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Processo n.º 880/04
2.ª Secção Relator: Conselheiro Mário Torres
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
1. Relatório
A. apresentou reclamação, nos termos dos artigos 76.º, n.º 3, e 77.º da Lei de Organização, Funcionamento e Processo do Tribunal Constitucional, aprovada pela Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, e alterada, por último, pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro (LTC), contra o despacho do Presidente do Tribunal da Relação do Porto, de 10 de Maio de 2004, de não admissão do recurso de constitucionalidade interposto contra o seu despacho de
14 de Abril de 2004, que, por seu turno, indeferira reclamação do despacho de 6 de Maio de 2003 do juiz do 4.º Juízo Cível da Comarca do Porto, que não admitira, por intempestivo, recurso interposto por aquele embargante-executado contra a sentença de 30 de Janeiro de 2003, que julgara improcedentes os embargos de executado por ele deduzidos. Neste despacho de 6 de Maio de 2003, consignou-se que a referida sentença se considerava notificada ao embargante em
7 de Fevereiro de 2003, pelo que o prazo de 10 dias para interposição de recurso terminava no dia 17 seguinte (ou no dia 20, com pagamento de multa), sendo, assim, intempestiva a apresentação do requerimento de interposição de recurso efectuada apenas em 23 de Abril de 2003. E uma vez que o embargante, nesse requerimento, logo sustentara a tempestividade da interposição do recurso “por ter sido interrompido o prazo para a prática de acto judicial em 11 de Fevereiro de 2003 (...) com a requisição de apoio judiciário (ut artigo 25.º da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro)” e “ter ocorrido a notificação ao [novo] patrono em 4 de Abril de 2003”, o aludido despacho acrescentou: “Note-se que o prazo em questão jamais se interrompeu, ao contrário do que pretende o embargante, pois que para tal teria o mesmo que juntar aos autos documento comprovativo do pedido de apoio judiciário formulado nos competentes serviços de segurança social para a nomeação de patrono, em conformidade com o disposto no artigo 25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, o que não fez”.
A reclamação que o embargante deduziu deste despacho para o Presidente do Tribunal da Relação do Porto desenvolveu a seguinte argumentação:
“1. O recurso devia ter sido admitido de forma tempestiva e por duas ordens distintas de razões, a saber:
– por ocorrer interrupção do prazo por força do pedido de apoio judiciário;
– por se encontrar suspenso o processo referente aos embargos deduzidos por falta de constituição de advogado.
2. Sendo certo em ambos os casos que só com a nomeação de patrono ao abrigo do regime do apoio judiciário veio a cessar a suspensão dos autos por falta de constituição de advogado.
Com efeito,
3. Nos presente autos, era obrigatória, nos termos da alínea a) do n.º 1 do artigo 32.º do Código de Processo Civil, por os embargos admitirem, pelo seu valor (superior à alçada de primeira instância), recurso ordinário, a constituição de advogado, tendo o advogado constituído renunciado ao mandato.
4. Por força da renúncia ao mandato (que foi julgada válida por despacho de fls. 123), operada nos termos do artigo 39.º do Código de Processo Civil, e igualmente por força do disposto no n.º 3 deste mesmo artigo, ao não ter sido constituído mandatário no prazo de vinte dias, verificou-se a suspensão do processo de embargos, efeito que se produz ope legis.
5. Porquanto, neste processo, é autor o embargante, sendo a este embargante que se aplicam as regras atinentes à condição de autor, ou seja, a suspensão do processo até à constituição de novo mandatário.
6. Não sendo de aplicar as regras referentes ao réu, porquanto, no processo de embargos, o embargante não é réu, mas, sim, autor.
7. Por outro lado, o direito à assistência por advogado é um direito de dimensão constitucional, que não pode ser afastado, e, muito menos, se pode fazer prosseguir livremente julgamento contra legem, o que constitui nulidade.
