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Processo n.º 124/04
1ª Secção Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. Por acórdão de 26 de Junho de 2003, do Tribunal da Comarca de Loures
(fls. 11549 a 11762), foram condenados, entre outros, os seguintes arguidos:
– A., pela prática, em autoria material e em concurso real, de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1, e 24º, alíneas b), c), e j), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma, de um crime de detenção de arma proibida, previsto e punível pelo artigo 275º, n.º 3, do Código Penal, de um crime de falsificação de documentos autênticos, previsto e punível pelos artigos 256º, n.º 1, alínea a), e n.º 3, do Código Penal, de um crime de falsidade de declaração, previsto e punível pelo artigo 359º, n.º 2, do Código Penal, e de um crime de condução de veículos automóveis na via pública sem habilitação, previsto e punível pelo artigo 3º, n.º 2, do Decreto-Lei n.º
2/98, de 3 de Janeiro, em cúmulo jurídico, na pena unitária de nove anos e seis meses de prisão.
– B., pela prática, em autoria material e em concurso real, de um crime de tráfico ilícito de estupefacientes agravado, previsto e punível pelos artigos 21º, n.º 1, e 24º, alíneas b), c) e j), do Decreto-Lei n.º 15/93, de 22 de Janeiro, com referência às tabelas I-A e I-B anexas ao mesmo diploma, e de um crime de burla qualificada, previsto e punível pelos artigos 217º, n.º 1, e
218º, n.º 2, alínea a), do Código Penal, em cúmulo jurídico, na pena unitária de doze anos de prisão.
2. Tanto B. como A. interpuseram recurso desse acórdão para o Tribunal da Relação de Lisboa (respectivamente a fls. 12608 a 12637 e 12639 a 12668).
Nas conclusões da motivação que apresentaram, quer o recorrente B., quer o recorrente A., declararam que mantinham interesse na apreciação do recurso intercalar, referente às escutas telefónicas (respectivamente a fls.
12637 e 12668).
Na motivação desse recurso intercalar, interposto da decisão instrutória na parte que indeferiu a arguição de “nulidade das escutas telefónicas, como meio de prova nos autos, por violação do formalismo legal, dado não ter havido acompanhamento judicial tempestivo das mesmas”, os recorrentes concluíram, para o que aqui releva, do seguinte modo (fls. 7086):
“[...]
1º- Os despachos a ordenar as escutas não estão fundamentados, nem de facto, nem de Direito, tal como é exigido. O M. Juiz ao não ter fundamentado [n]os despachos, fez errada interpretação das normas contidas no art. 97º n.º 4 e 187º n.º 1 do C.P.P., por violação do dever de fundamentação – art. 205º n.º 1 e direito ao recurso, art. 32º n.º 1 da C.R.P., pelo que nos termos supra referidos e do art. 189º são nulos, sendo consequentemente as escutas dependentes desses despachos.
2º- O Meritíssimo Juiz deve tomar conhecimento das gravações efectuadas e só depois face à ponderação destas e ordenada a sua junção, deverá prorrogar o prazo de intercepção e fundamentar essa prorrogação, o que não foi o caso, conforme despachos.
3º- Não houve supervisão jurisdicional das escutas realizadas a partir dos postos de escuta, na medida em que se não mostra ter sido ouvida pelo M. Jic qualquer cassete contendo elementos de prova recolhidos a partir da audição das fitas magnéticas com as conversações interceptadas.
4º- Atendendo que o M. Juiz se limitou a ordenar a junção nos termos sugeridos pelos Senhores Inspectores da Polícia Judiciária unicamente obedeceu ao critério
– escolhido pela entidade policial, não tendo sido respeitado o n.º 3 do art.
188º, nem o prazo consignado no n.º 1 daquele artigo.
5º- Não houve supervisão jurisdicional atempada das escutas telefónicas, constatando-se que toda a iniciativa e verificação do interesse de matéria interceptada ficou a cargo dos elementos da Polícia Judiciária, o que não se coaduna com o vertido no art. 188º n.ºs 1-3 do C.P.P.
6º- Não resultaram pois as transcrições da selecção feita pelo M. Jic, mas sim pela Polícia Judiciária, pelo que se está perante acto jurisdicional levado a cabo por quem não está investido desse poder, pelo que tal acto terá de ser considerado inexistente.
7º- Consequentemente não deverão as gravações dessas cassetes referentes aos registos magnéticos ser valoradas pelo Tribunal.
8º- Assim sendo, considerando que toda a iniciativa e verificação do interesse da matéria interceptada ficou a cargo exclusivo dos elementos da Polícia Judiciária, até fls. as quais não foram de imediato apresentadas ao M. Juiz, entende-se que as escutas realizadas aos postos telefónicos são nulas e consequentemente nulo o valor das provas obtidas mediante o recurso às mesmas, nos termos dos artigos 34º, 32º,18º da C.R.P e 189º e 126º do C.P.P.
