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Processo n.º 888-A/12
2.ª Secção
Relator: Conselheiro Fernando Ventura
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, por Acórdão n.º 406/13, proferido em 15 de julho de 2013, foi decidido:
«a) Não julgar inconstitucional as normas dos artigos 1.º, alínea a) e 4.º, alínea a), da Lei n.º 12/83, de 24 de agosto;
b) Não julgar inconstitucional a norma do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de janeiro;
c) Julgar improcedente, nessa parte, os recursos interpostos pelos arguidos A., B., C., Lda, e D., Lda, por um lado, e pelo arguido E., por outro;
d) Não conhecer das demais questões colocadas pelos arguidos A., B., C., Lda, D., Lda, e E.»
2. Notificada a decisão, foi suscitada a sua nulidade pelos recorrentes A., B., C., Lda e D., Lda, nos seguintes termos:
2.1. Em requerimento conjunto, os recorrentes A., B., C., Lda e D., Lda, vieram dizer, no que tange a esse vício:
«(...) No recurso que interpuseram para este Venerando Tribunal, os Recorrentes arguíram, entre outras, a inconstitucionalidade do entendimento propugnado pelo Tribunal da Relação de Coimbra a propósito dos artigos 39.º, n.º 1, alínea c) e artigo 40.º do CPP e dos n.ºs 1 e 2 do artigo 649.º do CPC de 1961.
Em concreto, consideraram os Recorrentes que “ao admitir [...] que um órgão de policia criminal pode, em sede de processo penal desempenhar a função de assessor técnico do tribunal tendo já tido intervenção anterior na questão em discussão e interesse direto na mesma, o Tribunal da Relação de Coimbra fez uma interpretação/aplicação dos artigos 39.º, n.º 1, alínea c) e 40.º do CPP e dos n.ºs 1 e 2 do artigo 649.º do CPC que atenta de forma grosseira contra os princípios básicos do Estado de Direito, das garantias de defesa dos ditames de um processo equitativo, plasmados nos artigos 2.º e 32.º, n.ºs 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e no artigo 6.º, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH)”.
Ora, o Tribunal Constitucional entendeu não conhecer desta questão por considerar, em suma, “encontrarmo-nos perante questão que visa na realidade ver controlado pelo Tribunal Constitucional o ato de julgamento, em si mesmo considerado, na autónoma valoração das particularidades do caso em apreço e da atividade de subsunção do direito ordinário, e não a conformidade constitucional de qualquer norma ou interpretação normativa enunciada abstratamente e vocacionada para aplicação generalizada a todos os processos”.
E assim, de forma conclusiva e, salvo o devido respeito, infundamentada, eximiu-se o Tribunal do dever que sobre si impendia de conhecer da questão que concretamente lhe havia sido colocada.
O Tribunal Constitucional não sustenta tal asserção nos factos dados como provado, nem tampouco naqueles que foram carreados para o recurso.
Do mesmo modo, o Tribunal Constitucional não apresenta os fundamentos de direito em que se ancora a decisão de “não conhecimento” deste concreto fundamento do recurso.
É que a questão colocada pelos Recorrente, que, valha a verdade – e contrariamente ao que se diz no Acórdão -, tem um pendor de marcada aplicabilidade generalizada, é tão só a de saber se a interpretação impugnada pelo Tribunal da Relação no sentido de admitir o desempenho de funções como assessores técnicos do tribunal de órgãos de policia criminal e de pessoas que haviam já intervindo em fase anterior do processo, designadamente como autuantes, escorando-se no artigo 43.º, n.º 1 do CPP e nas demais normas aplicáveis, designadamente os artigos 39.º, n.º 1, alíneas c) e 40.º do CPP e dos n.ºs 1 e 2 do artigo 649.º do CPC de 1961, é ou não inconstitucional por violar as garantias plasmadas nos artigos 2.º e 32.º, n.ºs 1 e 5, da Constituição da República Portuguesa (CRP) e no artigo 6.º, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (CEDH).
Do teor do acórdão n.º 406/2013 não se percebe, na verdade, - nem o Tribunal Constitucional fundamenta – porque razão entendeu que o Tribunal da Relação não aplicou as aludidas normas.
É que o Tribunal da Relação, no conhecimento do quadro legal aplicável, admitiu expressamente o desempenho de funções como assessores técnicos do tribunal de um órgão de policia criminal e de pessoas que haviam já intervindo em fase anterior do processo, apesar da veemente oposição e arguição de inconstitucionalidade por parte dos aqui Recorrentes.
