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Processo n.º 763/04
1ª Secção Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. Foi, a fls. 2049 e seguintes, proferida decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso interposto para este Tribunal por A., pelos seguintes fundamentos:
“[...]
2. Observe-se, em primeiro lugar, que o pedido apresentado pelo recorrente ao Tribunal Constitucional se dirige fundamentalmente à apreciação da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça e não a uma ou mais normas aplicadas nessa decisão. No requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional (cfr. supra, 1.), o recorrente afirma que:
– «a não apreciação da matéria objecto das primeiras 52 conclusões do recurso violou a alínea c) do n.º 1 do artigo 379° do CPP» (n.º 2º);
– «e viola, a nosso ver, já que a omissão de pronúncia viola um direito fundamental consagrado na Constituição da República» (n.º 3°);
– «acabando o douto Acórdão por violar o seu direito à justiça e à apreciação de toda a matéria jurídica pondo mesmo em risco a sua liberdade já que está condenado a uma pena privativa da liberdade, bem pesada» (n.º 7º);
– «a não apreciação pelo Tribunal das primeiras 52 conclusões do recurso interposto baseada na interpretação que fez das normas do CPP referidas é inconstitucional por violação do disposto nos artigos 32° n.º 1 e 24º a 26º todos da Constituição e dos princípios da aplicação da Justiça» (n.º 10º). Ora, o Tribunal Constitucional não tem competência para sindicar a boa ou má aplicação do direito ao caso concreto, nem para aferir se essa aplicação do direito consubstancia uma decisão judicial desconforme com a Constituição, que
é, afinal, a questão colocada pelo recorrente. Com efeito, o recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional – a alínea invocada pelo recorrente – não visa sindicar os pressupostos em que assentou a aplicação do direito pelo tribunal recorrido nem a conformidade constitucional da decisão recorrida em si mesma considerada, tendo diversamente em vista o controlo da conformidade constitucional de normas, ou de normas, numa certa dimensão interpretativa. Em suma, o recurso interposto pelo recorrente configura-se como um recurso de amparo, desconhecido na nossa ordem jurídica.
3. Acresce que, mesmo que pudesse ver-se no recurso um pedido de apreciação de uma questão de inconstitucionalidade normativa, certo é que tal questão não foi suscitada pelo recorrente em termos processualmente adequados. O próprio recorrente afirma que só «no pedido de declaração de nulidade do douto acórdão» proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça referiu que «a não apreciação da matéria objecto das primeiras 52 conclusões do recurso violou a alínea c) do n.º 1 do artigo 379° do CPP» (cfr. supra, 1., n.º 2). Foi, com efeito, no requerimento através do qual arguiu a nulidade do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça que o recorrente disse que «ao não apreciarem a matéria objecto das 52 primeiras conclusões violaram a alínea c) do n.º 1 do artigo 379° do CPP», que «não pretendeu que este alto Tribunal alterasse a matéria de facto mas que a interpretasse do modo que o recorrente entende adequado e fizesse, por isso, nesta perspectiva, a aplicação do Direito» e que
«a interpretar-se o artigo do CPP por forma a excluir o que referimos, então é inconstitucional por violação do disposto no artigo 266 n.º 2 da Constituição»
(requerimento de fls. 2012). Acontece que o recorrente teve oportunidade processual de confrontar o Supremo Tribunal de Justiça, antes de proferido o acórdão recorrido, com a questão que agora enuncia como respeitando à «congruência lógica dos factos apurados e da sua qualificação jurídica» (cfr. requerimento de interposição do recurso, n.º
8º, supra, 1.). Na verdade, na resposta às alegações do recurso interposto pelo ora recorrente, do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação do Porto, disse o representante do Ministério Público junto desse Tribunal da Relação (fls. 1941 e seguintes):
«[...] Nos termos da lei (artigo 412º, CPP), as conclusões da motivação delimitam o objecto do recurso, aquilo que é pretensão do Recorrente e sobre que recairá a pronúncia do tribunal de recurso. No caso presente, se assim se procedesse, entrar-se-ia numa confusão tal que nunca mais se entenderia o que quer o Recorrente, pois em quarenta e tal páginas de alegação, quase metade constituem conclusões, onde, aliás, se mistura o relevante com o que não tem relevância alguma. Desde logo, é absolutamente inútil o percurso que o Arguido faz em tudo quanto respeita a matéria de facto, pois o STJ apenas conhece de direito (artigo 434º, CPP), donde que, aí, teremos de passar à frente, sem embargo do conhecimento oficioso dos vícios do artigo 410º do mesmo Código. Com o que fica prejudicada qualquer observação sobre as conclusões 1ª a 52ª, dado que, nelas, o Arguido discute só matéria de facto e não vejo onde o tribunal decidiu com dúvidas, o que, a conhecer-se, igualmente constituiria matéria de facto, por via do erro notório na apreciação da prova (artigo 410º, n.º 2, al. c), CPP) que é onde nos conduz a violação do princípio do ‘in dubio pro reo’.
