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Processo n.º 218/06
3ª Secção
Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, na 3ª Secção
do Tribunal Constitucional:
1. A. interpôs, no Tribunal Central Administrativo, recurso contencioso de
anulação do acto de indeferimento tácito, imputado ao Secretário de Estado dos
Assuntos Fiscais, da pretensão de integração no índice 235 do Novo Sistema
Retributivo, acrescido de um determinado diferencial, tendo em conta as
remunerações acessórias auferidas, enquanto 2.ª Oficial do Gabinete da Área de
Sines, na situação de requisitada pela Direcção Geral das Contribuições e
Impostos, no período que antecedeu a sua integração no quadro de pessoal desta
mesma direcção geral.
Por acórdão do Tribunal Central Administrativo de 4 de Março de 2004, de fls.
118, foi negado provimento ao recurso.
Inconformada, a recorrente interpôs recurso para o Supremo Tribunal
Administrativo que, por acórdão de 11 de Novembro de 2004, de fls. 156, lhe
negou provimento, mantendo a decisão do Tribunal Central Administrativo.
Ainda inconformada, recorreu para o Pleno da 1.ª Secção do Supremo
Tribunal Administrativo, com fundamento em oposição com o julgado no acórdão do
mesmo Supremo Tribunal de 29 de Maio de 2002, proferido no recurso n.º 48.243.
Por acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 24 de Maio de 2005,
de fls. 190 , foi reconhecida a oposição e ordenado o prosseguimento dos autos,
afirmando-se, nomeadamente, o seguinte:
«No acórdão recorrido é negado provimento ao recurso contencioso de um
indeferimento tácito, onde era formulada uma pretensão da recorrente ser
integrada no NSR em escalão/índice da escala remuneratória da sua categoria
idêntico àquele em que foram integrados os seus colegas que em 1/10/89 já
pertenciam ao quadro e dispunham do mesmo número de diuturnidades, e o
respectivo abono diferencial de integração previsto, agora com os valores
corrigidos. Esta pretensão assentava na aplicação aos funcionários que em
1/10/89 ainda não pertenciam aos quadros da DGCI do regime previsto nos artigos
32.º do Dec. Lei 353-A/89, com referência ao art. 30.º e ao art. 4.º do Dec. Lei
204/91. O acórdão recorrido entendeu que pelo facto da recorrente não pertencer
ao quadro da DGCI, na data da respectiva integração no novo sistema retributivo,
estabelecido pelo Dec. Lei 353-A/89 não lhe era aplicável o regime previsto no
art. 3.º, n.º 4, do Dec. Lei 187/90, de 7/6, cujo âmbito de aplicação se limita
“… ao pessoal do quadro da direcção Geral das Contribuições e Impostos…”. Deste
modo, e como a recorrente, na data em que o Dec. Lei 353-A/89, de 16/10 começou
a produzir efeitos, ainda não iniciara o destacamento na DGCI, encontrando-se a
exercer funções no serviço de origem, sem auferir as tais remunerações
acessórias, não ocorre a violação do art. 30.º, n.º 5, do referido Dec. Lei n.º
353-A/89. Daí que, em coerência com tal entendimento, tenha concluído que o
indeferimento tácito da pretensão da recorrente era legal.
No acórdão fundamento, e perante pretensão substancialmente idêntica,
onde um funcionário que só foi transferido em para o quadro da DGCI em 13-2-92,
portanto depois de 1/10/89, pretendia que lhe fosse aplicável o art. 30.º do
Dec. Lei 353-A/89, de 16/10, conjugado com o art. 3.º, n.º 4, do Dec. Lei
187/90, entendeu-se que o indeferimento tácito dessa pretensão era ilegal. Na
base desta decisão, oposta à do acórdão recorrido subjaz o entendimento segundo
o qual o facto do recorrente não pertencer ao quadro de pessoal da DGCI em
1/10/89 era irrelevante. O DL 187/90, de 7/6, no seu artigo 3.º, não alude às
normas do art. 32.º do DL 353-A/89, mas nem por isso esta última norma deixou de
produzir efeitos concretos, naqueles casos em que, à data da publicação do DL
187/90, se não tinha produzido ainda a integração de funcionários que
continuavam na situação de requisitados, como era o caso da ora recorrida, que
só mais tarde veio a ser integrada no quadro da DGCI. “(…) Na verdade, –
argumenta o acórdão fundamento – o DL 187/90 limitou-se a, no desenvolvimento do
DL 353-A/89, estabelecer o estatuto remuneratório do pessoal da administração
tributária. E no que concerne à transição, regulou apenas a do pessoal integrado
nas carreiras. No entanto, para efeitos remuneratórios, a situação dos
funcionários que não estavam ainda integrados, mas que já então exerciam funções
para a DGCI, como era o caso da ora recorrida (que recebia remunerações
acessórias desde o momento em que ali começou a prestar serviço), teria de ser
resolvida através da conjugação das referidas normas dos dois aludidos diplomas,
e ainda do despacho do SEO, por forma a que do NSR, lhes não resultasse qualquer
diferenciação de vencimentos em relação aos funcionários já integrados
anteriormente na mesma categoria.