Sendo que, para efeito de preenchimento do requisito de “aplicação da norma” de que depende o conhecimento da questão por parte do Tribunal Constitucional, “a aplicação da norma tanto pode ser expressa como implícita (acs 88/86, 47/90, 235/93) e a questão de inconstitucionalidade tanto pode reportar-se apenas a certa dimensão ou trecho da norma, como a uma certa interpretação da mesma (acs. 114/89, 612/94, 126/95, 178/95, 242795, 305/90, 238/94, 176/88, 764/93, 51/92)” (cf. Guilherme da Fonseca e Inês Domingues, Breviário de Direito Processual Constitucional, Coimbra, 1997, pág. 40 - (...)).
Isso mesmo reconhece o Tribunal Constitucional e pode ler-se na página 49ª do Acórdão n.º 406/2013, em que, ainda que a propósito de questão diversa, se diz o seguinte: “a circunstância de determinado preceito não ser expressamente referido na decisão recorrida não impede, de um ponto de vista lógico jurídico, a consideração da aplicação implícita da norma dele extraída, contanto que resulte com segurança da conjugação argumentativa que o Tribunal a quo não podia deixar de o ter em mente [...]”.
O certo é que os Recorrentes ficaram sem compreender – por não o ter o Tribunal explicado -, em concreto, que fundamentos de facto/ou de direito estão na base da decisão de não conhecimento do objeto do recurso com este concreto fundamento.
Circunstância que, salvo o devido respeito, inquina o Acórdão n.º 406/2013 da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC, que aqui expressamente se invoca e cuja declaração se requer.»
2.2. Por sua vez, em requerimento autónomo, a recorrente C., Lda, veio sustentar a nulidade da decisão, dizendo:
«(...) A) da nulidade do acórdão por omissão de pronúncia e por violação do princípio do caso julgado (artigos 615.º, n.º 1, alíneas d) e 620.º do CPC)
Nos termos do disposto no artigo 615.º, n.º 1, alínea d), do CPC, deve ser declarada nula a decisão quando o “juiz deixe de pronunciar-se sobre questões que devesse apreciar [...]”.
Eis, pois, o que sucedeu no caso em apreço.
Com efeito, resulta da lei, designadamente do disposto no artigo 78.º-A da LTC, que, quando entender que não pode conhecer-se do objeto do recurso, o relator profere decisão sumária dando conta disso mesmo.
Dessa decisão, podem as partes reclamar para a Conferência.
Contrariamente, quando o relator entenda que o Tribunal deve conhecer do objeto do recurso ou quando, em virtude de uma reclamação, tal entendimento tenha vindo a ser sufragado pelo Pleno da Secção ou pela Conferência, o relator manda notificar o recorrente para apresentar alegações.
Foi o que sucedeu no presente caso.
O Sr. Juiz Conselheiro Relator admitiu, na verdade, os diversos recursos apresentados,
Embora, é certo, tenha levantado reservas quanto ao conhecimento de algumas questões – que concretamente especificou – e para que advertiu, então, os recorrentes.
Contudo, relativamente àquelas questões que não foram objeto de advertência, ficou, naturalmente, o Tribunal obrigado a pronunciar-se,
Por efeito do despacho de admissibilidade a que se “autovinculou”,
Acaso assim não fosse, o Tribunal Constitucional podia sempre admitir os recursos para, já em sede de acórdão, não conhecer das questões suscitadas,
Subtraindo, dessa forma, aos recorrentes uma via de impugnação – a reclamação para a conferência do artigo 77.º da LTC – sobre decisões de não conhecimento/admissibilidade.
É por isso que, uma vez admitido o recurso, o Tribunal fica obrigado a conhecer das questões nele suscitadas.
Ora, justamente a questão colocada pelo Recorrente C. a propósito da “norma do artigo 401.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal (CPP) na precisa interpretação que lhe dá o Tribunal da Relação de Coimbra (de resto totalmente inédita e surpreendente e que, antecipe-se, vem a ser a norma que consubstancia o pressuposto processual da legitimidade para o recurso em processo penal)” não foi objeto de qualquer advertência quanto à respetiva admissibilidade.
Antes pelo contrário!