8. Por outro lado, da apresentação de documento de pedido de apoio judiciário, como se vê, foi dado conhecimento aos autos, pelo menos pela delegação da Póvoa de Varzim da Ordem dos Advogados, sendo certo que
9. Com a apresentação do expediente de pedido de apoio judiciário, se tem que no caso se deve ter por verificada a interrupção do decurso do prazo, na data em que foi formulado o pedido de apoio judiciário.
10. Sendo os efeitos de interrupção verificados e com referência ao pedido, assim sendo inutilizado o prazo em causa.
Ainda,
11. Se falecessem todos os argumentos atrás citados, sempre se teria que manter que, no caso vertente, a apresentação do recurso seria tempestiva, por ocorrer nos autos justo impedimento,
12. Porquanto se trata de acto que o recorrente não pode praticar sem a intervenção de advogado, advogado esse cuja nomeação aguardava lhe fosse efectuada pelas entidades competentes, cessando este com a nomeação operada ao mandatário da nomeação pela entidade competente, qual seja, a Ordem dos Advogados.”
A reclamação foi indeferida por despacho de 14 de Abril de 2004 do Presidente do Tribunal da Relação do Porto, com a seguinte fundamentação:
“Criam-se, por vezes, situações com decisões/comportamentos que não queremos classificar.
O que não deixa de ser certo é que, face ao requerimento da mandatária do embargante, apresentado em 27 de Novembro de 2002, conforme fls.
32 (108 do processo principal), consistente na declaração de renúncia, e porque o mandante não apresentou procuração no prazo legal, teria de considerar-se, ope legis, suspensa a instância do processo de embargos. Pura e simplesmente, conforme tudo consignado pelo artigo 39.º, n.º 3. E não se avente com a natureza do processo, porquanto é a lei que o determina sem excepções e sem especificar seja o que for. Assim, tendo sido a declaração de renúncia notificada, por carta registada emitida em 3 de Dezembro de 2002, aquele prazo deve considerar-se expirado em 8 de Janeiro de 2003 (quando muito, se for utilizado o mecanismo do artigo 145.º, n.ºs 5 e 6, em 13 de Janeiro de 2003).
Sem dúvida, o embargante deduziu o pedido de apoio judiciário, com nomeação de patrono, além do mais, em 11 de Fevereiro de 2003, conforme fls. 48
(196 do processo principal). Sem dúvida, o prazo suspende-se com tal pedido. Porém, só releva com a junção aos autos da respectiva informação.
O que não ocorreu. Na verdade, o que a Ordem dos Advogados transmite ao Tribunal é a efectiva nomeação do mandatário. E tão-somente nunca antes de 31 de Março de 2003, conforme fls. 45 (fls. 145 do processo principal).
Fora, no entanto, o tribunal notificado em 27 de Março pela Segurança Social da concessão do apoio judiciário, conforme fls. 43 (141 do processo principal).
Tudo quando o prazo se encontrava mais do que expirado, pelo que não releva o benefício invocado ao abrigo do artigo 25.º, n.º 4, da Lei n.º
30-E/2000, de 20 de Dezembro, enquanto a interrupção é do prazo «que estiver em
‘curso’».
Tendo sido o embargante notificado da sentença, por carta registada emitida em 4 de Fevereiro de 2003, conforme despacho de fls. 53/54 (fls. 154/155 do processo principal), o prazo de recurso, de 10 dias, conforme o artigo
685.º, n.º l, deve considerar-se expirado em 17 de Fevereiro de 2003 (quando muito, se for utilizado o mecanismo do artigo 145.º, n.ºs 5 e 6, em 20 de Fevereiro de 2003). Tendo sido apresentado o recurso apenas em 23 de Abril de
2003, conforme o despacho, já citado, de fls. 53-54, tem de considerar-se extemporâneo.
E não se invoque o justo impedimento. Não é para este tipo de situação que existe uma tal figura processual. O impedimento que deriva, de facto, da falta de mandatário está protegido autonomamente pelas normas acima invocadas respeitantes ao apoio judiciário. Mas, como em tudo, há que respeitar regras e, em especial, prazos. O que não sucedeu, como se expendeu e demonstrou.
