórdão do
Supremo Tribunal Administrativo de fls. 181 e invocou 'inconstitucionalidades de
interpretação dos preceitos legais, abaixo indicados, que, colhendo de surpresa
o recorrente, agora se arguem'.
Refere-se o recorrente aos artigos 690º, n.º 1, 660º, n.º 2 e 668º, n.º 1, b),
do Código de Processo Civil (cfr. XI do requerimento), e considera que é
incorrecto interpretá-los – e violador 'do preceituado no artigo 205º, n.º 1, da
CR – tratar como meros considerandos, para deixar de delas conhecer, conclusões
como:
– a da discutida natureza do projecto (…);
– as da aplicabilidade de preceitos legais (…);
– assim como a da expressa advertência, constante de despacho do directos dos
respectivos serviços, para a necessidade de cumprimento do preceituado no artigo
22º c) do Decreto-Lei 445/91 (…)'.
De igual modo ofenderia ainda o n.º 1 do artigo 205º da Constituição interpretar
tais preceitos de forma a não se concluir que o acórdão recorrido enferma de
'fundamentação contraditória', e ininteligível, o que equivale a falta de
fundamentação, nos termos que aponta.
Finalmente, o recorrente diz ainda ter sido ofendido o artigo 202º da
Constituição pela 'interpretação errada dos preceitos acabados de citar'
(artigos 341º do Código Civil, 659º, n.º 2 e 664º do Código de Processo Civil).
4. Por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 20 de Fevereiro de 2001, de
fls. 231, foi desatendida a arguição de nulidade.
Por acórdão também do Supremo Tribunal Administrativo, de 15 de Janeiro de 2002,
foi indeferido o pedido de esclarecimento do acórdão de 20 de Fevereiro.
Por acórdão do mesmo Supremo Tribunal, agora de 10 de Janeiro de 2004, de fls.
340, foi indeferida nova arguição de nulidade.
5. Finalmente, em 10 de Maio de 2004, a fls. 357, v., foi admitido o recurso
interposto para o Tribunal Constitucional a fls. 202.
Por despacho da mesmo data, de fls. 357, foi decidido não conhecer de uma
nulidade arguida a fls. 351, com o fundamento de que já tinha sido apreciada.
Deste despacho, o recorrente reclamou para a conferência (a fls. 359), que, por
acórdão de 16 de Maio de 2006, de fls. 382, indeferiu a reclamação.
6. A fls. 391, A., afirmando que 'o recurso para o Tribunal Constitucional foi
cautelarmente interposto – porquanto, ao mesmo tempo, foram arguidas nulidades,
entre elas, a de omissão de pronúncia, ocasionada por lapso em que o douto
tribunal incorreu', veio novamente recorrer para o Tribunal Constitucional, ao
abrigo do disposto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de
Novembro, 'do douto acórdão que julgou improcedente o de impugnação do embargo e
dos Acórdãos e despachos subsequentes que o confirmaram', nestes termos:
'(…) as normas constitucionais que se consideram violadas são as dos artigos 20º
n.º 5, 205º n.º 1, 202º e 268º n.ºs 3 e 4 da CR – por errada interpretação das
normas citadas nas peças do processo, a seguir indicadas – nomeadamente: os
artigos 57º n.º 3, 17º/A, 22º alª c) e 29º n.º 1 do Decreto-Lei 445/91 de 20/11,
em vigor após as alterações introduzidas pelo Decreto-Lei n.º 250/94; 124º, n.º
1, 125º, n.ºs 1 e 2 e 135º do CPA aprovado pelo Decreto-Lei 442/91, de 15 de
Novembro; os artigos 660º, n.º 2, 668º n.º 1, alªs b) e d), 6990º n.ºs 1 e 2 e
712º n.º 1º alª b) do CPC; 394º n.º 1 do Código Civil e 46º n.º 1 da então
vigente LPTA;
(…) as peças processuais em que as inconstitucionalidades foram suscitadas são
as alegações do recurso para o STA; e ainda nos subsequentes requerimentos,
ocupando-se da arguição de nulidades – por o recorrente ter sido colhido de
surpresa, pelo lapso do STA, e não menos, pela não correcção desse lapso' que
refere a seguir.
No mesmo requerimento, foi requerida a suspensão do 'do conhecimento do presente
recurso' enquanto não fosse julgado um outro, que o recorrente identifica.
7. Por despacho de 16 de Junho de 2006, de fls. 396, foi decidido:
«Nos termos do artº 666º nº 1 do Código de Processo Civil
“proferida a sentença fica imediatamente esgotado o poder jurisdicional do juiz
quanto à matéria da causa”.
Indefiro, ao abrigo deste preceito, a requerida apensação.
Notifique.
