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Processo n.º 140/13
3.ª Secção
Relator: Conselheira Maria José Rangel de Mesquita
Acordam, em conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e recorrido o MINISTÉRIO PÚBLICO, o primeiro interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua atual versão (LTC), da decisão proferida pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, em 29/01/2013 (fls. 139-142), que indeferiu a reclamação deduzida contra a não admissão, pelo relator na 2ª instância, do recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24/10/2012 que manteve a decisão condenatória de 1ª instância consubstanciada na aplicação de uma pena de um ano e seis meses de prisão pela prática de crime de sequestro p. p. pelo artigo 158.º, n.º 1, do Código Penal.
2. Pela Decisão Sumária n.º 585/2013, de 6 de outubro, decidiu-se não conhecer do objeto do recurso interposto, com a seguinte fundamentação (cfr. fls. 186-193):
«(…) 4. Cumpre, a partir do teor do requerimento de interposição de recurso apresentado pelo recorrente, verificar o cumprimento dos requisitos formais estabelecidos no artigo 75.º-A da LTC, desde logo os estabelecidos no seu n.º 1, que dispõe:
«O recurso para o Tribunal Constitucional interpõe-se por meio de requerimento, no qual se indique a alínea do n.º 1 do artigo 70.º ao abrigo do qual o recurso é interposto e a norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade se pretende que o Tribunal aprecie».
Cabe, assim, ao recorrente delimitar o objeto do recurso de constitucionalidade ou legalidade por referência ao que foi também submetido à apreciação do Tribunal recorrido, procedendo à indicação, clara e precisa, do tipo ou espécie de recurso de fiscalização concreta que pretende interpor.
Verifica-se que, no requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional (de fls. 145-150, o recorrente A. vem «interpor recurso de constitucionalidade da decisão do Meritíssimo Juiz Presidente do STJ, que indeferiu a Reclamação, mantendo o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 28 de Setembro, nos termos do disposto na alínea f), do n° 1, do artigo 70º, e 72°, nº 1, al. b), da Lei do Tribunal Constitucional» (sublinhados acrescentados), escrevendo, mais à frente que «(…) as normas constitucionais que se consideram violadas, em razão da interpretação assaz restritiva do preceito contido na al. f), do nº 1 do artigo 400° do C.P.P., são o n° 4, do artigo 29° e o nº 1 do artigo 32° da Constituição da República Portuguesa, inconstitucionalidade já suscitada no processo» e solicitando que «nestes termos e no mais de direito, deve o presente Recurso ser atendido e ser apreciada a inconstitucionalidade da interpretação dada às normas indicadas.»
Tendo em conta o teor da invocada alínea f) do n.º 1 do art. 70.º da LTC, pretenderia o recorrente ver apreciada a legalidade de norma constante de ato legislativo por violação de lei com valor reforçado, de norma constante de diploma regional por violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República ou de norma emanada de um órgão de soberania por violação de estatuto de uma região autónoma, já que ali se dispõe que cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que «apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos referidos nas alíneas c), d) e e)» (sublinhado acrescentado). Todavia, a questão colocada pelo Recorrente à apreciação do Tribunal Constitucional não faz menção a qualquer dos parâmetros normativos acima enunciados, relevantes para os recursos de legalidade, já que ao invés alega a violação de preceitos da Constituição - o n.º 4 do artigo 29.º e o n.º 1 do artigo 32.º da Constituição da República Portuguesa - «em razão da interpretação assaz restritiva do preceito contido na al. f), do n.º 1 do artigo 400º do C.P.P.».
Assim, foi o recorrente notificado, «nos termos do disposto no n.º 5 do artigo 75.º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua actual versão (LTC), e com os efeitos previstos no n.º 7 do mesmo artigo, para, querendo, no prazo de 10 dias, proceder ao aperfeiçoamento do requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional clarificando, nos termos do n.º 1 do mesmo artigo, a alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso é interposto, e clarificando e indicando, nos termos do n.º 2 do mesmo artigo 75.º-A da LTC, respectivamente, a norma e o princípio constitucional ou legal que se considere violado bem como a peça processual em que o recorrente suscitou a questão de inconstitucionalidade ou ilegalidade» (cfr. despacho de fls. 164, notificado a 11/03/2013).