A suspensão da instância, ainda que ope legis, acabou por não funcionar, com a realização do julgamento, em 30 de Janeiro de 2003, conforme fls. 37-42 (fls. 127-132 do processo principal). Mas era sobre ela que se teria de reagir através dos já referidos meios regulados pelo diploma adjectivo. O que não aconteceu. Portanto, nada há a alterar. Pelo que terá de manter-se a sentença que julgou os embargos improcedentes.
Em consequência e em conclusão,
Indefere-se a reclamação, interposta nos Embargos de Executado n.º
2139-A/01-4.º-3.ª, dos Juízes Cíveis do Porto, pelo embargante-executado A., por não ter sido admitido recurso, por intempestividade, da sentença que julgou improcedentes os embargos.”
O reclamante, notificado deste despacho, dele interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, referindo:
“(...)
4.° – Tendo o recurso por objecto a declaração de inconstitucionalidade resultante da interpretação do artigo 39.°, n.º 3, do Código de Processo Civil, em conjugação com o artigo 25.°, n.º 4, da Lei n.º
30-E/2000, de 20 de Dezembro, e no sentido em que a falta da apresentação do pedido de nomeação de mandatário, ao abrigo do regime do apoio judiciário e em processo onde tenha sido julgada válida a renúncia de mandatário, leva a que se não verifique a suspensão da instância e que se tenham por decorridos quaisquer prazos que se encontrem a correr, por tal interpretação violar de forma clara o disposto no artigo 20.°, n.ºs 1, 2 e 4, da CRP.
5.º – Para os devidos efeitos declara que a questão apenas se verifica no momento em que é proferido o acto recorrido, ou seja, a decisão da reclamação por parte do Ex.mo Senhor Desembargador Presidente do Tribunal da Relação do Porto, e não em momento anterior, e pelo facto de apenas na decisão agora recorrida ter ocorrido a interpretação que se deve entender como violadora da Constituição, a qual é assim uma questão nova.
6.° – Precisamente por se tratar de questão nova, ou seja, que apresenta um sentido de decisão diverso do colocado e propugnado em sede da reclamação que desatendeu o pedido de interposição de recurso, ficou o recorrente impedido de suscitar em momento prévio e perante as instâncias comuns a questão atinente à violação do direito constitucional, dado que o que era suscitado em sede de reclamação era apenas e só o pedido de que se considerasse que, por força da lei e da falta de constituição de mandatário, o processo estava suspenso e, como tal, apenas com a nomeação de novo patrono cessaria a suspensão.
7.° – Questão manifestamente diversa da constante da decisão, dado que o sentido apurado em sede de decisão recorrida e reclamada era a de aplicação analógica ao processo de embargos de regra processual distinta, que não da total desconsideração da questão atinente ao não decurso de qualquer prazo, por via da suspensão do processo.
8.° – A decisão agora em recurso abre uma nova e contraditória via, dado que, pese embora se reconheça na decisão em causa que a suspensão da instância opera ope legis, em manifesta contradição com este raciocínio, se considera que não obstante o efeito da lei ser o da suspensão da instância, o prazo de recurso corre normalmente, como se a instância não se encontrasse suspensa, e que, por tal facto, seria necessário provocar a interrupção do prazo com a apresentação do pedido de nomeação de patrono.
9.° – Afigura-se ainda manifesto que ocorre a violação do artigo
20.° da CRP, dado que se nega pela presente via o acesso ao direito e a uma tutela jurisdicional efectiva, bem como a um processo equitativo, dado que, se a parte, para poder estar em juízo, ou seja, para poder exercer a sua defesa, nomeadamente, para poder recorrer da decisão, carece de se fazer representar por advogado e, para o efeito, está dependente do deferimento da pretensão por parte do Estado, não pode considerar-se que os actos e prazos processuais seguem os seus termos sem que ocorra a assistência efectiva por parte de advogado.”
