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Processo n.º 1130/13
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal Administrativo, em que são reclamantes A. e B. e reclamados o Conselho de Ministros e outros, os primeiros reclamaram, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4, da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), do despacho de 24 de setembro de 2013, que não admitiu os recursos interpostos para o Tribunal Constitucional.
2. Os reclamantes e outros interpuseram ação administrativa especial contra os reclamados. Após algumas vicissitudes processuais, o Supremo Tribunal Administrativo, acordou em julgar a ação improcedente, em 12 de junho de 2012, absolvendo os réus do pedido. Deste acórdão recorreram para o Pleno da Secção, tendo sido negado provimento ao recurso por acórdão de 4 de julho de 2013.
Pode ler-se na respetiva fundamentação o seguinte:
«1. Com a presente ação os autores pretendiam que fosse declarada a ilegalidade decorrente da omissão de regulamentação a que se refere o art. 14.º do DL 112/2001, de 6.4, com as legais consequências, nomeadamente a publicação do decreto regulamentar omitido e o ressarcimento das implicações que essa falta teve nas suas carreiras. Com efeito, sustentam que sempre exerceram funções de inspeção, quer na extinta Direção-Geral de Viação (DGV), quer no IMTT, IP, que lhe sucedeu nas suas atribuições, pelo que a sua carreira, de inspeção, devia ser regulamentada, de acordo com o estabelecido nos artigos 2.º e 14.º do DL n.º 1 12/2001, de 6 de Abril. Com vista à abordagem do problema essencial colocado na ação, a omissão do pretendido regulamento, o acórdão recorrido fazendo apelo ao acórdão deste STA de 19.10.10, proferido no recurso 460/08, enunciou o problema em termos gerais e depois, procedeu à sua aplicação ao caso dos autos.
(…)
Esta omissão impugnatória faz claudicar, desde já, o recurso prejudicando o conhecimento de tudo o resto (numa situação semelhante, acórdãos deste Pleno, de 27.11.03 proferido no recurso 1772/03 e de 18.10.07 no recurso 715/07). Ao não impugnar o acórdão recorrido nessas vertentes, os recorrentes permitiram que ficasse definitivamente assente que, no momento em que propuseram a ação, não ocorria qualquer omissão de regulamentação, quer durante o período respeitante à DGV quer no referente ao IMTT tornando inútil a apreciação do recurso quanto às restantes questões, nomeadamente a violação do princípio da igualdade, em qualquer das vertentes invocadas que pressupunha, justamente, aquela ocorrência».
3. Notificados desta decisão, os reclamantes interpuseram recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, «do Acórdão proferido em primeira instância pela 1ª Seção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo, (STA), assim como do Acórdão proferido pelo Pleno do STA, (5.ª Seção)».
Requereram, por referência a esta última decisão, a apreciação das:
«normas constantes do art.º 45.º, n.º1, conjugada com o art.º 77.º n.º 1, ambos do CPTA (…), quando interpretadas no sentido de não ser aplicável à parte que alega um prejuízo diretamente resultante da situação de omissão das normas, quando comparados com situações iguais, afastando-as sem que seja apreciada a legítima e qualificada expectativa de ingressar na carreira inspetiva que deveria ter sido regulamentada e não o foi».
4. Foi então proferido o despacho de não admissão dos recursos de constitucionalidade, com a seguinte fundamentação:
«Os requerentes de fls. vieram interpor recurso para o Tribunal Constitucional dos acórdãos proferidos nos autos pela Secção e pelo Pleno deste Tribunal.
Importa sublinhar que o aresto do Pleno foi proferido na sequência do recurso deduzido do acórdão da Secção e que o fundamento único da improcedência do acórdão do Pleno foi a omissão impugnatória do decidido na Secção que, assim, transitou em julgado. Veja-se a sua parte final: Esta omissão impugnatória faz claudicar, desde já, o recurso prejudicando o conhecimento de tudo o resto (numa situação semelhante, acórdãos deste Pleno, de 27.11.03 proferido no recurso 1772/03 e de 18.10.07 no recurso 715/07). Ao não impugnar o acórdão recorrido nessas vertentes, os recorrentes permitiram que ficasse definitivamente assente que, no momento em que propuseram a ação, não ocorria qualquer omissão de regu1amentação, quer durante o período respeitante à DGV quer no referente ao IMTT tornando inútil a apreciação do recurso quanto às restantes questões, nomeadamente a violação do princípio da igualdade, em qualquer das vertentes invocadas que pressupunha, justamente, aquela ocorrência.
Não se impugnando este segmento decisório tem de concluir-se que este Pleno não aplicou qualquer preceito inconstitucional e que o acórdão da Secção transitou em julgado, não ocorrendo, por isso, nenhum dos fundamentos invocados para suscitar o presente recurso».
5. Contra tal decisão foi apresentada a presente reclamação, mediante requerimento onde se lê, entre o mais, o seguinte:
«8. O P1eno do STA para não admitir o recurso para o Tribuna1 Constitucional invoca que o recurso para o Pleno claudicou porquanto os Recorrentes não impugnaram o decidido pela Seção, nomeadamente que no momento em que propuseram a ação, não ocorria omissão de regulamentação.
9. Contudo, insistimos, que essa matéria é exatamente aquela que conduz à ap1icação do art.º 45.º do CPTA.
10. Cuja ap1icação foi afastada exatamente porque o AA. não tinham interesse pessoa1 na demanda.
(…)
18. Do douto despacho que se reclama, a fundamentação de indeferimento estriba-se essencialmente em dois vetores: i) porque o Acórdão da Seção transitou, o que não se concede, até porque também dele se recorre: ii) porque o Pleno do STA não aplicou nenhuma norma inconstitucional, logo não ocorre nenhum dos fundamentos invocados para suscitar o recurso, e mais uma vez, com o devido respeito, assim não entendem os ora reclamantes.
19. Pois, na verdade a decisão final do Pleno do STA aplicou normas inconstitucionais, (pela sua interpretação e melhor exp1icado no requerimento de recurso, para o qual remetemos, por mera economia processual), assim como o acórdão da Seção apenas transitará quando a ú1tima decisão transitar em julgado, nomeadamente,
20. As normas constantes do art.º 45.º n. º 1 e o art.º 77º, ambos do CPTA. conjugadas com o Decreto-1ei 484/99 de 10 de Novembro, e o art.º 2.º n.º 2 e o art. º 14.º, n.º 1 e 2 do Decreto-lei 112/2001 de 6 de Abril, Decreto Regulamentar n. º 25/2002 de 5 de Abri1, Decreto Regulamentar n. º 6/2003 de 1 de Abril, Portaria n. º 1014/2001, de 22 de Agosto, Decreto Regulamentar n. º 36/2002 de 24 de Abril, Decreto Regulamentar Regional n.º 2/2004/A de 1 de Julho, Decreto -Regulamentar Regional n.º 6/2005M, de 9 de Março, por violação do art.º 13.º da Constituição da República Portuguesa (CRP), quando interpretadas no sentido de excluir a legitimidade ativa para peticionar a declaração de ilegalidade de normas por omissão, por falta de expetativa legítima».
6. Neste Tribunal, o Ministério Público pronunciou-se pelo indeferimento da reclamação, nos seguintes termos:
«4. Assim, ao não conhecer da parte do recurso por inutilidade, aí se incluindo a questão de constitucionalidade, o acórdão do Pleno não aplicou as “normas” respeitantes a essa mesma questão.
5. Não podendo o Tribunal Constitucional sindicar a conclusão de que a “omissão impugnatória faz claudicar desde já o recurso, prejudicando o conhecimento de tudo o resto” e não vindo suscitada qualquer questão de constitucionalidade relacionada com essa matéria, falta esse pressuposto de admissibilidade do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
7. Quanto ao recurso interposto do acórdão proferido pela conferência, em 1.ª instância, tendo sido ele objeto de recurso, o qual abrangia matéria de constitucionalidade, o mesmo deixou de valer autonomamente.
8. Podíamos ainda acrescentar que “durante o processo” não foi suscitada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, passível de constituir objeto idóneo do recurso de constitucionalidade.
9. O afirmado no ponto a) e b) da petição, não traduz a enunciação de uma questão de inconstitucionalidade de natureza normativa.
(…)
13. Assim, também com este fundamento, sempre a reclamação seria de indeferir».
7. Os reclamantes foram notificados do que disse o Ministério Público, mas não apresentaram resposta.
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
Os reclamantes interpuseram recurso de constitucionalidade quer do acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 12 de junho de 2012, proferido em secção, quer do de 4 de julho de 2013, proferido posteriormente pelo pleno da secção de contencioso administrativo.
1. Do artigo 70.º, n.º 2, da LTC decorre que o recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 cabe apenas de decisões que não admitam recurso ordinário, de onde decorre a exigência de definitividade da decisão recorrida.
Não podendo ser interposto recurso de constitucionalidade de decisão relativamente à qual haja sido interposto recurso ordinário, é de concluir que bem decidiu o despacho reclamado ao não admitir o recurso interposto do acórdão de 12 de junho de 2012. Com efeito, ao recorrerem desta decisão para o pleno da secção de contencioso administrativo e ao interporem recurso de constitucionalidade da decisão desta formação os ora reclamantes obstaram à definitividade da decisão recorrida.
2. Constitui requisito do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC a aplicação pelo tribunal recorrido, como ratio decidendi, da norma cuja constitucionalidade é questionada pelo recorrente.
Ora, no acórdão de 4 de julho de 2013, o pleno da secção de contencioso administrativo não aplicou, como razão de decidir, norma reportada aos artigos 45.º, n.º 1, e 77.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos. Na decisão recorrida, o Supremo Tribunal Administrativo negou provimento ao recurso, por ter concluído pela inutilidade da apreciação do mesmo. Entendeu-se que, ao não terem impugnado o acórdão da secção numa das suas vertentes, «os recorrentes permitiram que ficasse definitivamente assente que, no momento em que propuseram a ação, não ocorria qualquer omissão de regulamentação».
Há que confirmar, pois, a decisão reclamada.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e confirmar a decisão de não admissão dos recursos de constitucionalidade interpostos.
Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 9 de janeiro de 2014. – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria Lúcia Amaral.