Na resposta ao convite de aperfeiçoamento do requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional (a fls. 166-167), o recorrente esclareceu:
A., Recorrente nos autos à margem referenciados, notificado do douto despacho de fls. ____,vem em cumprimento do mesmo responder ao convite formulado nos ermos seguintes:
1. No âmbito do recurso interposto perante o S.TJ., o Recorrente alegou que o entendimento contido no Acórdão do T.R.L. quanto à inadmissibilidade da recursória constitua, salvo melhor e mais douta opinião, uma mitigação do direito de recurso que assiste aos arguidos, por via de uma ¡interpretação muito restritiva artigo 400°, n° 1, al. f).
2. Considerando violados os artigos 29°, n° 4 e 32°, no 1, da C.R.P., em razão daquela interpretação assaz restritiva do preceito contido na al. f), do n° 1 do artigo 400° do C.P.P.
3. Verificando-se na hipótese inversa, uma inevitável compressão inadmissível das garantias de defesa do arguido, designadamente o direito ao recurso, consagradas no artigo 32°, nº 1, in fine, da C.R.P.
4. Por outro lado, ao aplicar o preceito em causa na versão atual, é violado o n° 4, do artigo 29° da Constituição: “Ninguém pode sofrer pena ou medida de segurança mais graves do que as previstas no momento da correspondente conduta ou da verificação dos respetivos pressupostos, aplicando-se retractivamente as leis penais de conteúdo mais favorável ao arguido”.
5. Sendo que, no âmbito dos direitos inscritos do arguido inclui-se o direito de recorrer de toda as decisões que lhe sejam desfavoráveis, (artigo 61°, n° 1 al. i), do C.P.P.), embora o preceito não declare quando nasce o direito ao recurso em concreto.
Em suma, as normas constitucionais que se consideram violadas, em razão da interpretação assaz restritiva do preceito contido na al a), do n° 2 do artigo 5º, e al. f), do n° 1 do artigo 400º do C.PP, são o n° 4, do artigo 29° e o n° 1 do artigo 32° da Constituição da República Portuguesa, questão já suscitada no recurso interposto para o STJ, e cuja admissibilidade foi recusada.
Termos em que requer, uma voz mais, a V. E° se digne apreciar o presente recurso, seguindo-se os demais termos legais.
Como se pode verificar, da resposta ao convite de aperfeiçoamento nada consta quanto à «clarificação» da alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC ao abrigo da qual o recurso é interposto, reiterando o recorrente que «as normas constitucionais que se consideram violadas, em razão da interpretação assaz restritiva do preceito contido na al. a), do nº 2 do artigo 5º, e al. f) do n.º 1 do artigo 400º do C.P.P., são o nº 4, do artigo 29º e o nº 1 do artigo 32º da Constituição da República Portuguesa, questão já suscitada no recurso interposto para o STJ (…).».
Ora, como já foi dito, na medida em que o tipo de recurso previsto na alínea f), do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC apenas pode ter objeto decisões dos tribunais que apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada pelo recorrente (aqui se incluindo os recursos de legalidade de: i) norma constante de ato legislativo por violação de lei com valor reforçado; ii) norma constante de diploma regional por violação do estatuto da região autónoma ou de lei geral da República; ou iii) norma emanada de um órgão de soberania por violação de estatuto de uma região autónoma), o que não encontra qualquer correspondência com a questão de constitucionalidade colocada pelo Recorrente à apreciação do Tribunal Constitucional (e que se afigura antes caber no tipo ou espécie de recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC), é manifesto que falta o pressuposto essencial de admissibilidade do recurso, pelo que a pretensão do recorrente não pode ser admitida.
Com efeito, cabe ao recorrente o ónus da especificação do tipo de recurso de fiscalização concreta que pretende interpor para o Tribunal Constitucional, em termos claros e precisos, em consonância com a delimitação do objecto do recurso que também lhe compete, devendo ainda, caso se interponha recurso ao abrigo das alíneas b) ou f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, constar do requerimento a indicação da norma ou princípio constitucional ou legal que se considera violado, conforme decorre dos números 1 e 2 do artigo 75.º-A da LTC.