O recurso para o Tribunal Constitucional não foi admitido por despacho do Presidente do Tribunal da Relação do Porto, de 10 de Maio de 2004, do seguinte teor:
“Pese embora o recorrente venha alegar, no próprio requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional, que só agora invoca a inconstitucionalidade da decisão proferida na «Reclamação», o certo é que não se demonstra cumprido o requisito para a interposição do recurso enquadrado no disposto no artigo 70.º, n.º 1, alínea f), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, ou seja, «Cabe recurso ... Que apliquem norma cuja ilegalidade haja sido suscitada durante o processo...».
O que é confirmado pela exigência inserta no artigo 75.º-A, n.º 2.
O que não aconteceu. E «não aconteceu» na medida em que, quando é interposto recurso da decisão condenatória e não se estava já a respeitar o prazo normal, era obrigação do apresentador de tal peça alegar e justificar o facto, sob pena de até a própria Secção de Processos nem dever fazer junção dessa peça ou então frustrar que o Magistrado não abordasse os fundamentos que ora invoca por não adivinhar o que cada um pensa sobre a matéria em causa. Ora, não só não fundamentou – repete-se – como também não abordou a ora alegada e invocada inconstitucionalidade do não alargamento do prazo.
E o mesmo comportamento manteve aquando da dedução da reclamação.
Alegar que era intempestivo não merece apoio, porquanto a decisão ora recorrida não deixa de manter a decisão reclamada e praticamente nada mais a ela acrescenta, além de considerações que não se revestem de qualquer especialidade e, muito menos, essencialidade.
E não se diga que a decisão é inédita. Trata-se de uma questão que para nós, porque já estudada e abordada, merecia que, se não era aceite pelo recorrente, fosse abordada desde o seu início.
Invocar o artigo 20.º da CRP, por outro lado, também não é suficiente, pois este, além de não dizer respeito, nos n.ºs 2 e 4 invocados, à matéria em apreço, pressupõe o respeito de todas as regras do processo.
Daí que, pelos fundamentos ora invocados – alínea f) – não se admite o recurso para o Tribunal Constitucional.”
É contra este despacho de não admissão do recurso de constitucionalidade que – como se referiu – vem deduzida a presente reclamação, nos termos dos artigos 76.º, n.º 3, e 77.º da LTC, aduzindo o reclamante:
“3. Salvo o devido respeito, e atentas as razões do recurso em causa, e o momento em que se verifica a violação constitucional, não era possível fazer apreciar a questão por via do tribunal comum, dado que a decisão sobre a reclamação não é passível nem de recurso ordinário, nem de reclamação
(por o processo a não comportar), e, como se alega em sede de requerimento de interposição de recurso, a violação da Constituição apenas surge no momento em que é decidida a reclamação.
4. Ora, este Tribunal Constitucional tem admitido a interposição de recurso em casos semelhantes, obrigando contudo à fundamentação do requerimento de interposição de recurso e no qual deve ser suscitada desde logo a concreta questão constitucional a apreciar, e sumariamente justificadas as razões da desconformidade com a lei constitucional.
5. Efectuou o recorrente tal fundamentação, ainda que de forma sucinta, renovando-se aqui as razões que ditavam que apenas nesta sede se poderia proceder à apreciação da constitucionalidade, dado que apenas em sede de decisão se abriu nova via, com aplicação da lei em violação da lei fundamental.”
Neste Tribunal Constitucional, o representante do Ministério Público emitiu o seguinte parecer:
“A presente reclamação é manifestamente improcedente. Na verdade, fundando-se o recurso de fiscalização concreta interposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei n.º 28/82 (e não na alínea f), como, por lapso, se refere no despacho que o rejeitou), cumpria ao recorrente ter suscitado, durante o processo e em termos procedimentalmente adequados, a questão de inconstitucionalidade que constitui objecto do recurso. Tal ónus não foi cumprido, já que, ao deduzir reclamação perante o Presidente da Relação, ao ser confrontado com o despacho de rejeição do recurso ordinário interposto do decidido em 1.ª instância, o reclamante não delineou qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, apesar de ser previsível a eventualidade de vir a ser realizada a interpretação dos preceitos em causa que efectivamente o Presidente da Relação fez.”