Resulta assim, que as normas citadas contemplam a situação da ora
recorrida, qualquer que fosse o tempo de serviço como requisitada, bem como o
momento da sua integração na carreira, devendo considerar-se que, num caso ou
noutro, a extinção das remunerações acessórias, ou a restrição, se operou, com o
NSR, por integração no novo vencimento, no novo escalão, ou por diferencial de
integração, nunca por extinção pura e simples.
Por tais razões, e como resulta da conjugação das aludidas normas do DL
353-A/89 (e 187/90), em cujo âmbito se acolhe a situação em apreço, a ora
recorrida deveria ter sido integrada na categoria e no escalão correspondente à
aplicação das aludidas regra, considerando a sua categoria e remunerações
anteriormente percebidas e que a lei não eliminou, o que vale por dizer no
escalão que oportunamente reclamou. Efectivamente, e como já se salientou, a ora
recorrida encontrava-se a prestar serviço da mesma natureza, na mesma Direcção
Geral e nos mesmos serviços, até que se tornou exequível o NSR, sendo certo que
desde o início de funções e quando transitou para o quadro da DGCI, sempre lhe
foram processados emolumentos.
(…)
Verifica-se, assim, sem margem para dúvidas a apontada oposição pelo
que o recurso deve prosseguir: no acórdão recorrido entendeu-se que o art. 30.º
do Dec. Lei 353-A/89, de 16/10, conjugado com o art. 3.º, n.º 4, do Dec. Lei
187/90, de 7/6, só era aplicável aos funcionários que antes de 1/10/89 já
pertencessem ao quadro da DGCI; o acórdão fundamento, pelo contrário, entendeu
que tal regime era aplicável a um funcionário que começou a prestar serviço,
como requisitado, na DGCI em data posterior a 1/10/89.»
Por acórdão do supremo Tribunal Administrativo de 6 de Dezembro de
2005, de fls. 222, foi negado provimento ao recurso, com este fundamento:
«2.2.1. A questão jurídica a decidir é a de saber se as remunerações
acessórias auferidas, após 30/09/1989, por funcionários requisitados depois
dessa data para o exercício de funções na DGCI e mais tarde integrados no
respectivo quadro de pessoal (como era o caso da Recorrente), poderiam ser
computadas na aplicação do regime de transição para o novo sistema retributivo
da função pública estabelecido pelo DL 353-A/89, de 16.10.
(…)
“… Ora, a integração no NSR, quer por aplicação do DL 353-A/89, de
16-10, quer por aplicação do DL 187/90, de 7-6, tem os seus efeitos reportados a
1-10-89, daí que, tendo a recorrente entrado para a DGCI em data já posterior à
entrada em vigor do DL 187/90 e pertencendo até 30-7-93 ao quadro de origem, a
sua transição para o NSR não pudesse ser feita nos termos do regime decorrente
desse mesmo diploma, uma vez que este se aplica ao pessoal do quadro da DGCI, o
que implica a insubsistência da arguida violação dos artigos 3.º, n.º 4, do DL
187/90;
E também não se mostram violados os artigos 30.º e 32.º, do DL
353-A/89, dado que as remunerações acessórias recebidas pelos funcionários no
âmbito da DGCI não eram auferidas pela recorrente em 30-9-89 (data imediatamente
anterior àquela a que se reporta o início da produção dos efeitos do NSR –
1-10-89);
Com efeito, nessa altura, anterior à requisição (que só ocorreu por
despacho publicado no DR, II Série, de 2-5-90), a recorrente exercia funções no
serviço de origem onde não auferia remunerações acessórias.”
(…)
2.2.2. Alega a recorrente que, com esta interpretação, a lei viola o
disposto nos artigos 13.º e 59.º da Constituição da República Portuguesa.
Também a este argumento daremos resposta idêntica à que já mereceu
neste Pleno, no acórdão de 2005.10.25 – rec. N.º 525/04 e que foi a seguinte:
“Este entendimento não viola o princípio da igualdade previsto no art.
13.º e 59.º, n.º 1, alínea a), da Constituição, uma vez que existe uma diferença
das situações de facto: de um lado, temos funcionários que entraram no quadro da
Direcção Geral das Contribuições e Impostos antes da entrada em vigor do Dec.
Lei 187/90, de 7/6, e no outro lado, temos funcionários integrados no mesmo
quadro, depois daquela data.
Os funcionários que só foram integrados no quadro depois da referida
data, ingressaram directamente no Novo Regime Remuneratório. A não aplicação a
estes funcionários de regras destinadas a regular a transição para o novo regime
tem assim uma razão de ser objectiva e não arbitrária, ou seja um fundamento
razoável, e portanto, na margem de livre conformação do legislador: aplicar o
regime de transição para o novo regime apenas a quem transita para esse regime e
não para quem é nomeado já na sua vigência.
Note-se, que nos termos do art. 32.º, b), do Dec. Lei 353-A/89,
aplicável aos funcionários requisitados, se o lugar de destino conferir direito
a remuneração acessória de qualquer natureza, a remuneração a abonar no lugar de
destino, enquanto se mantiver a requisição, é apurada nos termos do art. 30.º,
n.º 2 a 5. Assim, o funcionário requisitado tem um tratamento igual aos
funcionários do quadro ‘enquanto se mantiver a requisição’. Nos termos do art.
