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Processo n.º 1061/2013
3ª Secção
Relator: Conselheiro Carlos Fernandes Cadilha
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. O relator no Tribunal Constitucional decidiu não conhecer do recurso que A., ora reclamante, interpôs ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), porque o recorrente não observou o ónus de prévia suscitação previsto, como condição do recurso, pelas disposições conjugadas dos artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da LTC (decisão sumária n.º 628/13).
O recorrente reclama dessa decisão, invocando, em síntese, que não podia prever que o tribunal recorrido viesse a adotar, como veio, a interpretação que reputa inconstitucional, não lhe sendo, por isso, exigível que suscitasse antes da prolação do acórdão recorrido, designadamente em sede de resposta às alegações do recurso de apelação apresentadas pela parte contrária, a questão de inconstitucionalidade que integra o objeto do presente recurso. Por isso, conclui, apenas o pôde fazer no momento em que interpôs da decisão recorrida recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, o qual, embora dirigido a esta última instância ordinária de recurso, foi entregue no tribunal da relação, que o não admitiu, devendo, pois, considerar-se que as respetivas alegações constituíram «o único meio processualmente adequado para o reclamante invocar, perante o tribunal recorrido, a inconstitucionalidade da interpretação por este efetuada no Acórdão [recorrido]». Caso assim não entenda, incorrerá o próprio Tribunal Constitucional em vício de inconstitucionalidade, por violação do direito ao recurso e, em consequência, das normas dos artigos 1.º, 9.º, 20.º, 202.º, 204.º, 221.º, 268.º, n.º 4, 280.º, n.º 1, e 205.º da Constituição e, ainda, dos artigos 69.º, 70.º, nºs. 1, alínea b), e 2, 72.º, nºs. 1, alínea b), e 2, 75.º e 75.º-A da LTC.
A recorrida B., Lda. pugnou, em resposta, pela manutenção do julgado, por não verificado o pressuposto processual que o relator julgou omisso.
2. Cumpre apreciar e decidir.
Insiste o reclamante pelo conhecimento de mérito do recurso, que tem por objeto os artigos 140.º, nºs. 1, 2, alínea f), e 4, alínea a), e 349.º do Código de Trabalho, na interpretação segundo a qual: a) «não existe atualmente a proibição legal de um contrato a termo do trabalhador já contratado anteriormente pela mesma entidade patronal por tempo indeterminado»; b) a celebração, pelas mesmas partes, de um contrato de trabalho a termo em plena vigência de um contrato de trabalho celebrado anteriormente por tempo indeterminado tem a virtualidade de fazer cessar o primeiro, desde logo por se tratar da conversão (por acordo) de um contrato sem termo num contrato a termo».
Assumindo que não o fez antes da prolação do acórdão proferido pelo tribunal da relação, de que ora recorre, defende o recorrente que não lhe era exigível suscitar perante o tribunal recorrido tais questões de inconstitucionalidade por não poder prever que este viesse a adotar tais interpretações da lei, sendo, pois, ainda oportuna a sua suscitação nas alegações do recurso de revista que interpôs do acórdão recorrido, que, embora dirigidas ao Supremo Tribunal de Justiça, foram entregues no tribunal da relação, que rejeitou o recurso, por inadmissível.
Mas não lhe assiste razão. Com efeito, analisando as alegações do recurso de apelação interposto pela parte contrária, verifica-se que nelas se defendeu precisamente o entendimento que, no essencial, corresponde às teses interpretativas ora sindicadas (cf., em particular, conclusões 8.ª, 9.ª e 10.º), pelo que era exigível à recorrente, ora reclamante, que suscitasse perante o tribunal recorrido, na resposta às alegações que então apresentou em juízo, as questões de inconstitucionalidade que inovatoriamente integra no objeto do presente recurso de constitucionalidade. Sendo inteiramente irrelevante - tendo em conta o disposto no artigo 72.º, n.º 2, da LTC - que a recorrente tenha invocado as questões de inconstitucionalidade no recurso de revista, quando é certo que esse recurso não chegou a ser admitido, e o ónus de suscitação teria de ser cumprido perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida e, por isso, perante o próprio tribunal da relação. É, nesta perspetiva, absolutamente inócuo que as alegações de revista tenham sido apresentadas no tribunal da relação quando é evidente que o tribunal da relação não podia nem devia decidir a questão de inconstitucionalidade no contexto da apreciação liminar de um requerimento de interposição do recurso de revista, que não lhe era dirigido.
Ora, não tendo o reclamante observado ónus que a lei impõe como condição de admissão e conhecimento do recurso de constitucionalidade, por facto que lhe é exclusivamente imputável, é de confirmar a decisão que, com tal fundamento, não conheceu do recurso. Com efeito, uma tal exigência processual, que o relator se limitou a aplicar, justifica-se pela necessidade de garantir que o Tribunal Constitucional, que é uma instância de recurso, se limite a sindicar o juízo de inconstitucionalidade, ou não inconstitucionalidade, formulado pelos tribunais, e não a apreciar ex novo questões de inconstitucionalidade nunca antes suscitadas perante as instâncias, não se vendo, pois, como a aplicação da lei que justificadamente assim o determina represente violação do direito ao recurso e de quaisquer dos preceitos constitucionais e legais que o reclamante invoca.
3. Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta, sem prejuízo do apoio judiciário de que beneficia.
Lisboa, 13 de fevereiro de 2014. – Carlos Fernandes Cadilha – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral.