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Processo n.º 789/12
3.ª Secção
Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I - Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal Central Administrativo Sul, em que é recorrente A., S.A., e recorrido o MUNICÍPIO DE SINTRA, o relator, ao abrigo do n.º 1 do artigo 78.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), proferiu decisão sumária que, por remissão para a fundamentação constante do Acórdão n.º 581/2012, decidiu «a) Não julgar inconstitucional, quando aplicável a equipamentos de abastecimento de combustíveis líquidos inteiramente localizados em propriedade privada, o artigo 70.º, n.º 1, 1.1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008, na versão publicada pelo Aviso n.º 26235/2008 no Diário da República, 2.ª Série, de 31 de outubro de 2008, e mantido em vigor, sem qualquer atualização, no ano de 2009, por deliberação da Assembleia Municipal de Sintra, de 27 de fevereiro de 2009, conforme o n.º 1 do Aviso n.º 5156/2009, publicado no Diário da República, 2.ª Série, de 9 de março de 2009; e, em consequência, b) Não conceder provimento ao recurso.» (cfr. Decisão Sumária n.º 108/2013, de 20 de fevereiro, a fls. 318-323).
2. A recorrente reclama daquela Decisão Sumária n.º 108/2013 para a conferência, ao abrigo do artigo «78/B, n.º 3» (leia-se 78.º-A, n.º 3), da LTC, concluindo no sentido de ser concedido provimento à reclamação e do prosseguimento dos autos, com os fundamentos seguintes (cfr. fls. 356-359):
«(…) 1 – Através do douto despacho supra referido, veio a Exma. Sra. Juíza Conselheira Relatora, proferir decisão sumária no sentido de não julgar inconstitucional, quando aplicável a equipamentos de combustíveis líquidos inteiramente localizados em propriedade privada, o artigo 70º, n.º 1, 1.1 da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008, na versão publicada pelo aviso n.º 226235/2008, no DR, 2ª série, de 31/08, não sendo, assim, concedido provimento ao recurso interposto pela recorrida.
2 – Se bem se alcançou o entendimento vertido na douta decisão reclamada, considerou a Exma. Sra. Juíza Conselheira Relatora que a questão a tratar nos presentes autos é simples, designadamente por a mesma já ter sido objeto de decisão anterior do Tribunal, pelo que, por mera remissão para anterior jurisprudência deste alto tribunal e sem que tivesse sido facultado à Recorrida o direito para apresentar as competentes alegações, foi negado provimento ao recurso apresentado.
3 – Salvo o devido respeito não poderá concordar-se com tal entendimento.
4 – Com efeito, contrariamente ao entendimento vertido na douta decisão reclamada, a questão a tratar nos presentes autos não se mostra dotada da “simplicidade” apontada, não se mostrando, como tal, legitimada a prolação de decisão sumária, negando provimento ao recurso apresentado por mera remissão para anterior jurisprudência.
5 – Em primeiro lugar, cumpre referir que, na sequência da prolação do mencionado acórdão n.º 581/2012, a aqui recorrente (e que também é recorrida naqueles autos) veio apresentar recurso para o plenário, o qual, não tendo sido admitido, por decisão do Exmo. Sr. Conselheiro Relator, foi objeto de reclamação para a conferência, a qual aguarda ainda decisão.
6 – Em segundo lugar, tal como se avançou no âmbito dos autos de processo n.º 204/12 (no âmbito do qual foi proferido o acórdão n.º 581/2012), trata-se de questão que não é nova na jurisprudência do Tribunal Constitucional e que foi tratada, nomeadamente, pelo acórdão do Tribunal Constitucional n.º 24/2009, da 3ª secção, proferido em 14/01/2009.
7 – Na verdade, também no acórdão do Tribunal Constitucional n.º 24/2009 se apreciou a constitucionalidade da norma constante do ponto 1.1 do n.º 1 do artigo 69º do Regulamento e Tabelas de Taxas e Licenças da Câmara Municipal de Sintra, quando aplicada a postos de abastecimento de combustíveis totalmente localizados em propriedade privada.
8 - Todavia, ao contrário do que sucedeu nos autos de processo n.º 204/12 (no âmbito do qual foi proferido o acórdão n.º 581/2012) e, bem assim, nos presentes autos, pela 3ª Secção foi então proferido acórdão no sentido de julgar inconstitucional a referida norma, quando interpretada no sentido da sua aplicação a posto de abastecimento instalado totalmente em terreno privado, por violação do disposto na alínea i) do n.º 1 do artigo 165º da Constituição Portuguesa.
9 - Como é bom de ver, quer o acórdão proferido nos presentes autos, quer o acórdão n.º 24/2009 proferido pela 3ª secção deste Venerando Tribunal, analisaram e apreciaram uma mesma norma e com idêntico teor (pese embora a diferença de numeração existente entre ambas e ainda substituição da expressão “da inerente degradação e utilização ambiental dos recursos naturais pela do impacto ambiental negativo da atividade nos recursos naturais), tendo tomado diferentes posições sobre a mesma.