9º- A se não entender desta forma, deve considerar-se inconstitucional por violação das disposições conjugadas dos arts. 32º-8, 34º-1-4 e 18º da C.R.P., a norma constante do art. 188º n.º 1 do C.P.P., quando interpretada no sentido de não impor que o auto de intercepção e gravação de conversações telefónicas seja de imediato lavrado e levado ao conhecimento do Juiz e que, autorizada a intercepção e gravação por certo período, seja concedida a autorização para a sua continuação, sem que o Juiz tome conhecimento do resultado anterior. Neste sentido Ac. do Trib. Const. [10/07/01], 1ª Secção, Proc. 299/01. Deve pois, ser dado provimento ao recurso nos termos expostos.
[...].”
Na resposta ao recurso interposto pelos arguidos B. e A., o Ministério Público pronunciou-se no sentido do não provimento do recurso (fls.
22 e seguintes do Apenso H), tendo concluído assim, para o que agora interessa considerar:
“[...]
1) Os despachos referidos pelos recorrentes, que ordenaram a intercepção de determinados telefones, encontram-se fundamentados, nos planos factual e jurídico, não enfermando da nulidade que pelos recorrentes lhes é assacada;
2) As escutas telefónicas efectuadas no decurso do inquérito, e designadamente aquelas cuja nulidade os recorrentes invocam, foram judicialmente autorizadas, tendo sido objecto de controlo judicial prévio, de acompanhamento judicial no seu decurso e de controlo judicial subsequente, restringindo, dessa forma, ao mínimo estritamente indispensável a intromissão na vida privada das pessoas visadas pelas mesmas;
3) Tais escutas (englobando as operações de intercepção, gravação e transcrição), tendo em consideração as características específicas deste processo e a sua grande complexidade, decorreram dentro de parâmetros perfeitamente enquadráveis na previsão dos arts. 187º e 188º do CPP, bem como dos arts. 18º n.º 2, 32º n.º 8 e 34º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa;
4) Não se verificou, pois, a nulidade invocada pelos recorrentes;
5) Todavia, e se, por mera hipótese, se viesse a julgar procedente a alegada nulidade do acto jurídico-processual da apresentação, pelo OPC ao juiz de instrução, dos suportes sonoros, com os autos de intercepção e gravação, pelo facto de tal apresentação não ter sido imediata (no sentido temporal), tal apenas determinaria a invalidade desse acto e dos que dele directamente dependessem para o futuro, não afectando toda a prova anteriormente adquirida para o processo com base em audição prévia, por parte do OPC, para efeitos cautelares, de conversas gravadas, ou de conversas em tempo real;
6) Deve, pois, o recurso ser julgado improcedente, na totalidade.
[...].”
3. Por acórdão de 10 de Dezembro de 2003 (fls. 12963 a 13024), o Tribunal da Relação de Lisboa declarou a nulidade de algumas das escutas realizadas, declarou nulo o despacho de pronúncia proferido nos autos e os demais actos que se fundamentaram na prova cuja valoração foi considerada proibida, entre os quais se inclui o acórdão proferido em 26 de Junho de 2003
(supra, 1.), não conheceu dos restantes recursos interpostos e ordenou a imediata libertação, entre outros, dos arguidos A. e B..
A propósito do “regime constitucional e legal das escutas telefónicas”, o Tribunal da Relação de Lisboa começou por tecer as seguintes considerações gerais (fls. 13003-13006):
“[...] O n° 1 do artigo 34° da Constituição da República Portuguesa garante a inviolabilidade dos meios de comunicação privada, entre os quais se incluem as telecomunicações. Ressalva, no entanto, o n° 4 desse mesmo preceito constitucional a possibilidade de haver ingerência das autoridades públicas nesses meios de comunicação nos casos previstos na lei em matéria de processo criminal. Para dar eficácia às garantias que consagra neste campo, a Constituição estabelece, no n.° 8 do seu artigo 32°, a nulidade das provas obtidas mediante abusiva intromissão nas telecomunicações. Para além disso, uma vez que a ingerência nas telecomunicações se traduz numa limitação de um direito fundamental, a actuação das autoridades públicas neste domínio está ainda limitada dado que se estabelece, no n.° 4 do artigo 32° da Constituição, quanto a essa matéria, uma reserva de jurisdição [...]. Essa reserva de jurisdição, não abrangendo a execução dos actos materiais, implica, no entanto, que o juiz controle efectivamente [...] os concretos termos da intrusão do Estado no domínio da privacidade, ponderando, caso a caso, os interesses conflituantes e assegurando que toda a limitação que ocorra se cinja ao mínimo indispensável à realização da justiça. Tendo em atenção o regime constitucional acabado de traçar, o legislador ordinário procurou, logo na versão originária dos artigos 187° a 190° do Código de Processo Penal, definir um regime rigoroso que assegurasse aquele efectivo controlo jurisdicional.