32.º, a), do mesmo diploma legal, dá-se o mesmo no lugar de origem. O
funcionário requisitado vê assim o seu lugar de origem ser integrado no NSR, e o
seu lugar de destino ‘enquanto se mantiver a requisição’ ter idêntico
tratamento.
Refira-se, por último, que os funcionários em questão estavam
requisitados e mantiveram-se, nessa situação, até à nomeação no quadro da
Direcção Geral das Contribuições e Impostos. Portanto, no momento da nomeação,
tiveram a possibilidade de optar entre o ingresso no lugar de destino ou o
regresso ao lugar de origem, lugar onde também se repercutiu na transição para o
NSR a remuneração acessória de qualquer natureza – cfr. Art. 32.º, al. A), do
Dec. Lei 353-A/89, de 16/10. A opção entre ficar no lugar de destino de acordo
com as novas regras da transição para o NSR, mostra que qualquer diferencial
remuneratório que resulte da passagem de funcionário requisitado para
funcionário do quadro da Direcção Geral das Contribuições e Impostos depende da
sua aceitação (opção) do lugar num quadro diferente, e das diferenças
remuneratórias dos cargos respectivos (lugar de origem de destino). Daí que,
nesta perspectiva, não seja arbitrária uma eventual quebra remuneratória, uma
vez que é consentida e querida a transferência entre lugares remunerados de
forma diversa. (…)”.»
2. Novamente inconformada, A. veio «interpor recurso para o Tribunal
Constitucional nos termos da alínea b) do n.º 1 e n.º 2 do art. 70.º da Lei
28/82 de 15 de Novembro com a alteração introduzida pela Lei 85/89 de 7-9 por
considerar que a interpretação que no Acórdão recorrido se faz dos artigos 2.º e
3.º, n.º 4, do DL n.º 187/90, de 7 de Junho, e arts. 30.º e 32.º do DL 353-A/89
de 16-10 viola os arts. 13.º e 59.º da Constituição».
Já neste Tribunal, foi pela Relatora do presente processo proferido
despacho, a fls. 241, convidando a recorrente, nos termos do disposto no n.ºs 1,
5 e 6 do artigo 75.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, a definir as normas,
contidas nos preceitos legais por ela indicados, cuja inconstitucionalidade
pretende que o Tribunal aprecie.
Na resposta ao convite mencionado, a recorrente veio indicar que
«… de acordo com a interpretação que deles faz [os preceitos indicados
no requerimento de interposição de recurso] o Acórdão recorrido, por força de
uma interpretação literal (e restritiva) do art. 2.º do DL 187/90 de 7-6, a
transição para o NSR dos funcionários no exercício de funções na DGCI, e a
receber remunerações acessórias à data de implementação do NSR (o que sucedeu só
após a publicação do DL 187/90 de 7/6 conjugado com o Despacho Ministerial de
19-4-91), só seria feita, com integração dessas mesmas remunerações acessórias,
se o funcionário em questão estivesse em 30-9-89 já integrado no quadro da mesma
DGCI, o que não sucedeu no caso concreto.
Entende, ao invés, a recorrente (e com ela alguma jurisprudência do
STA) que o que está em causa é o regime de transição para o NSR da recorrente,
enquanto integrada no pessoal do regime geral da DGCI (art. 3.º, n.º 4, do DL
187/90) para efeitos das remunerações acessórias a considerar na sua transição
para o NSR de acordo com o n.º 3 do art. 30.º do DL 353-A/89 de 16-10 atenta a
regra de transição do pessoal requisitado constante do art. 32.º b) do mesmo DL
353-A/89 de 16/10 segundo o qual, se o lugar de destino conferir direito a
remuneração acessória de qualquer natureza, a remuneração a abonar no lugar de
destino enquanto se mantiver a requisição é apurada nos termos do n.ºs 2 a 5 do
art. 30.º do mesmo diploma, não havendo pois razão a justificar um desigual
tratamento daqueles que ainda não estavam no quadro da DGCI em 30-9-89 mas que,
apesar disso, estavam requisitados na DGCI à data da implementação do NSR (o que
só sucedeu com a aplicação do DL 187/90 de 7-6 pelo Despacho Ministerial de
19-4-91) e que assim receberam legalmente as remunerações acessórias devidas ao
pessoal do quadro, até à sua integração no NSR, como é o caso da ora recorrente.
Nem se diga que existe uma diferença de situações de facto
(funcionários do quadro da DGCI antes da entrada em vigor do DL 187/90 e depois
da sua entrada em vigor) a justificar o desigual tratamento na integração no
NSR, como argumenta o Acórdão recorrido.
Na verdade, há, salvo o devido respeito, violação do princípio
constitucional da igualdade de tratamento (arts. 13.º e 59.º da Constituição) na
interpretação feita pelo Acórdão “a quo” dos arts. 2.º e 3.º, n.º 4, do DL
187/90 de 7/6 conjugados com os arts. 30.º e 32.º do DL 353-A/89 de 16-10, cuja
razoabilidade não se alcança.