10 – A questão é uma, é de direito, é de inconstitucionalidade e claramente não é de fácil análise e decisão (atenta a divergência jurisprudencial existente): na utilização de bens particulares é ou não é conforme à Constituição a possibilidade de um Município aplicar uma taxa, bastando para tanto “a mera declaração de finalidade ou justificação geral do tributo, sem uma descrição que corresponda a qualquer uma das hipóteses de imposição que, pela presença de contraprestação pública e individualizável satisfaça o conceito de taxa” e, num e noutro acórdão, o Tribunal adotou entendimentos completamente distintos.
11 – Em terceiro e último lugar, não poderá ser negado à aqui reclamante o direito de, por via da apresentação das suas alegações de recurso, sustentar de forma concreta e fundamentada aqueles que são, no seu entender os argumentos decisivos para que seja concedido provimento ao seu recurso, sob pena de ser preterido o seu direito de defesa e de acesso aos tribunais (documento n.º1 que ora se anexa).».
A recorrente, face ao alegado no n.º 11 da sua reclamação, juntou – ainda que extemporaneamente por o recurso não ter ainda prosseguido para o efeito – alegações de recurso (cfr. fls. 360-384), onde concluiu nos termos seguintes (cfr. fls. 384):
«Nestes termos, e nos demais que o Tribunal Constitucional doutamente suprirá, deverá ser julgada inconstitucional a norma do artigo 70.º, 1.1., da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra, aplicada ao ano económico de 2010, e consequentemente desaplicada, por violação direta do disposto nas seguintes normas constitucionais: artigo 103.º, n.º 2, artigo 104.º, artigo 165.º, n.º 1, alínea i), artigo 238.º, n.º 4, e artigo 241.º, estes últimos por desvio inconstitucional de poder.».
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
3. A recorrente reclama para a conferência alegando, em síntese, que a questão a decidir objeto da Decisão Sumária reclamada não se afigura simples pelo que não justificaria a prolação de decisão sumária, que a recorrente interpôs recurso do Acórdão n.º 581/12 para o Plenário deste Tribunal (à data da presente reclamação ainda em curso de decisão, pela conferência, sobre a sua admissão), que existe divergência quanto ao sentido decisório dos Acórdãos n.º 581/12 e n.º 24/2009 e, por fim, que à reclamante assiste o direito de, por via de apresentação das suas alegações de recurso, sustentar os argumentos decisivos no sentido de ser concedido provimento ao recurso, sob pena de ser preterido o seu direito de defesa e de acesso aos tribunais.
4. A questão de constitucionalidade que o recorrente e ora reclamante pretende ver apreciada, relativa à norma do artigo 70.º, n.º 1, 1.1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008 (na versão publicada pelo Aviso n.º 26235/2008 no Diário da República, II Série, de 31 de outubro de 2008 e mantido em vigor, sem qualquer atualização, no ano de 2009, por deliberação da Assembleia Municipal de Sintra, de 27 de fevereiro de 2009, conforme o n.º 1 do Aviso n.º 5156/2009, publicado no Diário da República, II Série, de 9 de março de 2009), quando aplicável a equipamentos de abastecimento de combustíveis líquidos inteiramente localizados em propriedade privada – e que constituiu o fundamento das notas de liquidação relativas ao ano de 2010, impugnadas judicialmente pelo recorrente, e foi aplicada pelo tribunal recorrido – e a alegada divergência de sentido decisório entre os Acórdãos n.º 581/12 e n.º 24/2009, sustentada na sua reclamação, foram já objeto de apreciação pelo Plenário deste Tribunal no âmbito do processo n.º 204/12 no qual foi proferido o acórdão n.º 581/12.
O Acórdão do Plenário n.º 316/2014, de 1 de abril, decidiu «Não julgar inconstitucional, quando aplicável a equipamentos de abastecimento de combustíveis líquidos inteiramente localizados em propriedade privada, o artigo 70.º, n.º 1, 1.1, da Tabela de Taxas e Outras Receitas do Município de Sintra para 2008, na versão publicada pelo Aviso n.º 26235/2008 no Diário da República, II Série, de 31 de outubro de 2008, e mantido em vigor, sem qualquer atualização, no ano de 2009, por deliberação da Assembleia Municipal de Sintra, de 27 de fevereiro de 2009, conforme o n.º 1 do Aviso n.º 5156/2009, publicado no Diário da República, II Série, de 9 de março de 2009» e, em consequência, negou provimento ao recurso.
Estando em causa, nos presentes autos, idêntica questão de constitucionalidade relativa à mesma norma objeto daquele Acórdão do Plenário, e em aplicação do decidido no mesmo, indefere-se a presente reclamação para a conferência e, em consequência, mantém-se a decisão sumária reclamada.
III – Decisão
5. Pelo exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 5 (cinco) unidades de conta, nos termos do disposto no artigo 7.º e 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro.
Lisboa, 9 de abril de 2014.- Maria José Rangel de Mesquita – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.