Resulta do requerimento de interposição do presente recurso que o mesmo foi interposto ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
Este preceito prevê o recurso para o Tribunal Constitucional de decisões judiciais que apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo com qualquer dos fundamentos previstos na lei (violação de lei com valor reforçado, violação do estatuto de região autónoma ou violação de lei geral da República).
Ora, relativamente ao recurso previsto na alínea f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, é evidente que os respectivos pressupostos não se encontram preenchidos, atendendo a que recorrente não suscitou, durante o processo ou mesmo no requerimento do recurso para o Tribunal Constitucional, em relação à norma que agora pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional, qualquer dos vícios de ilegalidade reforçada previstos na disposição invocada como fundamento do recurso, tendo-se limitado a invocar a inconstitucionalidade de tal norma.
Convidado a aperfeiçoar o requerimento de interposição do recurso, o recorrente veio explicitar a norma (ou dimensão normativa) do artigo 400.º, n.º 1, alínea f) do Código do Processo Penal que pretende ver sindicada e indicar as normas ou princípios constitucionais que reputa violados – constantes dos artigos 29.º, n.º 4 e 32.º, n.º 1, ambos da Constituição.
Conclui-se, em conformidade, que não estando preenchidos os pressupostos processuais do recurso interposto ao abrigo do disposto na alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º, da Lei do Tribunal Constitucional, não é possível conhecer-se do respectivo objeto. (…)».
3. Vem agora o recorrente, representado por novo mandatário (cfr. fls. 196-197), reclamar para a conferência da referida Decisão Sumária n.º 585/2013, de 16 de outubro, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 4 – leia-se n.º 3 –, da LTC, com os fundamentos seguintes (cfr. fls 198 a 203):
«(…) 1°
A Decisão Sumária, de 16/10/2013, decidiu não conhecer do objecto do recurso, ao abrigo do art.º 78.º-A n.º 1 da Lei 28/82, de 15 de Novembro.
2°
Isto porque do requerimento de interposição do recurso se escreveu que o mesmo foi interposto ao abrigo da al. f) do n.º 1 do art.º 70.º da LTC, não tendo o recorrente suscitado durante o processo qualquer dos vícios de ilegalidade reforçada previstos na disposição invocada.
Ora,
3°
É manifesto que o recurso foi interposto ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art.º 70.º da LTC, uma vez que a inconstitucionalidade foi suscitada, conforme aliás consta de Fls. 6 da Decisão Sumária, e do n.º 21 do requerimento, a Fls. 13,
4°
Arguição de desconformidade constitucional que o STJ bem percebeu, como decorre do n.º 2 do despacho de Fls. 140:
'A interpretação restritiva da norma do art.º 400.º n.º 1 al. f) do CPP, é inconstitucional por violação dos art.ºs 29.º, n.º4 e 32°, n° 1, da CRP'.
5º
E a Fls. 142 dos autos:
'O reclamante invoca a inconstitucionalidade do art.º 400.º n.º 1 al. f) do CPP, por violação dos art.ºs 29.º n.º 4 e 32.º n.º 1, da CRP. '.
6°
Analisando os auto, torna-se patente que ocorreu um mero lapso de escrita na indicação da alínea do n.º 1 do art.º 70.º da LTC, pois onde a ex-mandatária do recorrente escreveu alínea f) queria dizer alínea b), do n.º 1 do art' 70° da LTC.
7°
Um mero lapso de escrita que nos parece poder ser retificado nos termos do art.º 249.º do Código Civil, o que abaixo se pedirá ex-professo.
8°
O Supremo Tribunal de Justiça, em elegante e doutíssimo acórdão de 19/10/1995, julgou que as normas devem ser interpretadas com os olhos postos na Justiça:
'Mas também é verdade que - 'ubi non est iustitia ibi, non potest esse ius'. E o certo é que interpretando a norma em causa, com os olhos postos na justiça, mais do que na mera literalidade do preceito, na sua força e poder, vemos que a conclusão a que chegamos será outra- 'Scire leges non hoc verba earum teneri, sed vim ac potestatem.'
In. CJ. Acs do STJ, Ano 1995, Tomo lIL pág. 210.