À reserva de juiz fez acrescer duas outras importantes garantias. Apenas autorizou a intercepção e gravação das comunicações quanto a determinadas infracções (sistema de crimes de catálogo) e impôs a utilização de critérios de subsidiariedade e idoneidade, só autorizando o recurso a este meio de obtenção de prova no caso de existirem razões para crer que a diligência viesse a assumir grande interesse para a descoberta da verdade ou para a prova (artigo 187°)
[...]. Para além de estabelecer estas regras de admissibilidade das escutas telefónicas, o legislador preocupou-se em definir as formalidades das operações
(artigo 188°), cominando com nulidade a violação de qualquer dos requisitos e condições estabelecidos nos artigos 187° e 188° (artigo 189°). A emanação destas normas não impediu, contudo, que logo tenham surgido divergências quanto aos termos dos formalismos estabelecidos pelo artigo 188° do Código de Processo Penal. Para uns esta disposição legal impunha a elaboração de dois autos, um que certificava o desenrolar das operações de intercepção e gravação e outro que continha as transcrições dos extractos das conversas que o juiz, depois de ouvir a totalidade das gravações efectuadas, viesse a considerar relevantes para a prova [...]. Daí que impusesse que o primeiro desses autos, juntamente com as fitas gravadas ou elementos análogos, fosse imediatamente levado ao conhecimento do juiz. Outros entendiam que apenas havia que elaborar um auto que, para além de mencionar os termos das operações realizadas, conteria a integralidade, ou parte
[...], das conversas interceptadas e gravadas. Tal disputa veio a ser, em nosso entender, resolvida pelo legislador de 1998 que, através da nova redacção dada ao artigo 188°, consagrou claramente a primeira daquelas teses. Ao auto que comprova a realização das operações materiais, a que se reporta o n.° 1 do artigo 188°, acresce um outro, o mencionado no n.° 3, que deve conter apenas os extractos seleccionados pelo juiz
(n.ºs 3 e 4 da nova redacção do preceito). Todo este regime propicia um efectivo controlo por parte do juiz da execução deste meio de obtenção da prova, controlo este que não pode deixar de passar:
– pela verificação pelo juiz, em concreto, das condições de admissibilidade deste meio de obtenção da prova, o que implica que ele se certifique da natureza do crime investigado e da relevância que a utilização da escuta pode ter para a descoberta da verdade ou para a prova;
– pelo estabelecimento de um prazo relativamente apertado para a realização das intercepções e gravações ou, caso isso não aconteça, pelo acompanhamento das operações com uma proximidade que permita o tempestivo conhecimento dos seus resultados, para as fazer cessar logo que deixem de ser imprescindíveis;
– em caso de prorrogação do prazo inicialmente estabelecido, pela análise prévia dos resultados obtidos através das diligências anteriormente realizadas para assim poder decidir se elas devem prosseguir e, sendo caso disso, qual o horizonte temporal das novas operações;
– pelo acompanhamento próximo das diligências autorizadas, que, no mínimo, se deve traduzir no imediato conhecimento, no fim do prazo estabelecido, do resultado das gravações efectuadas [...];
– pela selecção feita pessoalmente pelo juiz das sessões a transcrever uma vez que, dado o sistema por que o nosso Código optou [...], só o juiz pode aqui garantir a imparcialidade da selecção dos elementos de prova, à charge et à décharge, e que ela não reflicta apenas a perspectiva da acusação [...]. Assegurado este controlo efectivo, que passa, como se disse, por garantir que o juiz tome conhecimento das gravações efectuadas através da audição directamente feita através da utilização dos suportes em que ela se contém, perde grande parte da relevância a questão, muitas vezes suscitada, do prazo de elaboração do
2° auto, que contém as transcrições [...]. Para ele a lei não estabelece qualquer prazo. Deve, portanto, ser elaborado o mais depressa possível, sempre antes do termo do inquérito, mas sem que exista um limite temporal peremptório. Partindo desta visão das coisas, analisemos então cada um dos recursos interpostos pelos arguidos em matéria de escutas telefónicas.
[...].”
Relativamente ao recurso interposto pelos arguidos B. e A., a propósito das escutas telefónicas de que foram alvo, lê-se no texto do acórdão, para o que aqui releva (fls. 13009):
“[...] No que respeita à escuta efectuada ao cartão com o n° 9xxxxxxxx, identificado como alvo 8112-E, cujas transcrições constam do apenso n° 29, verifica-se que a mesma foi efectuada na sequência do despacho de fls. 1033, datado de 19 de Dezembro de 2000, que autorizou, pelo período de 60 dias, a intercepção e gravação das conversações efectuadas, entre outros, através do cartão n.º
9yyyyyyyy e de todos os cartões que viessem a ser utilizados no mesmo aparelho, um dos quais foi o aqui em causa. Decorreu de 7/2/2001 (fls. 1584) a 3/3/2001 (fls. 1729). O material gravado foi apresentado em 27/3/2001 a uma das senhoras juízas de instrução criminal de Leiria que tiveram intervenção nestes autos, a qual procedeu, em 30/3/2001, à audição das gravações e determinou a sua transcrição
(ver fls. 2033). Embora fosse desejável que o acompanhamento das diligências efectuadas tivesse sido mais pleno e próximo, não se pode considerar que tenham, no essencial, sido desrespeitados os preceitos constitucionais e legais atrás mencionados, razão pela qual se nos afigura que, quanto a esta intercepção, nenhuma nulidade foi cometida, nada obstando à valoração da prova através desse meio obtida.
[...].”
E, mais adiante (fls. 13010):
“[...] Passemos agora a analisar a escuta realizada ao cartão com o n.º 9zzzzzzzz, identificado como alvo n.º 9238-A, cujas transcrições constam do apenso n° 27. Verifica-se que a mesma foi efectuada ao abrigo do despacho de fls. 1335, datado de 16 de Janeiro de 2001, que autorizou, pelo período de 60 dias, a intercepção e gravação das conversações efectuadas, entre outros, através do cartão n.º
9wwwwwwww e de todos os cartões que viessem a ser utilizados no mesmo aparelho, um dos quais foi o aqui em causa. A intercepção foi iniciada em 5/2/2001 (fls. 1573) e terminou em 19/3/2001 (fls.
2008). O material gravado foi apresentado em 27/3/2001 a uma das senhoras juízas de instrução criminal de Leiria que tiveram intervenção nestes autos, a qual procedeu, em 30/3/2001, à audição das gravações e determinou a sua transcrição
(ver fls. 2033). Também neste caso embora fosse desejável que o acompanhamento das diligências efectuadas tivesse sido mais próximo e pleno, não se pode dizer que não foram, no essencial, respeitados os preceitos constitucionais e legais atrás mencionados, razão pela qual se nos afigura que, também quanto a esta intercepção, nenhuma nulidade foi cometida, nada obstando à valoração da prova através desse meio obtida.
[...].”
4. Deste acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa vieram A. e B. interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no artigo
70º, n.º 1, alíneas b) e g), da Lei do Tribunal Constitucional, para apreciação da inconstitucionalidade da “norma constante do art. 188°-1 do CPP, quando interpretada no sentido de não impor que o auto de intercepção e gravação das escutas seja de imediato lavrado e levado ao conhecimento do Juiz, e que autorizada a intercepção e gravação por certo período, seja concedido autorização para continuar sem que o Juiz tome conhecimento das anteriores. Foi já alvo de várias decisões do T.C., designadamente por Ac. de [10/07/01] – 1ª Secção, Processo 299/01. Pretende ver apreciada a inconstitucionalidade da norma do art. 188º, n.ºs 1 e 3 do C.P.P., com a interpretação com que foi aplicada na Decisão recorrida” (fls. 13125/13127).
5. Ainda no Tribunal da Relação de Lisboa foi determinada a notificação dos recorrentes para darem integral cumprimento ao disposto no artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional (despacho de fls. 13135).
Os recorrentes responderam através do requerimento de fls. 13153, nos seguintes termos:
“A. e B., recorrentes nos autos [...], notificados nos termos do artigo 75°-A n.º 5 da Lei do Tribunal Constitucional esclarecem que: Vêm interpor recurso da decisão que foi notificada quanto aos apensos 27 e 29, para o Tribunal Constitucional, o que fazem nos seguintes termos: O recurso é interposto ao abrigo da al. b) e g) do art° 70 da Lei do Tribunal Constitucional, com a sua nova redacção Lei 13-A/98. Pretendem ver apreciada a inconstitucionalidade do segmento da norma do n.º 1 do art° 188° do CPP, com a interpretação com que foi aplicada na decisão recorrida, isto é, quando interpretada no sentido de não impor que o auto de intercepção e gravação da escuta seja levado de imediato ao conhecimento do juiz. Tal interpretação da norma viola os princípios consagrados no art.º 32º n.º 1 da CRP. Também se interpõe recurso ao abrigo da al. g), invocando para tal o Acórdão
347/2001 e 597/2003 da 1ª secção do Tribunal Constitucional. A questão da inconstitucionalidade foi suscitada nos autos na motivação do recurso interposto e sobre o qual recaiu a decisão de que se recorre. Nestes termos deve o presente recurso ser admitido e feito subir com o efeito próprio, seguindo os demais termos até final.”
O recurso foi admitido por despacho de fls. 13154.
