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Processo n.º 452/03
1ª Secção
Relator: Conselheiro Pamplona de Oliveira
Acordam no Tribunal Constitucional
1. A. deduziu oposição à execução fiscal que contra ele revertera, na
qualidade de sócio-gerente de B., LDA., para cobrança de dívidas relativas a IRC
e IVA correspondentes a determinados períodos indicados nos autos.
Por sentença do Tribunal Tributário de 1ª Instância de Vila Real de 30 de Maio
de 2002 – fls. 126 – foi julgada extinta a instância, não obstante a oposição do
interessado, por impossibilidade superveniente da lide resultante de pagamento
voluntário da dívida exequenda.
Inconformado, A. recorreu para o Supremo Tribunal Administrativo, sustentando,
para o que agora releva, a 'inconstitucionalidade da interpretação dada ao
artigo 23º n.º 5 da LGT, em articulação com os artigos 176º n.º 1 alínea a),
264º n.º 1, e 269º do CPPT', por violação do disposto nos artigos 13º, 20º e
268º da Constituição.
2. Por acórdão de 7 de Maio de 2003, de fls. 191, o Supremo Tribunal
Administrativo negou provimento ao recurso, nos seguintes termos:
'(...)
2. O objecto do presente recurso tem como escopo determinar se, paga a quantia
exequenda pelo revertido, lhe é lícito deduzir oposição.
O Mm. Juiz entende que não, pois julgou extinta a instância por impossibilidade
superveniente da lide (art. 287°, e) do CPC), uma vez que, tendo sido paga, pelo
oponente, a quantia exequenda, extinguiu-se a execução e, necessariamente, a
oposição, dado o carácter instrumental desta em relação àquela de que depende:
“a sua finalidade não é apurar direitos ou responsabilidades mas extinguir a
execução quanto ao oponente. E se a extinção já ocorreu por motivos alheios à
oposição tal desiderato toma-se impossível”.
E contra o assim decidido que se insurge o recorrente, alegando, em síntese, e,
por um lado, que, não tendo pago os juros de mora e o acrescido, a execução deve
prosseguir os seus termos normais, dado que não se extingue (cfr. art°s. 176° e
264° do CPPT) e, por outro lado, o entendimento sufragado naquele despacho viola
os princípios de acesso aos tribunais, de uma tutela jurisdicional efectiva e da
igualdade, constitucionalmente consagrados nos art°s. 2°, 268°, 4, e 13° da CRP.
Quid juris?
Adiantando razões, diremos desde logo que o recorrente não tem razão.
Na verdade, a oposição tem como escopo extinguir a execução. Na medida em que
obtenha ganho de causa, o oponente faz extinguir a execução. A extinção da
execução é o escopo normal da oposição. Ora, se a execução se extingue, não há
mais lugar para a oposição à execução. Nem vale a pena dizer que a execução se
mantém para cobrança dos juros de mora e custas. Na verdade a execução, para o
executado-revertido extinguiu-se. E tendo-se extinguido a execução não há mais a
possibilidade de o oponente se opor a uma execução que, para si, “morreu”.
Nem se traga à colação o n. 3 do art. 9° da LGT. Sendo embora possível englobar
a figura jurídica da oposição à execução num dos termos aí referidos
(“reclamação, impugnação ou recurso”), a ratio da lei não comporta essa
interpretação. Na verdade, como defendem Leite de Campos e Outros, in “Lei Geral
Tributária”, Comentada e Anotada', em comentário àquele artigo, “o número 3 do
art. 9° visa pôr ponto final a certa jurisprudência que entendia que um
contribuinte que pagasse o imposto, eventualmente devido, nos quadros de leis
que concedem benefícios fiscais (vulgo “amnistias fiscais”), renunciava
implicitamente ao direito de reclamar ou impugnar esse pagamento”.