9°
Interpretar as normas com os olhos postos na Justiça é, talvez, uma das mais belas maneiras de chegar ao numeno do que é a Justiça, enquanto virtude cantada por Sócrates, como significando fazer bem aos amigos e mal aos inimigos.
10°
O lapso de escrita em que incorreu a ex-mandatária do arguido, decorre de um erro de escrita por simpatia, pois a norma de direito infra-constitucional em causa é a do art.º 400.º n.º 1 al. f) do CPP.
11°
Este lapso pode ser retificado ao abrigo do art.º 249° do C. Civil ou não?
12°
Cremos que podemos dizer que sim sem cairmos em mera sofistica, por interpretação até literal da norma do art.º 249.º do C. Civil.
Na verdade,
13°
Estatui a norma do art.º 249.º do C. Civil:
'O simples erro de cálculo ou de escrita, revelado no próprio contexto da declaração ou através das circunstâncias em que a declaração é feita, apenas dá direito à retificação desta. '.
14°
O que é o caso, mero lapso de escrita, uma vez que durante o processo foi suscitada a inconstitucionalidade da norma do art.º 400.º n.º 1 al. f) do CPP e indicadas as normas da CRP ofendidas, ou violadas, as dos art.ºs 29° n.° 4 e 32.º, n.º 1, da CRP, o que se traduz em inconstitucionalidade material, devidamente suscitada no processo.
15°
É verdade que ocorreu despacho de aperfeiçoamento e mesmo assim a ex-mandatária do recorrente não percebeu que estava em lapso,
16°
Mas é perfeitamente visível que se trata de lapso de escrita.
17°
Direito é cultura e cabe aqui referir que muitas vezes nós olhamos para as coisas e mesmo elas em frente não conseguimos descortinar o lapso.
18°
O poeta António Aleixo escreveu a seguinte quadra:
'Porque será que nós temos
Na frente, aos montes, aos molhos,
Tantas coisas que não vemos
Nem mesmo perto dos olhos?'
In Este Livro Que Vos Deixo. Pág. 41, 7ª Edição, Loulé 1983.
19°
Só a norma foi mal indicada, por erro de escrita, sendo perfeitamente sustentável que atentas as circunstâncias em que a declaração é feita, ou seja perante o facto de ter sido suscitada a inconstitucionalidade de norma infra-constitucional, in casu a do art.º 400.º n.º 1 al. j) do CPP, a norma do art.º 70.º n.º 1 da LTC é a da al. b) e não a da alínea f), pois jamais foi suscitada.
20°
Olhando e interpretando as normas com os olhos postos na Justiça temos que nada impede a retificação ao abrigo do disposto no art.º 249.º do C. Civil.
21°
Tanto mais que estamos no domínio do Direito Constitucional e não é racional e eticamente aceitável que o recurso tenha sentença de morte por um mero lapso de escrita.
Por outra via,
22°
A questão subjacente ao recurso tem relevância doutrinária, jurisprudencial, a nível interno e com repercussões no âmbito da CEDH.
Com efeito,
23°
Quem está atento às decisões do TEDH sabe que ainda há dias foi decidido pelo TEDH julgar desconforme a normas da CEDH a chamada 'Doutrina Parot' relativa à contagem do prazo de prisão dos prisioneiros da ETA - e com incidência também em todos os outros casos - tendo o TEDH julgado desconforme à CEDH a aplicação retroativa da Doutrina Parot, impedindo o alargamento retroativo do prazo de prisão.
24°
Ora, parece que é claro que o direito processual penal é direito constitucional aplicado, não fazendo sentido que as novas normas processuais penais mais desfavoráveis sejam aplicadas a casos anteriores.
25°
No caso concreto cercear o direito ao recurso para o STJ que antes da alteração do CPP era possível.
26°
Esta matéria é da maior relevância, sendo para nós pacífico que impedir o recurso com base em lei posterior menos favorável, ainda que seja processual penal, é ofender a norma do art.º 29.º n.º 4 e 32.º n.º 1 da CRPortuguesa.
27°
Cremos mesmo que ocorreria uma violação do principio da confiança e uma violação do principio da proporcionalidade.
