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Processo n.º 956/13
1ª Secção
Relatora: Conselheira Maria João Antunes
Acordam, em conferência, na 1.ª secção do Tribunal Constitucional
I. Relatório
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que é recorrente A. e são recorridos o Ministério Público, B. e C., foi interposto o presente recurso, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei da Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional (LTC), da decisão daquele Tribunal de 11 de julho de 2013.
2. Pela Decisão Sumária n.º 578/2013, decidiu-se, ao abrigo do disposto no artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC, não tomar conhecimento do objeto do recurso interposto. Tal decisão tem a seguinte fundamentação:
«De acordo com a alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, cabe recurso para o Tribunal Constitucional das decisões dos tribunais que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. Suscitação que há de ter ocorrido de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).
Sucede, porém, que não se pode dar como verificado o requisito da suscitação prévia e de forma adequada de uma questão de inconstitucionalidade reportada aos artigos 407.º, n.º 3, 411.º, n.ºs 1 e 4, e 400.º, n.º 1, alínea c), do Código de Processo Penal. Na reclamação para o Supremo Tribunal de Justiça o recorrente não identificou as dimensões interpretativas cuja constitucionalidade pretendia questionar, por referência a estes preceitos legais. Alega apenas que a interpretação dada ou feita é absolutamente inconstitucional, viola o estabelecido na CRP ou acarreta inconstitucionalidade.
A não verificação daquele requisito do recurso de constitucionalidade obsta ao conhecimento do seu objeto, justificando-se a prolação da presente decisão (artigo 78.º-A, n.º 1, da LTC)».
3. Da decisão sumária vem agora o recorrente reclamar para a conferência (artigo 78.º-A, n.º 3, da LTC), sustentando o seguinte:
«3 - Ora o recorrente indicou quais os artigos do CPP que violavam que artigos da CRC:
a) “(...) a interpretação dada ao 407º nº 3 do CPP é absolutamente inconstitucional, violando o estabelecido na CRP - Arts 2º, 20º nº 4 e 32º nº 1”
b) “(...) pela interpretação que faz do Artº 411º, n.º 1 e 4 do CPP, viola o estabelecido na CRP nos Arts 2º, 20º, nº 4 e 32.º, n.º 1, da CRP.”
c) “(...) interpretação dada ao Artº 400º al. c) do CPP acarreta inconstitucionalidade daquela norma, por violação do estabelecido nos Artigos 20º nº 1 e 4, 202º nº 2 e 204º da Constituição da República Portuguesa.”
4 - Assim parece parca a afirmação feita e supra transcrita e que terá justificado que logo no parágrafo seguinte se afirmasse que “A não verificação daquele requisito (...) obsta ao conhecimento do seu objeto (...).”
5 - A indicação da interpretação feita está contida no recurso, sendo manifesto que o teor dos artigos da CRC indicados são inequívocos no seu sentido, parecendo supérfluo, inócuo e maçador ter transcrito ipsis verbis aqueles dispositivos.
6 - Mesmo que se entendesse que o recorrente devia ter procedido à transcrição ou indicação por sinónimos do conteúdo dos artigos invocados, sempre devia ter havido lugar ao convite ao aperfeiçoamento do articulado.
7 - Sendo incontestável que do que foi escrito percebe-se o sentido do invocado - exceto se não se quiser ir ler os artigos em si...
8 - A decisão reclamada viola o estabelecido no Artº 78º A nº 1 da LTC.
9 - Por outro lado, a condenação em 7 UCs quando foi proferida uma breve e simplificativa decisão de não conhecimento do mérito, é de todo contrária aos princípios que orientam a condenação em custas, como a complexidade».
4. Os recorridos foram notificados da reclamação, mas respondeu apenas o Ministério Público, dizendo o seguinte:
«1º
Pela douta Decisão Sumária n.º 578/2013, não se conheceu do objeto do recurso interposto por A. para o Tribunal Constitucional.
