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Processo n.º 1371/13
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que são reclamantes A. e B. e é reclamado o Ministério Público, os primeiros reclamaram, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho de 2 de dezembro de 2013 que não admitiu recurso para o Tribunal Constitucional.
2. O despacho reclamado tem o seguinte teor:
«Não admito o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, dado que o recorrente não está em prazo.
Com efeito, o prazo para a interposição de tal recurso é de 10 dias (art. 75.º, n.º 1 da Lei n.º 28/82, de 15/11).
Ora, os recorrentes foram notificados do acórdão do STJ por carta enviada por via postal registada para o seu mandatário em 18/10/2013 (fls. 2229), presumindo-se notificados no dia 23/10 (terceiro dia útil seguinte) e tendo terminado o prazo para interpor recurso no dia 07/11 (dez dias mais três dias úteis com pagamento de multa).
Tendo o requerimento entrado no dia 28/11, via fax, o prazo está manifestamente ultrapassado.
É certo que os recorrentes interpuseram recurso para o Pleno das Secções do STJ, não estando previsto na lei tal tipo de recurso, que representaria um 4.º grau de jurisdição, pelo que o mesmo não foi admitido.
Porém, dada a manifesta inadmissibilidade de tal recurso e tendo entretanto esgotado o prazo de recurso para o Tribunal Constitucional, este também é inadmissível.
Acresce que os recorrentes não suscitaram a inconstitucionalidade das normas agora invocadas durante o processo, o que constitui igualmente fundamento de inadmissibilidade».
3. Desta decisão foi apresentada a presente reclamação, onde se lê, entre o mais, o seguinte:
«Sucede, porém, que o entendimento sufragado pelo Exm.º Senhor Juiz Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça, foi de não admitir o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, alegando, além do mais, no seu douto despacho que:
“Não admito o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, dado que o recorrente não está em prazo.
(...)
É certo que os Recorrentes interpuseram recurso para o Pleno das Secções do STJ, não estando previsto na lei tal tipo de recurso, que representaria um 4.º grau de jurisdição, pelo que o mesmo não foi admitido.
Porém, dada a manifesta inadmissibilidade de tal recurso e tendo entretanto esgotado o prazo de recurso para o Tribunal Constitucional, este também é inadmissível.
Acresce que os recorrentes não suscitaram a inconstitucionalidade das normas agora invocadas durante todo o processo, o que constitui igualmente fundamento de inadmissibilidade.”
Salvo o maior e devido respeito - que é muito - andou mal o Supremo Tribunal de Justiça.
Com efeito, o recurso interposto para esse Egrégio Tribunal Constitucional, estava em tempo e cumpria todos os demais requisitos exigíveis pelo artigo 75.º-A da Lei de Organização e Funcionamento do Tribunal Constitucional.
No que toca ao prazo para a interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, dispõe o artigo 75.º, n.º 1 da supra citada Lei, que:
“O prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional é de 10 dias e interrompe os prazos para a interposição de outros que porventura caibam da decisão, os quais só podem ser interpostos depois de cessada a interrupção.”
No caso vertente, notificados do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17/10/2013, que manteve a decisão do Tribunal da Relação do Porto, os arguidos e aqui reclamantes, discordando mais uma vez do decidido, vieram dele interpor recurso para o Pleno de Seções do Supremo Tribunal de Justiça.
Porém, tal recurso não foi admitido pelo Supremo Tribunal de Justiça, tendo essa decisão sido proferida no dia 14 de Novembro de 2013 e expedida, por correio registado, no dia 15 de Novembro de 2013.
Tendo em conta o que acima se referiu e atendendo à regra de contagem de prazos, os reclamantes consideraram-se notificados no terceiro dia útil posterior ao do envio, ou seja, no dia 18 de Novembro de 2013, terminando o prazo para interpor recurso no dia 03 de Dezembro de 2013 (dez dias acrescidos de mais três dias úteis com pagamento de multa).
Ora, os Recorrentes deram entrada em juízo do competente requerimento de interposição e respetivas alegações no dia 28 de Novembro de 2013, pelo que estavam em tempo.
O facto de terem recorrido para o Pleno e este não o ter apreciado por falta de fundamento legal, não é preclusivo do seu direito e não lhes seria exigível interpor, simultaneamente dois recursos, até porque só a partir da decisão do Pleno deixou de caber recurso, ou seja esgotou-se o poder jurisdicional do Supremo, devendo por tal facto o prazo contar-se a partir do momento em que se tome definitiva uma decisão que não admita recurso».