28°
Interpretando as normas com os olhos postos na Justiça e ao abrigo do disposto no art.º 249.º do C. Civil, o recorrente requer que seja permitida a retificação da alínea do n.º 1 do art.º 70.º da LTC, e onde se escreveu 'nos termos do disposto na alínea f) do n.º 1, do art.º 70.º da Lei do Tribunal Constitucional' passe a ler-se 'nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1, do art.º 70.º da Lei do Tribunal Constitucional'.
29°
Pelo que requer que vá o processo á conferência, por via desta reclamação e seja deferido o pedido de retificação do lapso de escrita e julgado que o recurso foi devidamente interposto ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art.º 70° da LTC,
30°
E por via disso conhecido o objeto do recurso. NESTES TERMOS REQUER:
1 - Que seja admitida e deferida esta reclamação;
2 - Que seja admitida a retificação do lapso de escrita supra-referido;
3 - Que seja conhecido o objeto do recurso;
4 - Uma vez que a ex-mandatária do recorrente se presume notificada no 3° dia de correio, a notificação foi feita no dia 21/10/2013 pelo que sendo enviada esta reclamação por fax no dia 05/11/2013 é legal mas está sujeita ao pagamento de multa do 3° dia, conforme art.º 139° n° 5 do CPC, pelo que requer sejam emitidas as guias para pagamento imediato. (…)».
4. O representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional, notificado da reclamação do recorrente, concluiu, na sua resposta, no sentido do não acolhimento da reclamação e, ainda que se entendesse que o recurso fora interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, pelo não conhecimento do mesmo por falta de requisitos de admissibilidade do recurso, nos termos e com os fundamentos seguintes (cfr. fls. 215-218):
«(…) 1º
A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional da decisão proferida pelo Senhor Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça que indeferiu a reclamação do despacho que, na Relação de Lisboa, não admitira o recurso interposto para aquele Supremo Tribunal.
2º
O recurso foi expressamente interposto ao abrigo da alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
3º
Como o requerimento não obedecia aos requisitos legalmente exigidos (artigo 75.º-A. n.ºs 1 e 2 da LTC), foi proferido o despacho-convite a que alude o n.º 5 do artigo 75-A da LTC.
4º
Segundo o despacho da Exma. Senhora Conselheira Relatora, notificado ao recorrente, este devia clarificar, entre o mais, qual a alínea do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, ao abrigo da qual o recurso era interposto.
5º
Na peça apresentada em resposta ao convite, o recorrente, sobre esta matéria nada diz, nada clarificando, portanto, sobre a alínea do n.º 1, do artigo 70.º, ao abrigo do qual o recurso era interposto.
6º
Ora, a indicação da alínea do n.º 1, do artigo 70.º, da LTC “define irremediavelmente o tipo de recurso interposto” (Carlos Lopes do Rego, Os Recursos de Fiscalização Concreta na Lei e na Jurisprudência do Tribunal Constitucional, pág. 204).
7º
Assim, naturalmente que na douta Decisão Sumária n.º 585/2013, analisaram-se os requisitos de admissibilidade do recurso interposto ao abrigo da alínea f) do n.º 1, do artigo 70.º da LTC, a única invocada (vd. 2.º).
8º
Sendo evidente a não verificação desses requisitos, decidiu-se não conhecer do objecto do recurso.
9º
O recorrente vem agora dizer, na reclamação da Decisão Sumária, que se tratou de um lapso, que era manifesto que o recurso fora interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC).
10º
Ora, se se tratou de um lapso, ao recorrente foi expressamente dada plena oportunidade de o corrigir, quando foi notificado nos termos do n.º 5 do artigo 75.º-A, da LTC, o que não fez (vd. n.º 3 a 5).
11º
Nestas circunstâncias, invocar, agora, após ter sido proferida decisão, que ocorreu um lapso na indicação da alínea, não se reveste de qualquer relevância processual.
12º
Tanto bastaria para indeferir a reclamação.
13º
Podemos ainda acrescentar que, mesmo que se entendesse que o recurso fora interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da LTC, não se poderia conhecer do mesmo.