6. No Tribunal Constitucional, os recorrentes apresentaram alegações
(fls. 13197 a 13202), tendo formulado as seguintes conclusões:
“1. O critério da interpretação do n.º 1 do art.º 188 do CPP terá e deverá ser muito restrito de modo a não violar os direitos fundamentais expressamente consagrados, e afectados pelas escutas telefónicas.
2. Foram interceptados diversos postos telefónicos, sem que em nenhum se mostre ter havido qualquer controlo jurisdicional, por parte de quem tinha poderes para o fazer, a titulo exemplificativo: Quanto ao alvo 9238 A, referente ao número de telefone 9zzzzzzzz, Apenso 27, as gravações das escutas somente foram ouvidas e ordenada a sua transcrição pelo M.JIC em 30.03.2001, porém a sua transcrição só foi levada a cabo a 20.06.2001. Alvo 8112 E, Apenso 29, relativo ao número de telefone 9xxxxxxxx, o início da sessão dá-se a 8 de Fevereiro de 2001, mas o auto de transcrição só ocorre a 20 de Junho do mesmo ano, conforme despacho de fls. 2033.
3. Nestes casos é patente a total ausência do já evidenciado controlo jurisdicional imediato.
4. Na verdade, para haver um efectivo acompanhamento da intercepção e gravação, essa intercepção e gravação têm de ser levadas de imediato ao conhecimento do Juiz, que decidirá se devem ser ou não transcritas ou se devem ou não ser mandadas destruir, por se revelarem desnecessárias para a lide.
5. E tal não se vislumbra, ao analisarmos todos os despachos que determinaram e ordenaram as respectivas escutas telefónicas, prorrogações e consequentes transcrições.
6. Assim sendo, a interpretação a dar à expressão «imediatamente» no contexto das finalidades telefónicas, terá que ser outra, que não aquela que foi dada pelo Tribunal da Relação.
7. Deverá ser aquela que foi perfilhada no Acórdão do Tribunal Constitucional de
21 de Maio de 1997 (in BMJ 467/199 e ss.), que julgou inconstitucional, por violação do disposto do n.º 6 do art.º 32 da CRP, a norma do 188º n.º 1 do CPP, quando interpretada em termos de não impor que o auto de intercepção e gravação de conversações ou comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz, de modo a este poder decidir atempadamente sobre a junção ao processo ou à destruição dos elementos recolhidos, ou de alguns deles, e, bem assim, também atempadamente, decidir, antes da junção ao processo de novo auto da mesma espécie, sobre a manutenção ou alteração da decisão que ordenou as escutas.
8. Assim sendo, a interpretação dada pelo Tribunal «a quo» à norma constante do art.º 188 n.º 1 do CPP, entendimento esse que apenas impõe que os autos de intercepção e as próprias gravações devem ser apresentadas ao Juiz no mais breve espaço de tempo, é inconstitucional por violação dos princípios consagrados nos artigos 32º n.º 1 e n.º 6 e 34º n.º 1 e n.º 4 da CRP. Consequentemente, deverá a referida norma segundo aquela interpretação ser declarada inconstitucional, declarando-se inválidos todos os actos que dependeram das intercepções realizadas conforme art.º 122º e 189º do CPP.”
Por sua vez, o Ministério Público concluiu as suas contra-alegações
(fls. 13220 a 13226) do seguinte modo:
“1 – O Tribunal Constitucional, através dos seus acórdãos n.ºs 407/91, 347/01 e
528/03, julgou inconstitucional a norma do n.º 1 do artigo 18[8]º do Código de Processo Penal, quando interpretada no sentido de não impor que o auto de intercepção e gravação de conversações e comunicações telefónicas seja, de imediato, lavrado e levado ao conhecimento do juiz, tendo os dois primeiros acórdãos estendido ainda o juízo de inconstitucionalidade, às situações em que não é atempadamente levado ao conhecimento e controlo do juiz o conteúdo das comunicações, em ordem a habilitá-lo a manter, alterar ou revogar a autorização judicial concedida para a intercepção.
2 – O objecto do recurso delimita uma questão diferente quanto ao segmento da norma do n.º 1 do artigo 188º do Código de Processo Penal já que é suscitada a questão da não apresentação imediata ao juiz do auto de intercepção e gravação junto com a gravação das comunicações, resultando porém dos autos e da decisão recorrida que houve prévio conhecimento e controlo judicial, o que configura situação diversa da tratada nos aludidos acórdãos.
3 – Deverá, assim, improceder o recurso, interposto nos termos da alínea g) do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional.
4 – Tendo o material gravado sido apresentado ao juiz de instrução, que procedeu
à sua audição e ordenou as respectivas transcrições, o facto de os correspondentes autos terem sido juntos ao processo para lá de um período temporal, susceptível de não se integrar no conceito de «imediatamente» utilizado pelo legislador ordinário no n.º 1 do artigo 188º do Código de Processo Penal, não há violação de qualquer norma constitucional, designadamente, a do n.º 4 do artigo 34º da Lei Fundamental, assegurado que foi o devido controlo judicial em matéria de comunicações privadas.