O Exmo. Sr. Conselheiro Relator, no despacho de admissão do recurso em que ordenou a notificação dos Recorrentes para alegações, debruçando-se expressamente sobre o recurso apresentado pela C., Lda, admitiu, sem reservas, a primeira das questões colocadas, isto é, a supra citada questão da norma do artigo 401.º, n.º 1, alínea b), do CPP.
Na verdade, ao referir-se ao recurso apresentado pela C. , Lda, determinou o Exmo. Sr. Conselheiro Relator: Notifique para alegações, com advertência para a eventualidade da segunda questão colocada não ser conhecida, por ausência de efetiva aplicação no Acórdão recorrido, como determinante do julgado, dos “segmentos normativos” indicados pelo recorrente” (...).
Significa isto, por conseguinte, que, ao aceitar sem reserva a primeira questão colocada no recurso, isto é, a questão de saber se a norma do artigo 401.º, n.º 1, alínea b), do CPP na precisa interpretação que lhe dá o Tribunal da Relação de Coimbra é ou não inconstitucional, o Tribunal Constitucional não podia não tomar conhecimento da mesma,
Porque a isso se “autovinculara” por força do despacho de admissão do recurso e notificação para alegação.
O Acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional padece, assim, de nulidade, por omissão de pronúncia,
Nulidade cuja declaração se requer com todos os devidos e legais efeitos.
Sem prescindir,
A decisão de não conhecimento expressa no acórdão configura igualmente uma violação patente e manifesta de caso julgado formal,
Pois que contradiz o anterior despacho incondicional de admissão do recurso que, nos termos do disposto no artigo 620.º do CPC, tem força obrigatória dentro do processo.
Vinculando, portanto, o julgador.
Compreende-se bem que assim seja, já que o caso julgado visa garantir. Fundamentalmente, o valor da segurança jurídica (cfr. Miranda, Jorge, Manual de Direito Constitucional,, T. II, 3ª ed., reim., Coimbra, 1966, p. 494),
E funda-se na proteção a essa segurança jurídica, relativamente a atos jurisdicionais, no princípio do Estado de Direito, pelo que se trata de um valor constitucionalmente protegido (Canotilho, Gomes, Direito Constitucional e Teoria da Constituição, Coimbra, 1998, p. 257).
Ora, “O caso julgado formal tem força obrigatória (apenas) dentro do processo, obstando a que o juiz possa, na mesma ação, alterar a decisão proferida (Antunes Varela, Manual, 1984, pág. 685).
Resulta deste modo claro que, ao decidir não conhecer da constitucionalidade da “norma do artigo 401.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal (CPP) na precisa interpretação que lhe dá o Tribunal da Relação de Coimbra [...]” o Tribunal violou o despacho do relator que, nesta parte, admitira já, sem reservas, o recurso.
Pois que, o despacho do relator a que alude o n.º 5 do artigo 78.º-A da LTC que admitiu o recurso e, portanto, determinou o conhecimento da questão por parte do Tribunal, tem força de caso julgado (art. 620.º do CPC).
Também por esta via se impõe, pois, a declaração de nulidade do acórdão, o que se invoca e requer.
B) Da nulidade do acórdão por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão (art.º 615.º, n.º1, al. b) do CPC)
Já vimos que no recurso que interpôs para este Venerando Tribunal, a Recorrente arguiu a inconstitucionalidade do entendimento propugnado pelo Tribunal da Relação de Coimbra a propósito do artigo 401.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal.
Em concreto, considerou a Recorrente que a interpretação perfilhada pelo Tribunal da Relação de Coimbra “viola e vulnera intoleravelmente o artigo 32.º, n.º 1, da CRP e, bem assim, o princípio da confiança e da segurança jurídicas decorrentes do princípio do Estado de Direito Democrático, consagrado no artigo 2.º da mesma lei fundamental”, o que redundaria num segmento normativo segundo o qual “o arguido não tem legitimidade para recorrer do despacho que indefere a realização de um meio de prova por si requerido se o tribunal, no respetivo despacho de indeferimento, equacionar a eventualidade de, ainda no decurso da audiência de julgamento, poder ponderar parcialmente a sua decisão, mesmo que o tribunal não tenha efetuado a tal reponderação e de ter até admitido, logo e sem mais, o recurso interposto contra o despacho de indeferimento”.