14º
No requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional e no apresentado na sequência do convite, não vem esclarecido qual a interpretação do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), do CPP que se questiona, apenas se falando em “interpretação restritiva”, desconhecendo-se, pois, qual a exacta dimensão normativa cuja inconstitucionalidade deveria constituir objecto do recurso.
15º
Por outro lado, na reclamação para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça (apresentado nos termos do artigo 405.º do CPP) – o momento processual próprio – não foi adequadamente suscitada a questão de inconstitucionalidade normativa.
16º
Tendo ocorrido uma alteração legislativa, defende-se a aplicação do regime anterior ao fixado pela Lei n.º 59/2007, de 4 de Setembro, porque mais favorável, fala-se em interpretação restritiva e da violação de princípios constitucionais, contudo não se enuncia com o mínimo de clareza qual a interpretação normativa que se considera violadora daqueles princípios constitucionais.
17º
Assim, faltariam também esses dois requisitos de admissibilidade do recurso.
(…)».
Cumpre apreciar e decidir.
II – Fundamentação
5. O recorrente, representado por mandatário diferente da mandatária que subscreveu o requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, reclama da Decisão Sumária n.º 585/2013, de 16 de outubro, invocando, em suma que «É manifesto que o recurso foi interposto ao abrigo da al. b) do n.º 1 do art.º 70.º da LTC (…)» e que a referência, no requerimento de interposição de recurso, à alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC constitui «um mero lapso de escrita» que pode ser rectificado nos termos do artigo 249.º do Código Civil (cfr. n.ºs 3.º a 21.º e 28.º e 29.º) e, ainda, que apenas suscitou durante o processo a inconstitucionalidade e não qualquer dos vícios de ilegalidade reforçada previstos na referida alínea f) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC.
6. Quanto à representação do ora reclamante por novo mandatário judicial decorre dos autos que:
- em 21/10/2013 o recorrente e ora reclamante veio juntar aos autos, no Tribunal Constitucional, requerimento a favor de novo mandatário (Dr. Ramiro Miguel) que, segundo o recorrente «implica revogação implícita do anterior mandato» (a favor da Sra. Dra. Ana Cristina Domingues), juntando ainda procuração respectiva a favor daquele (cfr. fls. 196-197);
- em 5/11/2013 deu entrada, neste Tribunal, via fax, o requerimento de reclamação para a conferência subscrito pelo Senhor Dr. Ramiro Miguel (cfr. fls. 198-203), tendo sido recebido nova cópia em 06/11/2013 (cfr. fls. 204-209) e em 12/11/2013;
- na sequência de despacho da relatora tendo em conta a referida junção aos autos de procuração em favor de mandatário diferente (cfr. fls. 229 e 230), o Tribunal da Relação de Lisboa, por ofício constante de fls. 231 e 236 (e documentos de fls. 232-235 e 237-242) entrado neste Tribunal em 25/11/2013, informou que deu entrada naquele Tribunal em 11/11/2013 um requerimento de renúncia ao mandato por parte da Sra. Dra. Ana Domingues, do qual o recorrente foi notificado por ofício de 15/11/2013, nos termos do artigo 47.º, n.º 1, do Código de Processo Civil (CPC) em 15/11/2013 e, ainda, que se encontrava a correr o prazo previsto naquele artigo.
Nos termos do referido artigo 47.º, n.º 2, do CPC, aplicável por força do disposto no artigo 69.º da LTC, os efeitos da renúncia do mandato – in casu apresentada pela Sra. Dra. Ana Domingues – produzem-se a partir da notificação ao mandante – notificação datada de 15/11/2012 –, sem prejuízo do disposto no n.º 3 da mesma disposição quanto à constituição de novo mandatário no prazo de 20 dias.
Em consequência, o mandatário que subscreve a reclamação para a conferência não tem poderes para intervir no processo, pelo que, nos termos do disposto do artigo 83.º da LTC, não pode conhecer-se da reclamação.
III – Decisão
7. Pelo exposto, decide-se não tomar conhecimento da reclamação.
Custas devidas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) UC, nos termos do artigo 7.º e 9.º, n.º 1, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro.
Lisboa, 7 de janeiro de 2014. – Maria José Rangel de Mesquita – Carlos Fernandes Cadilha – Maria Lúcia Amaral.