Nem vale dizer que o revertido fica em situação diversa e mais gravosa do que
qualquer outro sujeito passivo. Na verdade, o revertido ocupa o mesmo lugar do
originário executado, ficando na mesma situação deste. Nem com mais direitos,
nem com menos direitos. E assim, como o executado, pode opor-se à execução. Se a
sua pretensão obtiver vencimento, a execução extingue-se. Tal como acontece com
o executado, aliás. Se perder, paga juros e todo o mais que acrescer. Como o
executado, também.
Se o executado originário pagar, a execução extingue-se. E, tendo anteriormente
deduzido oposição à execução, esta vai também inexoravelmente extinguir-se, por
ser impossível prosseguir na lide. Se o revertido pagar, também a execução se
extingue. E extinguir-se-á a oposição, em termos absolutamente iguais. Não há
pois qualquer violação do princípio constitucional da igualdade. Revertido e
executado estão na mesma posição. A lei trata-os da mesma forma. E a
interpretação ora dada vai nesse sentido, e conforma-se ao respectivo comando
constitucional.
Nem vale dizer que se coarcta o direito do revertido de acesso aos tribunais. Já
vimos que ele, à semelhança do executado originário, pode fazer valer os seus
direitos. Opondo-se nos termos descritos. Impugnando a liquidação, se entender
que o acto tributário padece de ilegalidade(s). E que, diferentemente do que diz
o recorrente, logo que citado para a execução, na qualidade de revertido
(suposto que antes não teve conhecimento, através dos mecanismos legais
apropriados, do acto de liquidação), pode ele validamente impugnar a liquidação.
Mesmo que pague a dívida tributária, caso em que, a proceder a impugnação, será
emitido o título de anulação que lhe restituirá o que tiver pago. Daí poder
dizer-se igualmente que o revertido tem direito a uma tutela jurisdicional
efectiva.
Podemos pois concluir que não resultam violados os preceitos legais e
constitucionais invocados.
E o facto do executado-revertido – enquanto responsável subsidiário – poder (num
primeiro momento) pagar apenas a dívida (ficando isento de juros de mora e de
custas – art. 23°, 5, da LGT), destina-se a colocá-lo na mesma posição do
originário executado, que teve um tempo em que pôde pagar a dívida tributária
(sem o pagamento de juros e custas).
A pretensão do recorrente não pode pois proceder.
3. Face ao exposto, acorda-se em negar provimento ao recurso.'
3. A. veio então recorrer para o Tribunal Constitucional, ao abrigo
do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de
Novembro, 'por a decisão recorrida ter aplicado o disposto nos artigos 176º n.º
1 alínea a) e 264º n.º 1 do CPPT, na interpretação segundo a qual aquelas normas
determinam que paga a dívida exequenda, o executado não tem o direito de deduzir
oposição, o que viola o direito de acesso aos tribunais, o direito a uma tutela
jurisdicional efectiva e o direito a um tratamento conforme ao princípio da
igualdade, consagrados respectivamente nos artigos 20º, 268º, n.º 4 e 14º [13º]
da C.R.P., inconstitucionalidade já suscitada nas alegações de recurso para o
Supremo Tribunal Administrativo '.
4. Notificadas para o efeito, as partes apresentaram alegações, que o recorrente
concluiu da seguinte forma:
1. Ao dispor que “o responsável subsidiário fica isento de juros de
mora e de custas se, citado para cumprir a divida tributária principal, efectuar
o respectivo pagamento no prazo de oposição», o n.° 5 do artigo 23° da Lei Geral
Tributária estabelece um beneficio traduzido na isenção a favor do responsável
subsidiário, contra o qual tenha revertido a execução fiscal, de juro de mora e
de custas do processo quando citado para pagar a divida tributária principal, a
pague no prazo previsto para a oposição à execução fiscal.
2. Um entendimento das coisas que o legislador, de resto, assumiu, já
que o mesmo tem inequívoca expressão legal no princípio constante do art. 9°, n°
3, da LGT, pois, embora este preceito diga respeito directamente apenas aos
impostos, atenta a clara pretensão de validade geral ou ampla da LGT, deve o
mesmo aplicar-se também aos benefícios ou vantagens relativos às taxas, como
ocorre no presente caso com a isenção de custas.
3. Se o revertido pagou a divida exequenda e simultaneamente se opôs
à execução, não pretendeu pagar a dívida exequenda, mas tão-só preencher o
requisito para poder beneficiar da isenção de custas do anteriormente decorrido
processo de execução fiscal e dos juros de mora.
4. A interpretação dada pelo Acórdão recorrido aos artigos 176°, n.°
1, al. a) e 264°, n.° 1, ambos do CPPT, segundo a qual, ao pagar a dívida
exequenda, o revertido oponente não podia, por força da própria lei, senão
pretender a extinção da execução fiscal e, por conseguinte, a extinção da
oposição, afronta as referidas normas de inconstitucionalidade por violação do
direito de acesso aos tribunais, o direito a uma tutela jurisdicional efectiva e
o direito a um tratamento conforme ao principio da igualdade consagrados,
respectivamente nos artigos 20°, 268°, n.° 4 e 13° da Constituição.
5. Viola o direito de acesso aos tribunais porque ao interpretar os
direitos dos revertido, de requerer a isenção de custas e de poder opor-se à
execução, em termos de uma alternativa, o resultado a que conduz, em situações
como a dos autos, é a da total impossibilidade de o revertido sindicar a
legalidade da reversão e a correcção jurídica da execução contra ele revertida.
6. A interpretação sufragada pelo tribunal a quo, na medida em que
acaba por ter o alcance de o exercício por parte do revertido do direito de
isenção de custas, contemplado no art. 23°, n° 5 da LGT, desencadear como
consequência necessária a renúncia na prática aos direitos de impugnação
judicial da legalidade do acto de reversão e, bem assim, da legalidade do acto
de liquidação do imposto objecto do processo de execução fiscal, se apresenta em
desconformidade com a Constituição.
7. Com efeito, essa interpretação viola o direito de acesso aos
tribunais em segmentos importantes, designadamente no seu segmento de um direito
a uma justiça célere consagrado no n° 4 do seu art. 20°, em que se prescreve que
«todos têm direito a que a causa em que intervenham seja objecto de decisão em
prazo razoável e mediante processo equitativo”. Por isso, o princípio da
economia processual, que mais não é do que uma das expressões ou concretizações
dessa garantia fundamental, não se compadece com remeter os revertidos no
processo de execução fiscal, para assegurar as suas garantias fundamentais para
vias processuais diversas mais onerosas em tempo e dinheiro e, sobretudo, que
implicariam a renúncia prévia a um direito.
8. Tanto mais que o revertido preencheu o referido pressuposto de
facto da isenção de custas em consideração, na suposição inteiramente razoável
de que um tal comportamento não o impediria de exercer, no próprio processo de
execução fiscal, as garantias correspondentes a uma tutela.
9. Por isso, argumentar com o facto de que ele devia ter seguido a
via da impugnação judicial, abstendo-se de exercer o direito do art. 25°, n° 3,
da LGT, tem o significado de uma intolerável iniquidade, pois, ao contrário do
que ocorre com quaisquer outros sujeitos tributários, só poderia exercer esse
direito de tutela jurisdicional efectiva, caso renunciasse antecipadamente ao
direito à isenção de custas respeitantes, de resto, a uma fase do processo de
execução fiscal em que não participou.
10. O que, parecendo à primeira vista um mero condicionamento ao
exercício dessa garantia fundamental do revertido, já que a mesma estaria assim
condicionada ao não exercício por parte deste do direito à isenção das custas do
processo de execução fiscal decorrido até à reversão, acaba por se revelar uma
restrição, e uma restrição inteiramente desproporcionada dessa sua garantia
fundamental. Pois que, em troca dessa pequena vantagem, acaba por perder tão
importante e significativo direito fundamental.
11. A interpretação em análise violaria, também, o direito a igual
tratamento dos sujeitos passivos fiscais decorrente do principio constitucional
da igualdade, ao tratar diversamente situações que merecem tratamento idêntico,
reconhecendo o direito de isenção de custas e juros de mora ao revertido que não
possa ou não pretenda apontar qualquer ilegalidade e nega esse mesmo direito ao
revertido que tenha sido objecto de uma reversão ilegal contra a qual pretenda
reagir, opondo-se à execução fiscal.
12. Os artigos 176°, n.º 1, al. a) e 264°, n.° 1, ambos do CPPT, com a
interpretação que lhes é dada pela decisão recorrida vedaria ao revertido o
direito de reacção contra o acto da reversão, em consequência de ter feito uso
de um benefício constante de uma norma que o isenta de custas e juros de mora,
pagando a dívida e imposto, quando aos sujeitos passivos comuns, nos termos do
disposto no n.° 3 do artigo 9° da Lei Geral Tributária, é conferido o direito de
reagirem contra o acto fiscal no caso de terem pago o imposto ao abrigo de uma
qualquer norma que lhes conceda o direito o benefício no conjunto de certos
encargos ou condições.
Declarando-se a inconstitucionalidade dos artigos 176°, n.° 1, al. a) e 264°,
n.° 1, ambos do CPPT, com a interpretação segunda a qual aquelas normas
determinam que paga a divida exequenda, o revertido não tem o direito de deduzir
oposição, revogando-se em consequência o Acórdão recorrido será feita JUSTIÇA.
Quanto à Fazenda Pública, pronunciou-se no sentido da não inconstitucionalidade,
louvando-se no acórdão n.º 154/2002 deste Tribunal .
5. Constitui objecto do presente recurso a norma, resultante dos
artigos 176º, n.º 1 alínea a) e 264º n.º 1 do Código de Processo e de
Procedimento Tributário, interpretada no sentido de que, uma vez paga a dívida
exequenda, o executado não tem direito de deduzir oposição à execução, mas
apenas enquanto aplicada em casos de reversão.
É o seguinte o texto dos preceitos em causa:
Artigo 176º
Extinção do processo
1 – O processo de execução fiscal extingue-se:
a) Por pagamento da quantia exequenda e do acrescido;
(…)
Artigo 264º
(Pagamento voluntário. Pagamento por conta)
1 – A execução extinguir-se-á no estado em que se encontrar se o executado, ou
outra pessoa por ele, pagar a dívida exequenda e o acrescido, salvo o que, na
parte aplicável, se dispõe neste Código sobre a sub-rogação.
(…)
Resulta claramente do acórdão recorrido que estes preceitos foram aplicados
restringindo ao ora recorrente a extinção da execução, razão pela qual se não
considerou relevante, como pretendia o recorrente, não terem sido pagos 'os
juros de mora e o acrescido'.
Na verdade, e de acordo com o que consta do n.º 5 do artigo 23º da Lei Geral
Tributária, aprovada pelo Decreto-Lei n.º 398/98, de 17 de Dezembro, 'o
responsável subsidiário fica isento de juros de mora e de custas se, citado para
cumprir a dívida tributária principal, efectuar o respectivo pagamento no prazo
da oposição'.
Embora o recorrente não tenha feito incluir a citada norma no objecto do
recurso, o certo é que foi da conjugação daqueles dois preceitos com esta última
norma que o acórdão recorrido retirou a consequência da extinção da execução
quanto ao ora recorrente.
6. Pelo citado acórdão n.º 154/2002 (DR, II série, de 31 de Maio de
2002), foi julgada não inconstitucional a norma, constante do n.º 3 do artigo
246º do Código de Processo Tributário aprovado pelo Decreto-Lei n.º 154/91, de
23 de Abril, quando interpretada no sentido de que 'o pagamento da dívida pelo
responsável subsidiário, nos termos do citado preceito legal, dá lugar à
extinção da instância executiva, tornando impossível a oposição à execução por
aquele deduzida'.
