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Processo n.º 79/09
 
 3ª Secção
 Relator: Conselheiro Vítor Gomes
 
 
 
             Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional
 
 
 
             1. A.  reclama, ao abrigo do artigo 76.º, n.º 4 da Lei n.º 28/82 
 
 (LTC), do despacho de 16 de Dezembro de 2008, do relator no Tribunal da Relação 
 de Évora que, com fundamento em que o reclamante não suscitara qualquer questão 
 de constitucionalidade em termos processualmente adequados, não admitiu um 
 recurso que interpôs de um acórdão desse Tribunal ao abrigo  da alínea b) do n.º 
 
 1 do artigo 70.º da LTC.
 
  
 
             Alega o reclamante, em síntese, que “se a questão de 
 constitucionalidade não foi feita anteriormente, foi porque a sentença objecto 
 de recurso não suscitou ao recorrente qualquer questão neste âmbito, o mesmo já 
 não acontecendo relativamente ao acórdão proferido pelo Tribunal da Relação de 
 
 Évora.” E acrescenta que “Ao não contemplar a possibilidade de aplicação das 
 penas substitutivas da pena de prisão efectiva, nomeadamente a prisão por dias 
 livres, estando verificado o pressuposto formal da sua aplicação (pena de prisão 
 aplicada em medida não superior a 1 ano), o Tribunal violou o disposto no artº 
 
 5º do CPP e os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e 
 garantias do arguido contemplados no artº 32º da CRP, especificamente a norma do 
 artº 29º da CRP”.
 
  
 
             O Ministério Público pronunciou-se nos termos seguintes:
 
  
 
 “A presente reclamação carece manifestamente de fundamento não só o reclamante 
 não suscitou, durante o processo, isto é, até à prolação da decisão recorrida 
 qualquer questão de inconstitucionalidade, como é evidente – pelo teor do 
 requerimento de recurso e da presente reclamação – que se não pretende suscitar 
 qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, susceptível de constituir 
 objecto idóneo do controlo normativo, cometido a este Tribunal, nem tão somente 
 controverter a escolha e medida da pena, feita pelas instâncias em função das 
 particularidades do caso concreto.”
 
  
 
             2. Foram solicitados elementos complementares para instrução da 
 reclamação e foi notificado o reclamante da junção desses elementos e do parecer 
 do Ministério público, nada tendo dito.
 
  
 
             Cumpre decidir.
 
  
 
             3. Consideram-se relevantes para apreciação da reclamação as 
 seguintes ocorrências processuais:
 
             a) O ora reclamante foi condenado, por sentença do Tribunal Judicial 
 de Beja, na pena única de um ano de prisão efectiva, pela prática de dois crimes 
 de detenção de arma proibida, tendo a sentença ponderado o seguinte:
 
  
 
 “Importa agora ponderar se o arguido deverá cumprir efectivamente tal pena, ou 
 se a mesma deve ser suspensa na sua execução, substituída por multa ou cumprida 
 em dias livres (ponderando também aqui a aplicação da redacção do Cód. Penal 
 introduzida pela Lei 59/2007, de 04-09, eventualmente mais favorável ao arguido 
 atenta a nova redacção dos arts. 44º e 45º).
 Em face do historial do arguido em matéria de condenações, verifica-se que 
 beneficiou de sucessivas oportunidades para fazer cessar o seu percurso 
 criminoso. Inicialmente através de várias condenações em pena de multa e, já 
 numa fase posterior, através de penas de prisão que foram substituídas por multa 
 ou suspensas na execução. Apesar disso, voltou a cometer crimes, com a agravante 
 de terem sido praticados durante o período de suspensão de execução de duas 
 penas de prisão que lhe foram aplicadas em processos distintos, escassos meses 
 depois relativamente à data do respectivo trânsito em julgado.
 O arguido revela assim uma personalidade manifestamente anti-jurídica, não 
 interiorizando a reprovabilidade dos seus actos, o que permite que se faça um 
 juízo de prognose que lhe é absolutamente desfavorável no que respeita ao 
 cometimento de novos crimes.
 Pelo que considera que só o cumprimento efectivo da pena acabada de aplicar o 
 fará interiorizar a reprovabilidade dos seus actos, e consciencializar dos 
 valores intrínsecos à vida em sociedade.”
 
