Imprimir acórdão
Processo n.º 555/04
3.ª Secção Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam na 3.ª secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. Notificada do Acórdão n.º 619/04, que decidiu não julgar inconstitucional a norma constante do artigo 13° do Decreto-Lei n° 874/76, de 28 de Dezembro, quando interpretada no sentido de impor o pagamento da indemnização aí prevista
à entidade patronal, se esta obstar ao gozo de férias, durante o período em que prestem serviço, dos trabalhadores que se encontrem em situação de pré-reforma e, consequentemente, negou provimento ao recurso, apresentou a ora requerente A., “ao abrigo do disposto no art. 669°, n° 1, al. a) aplicável por força do art. 69° da Lei do Tribunal Constitucional”, o presente pedido de aclaração, onde afirma, nomeadamente, o seguinte:
“[...] Ou seja, todo o acórdão assenta numa premissa, premissa essa que é a de que a interpretação do acórdão recorrido atribuía aos recorridos, no ano em que apenas trabalharam alguns meses e não trabalharam outros, um número de dias de férias proporcional aos meses trabalhados, à razão de dois dias de férias por cada mês. [...] Porém, o caso é exactamente o oposto: a decisão recorrida entendeu, como entendeu a decisão da Relação de Lisboa e a sentença da 1a instância, que apesar de os trabalhadores apenas terem prestado serviço em alguns meses do ano, eles tinham direito às férias completas, ou seja, às férias a que teriam direito se tivessem trabalhado todo o ano (ou os onze meses habituais). Mais do que isso, a decisão recorrida e as que a antecederam reconheceram a esses trabalhadores, ora recorridos, não 22 dias úteis de férias, como era a regra geral e resulta do critério de dois dias por cada mês trabalhado, mas 26 dias de férias, por ser essa a duração 'normal' das férias decorrente do AE aplicável.
É contra este entendimento que se insurgiu a Recorrente! Ao entender puni-la com a sanção equivalente ao triplo das férias não gozadas, sendo esse triplo calculado por referência a 26 dias de férias para quem trabalhou apenas seis ou sete meses no ano, fez-se uma interpretação normativa que incluiu um pressuposto que não pode deixar, como no acórdão desse Tribunal Constitucional, de resto, se afirma, intolerável e inadmissível, porque desproporcional. Se a Recorrente obstasse ao gozo de férias a um trabalhador plenamente no activo e que tivesse trabalhado os doze meses do ano, o art. 13° da Decreto-Lei n°
874/76, de 28 de Dezembro, impor-lhe ia, a título de indemnização, o pagamento do triplo da retribuição correspondente ao período em falta, que neste caso seria indisputadamente de 26 dias por força do AE. Mas ao impor-se, por interpretação desta mesma norma, o pagamento de exactamente o mesmo valor (triplo da retribuição de 26 dias) como indemnização por falta de gozo de férias a quem não trabalhou doze, mas só trabalhou seis, ou sete, meses no ano, dá-se tratamento igual ao que é materialmente diferente e despreza-se a diferença de dois casos. O acórdão em apreço imputa ao acórdão recorrido uma interpretação normativa que, manifestamente, não é aquela que foi sufragada, nem aí, nem nas instâncias, razão, aliás, pela qual qualificou de absurda uma das conclusões do recurso. Contém, ou parece conter, pois, uma ambiguidade, uma obscuridade, que justifica o presente requerimento de aclaração.[...]”
3. Notificados os recorridos, nada disseram.
Cumpre decidir.
II. Fundamentação.
4. Pretende a requerente ver aclarado o Acórdão n.º 619/04 deste Tribunal. Não pode, porém, proceder o seu pedido. Com efeito, o acórdão aclarando é perfeitamente claro não só acerca do que nele se decidiu , mas também em relação aos motivos porque assim se decidiu. Não existe, deste modo, qualquer
“ambiguidade ou obscuridade” que mereça esclarecimento.
Na verdade, como é jurisprudência constante e reiterada do Tribunal Constitucional, a este apenas compete julgar a questão de constitucionalidade de normas e não a de decisões judiciais em si mesmas consideradas. Ora, no acórdão aclarando foi apreciada a constitucionalidade da norma constante do artigo 13° do Decreto-Lei n° 874/76, de 28 de Dezembro, tal como expressamente interpretada no acórdão do Supremo Tribunal de Justiça recorrido – isto é, no pressuposto de que “o período de férias é estabelecido por correspondência ao tempo de trabalho efectivamente prestado, na proporção de dois dias úteis por cada mês completo de trabalho”. E, naquela interpretação, foi julgado não ser a mesma inconstitucional.
Se a decisão concreta do caso conduziu nas instâncias a um resultado diverso do que resultaria da aplicação prática daquele critério é algo que, como se afirma, aliás, no acórdão recorrido, transcrito na decisão aclaranda, se deverá, porventura, “a considerações que não relevam da interpretação feita relativamente ao citado artigo 13° do Decreto-Lei n.º 874/76”, considerações essas que a requerente provavelmente conhecerá e que, não sendo objecto do presente recurso a inconstitucionalidade de qualquer outra norma, não cabe, manifestamente, a este Tribunal sindicar.
Assim, porque a decisão aclaranda não enferma de qualquer obscuridade ou ambiguidade que careça de ser esclarecida, há que desatender o pedido de aclaração formulado.
III - Decisão
Em face do exposto, decide-se desatender a requerida aclaração. Custas pela requerente, fixando-se a taxa de justiça em 15 (quinze) unidades de conta.
Lisboa, 7 de Dezembro de 2004
Gil Galvão Bravo Serra Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Vítor Gomes Rui Manuel Moura Ramos