[...].». Tendo esta resposta sido notificada ao recorrente (cfr. cota de fls. 1946 v.º), teve o recorrente oportunidade de, em relação a ela, se pronunciar e de, a propósito das considerações aí tecidas, suscitar a questão de inconstitucionalidade que posteriormente veio a reportar a uma alegada omissão de pronúncia. Tal questão – a existir – teria naturalmente de referir-se às normas que, na ordem jurídica portuguesa, definem os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça no âmbito dos recursos em matéria penal e não a normas que disciplinam a nulidade da sentença. Não o tendo feito desse modo e nesse momento, não pode dar-se por cumprido o
ónus a que se referem os artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional. Assim sendo, e ainda que pudesse considerar-se que o recorrente pretende a apreciação, pelo Tribunal Constitucional, de uma autêntica questão de inconstitucionalidade normativa, não poderia este Tribunal conhecer de tal questão, por não estar preenchido um dos pressupostos processuais do presente recurso: a invocação pelo recorrente, em termos processualmente adequados, da questão de inconstitucionalidade que vem submeter ao julgamento deste Tribunal.
4. De todo o modo, importa sublinhar que a decisão recorrida não perfilhou o entendimento identificado pelo recorrente no requerimento de interposição do presente recurso e por ele reputado contrário à Constituição. Se bem se atentar no requerimento de interposição do recurso para este Tribunal, verifica-se que o recorrente questiona «a não apreciação da matéria objecto das primeiras 52 conclusões do recurso». Não foi esse o entendimento do Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido, como claramente decorre da passagem que a seguir se transcreve (cfr. fls. 1998 e seguinte):
«[...]
2.2. Como muito bem disse o Senhor Procurador-Geral Adjunto do Tribunal a quo, as primeiras 52 conclusões versam pura e simples matéria de facto, estranha aos poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça fixados nos arts. 26° da LOFTJ (Lei 3/99 de 13 de Janeiro) e 434° do CPP. Com efeito, ao longo dessas longas páginas, o Recorrente não faz mais do que afirmar a sua discordância sobre o modo como a matéria de facto que levou à sua condenação foi julgada, por se lhe afigurarem erradas as ilações que dos factos materiais foram retiradas, partindo, para o efeito, de uma versão que, como ele afirma, o Tribunal considerou inverosímil, cuja fragilidade, de resto, ele próprio reconhece por «não [ser] tão inocente para acreditar que uma tal
‘história’ é vulgar de acontecer». Certo que, em última instância, ciente naturalmente de que esta alegação só podia ser rejeitada liminarmente, o Recorrente reconduziu aquela sua divergência
à insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e invocou a ocorrência do vício da alínea a) do n.° 2 do art.º 410° do CPP que, relembrou, é de conhecimento oficioso. Mas o expediente também não tem melhor sorte. Por um lado, porque divergir da decisão das instâncias sobre a matéria de facto nada tem a ver com a sua insuficiência para a decisão. E a verdade é que o Recorrente não aponta a falta de um único facto indispensável à qualificação jurídica operada ou, até, à apreciação e julgamento das concretas questões de direito que suscitou: atenuação especial da pena e medida e espécie desta. Por outro porque, como repetidamente tem afirmado o Supremo Tribunal de Justiça, este só conhece de tais vícios, por sua iniciativa e para definir correctamente o direito do caso, para impedir que a solução de direito assente em premissas deficientes ou até erradas, como é próprio de um tribunal de revista (no mesmo sentido, cfr. art.º 729°, n.° 3 do CPC) – cfr. os Acs. de 20.03.03, P.º 397/03 e de 03.04.03, P.º 1108/03, ambos publicados na CJSTJ, Tomo 1/2003, págs. 232 e
236, respectivamente). Não se conhece, pois, desta parte da alegação.