5 – Pelo que deverá igualmente não proceder o recurso interposto nos termos da alínea b) do artigo 70º da Lei Tribunal Constitucional.”
7. Perante o teor das contra-alegações do Ministério Público, foi proferido pela relatora o seguinte despacho (fls. 13228):
“Atendendo a que, nas contra-alegações de fls. 13220 e seguintes, o Ministério Público sustenta que a interpretação perfilhada pelo tribunal recorrido quanto à norma impugnada no presente recurso não corresponde àquela que foi anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional e bem assim que tal interpretação não coincide com aquela que foi identificada pelo recorrente e por ele considerada incompatível com a Constituição, notifique o recorrente para, no prazo de 10 dias, se pronunciar, querendo, sobre tal questão prévia susceptível de obstar ao conhecimento do objecto do recurso.”.
A resposta dos recorrentes consta do requerimento de fls. 13243 a
13244:
“Os recorrentes suscitaram a falta do acompanhamento judicial das escutas, enquanto as intercepções decorreram, pois note-se que em todas elas, nomeadamente apensos 27 e 29, os autos de intercepção e gravação das conversas telefónicas entretanto autorizadas só foram levadas ao conhecimento do Juiz que as ordenou 52 e 50 dias após terem tido início, o que colide frontalmente com os interesses que se pretendem acautelar, com a exigência do imediato, na medida em que impede o acompanhamento próximo pelo Juiz. Também estarem longo tempo guardados os CD, não se sabe onde, e por quem, sem a supervisão e controlo do Juiz, podendo ser vistas e utilizadas por terceiros, este decurso de tempo impede o acompanhamento constante e contínuo por parte do Tribunal de material em relação ao qual não foi ordenada a destruição, mas sim a transcrição. Neste sentido os acórdãos já citados, assim como o n° 528/03 da 3ª Secção desse Tribunal. O recorrente não só foca nas suas alegações o acompanhamento durante as escutas
(gravações), mas também porque continua a ser importante após a audição pelo Juiz e ordenamento da transcrição, situação essa também, que deveria estar prevista nas normas contidas no n° 1 do art. 188° do C.P.P.. Assim, a interpretação dada pelo Tribunal da Relação, quanto às transcrições não serem feitas no mais curto prazo possível, referente às normas contidas no n° 4 do art.º 188°, conjugado com o n° 2 do art.º 101° do C.P.P., está ferida de inconstitucionalidade material por violação dos princípios consagrados nos arts.
32° n.° 1, n° 6 e 34° n.º 1, n.º 4 do C.P.P. [assim, no original].
Cumpre apreciar e decidir.
II
8. O presente recurso vem interposto ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (cfr. supra, 4. e 5.) e tem como objecto a apreciação da inconstitucionalidade da norma constante do artigo 188°, n.º 1, do Código de Processo Penal, que dispõe como segue (na versão aplicada no caso dos autos, emergente da Lei n.º 59/98, de 25 de Agosto):
“Artigo 188º
(Formalidades das operações)
1. Da intercepção e gravação a que se refere o artigo anterior é lavrado auto, o qual, junto com as fitas gravadas ou elementos análogos, é imediatamente levado ao conhecimento do juiz que tiver ordenado ou autorizado as operações.
[...].”
Sublinhe-se desde já que, apesar de em algumas peças processuais os recorrentes reportarem a inconstitucionalidade a normas contidas em outros números do artigo 188º do Código de Processo Penal (cfr. requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional e resposta à questão prévia suscitada pelo Ministério Público junto deste Tribunal), apenas pode estar em causa no âmbito do presente recurso a apreciação da conformidade constitucional da norma constante do n.º 1 do citado artigo 188°, pois só essa norma foi questionada nas alegações produzidas perante o Tribunal Constitucional
(cfr. supra, 6.).
9. Sendo impugnada pelos recorrentes uma determinada interpretação da norma transcrita, o Ministério Público sustentou nas suas contra-alegações que a interpretação perfilhada pelo tribunal recorrido quanto a tal norma não corresponde àquela que foi anteriormente julgada inconstitucional pelo Tribunal Constitucional e ainda que tal interpretação não coincide com aquela que foi identificada pelos recorrentes e por eles considerada incompatível com a Constituição.
Em primeiro lugar, na opinião do Senhor Procurador-Geral Adjunto, “o objecto do recurso delimita uma questão diferente [das que foram tratadas em anteriores acórdãos do Tribunal Constitucional] quanto ao segmento da norma do n.º 1 do artigo 188º do Código de Processo Penal já que é suscitada a questão da não apresentação imediata ao juiz do auto de intercepção e gravação junto com a gravação das comunicações, resultando porém dos autos e da decisão recorrida que houve prévio conhecimento e controlo judicial”, pelo que deveria “improceder o recurso interposto nos termos da alínea g) do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional”.