Ora, o Tribunal Constitucional entendeu não conhecer desta questão por considerar, em suma, que “o Tribunal a quo não aplicou norma, ou interpretação normativa, de que faça parte, como determinante da afirmação de ilegitimidade para o recurso, a mera possibilidade de vir a ser posteriormente ordenada perícia cuja realização tivesse sido apreciada e indeferida . [...]”
O Tribunal Constitucional concluiu, sem mais, que “a recorrente constrói a aplicação de interpretação normativa ancorada na alínea b) do n.º 1 do artigo 401.º do Código de Processo Penal que não se identifica com aquela efetivamente acolhida e aplicada pelo Tribunal a quo”.
E assim, de forma conclusiva e infundamentada, eximiu-se do dever que sobre ele impendia de conhecer da questão que lhe ele impendia de conhecer da questão que lhe havia sido colocada.
Não sustenta tal asserção nos factos dados como provados nem naqueles que foram carreados para o recurso.
Tampouco apresenta os fundamentos de direito em que se ancora a decisão de “não conhecimento”.
Não se percebe – e o Tribunal Constitucional não fundamenta – porque entendeu que o Tribunal da Relação não aplicou o artigo 402.º do CPP referente à questão de legitimidade.
É que o Tribunal da Relação – justamente no trecho da decisão citado no Acórdão do Tribunal Constitucional – afirma expressamente ter ancorado a sua decisão na pretensa falta de legitimidade da Recorrente ao afirmar:
“In casu afigura-se-nos comprovar-se o interesse em agir dos arguidos recorrentes, uma vez que carentes do processo (rectius, do recurso) para fazerem valer o seu direito a uma defesa ampla [...].
Todavia, outro tanto já não se verifica com a legitimidade [...].
Com efeito, apenas a hipotética e eventual ulterior apreciação da pretensão dos arguidos, denegando-lhes o solicitado, lhes concederia “legitimidade” – porque “afetados” – para, então, sim poderem controverter o decidido.”(...)
Acresce que, para efeito de preenchimento do requisito de “aplicação da norma” de que depende o conhecimento da questão por parte do Tribunal Constitucional, “A aplicação da norma tanto pode ser expressa como implícita (acs 88/86, 47/90, 235/93) e a questão de inconstitucionalidade tanto pode reportar-se apenas a certa dimensão ou trecho da norma, como a uma certa interpretação da mesma (acs. 114/89, 612/94, 126/95, 178/95, 242/95, 305/90, 238/94, 176/88, 764/93, 51/92)” (cf. Guilherme da Fonseca e Inês Domingues, Breviário de Direito Processual Constitucional, Coimbra, 1997, pág. 40) (...)
Isso mesmo reconhece o Tribunal Constitucional e pode ler-se na página 49ª do Acórdão, em que, embora a propósito de questão diversa, se afirma que “a circunstância de determinado preceito não ser expressamente referido na decisão recorrida não impede, de um ponto de vista lógico jurídico, a consideração da aplicação implícita da norma dele extraída, contanto que resulte com segurança da conjugação argumentativa que o Tribunal a quo não podia deixar de o ter em conta [...]” (...)
O certo é que, tudo bem lido e relido, a Recorrente ficou sem compreender – nem o Tribunal explicitou – em concreto, que fundamentos de facto e/ou de direito estão na base da decisão de não conhecimento,
Circunstância que inquina o acórdão da nulidade prevista no artigo 615.º, n.º 1, alínea b) do CPC, que aqui expressamente se invoca e cuja declaração se requer.»
3. O Ministério Público tomou posição, no sentido do indeferimento de ambos os requerimentos, dizendo:
«9.º
C., Ld.ª
No Acórdão, fundamenta-se de forma clara e precisa porque não se podia conhecer do recurso quanto à “segunda questão” e o recorrente pode antecipadamente pronunciar-se sobre essa possibilidade.
10.º
Não se vislumbra, pois, qualquer nulidade “por omissão de pronúncia e violação do caso julgado” ou por não se “especificar os fundamentos de facto e direito que justifiquem a decisão”.
11.º
Quanto à violação do caso julgado por o Tribunal não ter conhecido da questão, apesar de o Senhor Conselheiro Relator ter ordenado a produção de alegações, parece--nos óbvio que não assiste a mínima razão ao recorrente.
12.º
Mesmo que o Senhor Conselheiro Relator não tivesse colocado ao recorrente a possibilidade de não conhecimento para que aquele se pudesse pronunciar – o que não ocorreu – o essencial era que não fosse proferida uma decisão-surpresa.