[...].». Ou seja, e em resumo, o acórdão recorrido debruçou-se sobre as referidas 52 conclusões do recurso interposto pelo recorrente, tendo considerado que «o Recorrente não faz mais do que afirmar a sua discordância sobre o modo como a matéria de facto que levou à sua condenação foi julgada, por se lhe afigurarem erradas as ilações que dos factos materiais foram retiradas» e que «o Recorrente não aponta a falta de um único facto indispensável à qualificação jurídica operada ou, até, à apreciação e julgamento das concretas questões de direito que suscitou: atenuação especial da pena e medida e espécie desta». Tais afirmações – e é esse o aspecto que agora releva – demonstram que o entendimento do Supremo não corresponde ao que foi identificado pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso e por ele considerado desconforme com a Constituição. Também por esta razão se conclui que não pode conhecer-se do objecto do presente recurso.”
2. Notificado desta decisão, A. veio reclamar para a conferência, nos termos do artigo 78º-A, n.º 3, da Lei deste Tribunal, através do requerimento de fls. 2293 e seguintes), do seguinte teor:
“[...] Interpretando-se o art. 379/1c) do CPP de forma a impedir a apreciação, por parte do STJ, da congruência lógica e da sua qualificação jurídica, está a violar-se a Constituição da Republica Portuguesa designadamente o seu art. 32. Nas suas primeiras 52 conclusões de recurso, e ao contrário do que foi entendido pelos Ex.mos e Venerandos Conselheiros do Supremo Tribunal de Justiça e mesmo pela Ex.ma Relatora, o recorrente não se limitou a explanar a sua versão sobre a matéria de facto, mas sim a suscitar um diferente entendimento para a mesma, uma diferente qualificação jurídica desses mesmos factos. Tendo aí suscitado questões sobre a insuficiência da matéria de facto dada como provada para a condenação e sobre a aplicação desse mais alto Princípio, o Pr. «In dubio pro reo». Ora, se por um lado a exigência legal da formulação de conclusões na alegação de recurso delimita o conhecimento do Tribunal «ad quem», por outro lado também impõe sobre este um dever de expressamente se pronunciar (apreciando e decidindo) sobre as questões que lhe são colocadas.
É exactamente quando o Tribunal não aprecia ou decide sobre questões a que tenha sido chamado a resolver que se verifica uma omissão de pronúncia (sendo aliás irrelevante o sentido dessa pronúncia). Ressalvado o devido respeito, que é o maior, as duas importantes questões colocadas pelo recorrente nas suas primeiras 52 conclusões de recurso, exige uma apreciação e decisão por parte do Tribunal «ad quem». Para melhor apreciação da situação «sub iudice», o recorrente socorreu-se de vários argumentos e de vários excertos dos autos, é verdade, mas também é verdade que não deixou de suscitar e pedir a pronúncia dos Venerandos Conselheiros sobre a insuficiência da matéria de facto apurada para a aplicação e medida da pena em que o arguido veio efectivamente a ser condenado. Não pretende que o Tribunal «ad quem» se pronuncie sobre a matéria de facto
«strictu senso» mas sobre a sua, por si alegada, insuficiência; Por outro lado suscita e requer a pronúncia sobre a aplicação a seu ver necessária, no caso concreto, do Princípio «In dubio pro reo».