Na verdade, tendo a recorrente transitado – como 2.º oficial – em
regime de requisição para a DGCI, e auferindo, por isso, remunerações acessórias
à data da efectiva integração no NSR, deveria ter tido tratamento igual aos
demais funcionários (do regime geral) integrados no quadro de DGCI em, exercício
nesta, das mesmas funções e categoria idêntica. E isto enquanto se mantivesse
requisitada seguida de integração no quadro da DGCI como sucedeu “in casu”.
Donde, com todo o respeito, se afigura claro à recorrente que a
interpretação dos arts. 2.º e 3.º n.º 4 do DL 187/90 de 7/6 conjugados com os
arts. 30.º e 32.º do DL 353-A/89 dada pelo Acórdão recorrido, enquanto
restringindo aos funcionários (do regime geral) já integrados no quadro da DGCI
em 30-9-89, a transição para o NSR incluindo nesta as remunerações acessórias,
legalmente recebidas por todos, no exercício da mesmas funções e com a mesma
categoria até à implementação do NSR, é violadora do princípio da igualdade
previsto nos arts. 13.º e 59.º da Constituição sem que se perceba a
razoabilidade de um tal tratamento diferenciado, devendo como tal ser
declarada.»
3. O recurso foi admitido.
Notificadas para o efeito, as partes apresentaram as suas alegações, que a
recorrente concluiu do seguinte modo:
«a)Vem o presente recurso interposto do douto Acórdão do Pleno da secção do
contencioso Administrativo ‘do STA que considerou que não pertencendo a
recorrente ao quadro da DGCI na data da integração no NSR, não lhe era aplicável
o regime estabelecido no art° 3° n° 4 do DL 187/90, cujo âmbito de aplicação se
limitaria ao pessoal do quadro da DGCI naquela mesma data por força do art° 2°
do mesmo diploma.
b) Assim na transição da recorrente para o NSR não haveria que considerar
remunerações acessórias (arts. 30, n° 2 e n° 3 do DL 353-A/89 de 16-10) pois que
à data da produção de efeitos deste diploma ainda não iniciara funções como
requisitada na DGCI encontrando-se no serviço de origem sem auferir tais
remunerações.
c) Ora, ainda que a recorrente não fosse funcionária do quadro da DGCI à data de
1-10-89, já então era funcionária pública, possuindo a mesma categoria e
diuturnidades, razão pela qual teria de ser integrada com os restantes
funcionários da DGCI na mesma situação funcional, no mesmo índice remuneratório,
ainda que este apenas lhe fosse devido desde a sua tomada de posse, como
requisitada, na DGCI em 23-4-90.
d) Na verdade, o que sumariamente releva “in casu” é saber se ela já se
encontrava requisitada na DGCI e a receber as inerentes remunerações acessórias
aquando da transição para a nova estrutura salarial, o que apenas ocorreu após a
(posterior) publicação do DL 187/90 de 7-6, conjugado com o Despacho ministerial
de 19-4-91, o que efectivamente sucedeu.
e) Nem se compreende, com todo o respeito, o argumento utilizado pelo Acórdão
recorrido de que a possibilidade de opção da recorrente – até à ocupação de um
lugar do quadro da DGCI – entre ficar no lugar do destino, ou optar pelo
regresso ao lugar de origem, justificaria o desigual tratamento assim
pretensamente “querido” pelo recorrente pois, não é de modo algum crível que
alguém opte por um lugar do quadro de um serviço distinto do do seu lugar de
origem, onde já se encontrava requisitada com remuneração igual à dos
funcionários do quadro, sabendo que ficará por força dessa integração em
situação de desigualdade salarial com quem exerce as mesmas funções com igual
categoria e mesmo número de diuturnidades.
f) Donde, no entender da recorrente (acompanhada de parte da jurisprudência do
STA e do douto voto de vencido proferido no Acórdão recorrido) não há nenhuma
razão atendível para rejeitar a aplicação à recorrente do regime de transição do
NSR de acordo com o art° 30 e por força do art° 32 ambos do DL 353-A/89 quando
aquela, à data da publicação do DL 187/90 de 7-6 conjugado com o Despacho
Ministerial de 19-4-91 já se encontrava ao serviço da DGCI em regime de
requisição (desde 23-4-90) a receber como os demais funcionários (do quadro) da
DGCI, com idêntica categoria e n° de diuturnidades, as mesmas remunerações
acessórias, pelo que uma tal interpretação restritiva da lei (arts. 30 a 32 do
DL 353-A/89 conjugados com os arts 2° e 3° n° 4 do DL 187/90 de 7/6) sufragada
pelo Acórdão recorrido segundo a qual estas normas só se aplicariam ao pessoal
integrado no quadro da DGCI à data da entrada em vigor do NSR (1-10-89) é
atentatória do princípio da igualdade consagrado nos arts. 13 e 59 da
Constituição e, como tal, deve ser declarada inconstitucional por esse
Meritíssimo Tribunal Constitucional.»
Quanto ao recorrido, veio sustentar que o acórdão recorrido não violou, nem as
disposições legais aplicáveis, nem o princípio constitucional da igualdade,
desde logo porque “a situação da recorrente, que prestou serviço noutro
organismo que não a DGCI, por ser materialmente diferente da situação daqueles
que prestavam serviço e eram funcionários do quadro da DGCI à data da entrada em
vigor do NSR, constitui fundamento material bastante segundo critérios
objectivos relevantes, para que as remunerações acessórias a que tinham direito
os funcionários da DGCI que aí prestavam serviço antes da entrada em vigor do
NSR, não fossem levadas em conta para efeitos da transição da recorrente para o
NSR”.