Por outro lado, entende o representante do Ministério Público que,
“tendo o material gravado sido apresentado ao juiz de instrução, que procedeu à sua audição e ordenou as respectivas transcrições”, teria sido “assegurado o devido controlo judicial em matéria de comunicações privadas”, não obstante “os correspondentes autos terem sido juntos ao processo para lá de um período temporal, susceptível de não se integrar no conceito de «imediatamente» utilizado pelo legislador ordinário no n.º 1 do artigo 188º do Código de Processo Penal”, pelo que deveria igualmente “não proceder o recurso interposto nos termos da alínea b) do artigo 70º da Lei Tribunal Constitucional”.
Tais considerações configuram questões prévias, susceptíveis de obstar ao conhecimento do objecto do recurso, que, por isso, cumpre apreciar em primeiro lugar.
10. No requerimento de interposição do presente recurso, os recorrentes pedem ao Tribunal Constitucional a apreciação da inconstitucionalidade da “norma constante do art. 188°-1 do CPP, quando interpretada no sentido de não impor que o auto de intercepção e gravação das escutas seja de imediato lavrado e levado ao conhecimento do Juiz, e que autorizada a intercepção e gravação por certo período, seja concedido autorização para continuar sem que o Juiz tome conhecimento das anteriores”, por violação do artigo 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa (cfr. requerimento de fls. 13125/13127, supra, 4.).
Em cumprimento do disposto no artigo 75º-A, n.º 5, da Lei do Tribunal Constitucional, os recorrentes indicaram (cfr. requerimento de fls.
13153, supra, 5.) que pretendem ver apreciada a norma do n.º 1 do artigo 188° do Código de Processo Penal, “quando interpretada no sentido de não impor que o auto de intercepção e gravação da escuta seja levado de imediato ao conhecimento do juiz”, e que a norma identificada foi anteriormente julgada inconstitucional nos Acórdãos n.ºs 347/2001 e 597/2003 da 1ª secção do Tribunal Constitucional
[pretende-se certamente, neste último caso, mencionar o Acórdão n.º 528/2003, proferido no processo n.º 597/2003, em que era recorrente um dos ora recorrentes, A.]. Nesse requerimento, os recorrentes acrescentaram que “a questão da inconstitucionalidade foi suscitada nos autos na motivação do recurso interposto e sobre a qual recaiu a decisão de que se recorre”.
Nas alegações que apresentaram neste Tribunal (cfr. supra, 6.), os recorrentes referem-se à inconstitucionalidade “por violação dos princípios consagrados nos artigos 32º n.º 1 e n.º 6 e 34º n.º 1 e n.º 4 da CRP”, da
“interpretação dada pelo Tribunal «a quo» à norma constante do art.º 188 n.º 1 do CPP, entendimento esse que apenas impõe que os autos de intercepção e as próprias gravações devem ser apresentadas ao Juiz no mais breve espaço de tempo”
(conclusão n.º 8), questionando o modo e o momento da transcrição das escutas telefónicas efectuadas no caso dos autos – “as gravações das escutas somente foram ouvidas e ordenada a sua transcrição pelo M.JIC em 30.03.2001, porém a sua transcrição só foi levada a cabo a 20.06.2001” (conclusão n.º 2).
Por sua vez, no requerimento em que responderam às questões prévias de não conhecimento do recurso, suscitadas pelo Senhor Procurador-Geral Adjunto, os recorrentes concluíram que “a interpretação dada pelo Tribunal da Relação, quanto às transcrições não serem feitas no mais curto prazo possível [...] está ferida de inconstitucionalidade material”, por violação dos artigos 32°, n.° 1 e n° 6, e 34°, n.ºs 1 e 4 da Constituição (cfr. supra, 7.).
O que os recorrentes verdadeiramente questionam é, como se vê, uma interpretação da norma contida no artigo 188º, n.º 1, do Código de Processo Penal que não imponha que a transcrição das intercepções e gravações de escutas seja imediatamente junta aos autos.
Assim, tendo em conta o requerimento de interposição do recurso, a explicitação constante da resposta ao despacho de aperfeiçoamento e o teor das alegações, conclui-se que a questão de inconstitucionalidade colocada no presente recurso diz respeito à norma do n.º 1 do artigo 188° do Código de Processo Penal, “quando interpretada no sentido de não impor que o auto de transcrição de intercepções e gravações de escutas telefónicas seja levado de imediato ao conhecimento do juiz”.
Importa agora verificar se a norma foi aplicada com este sentido na decisão recorrida. Na verdade, tendo o recurso sido interposto ao abrigo das alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, só pode dele conhecer-se se a norma questionada tiver sido aplicada no processo com a interpretação identificada pelos recorrentes.