É esse o âmbito do recurso, a delimitação oferecida pelo recorrente na formulação das suas conclusões.
«Quando se limita um Tribunal de recurso ao conhecimento das questões que lhe são postas, o que está verdadeiramente em causa é a questão, o problema, o facto ou a omissão em si e não o[s] efeitos que o recorrente pretende fazer valer...»
[...]. No caso em apreciação o recorrente nem logrou obter um efeito legal e é disso que reclama, é isso que o faz recorrer a este Alto Tribunal, no sentido de lhe ser reconhecido o direito a uma decisão sobre questões que colocou à apreciação do Tribunal «ad quem» [...].
«A insuficiência da matéria de facto provada para a decisão da causa pode constituir fundamento de recurso penal desde que o vício resulte do texto da decisão proferida», o que se demonstrou em sede de alegação de recurso. Posta certa questão pelo recorrente, nas conclusões de alegação, a instância superior terá de pronunciar-se sobre elas. Não o fazendo, incorre na nulidade de omissão de pronúncia». A interpretação do art. 379/1c), quando feita no sentido em que impeça a apreciação e decisão do Tribunal «ad quem», é inconstitucional por violar frontalmente o art. 32° da CRP. A pretensão do recorrente é apenas e só ver as questões que suscitou nas suas primeiras 52 conclusões, apreciadas. Termos em que se requer a V. Ex.ª seja declarada a inconstitucionalidade da interpretação do artigo 379/1c) do CPP quando esta impeça o Tribunal Superior de se pronunciar sobre as duas questões postas à consideração do Tribunal Superior, questões essas que se podem reflectir na decisão.
[...].”
3. Notificado para se pronunciar sobre a reclamação apresentada, o representante do Ministério Público junto do Tribunal Constitucional respondeu
(fls. 2300 e seguinte):
“[...]
1 - A presente reclamação é manifestamente improcedente.
2 - Na verdade – e para além de se não mostrar suscitada, em termos procedimentalmente adequados, uma questão de inconstitucionalidade, referentemente ao critério normativo em que se fundou o não conhecimento pelo Supremo Tribunal de Justiça da matéria de parte das conclusões da alegação do recorrente, tida por reportada à matéria de facto,
3 - Verifica-se que tal questão sempre seria de considerar manifestamente infundada, por obviamente não afrontar qualquer princípio da Lei Fundamental a restrição dos poderes cognitivos do Supremo a «questões de direito».
4 - Não cumprindo obviamente a este Tribunal Constitucional sindicar o entendimento, concretização e densificação, pelo Supremo Tribunal de Justiça, dos conceitos de questão de facto e de direito.
[...].”
Cumpre apreciar e decidir. II
4. A decisão sumária reclamada, que não tomou conhecimento do objecto do recurso, invocou como fundamento o não preenchimento dos pressupostos processuais típicos do recurso interposto.
Em primeiro lugar, entendeu-se nessa decisão sumária que “o pedido apresentado pelo recorrente ao Tribunal Constitucional se dirige fundamentalmente à apreciação da decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça e não a uma ou mais normas aplicadas nessa decisão” e que “o recurso interposto pelo recorrente [se] configura como um recurso de amparo, desconhecido na nossa ordem jurídica”. Não tendo o Tribunal Constitucional competência para sindicar a boa ou má aplicação do direito ao caso concreto, nem para aferir se essa aplicação do direito consubstancia uma decisão judicial desconforme com a Constituição – que é, afinal, a única questão colocada pelo recorrente – não pode apreciar-se o objecto do presente recurso, interposto com fundamento na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, através do qual se visa o controlo da conformidade constitucional de normas, ou de normas, numa certa dimensão interpretativa.