A circunstância de, no presente recurso, estarem em causa normas contidas no
Código de Processo e de Procedimento Tributário, que revogou o Código de
Processo Tributário, e de não ter sido incluído no objecto do recurso de
constitucionalidade o n.º 5 do artigo 23º da Lei Geral Tributária (cuja
inconstitucionalidade fora aliás suscitada perante o Supremo Tribunal
Administrativo), não significa que a questão de constitucionalidade ali
apreciada não seja a mesma que é colocada no presente recurso.
Escreveu-se no Acórdão n.º 154/2002 o seguinte:
'(...) Dispõe o artigo 246º nº 3 do CPT:
“Se os responsáveis pagarem a dívida no prazo para a oposição, não lhes serão
exigidos juros de mora nem custas, valendo a citação como notificação.”
O disposto tem aplicação nos casos de reversão da execução fiscal contra
responsáveis subsidiários - como é, entre outros, o caso dos gerentes das
empresas por dívidas destas à Segurança Social, por força do disposto nos
artigos 13º nº 1 do CPT e 13º do Decreto-Lei nº 103/80, de 9 de Maio
- e consagra, verdadeiramente, um incentivo ao pagamento da dívida,
incentivo que ainda se reforça pelo facto de a falta de pagamento no prazo
indicado ou o decaimento na oposição implicar, para os responsáveis
subsidiários, o pagamento “das custas a que deram causa e as que forem devidas
pelos originários devedores” (nº 4 do mesmo artigo 246º).
Na situação em apreço, o recorrente veio a ser citado para a execução como
gerente da empresa originariamente executada e, no prazo para a oposição,
pretendendo fazer valer-se da isenção de juros de mora e custas prevista no
citado artigo 246º nº 3 do CPT, pagou a dívida.
Deduziu posteriormente, porém, oposição à execução, invocando a sua
ilegitimidade por não ter sido gerente de facto da referida empresa e pretendia,
como se disse, discutir esta questão beneficiando, simultaneamente, do pagamento
da dívida nos termos referidos.
Não compete ao Tribunal Constitucional sindicar o modo como foi aplicado o
direito infraconstitucional, ou seja, no caso, o entendimento de que o pagamento
da dívida não dá lugar à suspensão da execução para ser decidida a oposição
posteriormente deduzida.
Dir-se-á, no entanto, que, tratando-se de um pagamento voluntário, ele determina
nos termos do artigo 343º nº 1 do CPT, a extinção da execução, no estado em que
se encontrar, compreendendo-se, assim, que, extinta a execução, a oposição
contra ela deduzida deixe de ter qualquer sentido, por ter perdido o seu
objecto.
Mas estará a norma em causa, no entendimento dado pelo acórdão recorrido, ferida
das apontadas inconstitucionalidades ?
É desde logo impertinente a invocação da violação do princípio “solve et
repete”, como vício de inconstitucionalidade.
Na verdade, independentemente de quaisquer considerações sobre o acerto da tese
do recorrente no que concerne à vigência no direito tributário do referido
princípio, certo é que este se não mostra consagrado em qualquer norma
constitucional.
De resto, nem o recorrente ensaia ancorar o princípio em preceito
constitucional, limitando-se a afirmar a sua violação.
Tanto basta para se julgar improcedente uma tal alegação.
Mas, ocorrerá violação do direito de acesso aos tribunais ou à justiça, este
sim, consagrado no artigo 20º nº 1 da Constituição ?
A resposta é, também, aqui, negativa.
É extensa a jurisprudência do Tribunal Constitucional sobre aquele direito.
Sobre o sentido da imposição constitucional que de tal direito decorre para o
legislador, escreveu-se no Acórdão nº. 1144/96, (in “Acórdãos do Tribunal
Constitucional”, 35º vol., pág. 349):
“Ao legislador é apenas vedada a criação de obstáculos que dificultem ou
prejudiquem sem fundamento e de forma desproporcionada o direito de acesso dos
particulares aos tribunais em geral.”
E no Acórdão nº 266/2000 (inédito) considerou-se constitucionalmente proscrita
qualquer regra que “possa diminuir intoleravelmente as garantias processuais do
recorrente, ou implicar um cerceamento das suas possibilidades de defesa que se
tenha de considerar desproporcionado ou intolerável (...)”.
