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Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido de que o
acórdão não enferma de qualquer nulidade.
Foram colhidos os vistos legais.
Cumpre decidir.
Os elementos constantes dos autos com interesse para a decisão são os acima
referidos.
Dispõe a al. c) do n.°1 do art. 379.° do C. P. Penal, aqui aplicável ex vi n.°4
do art. 425.° do mesmo código, que é nula a sentença quando o tribunal deixar de
se pronunciar sobre questões que devesse apreciar ou conhecer de questões de que
não podia tomar conhecimento.
A omissão de pronúncia a que alude aquela disposição legal diz respeito ao não
conhecimento, na decisão, de uma questão suscitada e sobre a qual o tribunal
tinha de se pronunciar. A não aplicação de qualquer disposição legal que o
devesse ter sido configura um erro de direito.
Como decorre dos fundamentos invocados pelo arguido, bem como da motivação do
recurso por si interposto para o STJ, o acórdão cuja nulidade foi invocada
pronunciou-se sobre as questões suscitadas no recurso, só que em sentido
contrário ao da sua pretensão. Não enferma, assim, daquela nulidade, nem de
qualquer outra.
Questão diferente é a de saber se se trata de uma decisão errada do ponto de
vista jurídico, por não ter sido aplicado o disposto no art. 29.°, n.°1, al. g)
do Código das Custas Judiciais, e que, ao fim e ao cabo, é aquilo que o arguido
defende ao invocar a nulidade da mesma, assim pretendendo obter por este meio
aquilo que não obteve através da interposição de recurso.
Ora, se se tratasse de uma decisão errada, como é aquilo que o arguido defende,
só através de recurso é que poderia ser atacada, procedimento que, neste caso,
lhe está vedado, por não ser admissível recurso para o STJ. É que, não estando
em causa qualquer nulidade nem qualquer das situações previstas no art. 380.° do
C. P. Penal, vedado está a este tribunal alterar a decisão, por se ter esgotado
o seu poder jurisdicional.
Em todo o caso, sempre dirá que o arguido carece de razão quando defende que lhe
é aplicável o disposto na al. g) do n.°1 do art. 29.° do C. C. Judiciais,
porquanto tal disposição legal, estando inserida no Título I daquele código, que
tem como epígrafe “Custas cíveis”, diz respeito às custas cíveis, sendo as taxas
de justiça inicial e subsequente a que se refere a sua epígrafe as devidas nos
termos dos arts. 23.° e 26.°. Á taxa de justiça pela interposição dos recurso
nos processos criminais é aplicável o art. 80.°, inserido no Título II e que tem
como epígrafe “Custas criminais”.
De referir que a violação, no despacho recorrido, do art. 20.° da CRP foi
invocada no recurso interposto daquele despacho, tendo sido decido no acórdão
deste tribunal que não enferma daquela inconstitucionalidade, não havendo assim,
também, omissão de pronúncia sobre tal questão. Quanto aos demais artigos da CRP
citados, a sua violação só agora, na arguição das nulidades, foi alegada, razão
pela qual não podia este tribunal ter-se pronunciado sobre eles no acórdão.
Também não o pode fazer agora, uma vez que o objecto desta decisão é a nulidade
do acórdão, sendo a alegada violação daquelas normas da CRP uma questão nova.
Deste modo, indefere-se a invocada nulidade do acórdão.”
2. Notificado, veio o recorrente apresentar o seguinte requerimento:
“[...] Nos presentes autos, o arguido é acusado do crime de condução de veículo
em estado de embriaguez, previsto e punido pelo artigo 292° ,n° 1 do Código
Penal.
A prática dos factos ocorreram em 19 de Outubro de 2001.
Por outro lado a que atender ao disposto nos artigos 120° e 121° do Código
Penal.
Ora tendo em conta a moldura penal aplicável ao crime em causa, a data da
prática dos factos, bem como o disposto nos preceitos supra referidos,
considerando que a prescrição é de conhecimento oficioso vem chamar atenção de V
Exas de que esta se verifica nos presentes autos.