Ponderou-se depois que, mesmo que pudesse ver-se no recurso interposto pelo recorrente “um pedido de apreciação de uma questão de inconstitucionalidade normativa”, tal questão não foi suscitada pelo recorrente em termos processualmente adequados, sendo certo que teve oportunidade processual para o fazer. É que tal questão – a existir – teria naturalmente de referir-se às normas que, na ordem jurídica portuguesa, definem os poderes de cognição do Supremo Tribunal de Justiça no âmbito dos recursos em matéria penal, e não a normas que disciplinam a nulidade da sentença, e deveria ter sido suscitada antes de esgotado o poder jurisdicional do Supremo Tribunal de Justiça. Não o tendo feito desse modo e nesse momento, concluiu-se portanto na decisão sumária reclamada não ser possível dar por cumprido o ónus a que se referem os artigos 70º, n.º 1, alínea b), e 72º, n.º 2, da Lei do Tribunal Constitucional.
Verificou-se, por último, na decisão reclamada, que o acórdão recorrido não perfilhou o entendimento identificado pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso e por ele reputado contrário à Constituição. Tendo o recorrente questionado “a não apreciação da matéria objecto das primeiras 52 conclusões do recurso”, a verdade é que o Supremo Tribunal de Justiça, no acórdão recorrido, se debruçou sobre as referidas 52 conclusões do recurso que lhe havia sido submetido pelo recorrente, embora se tenha pronunciado no sentido de que não assistia razão ao recorrente. Ora, não existindo correspondência entre o entendimento do Supremo e aquele que foi identificado pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso e por ele considerado desconforme com a Constituição, decidiu-se não ser possível também por esse motivo conhecer do objecto do recurso.
5. A reclamação apresentada apenas vem confirmar o bem fundado da decisão sumária proferida nos autos.
Na verdade, e desde logo, não se infirmam nessa reclamação os argumentos utilizados na decisão sumária reclamada, a saber:
– que o pedido apresentado pelo recorrente ao Tribunal Constitucional se dirige fundamentalmente à apreciação da própria decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça e não a uma ou mais normas aplicadas nessa decisão;
– que o recorrente não suscitou a questão de inconstitucionalidade em termos processualmente adequados, sendo certo que teve oportunidade processual para o fazer;
– que o acórdão recorrido não perfilhou o entendimento identificado pelo recorrente no requerimento de interposição do recurso e por ele reputado contrário à Constituição.
Além disso, reitera-se na reclamação que “a pretensão do recorrente
é apenas e só ver as questões que suscitou nas suas primeiras 52 conclusões apreciadas” e que nessas conclusões o recorrente suscitava “uma diferente qualificação jurídica” dos factos dados como provados e ainda questões sobre “a insuficiência da matéria de facto dada como provada para a condenação” e sobre a aplicação do princípio “in dubio pro reo”.
Ou seja, o teor da reclamação demonstra que o recorrente pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a decisão proferida pelo Supremo Tribunal de Justiça e não uma ou mais normas aplicadas nessa decisão.
Ora, como já antes se deixou dito, tal apreciação excede a competência do Tribunal Constitucional. O controlo de constitucionalidade que, nos recursos das decisões dos outros tribunais, a Constituição e a lei cometem ao Tribunal Constitucional é um controlo normativo, que apenas pode incidir, consoante os casos, sobre as normas jurídicas que tais decisões tenham aplicado, não obstante a acusação que lhes foi feita de desconformidade com a Constituição, ou sobre as normas jurídicas cuja aplicação tenha sido recusada com fundamento em inconstitucionalidade.
Nada mais resta pois do que confirmar o decidido.
III
6. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando a decisão reclamada que não tomou conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 2 de Agosto de 2004
Maria Helena Brito Carlos Pamplona de Oliveira Luís Nunes de Almeida