Tudo visto, cumpre apreciar e decidir.
2. Fundamentação
A admissibilidade dos recursos interpostos ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC – como ocorre no presente caso, devendo-se a manifesto lapso a referência no despacho reclamado à alínea f) desse preceito –, depende da verificação cumulativa dos requisitos de a questão de inconstitucionalidade haver sido suscitada “durante o processo”, “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (n.º 2 do artigo 72.º da LTC), e de a decisão recorrida ter feito aplicação, como sua ratio decidendi, das dimensões normativas arguidas de inconstitucionais pelo recorrente. Aquele primeiro requisito (suscitação da questão de inconstitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferida a decisão impugnada) só se considera dispensável nas situações especiais em que, por força de uma norma legal específica, o poder jurisdicional se não esgota com a prolação da decisão recorrida, ou naquelas situações, de todo excepcionais ou anómalas, em que o recorrente não dispôs de oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade antes de proferida a decisão recorrida ou em que, tendo essa oportunidade, não lhe era exigível que suscitasse então a questão de constitucionalidade.
A questão crucial para a decisão da presente reclamação consiste em saber se a decisão de que se pretendeu interpor recurso para o Tribunal Constitucional – o despacho do Presidente do Tribunal da Relação do Porto, de 14 de Abril de 2004, que indeferiu a reclamação para ele deduzida – constitui uma decisão-surpresa que, pelo seu carácter inesperado, não tornava exigível que o recorrente, antes da sua prolação, viesse arguir a inconstitucionalidade das normas nela aplicadas.
Nesse despacho, começa por admitir-se como mais correcto o entendimento de que a não constituição de novo mandatário, pelo embargante, no prazo de 20 dias após a notificação da renúncia do anterior mandatário, devia produzir, ope legis, a suspensão da instância, em 8 (ou 13) de Janeiro de 2003, entendimento que, porém, não foi seguido pelo juiz de 1.ª instância, que realizou o julgamento e proferiu sentença a julgar improcedentes os embargos em
30 de Janeiro de 2003. Porém – prossegue o referido despacho – a reacção processual que o embargante devia usar era a interposição de recurso, no prazo legal. E foi esse prazo que foi ultrapassado, já que o efeito interruptivo desse prazo por força da apresentação de pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono dependia – nos termos do n.º 4 do artigo 25.º da Lei n.º
30-E/2000 – da junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do respectivo requerimento, o que não foi feito.
A interpretação assim dada à norma desse n.º 4 do artigo
25.º nada tem de inesperada ou insólita, desde logo porque corresponde ao teor literal do preceito (“Quando o pedido de apoio judiciário é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretende a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo” – sublinhado acrescentado), que constitui excepção à regra, proclamada no n.º 1, de que o procedimento de apoio judiciário é autónomo relativamente à causa a que respeite e não tem qualquer repercussão sobre o andamento desta, e, depois, porque é mera confirmação do entendimento já perfilhado no despacho do juiz de 1.ª instância reclamado (“Note-se que o prazo em questão jamais se interrompeu, ao contrário do que pretende o embargante, pois que para tal teria o mesmo que juntar aos autos documento comprovativo do pedido de apoio judiciário formulado nos competentes serviços de segurança social para a nomeação de patrono, em conformidade com o disposto no artigo
25.º, n.º 4, da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro, o que não fez”).
Teve, pois, o recorrente, quando já estava representado por mandatário, oportunidade processual para, justamente na reclamação deste despacho de não admissão do recurso por intempestividade, suscitar a questão de inconstitucionalidade da norma (ou interpretação normativa), que, sem surpresa, veio a ser acolhida na decisão de que pretendeu interpor recurso de constitucionalidade.
Não o tendo feito, quando o podia e devia ter feito, falta o aludido requisito específico de admissibilidade do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, o que conduz ao indeferimento da presente reclamação.
3. Decisão
Em face do exposto, acordam em indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em
20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 19 de Outubro de 2004
Mário José de Araújo Torres Paulo Mota Pinto Rui Manuel Moura Ramos