Ora, no caso, não se verifica qualquer cerceamento das possibilidades de defesa
do recorrente que se deva considerar desproporcionada ou intolerável.
Com efeito, a lei não impedia que o recorrente discutisse a sua legitimidade
como responsável subsidiário pelo pagamento da dívida exequenda.
Foi o próprio recorrente, pagando a dívida com a isenção de juros de mora e
custas, que se colocou, por acto voluntário, em condições de o não poder fazer.
Bastaria que o recorrente não procedesse ao pagamento para nada se poder opor ao
prosseguimento da oposição à execução, o que – saliente-se – determinaria a
suspensão da execução nos termos dos artigos 293º e 255º do CPT.
O “ónus” que recairia sobre o recorrente seria o risco de, em caso de decaimento
na oposição, ter que pagar a divida já sem o benefício concedido pelo artigo
246º nº 3 do CPT.
Simplesmente, este não deixa de ser, de algum modo, o risco de todos aqueles que
não procedem ao pagamento de uma dívida que lhes é judicialmente exigido,
firmados no entendimento de que, por uma ou outra razão, não são devedores, bem
sabendo que o montante da condenação, em caso de improcedência da defesa, será,
em regra, por via do acréscimo de juros moratórios, superior ao do capital em
dívida.
De resto, em processo civil e em lugar paralelo, os embargos de executado não
dão lugar à suspensão da execução, salvo se o embargante a requerer e prestar
caução (artigo 818º nº 1 do CPC).
Por outro lado, não pode esquecer-se que a dívida era líquida e exigível,
devidamente titulada, e que, o recorrente foi demandado na execução como
responsável pelo seu pagamento, embora o seu património só possa ser afectado
depois de excutidos os bens do originário executado.
Não se considera, em suma, que o entendimento de que o pagamento da dívida nos
termos do artigo 246º nº 3 do CPT extingue a execução e inviabiliza a oposição à
execução, no que dele decorre de que esta só é admissível se o executado por
reversão se sujeitar, em caso de decaimento, ao disposto no nº 4 do mesmo
preceito legal, cerceie as possibilidades de defesa em termos desproporcionados
ou intoleráveis, de modo a ofender o disposto no artigo 20º nº 1 da CRP.(...)'
É este julgamento de não inconstitucionalidade que aqui se reitera, uma vez
que, manifestamente, não ocorre violação do princípio da igualdade ou violação
das garantias previstas no artigo 268º n.º 4 da Constituição. Aliás, a análise
da justificação desenvolvida nas alegações sobre a violação do princípio da
igualdade – baseada na comparação entre os 'sujeitos passivos comuns' e o
executado 'revertido', que ficaria impedido de utilizar um benefício que lhe é
concedido pela lei – só seria aceitável se tivesse sido incluído no objecto do
presente recurso a norma constante do n.º 5 do artigo 23º da Lei Geral
Tributária ['O responsável subsidiário fica isento dos juros de mora e de custas
se, citado para cumprir a dívida tributária principal, efectuar o respectivo
pagamento no prazo de oposição'], ao abrigo da qual foi admitido o pagamento e
determinada a extinção da execução.
Não podendo ampliar-se o objecto do recurso nas alegações (Acórdãos 366/96 ou
589/99, DR II, de 10 de Maio de 1996 e de 20 de Março de 2000), e nele não se
incluindo a citada norma retirada do n.º 5 do artigo 23º da Lei Geral
Tributária, perde sentido a invocação do princípio da igualdade para fundamentar
a alegada inconstitucionalidade.
Nada há, portanto, a acrescentar à fundamentação constante do acórdão n.º
154/2002.
8. Nestes termos, nega-se provimento ao recurso, confirmando-se a
decisão recorrida no que respeita à questão de constitucionalidade.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC.
Lisboa, 26 de Setembro de 2006
Carlos Pamplona de Oliveira
Maria Helena Brito
Rui Manuel Moura Ramos
Maria João Antunes
Artur Maurício