2º
Efetivamente, como de forma inequívoca se demonstra na douta Decisão Sumária, na reclamação para o Senhor Presidente do Supremo Tribunal de Justiça da decisão que, na Relação de Guimarães, não admitira o recurso interposto para aquele Supremo Tribunal, não foi suscitada de forma minimamente adequada qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, única passível de constituir objeto idóneo do recurso de constitucionalidade.
3º
Quanto a essa ausência de normatividade, na reclamação agora apresentada, nada de concreto se diz.
4º
Como o não conhecimento do objeto do recurso, interposto ao abrigo do artigo 70.º, n.º 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), ficou a dever-se à não verificação de um requisito de admissibilidade, não tinha que ser proferido o despacho-convite a que alude o artigo 75.º-A, n.º 5 e 6 da LTC, uma vez que este apenas se destina a dar a possibilidade aos recorrentes de suprirem deficiências formais de que o requerimento de interposição do recurso enferme.
5º
Quanto à condenação em custas (7 unidades de conta) constante da decisão reclamada, a mesma situa-se dentro dos limites legais (artigo 6.º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de Outubro) e está em plena consonância com os critérios jurisprudenciais que este Tribunal Constitucional vem reiteradamente seguindo em situações idênticas à dos autos.
6º
Pelo exposto, deve indeferir-se a reclamação e o pedido de reforma da decisão quanto à condenação em custas, que é no que se traduz o afirmado no ponto 9 da reclamação».
Cumpre apreciar e decidir.
II. Fundamentação
1. Foi proferida decisão de não conhecimento do objeto do recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, por não se poder dar como verificado o requisito da suscitação prévia e de forma adequada das normas cuja apreciação foi requerida (artigo 72.º, n.º 2, da LTC).
Muito embora pretenda contrariar o decidido, o reclamante acaba por confirmar o bem fundado da decisão sumária proferida. Nas passagens para onde remete é inequívoco que não identifica as dimensões interpretativas cuja constitucionalidade pretendia questionar (cf. ponto 3. da reclamação). Quando se pretende a apreciação da conformidade constitucional de determinada interpretação de um preceito legal (ou de mais do que um conjugadamente) é um ónus do recorrente identificar tal interpretação perante o tribunal recorrido, não podendo este Tribunal substituir-se ao recorrente, porque sobre ele impende também o ónus de definir o objeto do recurso de constitucionalidade (artigo 75.º-A, n.º 1, segunda parte).
O reclamante também não tem razão quando sustenta que devia ter havido lugar ao convite ao aperfeiçoamento do articulado. É óbvio que já não estava a tempo de aperfeiçoar o requerimento em que reclamou perante o Supremo Tribunal de Justiça do despacho de não admissão do recurso que então interpôs. O convite previsto no artigo 75.º-A, n.º 6, da LTC tem a ver estritamente com a satisfação dos requisitos do requerimento de interposição de recurso e, por isso, «só é possível se a omissão for sanável, ou seja, se consistir numa falta do próprio requerimento, não tendo cabimento para o suprimento de falta de pressupostos de admissibilidade do recurso que seja insanável” (Acórdão do Tribunal Constitucional n.º 99/2000, disponível em www.tribunalconstitucional.pt).
Há que reiterar, pois, a decisão de não conhecer o objeto do recurso interposto.
2. O reclamante requer ainda a reforma da decisão quanto a custas.
Sem razão, uma vez que a taxa de justiça (7 unidades de conta) foi fixada de acordo com o Regime de Custas no Tribunal Constitucional, previsto no Decreto-Lei n.º 303/98, de 7 de outubro. A taxa foi fixada dentro dos limites estabelecidos no artigo 6.º, n.º 2 (entre 2 UC e 10 UC), com respeito pelo critério constante do artigo 9.º e de acordo com o que este Tribunal vem decidindo.
III. Decisão
Pelo exposto, decide-se indeferir o requerido.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 unidades de conta.
Lisboa, 9 de janeiro de 2014. – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Maria Lúcia Amaral.