13.º
Ora, quer quanto a esta, quer quanto a todas as outras questões, podemos desde já adiantar que neste processo os recorrentes sempre tiveram possibilidade de se pronunciar previamente e/ou de contraditar toda a matéria respeitante às questões processuais que obstassem ao conhecimento do mérito.
Quer pela natureza, quer pelo conteúdo dos pedidos, parece-nos evidente a intenção dilatória que presidiu à sua apresentação, pelo que, em nossa opinião, o Tribunal devia, desde já, aplicar o disposto no n.º 8 do artigo 84.º da LTC.”
(...)
17.º
A. e outros
Quanto à nulidade do Acórdão “por não especificar os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”, não vislumbramos minimamente, que ela tivesse ocorrido, sendo aqui aplicável o que anteriormente dissemos quanto à clareza e ao exemplar grau de fundamentação que se surpreende no Acórdão e quanto ao pleno exercício do contraditório e à ausência absoluta de decisões-surpresa.»
4. Também o IFAD tomou posição sobre a arguição de nulidade, acompanhando a posição tomada pelo Ministério Público.
5. Determinada a extração de traslado (Acórdão n.º 700/13) e pagas as custas, cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
6. Vem a recorrente C., Lda, por um lado, e, conjuntamente, os recorrentes A., B., C., Lda e D., Lda, por outro, arguir a nulidade do Acórdão n.º 406/13. Ambos os requerimentos sustentam verificação do vício de nulidade no disposto no artigo 668.º, n.º 1, alínea b) do CPC (1961), ou seja, alegando que não foram especificados os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão, aduzindo a recorrente C., Lda, a verificação de um segundo vício, decorrente de, em seu entender, ter sido omitido conhecimento de questão de que o Tribunal deveria ter conhecido. Estaria então igualmente preenchido o fundamento de nulidade previsto na alínea d) do mesmo artigo e número.
Porém, como já se afirmou no Acórdão n.º 700/13, qualquer dos apontados fundamentos para a nulidade da pronúncia deste Tribunal constante do Acórdão n.º 406/13 padece de improcedência manifesta.
7. Com referência à arguição de nulidade por ausência de fundamentação, os dois requerimentos em apreço utilizam argumentação idêntica, notando-se o emprego em ambos de formulação muito aproximada, apesar de terem por referência a apreciação de distintas questões de constitucionalidade. Nos dois casos, os recorrentes destacam segmento do Acórdão n.º 406/13, que transcrevem, reputam-no de conclusivo e manifestam incompreensão quanto à motivação decisória, que consideram ausente. Todavia, logo de seguida, e com presença em ambos os requerimentos, passam a argumentar em sentido oposto ao decidido, o que sinaliza, em antinomia com a pretérita impercetibilidade dos fundamentos da decisão de não conhecimento, que compreenderam o que determinou tal decisão, revelando, antes, que não estão persuadidos da sua bondade.
Na verdade, os trechos transcritos pelos recorrentes constituem apenas uma pequena parcela – e uma parcela descontextualizada - da exteriorização das razões que levaram o Tribunal a decidir como decidiu. Especificadamente, o Acórdão n.º 406/13 tomou a dimensão normativa inscrita na questão colocada, confrontou-a com a determinante decisória constante da decisão recorrida e concluiu pela ausência de identidade entre a norma questionada e a norma efetivamente aplicada, como ratio decidendi, na decisão recorrida. Pode a recorrente C., Lda, discordar da conclusão atingida – como acontece – mas não lhe assiste a menor razão na alegação de que os fundamentos em que assentou a decisão de não conhecimento não foram explicitados.
O que se vem de dizer encontra cabimento igualmente perante os termos da arguição de nulidade formulada pelos recorrentes A., B., C., Lda e D., Lda. Também nesse requerimento, encontra-se destacado um pequeno segmento da fundamentação, que se diz não compreender, seguido de elaboração sobre a sua procedência.
Ora, a circunstância dos motivos avançadas para a decisão não coincidirem com o entendimento proposto ou defendido pelos recorrentes não consente a sua obnubilação, sendo patente da fundamentação exarada no Acórdão n.º 406/13 que o Tribunal deixou completa e devidamente exarado o percurso lógico e a base legal em que assentou a decisão de não conhecimento do recurso quanto à questão de constitucionalidade referidas nos requerimentos em apreço.