4. Não havendo obstáculos ao conhecimento do recurso, cabe começar por
fixar o respectivo objecto.
É o seguinte o texto das normas impugnadas (artigos 30.º, n.ºs 1 a 5, e
32.º, alínea b), do Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro e 2.º e 3.º, n.º
4, do Decreto-Lei n.º 187/90, de 7 de Junho):
– Decreto-Lei n.º 353-A/89, de 16 de Outubro:
Artigo 30.º
(Regime de transição)
1 – A integração na nova estrutura salarial faz-se de acordo com as
seguintes regras:
a) Na mesma carreira e categoria;
b) Em escalão a que corresponda na estrutura da categoria remuneração igual ou,
se não houver coincidência, a remuneração imediatamente superior.
2 – A remuneração a considerar para efeitos da transição referida no
n.º 1 resulta do valor correspondente à remuneração base decorrente do
Decreto-Lei n.º 98/89, de 29 de Março, actualizada a 12%, acrescida do montante
da remuneração acessória a que eventualmente haja direito, com excepção das que
sejam consideradas suplementos, nos termos do Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de
Junho, e deste diploma.
3 – Para efeitos do número anterior, as remunerações acessórias e
montante variável são fixadas no valor médio das remunerações acessórias
percebidas nos 12 meses imediatamente anteriores à data de produção de efeitos
do presente diploma.
4 – Sempre que o montante apurado nos termos dos números anteriores
ultrapasse o valor do escalão máximo da respectiva categoria, é criado um
diferencial de integração correspondente `diferença entre a remuneração
indiciária e o montante a que o funcionário ou agente tem direito nos termos dos
números anteriores.
5 – Da aplicação do presente diploma não pode resultar a redução das
remunerações efectivamente auferidas.
(…)
Artigo 32.º
(Regime de transição do pessoal destacado, requisitado e em comissão de serviço)
A transição do pessoal destacado, requisitado e em comissão de serviço
obedece ao disposto no artigo 30.º, devendo ainda atender-se às seguintes
regras:
a) Se o lugar de origem conferir direito a remuneração de acessória de qualquer
natureza, a remuneração a considerar para efeitos de transição no lugar de
origem é apurada nos termos dos n.ºs 2 e 3 do artigo 30.º, ainda que a
remuneração acessória não venha sendo efectivamente abonada;
b) Se o lugar de destino conferir direito a remuneração acessória de qualquer
natureza, a remuneração a abonar no lugar de destino, enquanto se mantiverem o
destacamento, a requisição e a comissão de serviço, é apurada nos termos dos
n.ºs 2 a 5 do artigo 30.º.
– Decreto-Lei n.º 187/90, de 7 de Junho:
Artigo 2.º
(Âmbito)
O presente diploma aplica-se ao pessoal do quadro da Direcção-Geral das
Contribuições e Impostos dos seguintes grupos:
a) Administrador tributário do grupo do pessoal dirigente superior;
b) Pessoal dirigente;
c) Pessoal técnico superior do Centro de Estudos Fiscais;
d) Pessoal técnico superior (economistas/juristas) que desempenhe funções na
área da fiscalização tributária;
e) Pessoal técnico de orientação e supervisão;
f) Pessoal técnico tributário;
g) Pessoal técnico de fiscalização tributária;
h) Pessoal técnico judicial.
Artigo 3.º
(Transição)
(…)
4 – Para efeitos de aplicação do n.º 3 do artigo 30.º do Decreto-Lei
n.º 353-A/89, de 16 e Outubro, ao pessoal do regime geral da Direcção-Geral das
Contribuições e Impostos, incluindo o pessoal dirigente abrangido pelo artigo
31.º do referido decreto-lei, adoptar-se-á critério idêntico ao utilizado para
as carreiras de pessoal da administração tributária, sendo os respectivos
montantes fixados por categoria, mediante despacho do Ministro das Finanças.
O artigo 30.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89 define o regime de transição
relativo à integração na nova estrutura salarial dos funcionários e agentes da
Administração Pública, prevista no mesmo diploma, estabelecendo o seu artigo
32.º as regras de transição do pessoal destacado, requisitado e em comissão de
serviço.
Nos termos do artigo 45.º do mesmo Decreto-Lei n.º 353-A/89, este «produz
efeitos a partir de 1 de Outubro de 1989».
Por seu turno, o artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 187/90, de 7 de Junho,
estabelece o critério para efeitos de aplicação do n.º 3 do artigo 30.º do
Decreto-Lei n.º 353-A/89, «ao pessoal do regime geral da Direcção-Geral das
Contribuições e Impostos».
Nos termos do artigo 15.º do mesmo diploma, este «produz efeitos a partir de 1
de Outubro de 1989 no que respeita à matéria de incidência remuneratória».