Custas do incidente pelo requerente, fixando-se a taxa de
justiça em 99 (noventa e nove) euros.
Como da decisão foi oportunamente interposto recurso para o Tribunal
Constitucional, recurso que foi admitido (fls. 357 v), e cujo despacho de
admissão foi notificado ao recorrente (fls. 358), que não reagiu, o mesmo
transitou em julgado.
Assim, não se admite o recurso novamente interposto para o Tribunal
Constitucional.
Notifique.
Custas do incidente pelo recorrente, fixando a taxa de justiça em 99 (noventa e
nove) euros.»
8. A fls. 400, A. veio apresentar a seguinte reclamação:
«A., recorrente nos autos à margem indicados, notificado do despacho do Exm°
Relator do STA, que não admitiu o recurso, para o Tribunal Constitucional, do
Acórdão do STA, que não conheceu de arguida nulidade, por omissão de pronúncia –
vem por este meio apresentar reclamação, o que faz nos termos e para os efeitos
do artigo 77° n° 1 da LOTC e com os fundamentos seguintes:
I
Da não admissão de recurso
1.º
O recurso não foi admitido, com o (aparente) fundamento de se tratar de
repetição de anterior requerimento, já admitido.
Isso parece significar a alusão a recurso novamente interposto.
II
Fundamentos da reclamação
2.°
O recurso, antes interposto, foi-o do douto Acórdão de 6/6/2000.
E como medida cautelar de patrocínio – como expressamente aí referido –
porquanto o mesmo requerimento foi acompanhado de arguição de nulidades do
Acórdão.
E poderia acontecer que a decisão dessa arguição justificasse novo recurso.
3.º
O recurso agora indeferido, foi interposto do Acórdão que não conheceu de
arguidas nulidades – entre elas, a de omissão de pronúncia.
Não se trata da repetição de anterior requerimento.
4.º
O que o recorrente teria de fazer era justificar a interposição desse novo
recurso.
Justificação que apresentou, no seu requerimento (n°s III e IV).
5.º
Sobre essa justificação – e se ela é bastante para legitimar o recorrente no
novo recurso – é o que competia ao Exm° Relator do STA decidir.
Sendo que, em caso de admissão, cabia ao TC reapreciá-la. (artigo 76° n° 3 da
LOTC).
II
Dos esclarecimentos a que se refere o artigo 75°-A, nºs 5 e 6 da LOTC
6.º
Acresce que há, no mesmo requerimento, uma parte que não é mais que a
antecipação de esclarecimento, que o Exm° Relator do STA deve oficiosamente
ordenar – quando o recorrente não o faça satisfatoriamente (artigo 75°-A, n°5 da
LOTC).
Esclarecimento que, se for incompleto, e não tendo sido ordenado no STA – teria
de ser ordenado pelo o Exm° Relator do TC (n° 6 do mesmo artigo).
7.º
Esclarecimento que está nos parágrafos 3.º e seguintes, da parte II do
indeferido requerimento.
III
Quanto a uma – que se diz – requerida apensação.
8.°
O recorrente não pediu a apensação deste, a outro recurso.
9.°
Além de não haver fundamento legal para a apensação – nem existe ainda recurso,
que penda no TC, no processo n° 960/03/1.3,
10.º
O que foi requerido foi a suspensão do conhecimento do presente recurso – até
que suba ao TC, recurso nesse processo n° 960/03/1.3,
11.°
E foi requerido, dada a conexão que o STA entendeu estabelecer entre os
julgamentos de ambos os recursos – como se expôs no último parágrafo do
requerimento. Ora,
12.°
Nem esse requerimento se dirigiu ao STA.
Não é a este que compete conhecer do recurso para o TC.
Somente foi apresentado no STA.
13.º
Tal suspensão só poderia enquadrar-se no disposto no artigo 279° n° 1, 2.ª
parte, do CPC (suspensão por vontade do juiz)
14.º
Se a suspensão se justifica ou não – só ao Exm° Relator do TC competirá decidir.
Termos em que,
Se requer a V.ª Ex.ª
– que seja admitido o recurso interposto em II, daquele requerimento – dada a
justificação exposta em III e IV do mesmo requerimento, ora indeferido.
– que sejam admitidos os esclarecimentos, prestados nos termos do artigo 75°-A
n°s 5 e 6 da LOTC. »
9. Remetidos os autos ao Tribunal Constitucional, foi notificado o Ministério
Público para se pronunciar sobre a reclamação, o que fez nestes termos:
'O recorrente optou por interpor recurso de
constitucionalidade, reportado a aplicações normativas que considera terem sido
efectuadas pelo acórdão do STA que se pronunciou sobre o mérito da causa – sem
que aguardasse a dirimição dos numerosos incidentes pós-decisórios que
sucessivamente suscitou.