Sem prescindir:
Caso assim não seja entendido por Vª Exas, atento o acórdão que indeferiu a
nulidade invocada pelo arguido, vem interpor recurso para o Tribunal
Constitucional, nos termos do n° 1 do artigo 70°, alínea a), art. 72° alínea b),
art. 75°, e art. 75°A todos da Lei do Tribunal Constitucional.
Pretende-se que o tribunal aprecie a constitucionalidade e ilegalidade da recusa
da aplicação do artigo 29°, n° 1, al.g) do Código da Custas Judiciais, por
violar o disposto nos artigos 13 n° 1 e 2, 20° e 32° da Constituição da
República Portuguesa. [...]”
3. Foi, então, em 16 de Março de 2006, proferido pelo Desembargador relator o
seguinte despacho:
“Requerimento de fls. 107:
O arguido foi condenado pela prática, em 19 de Outubro de 2001, de um crime de
condução de veículo em estado de embriaguez previsto no n.°1 do art. 292° do
Código Penal. Tal crime é punível com pena de prisão até um ano ou com pena de
multa até 120 dias. Nos termos do n.°1, al. c), do art. 118.° do mesmo código, é
de 5 anos o prazo de prescrição do procedimento criminal pelos crimes com pena
de prisão cujo limite máximo for igual ou superior a 1 ano, mas inferior a 5
anos. O crime cometido pelo arguido é punível com pena de prisão até um ano,
pelo que, não tendo ainda decorrido cinco anos desde a sua prática, não se
encontra prescrito o respectivo procedimento criminal.
Deste modo, indefiro o requerimento do arguido.
Pelo incidente a que deu causa condeno-o na taxa de justiça que fixo em 1 (uma)
UC.
No requerimento acima referido, subsidiariamente, para o caso de não vir a ser
atendida a sua pretensão de ver declarado extinto o procedimento criminal por
prescrição, o arguido interpôs recurso para o Tribunal Constitucional ao abrigo,
entre outros, do art. 70.°, al. a), da Lei n.°28/82, de 15/11, “...atento o
acórdão que indeferiu a nulidade invocada...”.
Nos termos daquela disposição legal, cabe recurso para o Tribunal Constitucional
das decisões dos tribunais que recusem a aplicação de qualquer norma, com
fundamento em inconstitucionalidade.
No acórdão referido entre aspas e reticências, de fls. 101 a 104, foi indeferida
a arguição de nulidade do acórdão de fls. 41 a 46, por alegada omissão de
pronúncia, nele não tendo sido recusada a aplicação de qualquer norma com
fundamento em inconstitucionalidade.
Apesar disso, porque não estamos perante um caso que se enquadre na previsão do
n.°2 do art. 76.° da Lei n.°28/82, de 15/11, admito o recurso interposto pelo
arguido para o Tribunal Constitucional, a subir imediatamente, nos próprios
autos e com efeito suspensivo.
Notifique. [...]”
4. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao
abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro,
na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão
sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na
parte agora relevante, o seu teor:
“[...] Cumpre, antes de mais, decidir se pode conhecer-se do objecto do recurso,
uma vez que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal Constitucional
(artigo 76º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional).
A admissibilidade do recurso previsto na alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da Lei
do Tribunal Constitucional - o interposto pelo ora recorrente - pressupõe que a
decisão recorrida tenha, como sua ratio decidendi, recusado a aplicação, com
fundamento em inconstitucionalidade, de determinada norma. Ora, basta ler a
decisão recorrida, para se verificar que é manifesto que tal não aconteceu.
Na verdade, a decisão recorrida não recusou a aplicação de qualquer norma com
fundamento em inconstitucionalidade, nomeadamente do artigo 29°, n° 1, alínea g)
do Código da Custas Judiciais, limitando-se, com base na “al. c) do n.°1 do art.
379.° do C. P. Penal, aqui aplicável ex vi n.°4 do art. 425.° do mesmo código”,
a indeferir a arguição de nulidade, considerando não existir nem a omissão de
pronúncia invocada pelo recorrente, nem qualquer outra nulidade, não passando de
mero obiter dictum o que, além deste ponto, se adita naquela decisão.
Assim sendo, sem necessidade de maiores considerações, torna-se evidente que se
não pode conhecer do objecto do recurso que o recorrente interpôs, por falta de
um dos seus pressupostos, a saber: ter a decisão recorrida recusado a aplicação,
com fundamento em inconstitucionalidade, da norma questionada pelo
recorrente.[...]”