A decisão recorrida entendeu que as remunerações acessórias, a que respeitam o
artigo 30.º, n.º 3, do Decreto-Lei n.º 353-A/89 e o artigo 3.º, n.º 4, do
Decreto-Lei n.º 187/90, auferidas, após a data de produção de efeitos de ambos
os diplomas, isto é, 1 de Outubro de 1989, por funcionários, como a recorrente,
requisitados depois dessa data para o exercício de funções na Direcção Geral das
Contribuições e Impostos, e mais tarde integrados no respectivo quadro de
pessoal, não poderiam ser consideradas na aplicação do regime de transição para
o novo sistema retributivo da função pública estabelecido pelos citados
diplomas.
A recorrente sustenta, todavia, que «a interpretação dos artigos 2.º e 3.º, n.º
4, do DL 187/90 de 7/6 conjugados com os artigos 30.º e 32.º do DL 353-A/89 dada
pelo acórdão recorrido, enquanto restringindo aos funcionários (do regime geral)
já integrados no quadro da DGCI em 30-9-89, a transição para o NSR incluindo
nesta as remunerações acessórias, legalmente recebidas por todos, no exercício
da mesmas funções e com a mesma categoria até à implementação do NSR, é
violadora do princípio da igualdade previsto nos artigos 13.º e 59.º da
Constituição».
Constituem, assim, o objecto do presente recurso as normas conjugadas dos
artigos 2º e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 187/90, e 30.º e 32.º do Decreto-Lei
n.º 353-A/89, interpretadas no sentido de que as remunerações acessórias
recebidas, após a data da entrada em vigor destes dois diplomas, por
funcionários requisitados depois dessa data para o exercício de funções da
Direcção-Geral das Contribuições e Impostos e mais tarde integrados no
respectivo quadro de pessoal, não podem ser consideradas na aplicação do regime
de transição para o novo sistema retributivo da função pública, estabelecido
pelos citados diplomas.
5. Como se viu, o acórdão recorrido pronunciou-se expressamente sobre a questão
de constitucionalidade suscitada pela recorrente.
Afirmou-se em tal decisão que a interpretação adoptada para as normas impugnadas
«não viola o princípio da igualdade previsto no artigo 13.º e 59.º, n.º 1,
alínea a), da Constituição, uma vez que existe uma diferença das situações de
facto: de um lado, temos funcionários que entraram no quadro da Direcção Geral
das Contribuições e Impostos antes da entrada em vigor do Dec. Lei n.º 187/90,
de 7/6, e no outro lado, temos funcionários integrados no mesmo quadro, depois
daquela data».
Por outras palavras, a decisão recorrida entendeu que as remunerações acessórias
só seriam consideradas para efeitos de integração no novo sistema retributivo
desde que auferidas por pessoal já integrado no quadro da Direcção-Geral de
Contribuições e Impostos à data da produção de efeitos do Decreto-Lei n.º
187/90. Aos funcionários que em tal data não faziam parte do quadro de pessoal
da Direcção Geral das Contribuições e Impostos, nem tão pouco, como é o caso da
recorrente, se encontravam na situação de requisitados por essa direcção geral,
não seria aplicável o regime dos artigos 30.º, 32.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89,
e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 187/90.
A recorrente sustenta, em sentido contrário, que tendo «transitado –
como 2.º oficial – em regime de requisição para a DGCI, e auferindo, por isso,
remunerações acessórias à data da efectiva integração no NSR, deveria ter tido
tratamento igual aos demais funcionários (do regime geral) integrados no quadro
de DGCI em, exercício nesta, das mesmas funções e categoria idêntica. E isto
enquanto se mantivesse requisitada seguida de integração no quadro da DGCI como
sucedeu “in casu”».
Para se avaliar a razoabilidade do tratamento diverso subjacente à
interpretação das normas impugnadas levada a cabo pela decisão recorrida
(tratamento diverso aí expressamente assumido), é necessário ter presentes
alguns traços do regime dos diplomas onde se contêm tais normas.
O Decreto-Lei n.º 353-A/89, que estabelece regras sobre o estatuto remuneratório
dos funcionários e agentes da Administração Pública e sobre a estrutura das
remunerações base das carreiras e categorias nele contempladas (cfr. Artigo 1.º)
foi, como no respectivo preâmbulo se esclarece, emitido no desenvolvimento do
regime jurídico definido pelo Decreto-Lei n.º 184/89, de 2 de Junho.
Este último diploma, por seu turno, fixa os princípios gerais em matéria de
emprego público, remunerações e gestão de pessoal da função pública.
O respectivo artigo 38.º, sob a epígrafe «Remunerações acessórias», preceitua
que são extintas todas as remunerações não previstas ou enquadráveis no artigo
15.º, isto é, a remuneração base, as prestações sociais e subsídio de refeição,
e os suplementos.
O artigo 39.º do mesmo diploma define o regime de transição nos termos do qual
cada funcionário ou agente é integrado na nova estrutura salarial. No seu n.º 3,
preceitua que «nos casos de percepção de remunerações acessórias extintas pelo
artigo anterior, a remuneração a considerar para efeitos de transição resulta do
somatório dos montantes correspondentes à remuneração base, às diuturnidades e
às remunerações acessórias».
Finalmente, o Decreto-Lei n.º 187/90, emitido, como se diz também no respectivo
preâmbulo, no desenvolvimento do regime jurídico definido pelo Decreto-Lei n.º
353-A/89, de 16 de Outubro, estabelece o estatuto remuneratório do pessoal da
administração tributária e aprova a respectiva escala salarial (cfr. Artigo
1.º).