Estando tal recurso de constitucionalidade admitido, é
manifesto que não é possível ao recorrente reiterá-lo em momento ulterior,
restando aguardar pela respectiva subida a este Tribunal Constitucional.
O recurso, ora interposto a fls. 391 apenas poderá, deste
modo, incidir sobre o acórdão que dirimiu ajudas incidentes pós-decisórios –
cumprindo ao recorrente explicitar claramente qual é, em concreto, a decisão que
pretende impugnar (não sendo admissível que o recurso de constitucionalidade
seja reportado, em bloco, a uma multiplicidade indefinida de “acórdãos e
despachos” que sucessivamente foram sendo proferidos no decurso do processo).
Sucede, porém, que – como é manifesto – não se mostra suscitada
qualquer questão de inconstitucionalidade normativa referentemente aos preceitos
legais que se reportam aos ditos incidentes, não tendo, aliás, o recorrente
especificado, em termos minimamente inteligíveis, qual a específica
interpretação normativa que pretendia controverter (e não cumprindo obviamente a
este Tribunal pronunciar-se sobre a existência ou inexistência dos “lapsos”,
nulidades e obscuridades invocadas).
10. Após tão longo relatório, imprescindível para se poder
compreender o que está em causa na presente reclamação, cumpre julgá-la.
E cabe começar por observar que, embora na reclamação
apresentada a fls. 400 contra o despacho de não admissão do recurso, proferido a
fls. 396, o ora reclamante afirme que não há repetição, porque o primeiro
recurso interposto para o Tribunal Constitucional apenas respeitava ao acórdão
do Supremo Tribunal Administrativo de 6 de Junho de 2000, e o segundo ao
'acórdão que não conheceu de arguidas nulidades' (sem especificar qual acórdão),
a verdade é que no requerimento de interposição de recurso de fls. 391 disse
expressamente que recorria 'do douto Acórdão que julgou improcedente o de
impugnação do embargo e dos Acórdãos e despachos subsequentes que o
confirmaram'.
Ora o 'acórdão que julgou improcedente o de impugnação do
embargo' é o acórdão de 6 de Junho de 2000, como é manifesto.
Assim sendo, e tendo em conta a explicitação feita pelo próprio
reclamante no requerimento de fls. 400, considera-se que a presente reclamação
não respeita ao recurso de constitucionalidade do acórdão do Supremo Tribunal
Administrativo de 6 de Junho de 2000, interposto a fls. 202 e admitido a fls.
357, v.
11. Ora a presente reclamação é claramente improcedente.
Nem interessa agora apontar ao reclamante que ele não esclarece
de que acórdãos está a recorrer para o Tribunal Constitucional – o que, aliás,
se não entende, dadas as divergências entre o requerimento de interposição de
recurso de fls. 391, que se refere aos 'Acórdãos e despachos subsequentes que'
confirmaram o acórdão de 6 de Junho de 2000 – e a reclamação de fls. 400, que
afirma que o recurso respeita ao 'Acórdão que não conheceu de arguidas nulidades
(…)'.
Com efeito, e apesar dos esclarecimentos que considera ter
fornecido 'nos parágrafos 3º e seguintes, da parte II, do (...) requerimento' de
fls. 391 (dos quais naturalmente se ignoram, agora, os que respeitam aos
preceitos que só no acórdão de 6 de Junho de 2000 foram aplicados), verifica-se
que o ora reclamante nunca suscitou nenhuma questão de constitucionalidade
normativa referida a nenhum dos preceitos referidos, seja no requerimento de
interposição de recurso, seja nas 'peças processuais' (aliás
indiscriminadamente) indicadas nos referidos esclarecimentos, seja na reclamação
de fls. 400.
Assim, ainda que fosse admissível a utilização, já na fase da
reclamação contra a não admissão do recurso de constitucionalidade, do mecanismo
previsto no artigo 75º-A da Lei nº 28/82 para convidar o recorrente a esclarecer
algum ponto relativo ao recurso que interpôs, sempre seria inútil tal convite
por não ter sido invocada, 'durante o processo', a inconstitucionalidade de
norma alguma.
Também nem interessa, portanto, saber se terá ou não ocorrido qualquer motivo
que legitime suscitar a inconstitucionalidade num ou noutro momento processual,
por ter ou não ocorrido qualquer surpresa quanto à interpretação ou aplicação de
uma qualquer norma.
12. Nestes termos, decide-se:
a) Indeferir a presente reclamação;
b) Determinar que seja levado à distribuição o
recurso interposto a fls. 202 e admitido a fls. 357, v.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de
justiça em 20 ucs.
Lisboa, 22 de Setembro de 2006
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Vítor Gomes
Artur Maurício