4. Neste Tribunal, o Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação, dizendo, entre o mais, o seguinte:
«1. O Supremo Tribunal de Justiça, por acórdão de 17 de Outubro de 2013, negou provimento ao recurso interposto pelos arguidos A. e B. do acórdão da Relação do Porto que, concedendo parcial provimento ao recurso por eles interposto da decisão da 1ª instância, condenou cada um deles, em cúmulo, na pena única de 9 anos de prisão.
2. Não se conformando, os arguidos, daquele acórdão, interpuseram recurso para o “Pleno das Secções do Supremo Tribunal de Justiça”.
3. Por ser manifesto que esse recurso não tinha qualquer fundamento legal, o mesmo não foi admitido.
4. Vieram então os arguidos interpor recurso para o Tribunal Constitucional do “acórdão” proferido por “este tribunal”, ou seja, do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que negara provimento ao recurso (vd. nº 1).
5. Como o recurso não foi admitido, apresentaram a presente reclamação.
6. A questão a decidir no recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça tinha a ver, exclusivamente, com a medida da pena única.
7. O recurso interposto para o “Pleno das Secções do Supremo Tribunal de Justiça” (vd. nº 2) equivaleria a conceder aos arguidos um triplo grau de recurso.
8. Como se diz e claramente se demonstra no douto despacho que não o admitiu (vd. nº 3), estamos perante um meio processual inexistente no nosso ordenamento jurídico, em matéria processual penal.
9. Ora, como o Tribunal Constitucional tem reiterada e unanimemente entendido, a utilização de um meio impugnatório inexistente constitui um incidente processual anómalo que, naturalmente, não tem a virtualidade de interromper ou suspender o prazo de interposição de recurso para este Tribunal (vd. v.g. Acórdãos nºs 463/2007, 640/2011 e 95/2012).
10. Assim, tendo o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça sido notificado aos recorrentes por carta enviada em 18 de Outubro de 2013 (fls. 123), quando foi interposto recurso para o Tribunal Constitucional, em 28 de Novembro de 2013 (fls. 145), o prazo de dez dias (artigo 75º, nº 1, da LTC), já havia sido ultrapassado».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
O despacho reclamado não admitiu o recurso de inconstitucionalidade interposto do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 17 de outubro de 2013, mediante requerimento entrado no dia 28 de novembro, com fundamento na circunstância de o mesmo ter sido interposto fora do prazo legalmente estabelecido. Segundo a decisão, como os ora reclamantes foram notificados daquele acórdão no dia 18 de outubro, presumindo-se notificados no dia 23 do mesmo mês, o prazo terminou no dia 7 de novembro (dez dias mais três dias úteis com pagamento de multa). Mais entendendo que para a contagem do prazo é irrelevante o recurso que entretanto foi interposto para o pleno das secções do Supremo Tribunal de Justiça, «dada a manifesta inadmissibilidade de tal recurso».
Para contrariar o decidido, os reclamantes sustentam que «o facto de terem recorrido para o Pleno e este não o ter apreciado por falta de fundamento legal, não é preclusivo do seu direito e não lhes seria exigível interpor, simultaneamente dois recursos, até porque só a partir da decisão do Pleno deixou de caber recurso, ou seja esgotou-se o poder jurisdicional do Supremo, devendo por tal facto o prazo contar-se a partir do momento em que se tome definitiva uma decisão que não admita recurso». Sem razão.
É verdade que o prazo de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional é de 10 dias e que interposto recurso ordinário que não seja admitido com fundamento em irrecorribilidade da decisão, o prazo para recorrer para o Tribunal Constitucional conta-se do momento em que se torna definitiva a decisão que não admite recurso (artigo 75.º da LTC). Só que esta estatuição não abrange a utilização do meio impugnatório usado pelos reclamantes, já que é legalmente inexistente. A lei não prevê, de todo, recurso para o pleno das secções do Supremo Tribunal de Justiça de acórdão deste tribunal que negue provimento a recurso do tribunal da relação interposto de acórdão condenatório de 1.ª instância (cf. artigos 400.º, 427.º e 432.º do Código de Processo Penal).
É entendimento reiterado deste Tribunal que a errónea e indesculpável dedução de um incidente legalmente inexistente não tem a virtualidade de interromper ou suspender o prazo de dez dias legalmente estabelecido para a interposição do recurso de constitucionalidade (cf., entre muitos outros, Acórdãos n.ºs 640/2011 e 95/2012, disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt).
Uma vez que a decisão recorrida foi notificada no dia 18 de outubro de 2013 e que o recurso de constitucionalidade foi interposto no dia 28 do mês seguinte, é manifesta a intempestividade do mesmo, face ao disposto no artigo 75.º da LTC. Há que confirmar, pois, o despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada.
Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 22 de janeiro de 2014. – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria Lúcia Amaral.