Assim, os artigos 39.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 184/89, os
artigos 30.º e seguintes do Decreto-Lei n.º 353-A/89 e o artigo 3.º do
Decreto-Lei n.º 187/90 estabelecem, todos eles, como se alcança desde logo pelas
respectivas epígrafes, regras relativas à transição para o novo sistema
retributivo, cujos princípios gerais foram definidos pelo primeiro dos diplomas
e depois sucessivamente desenvolvidos e concretizados pelos segundo e terceiro.
De um modo especial, as normas dos artigos 30.º e 32.º do Decreto-Lei n.º
353-A/89 e do artigo 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 187/90, impugnadas pela
recorrente, prevêem, quanto às remunerações acessórias, dois tipos de situações.
Em primeiro lugar, o regime de transição das remunerações acessórias para a nova
estrutura remuneratória do pessoal integrado nas carreiras da administração
tributária (artigo 3.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 187/90), isto é, do pessoal do
quadro da Direcção-Geral das Contribuições e Impostos (artigo 2.º do Decreto-Lei
n.º 187/90). Tal regime encontra-se previsto nos artigos 30.º, n.ºs 2 e 3, do
Decreto-Lei n.º 353-A/89, e 3.º, n.º 4, do Decreto-Lei n.º 187/90.
Em segundo lugar, o regime de transição das remunerações acessórias para a nova
estrutura remuneratória do pessoal destacado, requisitado e em comissão de
serviço, previsto no artigo 32.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89. Quanto a esta
segunda situação, importa especialmente salientar, na perspectiva do caso dos
autos, que a transição do pessoal requisitado para o novo sistema remuneratório
obedece ao disposto no artigo 30.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, devendo ainda
atender-se, nos termos da alínea b) do citado artigo 32.º, a que, se o lugar de
destino conferir direito a remuneração acessória de qualquer natureza, a abonar
nesse lugar de destino, esta será apurada nos termos dos n.ºs 2 a 5 do artigo
30.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89, enquanto se mantiver a requisição.
A questão de saber se um funcionário se integra nalguma das duas situações
mencionadas, isto é, saber se se trata de funcionário do quadro da
Direcção-Geral das Contribuições e Impostos ou de funcionário requisitado para
essa mesma direcção geral, determinar-se-á, naturalmente, considerando a data de
produção de efeitos de ambos os diplomas, fixada em 1 de Outubro de 1989.
Nesta última data, a recorrente não pertencia ao quadro da
Direcção-Geral das Contribuições e Impostos, nem tão pouco se achava ainda
requisitada pela mesma direcção geral, vindo a tomar posse como funcionária do
quadro de pessoal da DGCI ao abrigo da Portaria n.º 52/92, publicada no Diário
da República, II Série, de 21 de Fevereiro de 1992 (cfr. Pontos 1 a 3 da matéria
de facto dada como assente pela decisão recorrida, a fls. 223).
Por esta razão, entendeu-se, na decisão recorrida, que as remunerações
acessórias eventualmente auferidas pela recorrente após a data da produção de
efeitos do Decreto-Lei n.º 187/90, mas ainda na situação de requisitada, não
deveriam ser consideradas para efeitos de integração no novo sistema
retributivo. Nas palavras do acórdão, a «não aplicação a estes funcionários [que
à data da produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 187/90 não faziam parte do
quadro da DGCI] de regras destinadas a regular a transição para o novo regime
tem assim uma razão de ser objectiva e não arbitrária, ou seja um fundamento
razoável, e portanto, na margem de livre conformação do legislador: aplicar o
regime de transição para o novo regime apenas a quem transita para esse regime e
não para quem é nomeado já na sua vigência».
Com efeito, a transição do pessoal do quadro da DGCI, ou mesmo de pessoal
requisitado para essa direcção geral (e neste caso apenas pelo período da
requisição), para o novo sistema retributivo não depende da respectiva vontade,
mas resulta da lei.
Pelo contrário, a aplicação das novas regras do estatuto remuneratório do
pessoal da administração tributária não se deu, no caso da recorrente, em
virtude de transição para o novo estatuto, mas de nomeação (dependente da
respectiva aceitação, nos termos do artigo 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º
427/89, de 7 de Dezembro) já no seu âmbito de vigência.
Assim, diferentemente do que pretende a recorrente, existe um fundamento
razoável para a interpretação das normas dos artigos 2.º e 3.º, n.º 4, do
Decreto-Lei n.º 187/90, e 30.º e 32.º do Decreto-Lei n.º 353-A/89 levada a cabo
pela decisão recorrida, nos termos da qual as remunerações acessórias auferidas,
após a data de produção de efeitos de ambos os diplomas, isto é, 1 de Outubro de
1989, por funcionários, como a recorrente, requisitados depois dessa data para o
exercício de funções na Direcção Geral das Contribuições e Impostos, e mais
tarde integrados no respectivo quadro de pessoal, não poderiam ser consideradas
na aplicação do regime de transição para o novo sistema retributivo da função
pública estabelecido pelos citados diplomas.