5. Inconformado com esta decisão o recorrente veio, ao abrigo do disposto no
artigo 78º-A, nº 3, da LTC, reclamar para a Conferência, nos seguintes termos:
“[...]vem dela reclamar nos termos do artigo 78º-A, nº 3 da Lei do Tribunal
Constitucional, com os seguintes fundamentos:
Muito embora , não se verifique o pressuposto do artigo 70º , nº 1, alínea a) da
LTC, o recurso deverá ser admitido por estarem preenchidos todos os requisitos
do artigo 75º. A da LCT.
Sem prescindir:
Sempre o recurso será admissível por aplicação da alínea b) do artigo 70º da
LTC, uma vez que o acórdão recorrido aplica no caso em apreço o artigo 80º da
CCJ, sendo que já foi suscitada durante o processo a inconstitucionalidade desta
norma.
Não tendo o ora reclamante referido este pressuposto, nada impede a este
Venerando Tribunal o seu conhecimento, por força do artigo 664º do CPC.
Termos em que se requer a V.ª Ex.ª, que a presente reclamação seja levada à
conferência , com a consequente admissão do recurso para este tribunal, por ser
conforme à lei e à justiça. [...]”
6. Notificado para se pronunciar, querendo, sobre reclamação do recorrente, o
Ministério Público veio responder-lhe nos seguintes termos:
“1 – A presente reclamação é manifestamente infundada.
2 – Na verdade, o recorrente parte da errada suposição que é irrelevante a
indicação, por si feita, do tipo de recurso de fiscalização concreta que
pretende interpor, cabendo ao Tribunal oficiosamente suprir a errónea opção do
recorrente.
3 – Sendo obviamente inadmissível que se pretenda no âmbito da reclamação
deduzida, convolar do tipo de recurso interposto para o que o recorrente passe
agora a considerar adequado.”
Dispensados os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
III – Fundamentação
7. Na decisão sumária reclamada concluiu-se no sentido da impossibilidade de
conhecer do objecto do recurso que o recorrente, ao abrigo do disposto na alínea
a) do nº 1, do art. 70º da LTC, interpôs para este Tribunal, por falta dos seus
pressupostos de admissibilidade. Com a presente reclamação o reclamante não
contesta que assim seja, mas alega que estão “preenchidos todos os requisitos do
artigo 75º. A da LCT”. Alega, ainda, que “sempre o recurso será admissível por
aplicação da alínea b) do artigo 70º da LTC, uma vez que o acórdão recorrido
aplica no caso em apreço o artigo 80º da CCJ, sendo que já foi suscitada durante
o processo a inconstitucionalidade desta norma”. Não tem, porém, como se verá,
já de seguida, qualquer razão.
Em primeiro lugar, porque, estando o recorrente representado por profissional do
foro, só por lapso manifesto se pode confundir, como se faz na reclamação em
causa, pressupostos de admissibilidade do recurso com requisitos do requerimento
de interposição do mesmo. Ausentes aqueles, forçosamente, se tem de concluir,
como se fez na decisão reclamada, pela impossibilidade de conhecimento do
recurso interposto.
Em segundo lugar, porque, tendo o reclamante interposto o recurso ao abrigo da
alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, não há, como este Tribunal tem
sistemática e reiteradamente afirmado, qualquer possibilidade de convolação de
um tal recurso para o referido na alínea b) do mesmo preceito (veja-se, por
todos, o Acórdão n.º 429/2006, disponível em
http://www.tribunalconstitucional.pt/tc/acordaos/). Sendo certo que a invocação
do artigo 664º do Código de Processo Civil nenhuma pertinência tem no presente
contexto.
8. Assim, em face do exposto, apenas resta, reiterando as razões constantes da
decisão reclamada, que em nada são abaladas pela reclamação apresentada,
confirmar o julgamento que ali se formulou no sentido da impossibilidade de
conhecer do objecto do recurso.
III - Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência,
confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do
recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de
conta.
Lisboa, 25 de Julho de 2006
Gil Galvão
Bravo Serra
Artur Maurício