Improcede, pelo exposto, a arguição de nulidade do Acórdão n.º 406/13, por ausência de fundamentação, nos termos previsto na alínea b) do n.º1 do artigo 615.º do CPC (de 2013), seja na vertente invocada pela recorrente C., Lda, seja naquela suscitada conjuntamente pelos recorrentes A., B., C., Lda e D., Lda.
8. Sustenta ainda a recorrente C., Lda, que o Tribunal não conheceu de questão de que lhe cabia conhecer, padecendo do vício previsto na alínea d) do n.º1 do artigo 615.º do CPC, o que estriba na circunstância do relator não ter proferido decisão sumária e, assim, ter-se “autovinculado” quanto à admissibilidade do recurso, obrigando, por seu turno, e com força de caso julgado, o Tribunal a conhecer das questões nele suscitadas.
Ora, este entendimento enferma de erro quanto à natureza e conteúdo da decisão do relator de ordenar o prosseguimento do recurso para alegações. Contrariamente ao considerado pela recorrente, e independentemente de não estar vedada a prolação de decisão sumária parcial, essa apreciação liminar não comporta o sentido de fixar a verificação (positiva) dos pressupostos de que depende o conhecimento do recurso e muito menos poderia comportar qualquer vinculação do Tribunal, em composição coletiva. Significa apenas que, de acordo com o critério seguido, não se evidenciam os fundamentos para a prolação de decisão sumária de não conhecimento (total) do recurso ou para o conhecimento do seu mérito, nos termos decorrentes dos n.ºs 1 e 5 do artigo 78.ºA da LTC, sem qualquer efeito preclusivo da apreciação cometida ao Pleno da Secção, designadamente face à posição assumida pelos recorridos nas contra-alegações.
Aliás, o Acórdão n.º 406/13 tomou posição expressa nesse sentido:
“Expostos, sumariamente, os pressupostos essenciais ao conhecimento do recurso de constitucionalidade interposto nos termos do artigo 70.º, n.º 1, alíneas b), da LTC, cumpre verificar o seu preenchimento, relativamente às questões colocadas pelos recorrentes nos presentes autos, tendo em atenção que, como dispõe o n.º 3 do artigo 76.º da LTC, a decisão que admitiu o recurso não vincula o Tribunal Constitucional, assim como a determinação do prosseguimento do processo para alegações não preclude essa apreciação, desde logo face à posição dos recorridos.”
Face a tais preceitos legais, e tendo em atenção as sucessivas advertências dos recorrentes para a possibilidade da decisão de não conhecimento que se veio a materializar no Acórdão n.º 406/13, mormente perante as questões de inadmissibilidade suscitadas pelos recorridos em contra-alegações, que sempre caberia ao Tribunal apreciar, sob pena de omissão de pronúncia, carece manifestamente de fundamento sustentar que fora dado como adquirido nos autos que o mérito dos recursos seria inexoravelmente conhecido em todo a sua plenitude e bem assim que os recorrentes foram surpreendidos pela decisão de não conhecimento (parcial).
De qualquer modo, e mesmo que assim não fosse, sempre caberia afastar a presença da apontada nulidade. Com efeito, a pretensão formulada pela recorrente traduz-se, em substância, na reapreciação do mérito da decisão de não conhecimento do recurso, matéria relativamente à qual encontra-se esgotado o poder jurisdicional do Tribunal
Improcede, pois, a arguição de nulidade também neste plano.
III. Decisão
9. Pelo exposto, decide-se:
a) Nos termos e pelos fundamentos expostos, indeferir a arguição de nulidade formulada pelos conjuntamente recorrentes A., B., D., Lda e C. Lda e, autonomamente, pela recorrente C., Lda;
b) Condenar os recorrentes nas custas, fixando-se a taxa de justiça (conjunta) em 20 (vinte) unidades de conta para os reclamantes A., B., C., Lda e D., Lda, e em 20 (vinte) unidades de conta para a recorrente C., Lda, tendo em atenção os critérios seguidos por este Tribunal e a dimensão do impulso desenvolvido pelos reclamantes.
Notifique.
Lisboa, 28 de novembro de 2013.- Fernando Vaz Ventura – Ana Guerra Martins – Pedro Machete – João Cura Mariano – Joaquim de Sousa Ribeiro.