11. Resulta dos autos, e foi dado como provado no acórdão recorrido, que:
– Por despachos de 19 de Dezembro de 2000 (fls. 1033) e de 16 de Janeiro de 2001 (fls. 1335), foi autorizada, no Tribunal da Comarca de Loures, por um período de 60 dias, a intercepção de chamadas telefónicas efectuadas, entre outros, através de cartões relacionados com os aqui recorrentes, por se considerar que “tais procedimentos se revelam essenciais ao desenvolvimento das investigações em curso no âmbito dos presentes autos”.
– As intercepções decorreram, respectivamente, entre 7 de Fevereiro de 2001 e 3 de Março de 2001 (fls. 1584 e 1729 – apenso n.º 29) e entre 5 de Fevereiro de 2001 e 19 de Março de 2001 (fls. 1573 e 2008 – apenso n.º 27).
– O material gravado foi apresentado a uma das Juízas de Instrução Criminal de Leiria, que, em 30 de Março de 2001, procedeu à sua audição, determinou a transcrição da parte relevante e ordenou a destruição daquilo que considerou irrelevante (despacho de fls. 2033).
Perante as circunstâncias apontadas, o Tribunal da Relação de Lisboa entendeu, quanto às intercepções que estão na origem do presente recurso, que,
“embora fosse desejável que o acompanhamento das diligências efectuadas tivesse sido mais pleno e próximo, não se pode considerar que tenham, no essencial, sido desrespeitados os preceitos constitucionais e legais atrás mencionados, razão pela qual se nos afigura que, quanto a esta intercepção, nenhuma nulidade foi cometida, nada obstando à valoração da prova através desse meio obtida” (cfr. fls. 13009 e 13010, supra, 3.).
Esta decisão do tribunal a quo assentou nas considerações gerais expressas no acórdão recorrido relativamente ao “regime constitucional e legal das escutas telefónicas”, designadamente nos pressupostos legais de “efectivo controlo por parte do juiz da execução deste meio de obtenção da prova”, que se encontram enunciados no próprio acórdão (cfr. fls. 13003-13006, supra, 3.).
Relativamente às intercepções que estão na origem do presente recurso, o Tribunal da Relação teve em conta o tempo que decorreu entre a data da autorização das escutas e a data do início das intercepções e gravações, atendeu ao período de duração das intercepções e, verificando o momento em que a Juíza procedeu à audição das gravações, pronunciou-se sobre o acompanhamento das diligências autorizadas, tendo concluído no sentido de que, no essencial, não foram desrespeitados os preceitos constitucionais e legais aplicáveis.
Nada disse a Relação, quanto às intercepções e gravações que estão na origem do presente recurso, sobre o momento da apresentação ao juiz do auto de transcrição das intercepções e gravações das escutas telefónicas efectuadas. Embora o acórdão recorrido inclua igualmente certas considerações gerais quanto ao regime a que se encontra sujeita a transcrição das intercepções e gravações de escutas telefónicas (cfr. fls. 13006, supra, 3.) – certamente porque no acórdão se apreciava um grande número de recursos interpostos por diversos arguidos, alguns dos quais diziam respeito a essa questão –, a verdade é que, em relação ao recurso interposto pelos ora recorrentes, nada se decidiu sobre o modo e o momento das transcrições efectuadas.
Conclui-se assim que o Tribunal da Relação de Lisboa não interpretou a norma do n.º 1 do artigo 188° do Código de Processo Penal, “no sentido de não impor que o auto de transcrição de intercepções e gravações de escutas telefónicas seja levado de imediato ao conhecimento do juiz”.
12. Procede, deste modo, a questão prévia suscitada pelo Ministério Público na parte em que considerou que a interpretação perfilhada pelo tribunal recorrido quanto à norma impugnada não coincide com aquela que foi identificada pelos recorrentes e por eles considerada incompatível com a Constituição.
Não pode portanto o Tribunal Constitucional conhecer do objecto do recurso interposto com fundamento nas alíneas b) e g) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, por falta de um pressuposto processual típico do recurso previsto nessas disposições: a aplicação na decisão recorrida, como ratio decidendi, da norma impugnada, com a interpretação identificada pelos recorrentes e por eles reputada contrária à Constituição.
Atingida esta conclusão, desnecessário se torna verificar o preenchimento dos restantes pressupostos processuais dos recursos interpostos e apreciar a outra questão prévia de não conhecimento do recurso suscitada pelo Ministério Público.
III
13. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide não tomar conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelos recorrentes, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta, por cada um, sem prejuízo do apoio judiciário concedido.
Lisboa, 29 de Setembro de 2004
Maria Helena Brito Artur Maurício Carlos Pamplona de Oliveira Rui Manuel Moura Ramos