Só poderia falar-se de “transição” em relação ao pessoal já integrado nas
carreiras da administração tributária, o que não sucedeu, em relação ao momento
relevante, no caso da recorrente.
6. A recorrente fundamentou o seu recurso na violação do princípio da
igualdade, quer em geral (artigo 13º da Constituição), quer no domínio das
relações de trabalho (artigo 59º da Constituição).
Como se escreveu no acórdão n.º 455/2002 (Diário da República, II
série, de 3 de Janeiro de 2003), «é abundante a jurisprudência constitucional
sobre este princípio. Recorrendo, por exemplo, ao Acórdão n.º 188/90 (in
Acórdãos do Tribunal Constitucional, 16º vol., 1992, pp. 416-417 e Diário da
República, II Série, de 12 de Setembro de 1990), verifica-se que
“(…) este Tribunal Constitucional vem perfilhando a interpretação do princípio
da igualdade como proibição do arbítrio. Afirma-se, como efeito, no Acórdão n.º
39/88 (Diário da República, 1ª série, de 3 de Março de 1988): «O princípio da
igualdade não proíbe, pois, que a lei estabeleça distinções. Proíbe, isso sim, o
arbítrio; ou seja: proíbe as diferenciações de tratamento sem fundamento
material bastante, que o mesmo é dizer sem qualquer justificação razoável,
segundo critérios de valor objectivo, constitucionalmente relevantes, Proíbe
também que se tratem por igual situações essencialmente desiguais. E proíbe
ainda a discriminação; ou seja: as diferenciações de tratamento fundadas em
categorias meramente subjectivas, como são as indicadas, exemplificativamente,
no n.º 2 do artigo 13º». E, no Acórdão n.º 157/88 (Diário da República, 1ª
série, de 26 de Julho de 1988), escreve-se: «Retomando aqui, uma vez mais, o
entendimento que este Tribunal vem perfilhando (na esteira, de resto, da
Comissão Constitucional e da doutrina) acerca do sentido e alcance do princípio
da igualdade, na sua função ‘negativa’ de princípio de ‘controle’…, tudo estará
em saber se, ao estabelecer a desigualdade de tratamento em causa, o legislador
respeitou os limites à sua liberdade conformadora ou constitutiva
(‘discricionariedade’ legislativa), que se traduzem na ideia geral de proibição
de arbítrio. Ou seja: tudo estará em saber se essa desigualdade se revela como
‘discriminatória’ e arbitrária, por desprovida de fundamento racional (ou
fundamento material bastante), atenta a natureza e a especificidade da situação
e dos efeitos tidos em vista (e logo o objectivo do legislador) e, bem assim, o
conjunto dos valores e fins constitucionais (isto é, a desigualdade não há-de
buscar-se num ‘motivo’ constitucionalmente impróprio)»
(…)
Esclareça-se que a «teoria da proibição do arbítrio» não é um critério definidor
do conteúdo do princípio da igualdade, antes expressa e limita a competência de
controlo judicial. Trata-se de um critério de controlabilidade judicial do
princípio da igualdade que não põe em causa a liberdade de conformação do
legislador ou a discricionariedade legislativa. A proibição do arbítrio
constitui um critério essencialmente negativo, com base no qual são censurados
apenas os casos de flagrante e intolerável desigualdade. A interpretação do
princípio da igualdade como proibição do arbítrio significa uma autolimitação do
poder do juiz, o qual não controla se o legislador, num caso concreto, encontrou
a solução mais adequada ao fim, mais razoável ou mais justa.”»
Aplicando-se também agora a ideia de proibição de arbítrio que acaba de
ser exposta, pode igualmente dizer-se que considerar violado o princípio da
igualdade «implicaria já um controlo judicial da procura legislativa da solução
mais adequada, e não apenas a censura de um tratamento arbitrário por parte do
mesmo legislador» (citado acórdão n.º 455/2002).
Com efeito, no caso dos autos, as situações que a recorrente pretende comparar,
à luz do princípio constitucional da igualdade, são a dos funcionários que à
data da produção de efeitos do Decreto-Lei n.º 187/90 faziam parte do quadro da
DGCI, ou se achavam requisitados por essa direcção geral, e aos quais se
aplicou, independentemente da respectiva vontade, o regime de transição para o
novo estatuto remuneratório (no caso dos funcionários requisitados apenas pelo
período da requisição, como se viu) e os funcionários, como a recorrente, que
apenas após a data da produção de efeitos do citado diploma foram requisitados e
depois integrados, por nomeação, no quadro de pessoal da DGCI, portanto já na
vigência do novo estatuto remuneratório.
Colocada a questão nestes termos, não parece que se possa invocar um
tratamento desigual e arbitrário entre os dois grupos de funcionários. Desde
logo, porque não faz sentido falar de “transição” para o novo estatuto
remuneratório dos funcionários nomeados para o quadro de pessoal da DGCI já
depois daquele estatuto se encontrar em vigor e podendo o funcionário em causa
optar pelo regresso ao respectivo lugar de origem.
7. Assim, decide-se negar provimento ao recurso, confirmando a
decisão recorrida no que respeita à questão de constitucionalidade.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 ucs.
Lisboa, 27 de Setembro de 2006
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Bravo Serra
Gil Galvão
Vítor Gomes
Artur Maurício