  
 b) O arguido recorreu da sentença concluindo a motivação peticionando que a pena 
 de prisão efectiva fosse substituída por outra não privativa de liberdade, 
 nomeadamente a do art. 48 do Código Penal, ou, caso, assim não se entendesse, 
 fosse aplicado o regime estatuído no art. 45 do mesmo diploma legal.
 
             c) Por acórdão de 30 de Setembro de 2008 foi negado provimento ao 
 recurso, confirmando-se a sentença recorrida.  
 d) O reclamante arguiu a nulidade desse acórdão, alegando que:
 
 “Ao não contemplar a possibilidade de aplicação das penas substitutivas da pena 
 de prisão efectiva, com excepção da pena de suspensão, cujos fundamentos foram 
 expressos do douto acórdão, o Tribunal, além do artº 379, violou igualmente o 
 disposto no artº 5º, ambos do CPP e os preceitos constitucionais respeitantes 
 aos direitos, liberdades e garantias do arguido contemplados no artº 32º da CRP.
 Pois que para além de violar a letra e o espírito das normas constantes dos artº 
 
 45º e 48º do CP, contraria também os preceitos constitucionais acima 
 referenciados que visam assegurar os arguidos todas as garantias de defesa 
 designadamente nos processos de natureza criminal.”
 
  
 e) Por acórdão de 11 de Novembro de 2008, o Tribunal da Relação de Évora, embora 
 considerando não ter sido cometida nulidade, esclareceu expressamente os motivos 
 pelos quais se entendeu não ser de aplicar pena de substituição à pena de prisão 
 aplicada em concreto.
 
  
 f) O ora reclamante interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo 
 da alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC, dizendo pretender ver apreciada a 
 inconstitucionalidade da aplicação da pena de prisão efectiva, de duração não 
 superior a um ano, em detrimento da aplicação de penas alternativas, 
 nomeadamente a pena prevista no nº 1 do artº 45º do Código Penal, na redacção 
 dada pela Lei nº 50/2007, ou a do artº 46º, quando o arguido nunca antes tenha 
 sido condenado em pena privativa de liberdade.
 
  
 f) Sobre esse requerimento recaiu o seguinte despacho:
 
 “O arguido vem interpor recurso da decisão com fundamento na alínea b) do artigo 
 
 70º da Lei do Tribunal Constitucional, Lei 28/82, de 15 de Novembro.
 O pressuposto de tal interposição é, nos termos da citada alínea, a aplicação de 
 norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo.
 Verifica-se nos autos que o arguido não suscitou qualquer questão sobre 
 constitucionalidade e apenas no pedido de aclaração do acórdão refere, de forma 
 genérica e sem qualquer motivação concretizadora, uma referência ao artigo 32º 
 da CRP.
 Entende-se que suscitar, de forma genérica, uma norma da constituição apenas no 
 pedido de aclaração não constitui uma alegação de inconstitucionalidade “durante 
 o processo”, mais que não seja porque na aclaração o tribunal está limitado pelo 
 objecto do recurso interposto, tal como definido pelo arguido recorrente nas 
 suas conclusões e pela decisão lavrada.
 Conclui-se, portanto, que se não mostram verificadas as condições impostas pela 
 referida alínea da Lei do TC.
 Para tal razão não se admite o recurso interposto.”
 
  
 
 3. É este o despacho reclamado, sendo manifesta a improcedência da presente 
 reclamação.
 
  
 Em primeiro lugar, o reclamante não suscitou, de modo processualmente adequado, 
 qualquer questão de constitucionalidade normativa perante o tribunal que 
 proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer, 
 como é pressuposto do recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade 
 interposto (cf. alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º e n.º 2 do artigo 72.º da 
 LTC). Apenas no requerimento de arguição de nulidade refere, de forma genérica e 
 reportando-a ao acórdão que confirma a sentença condenatória, ter havido 
 violação dos “preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e 
 garantias do arguido contemplados no artigo 32.º da CRP”.
 Ora, é indiscutível que nem pelo tempo, nem pelo modo, nem pelo objecto pode 
 tomar-se essa afirmação como suscitação de uma questão de constitucionalidade de 
 uma norma perante o tribunal da causa, em termos de abrir a via do recurso 
 prevista na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da LTC. 
 
  Efectivamente a suscitação da questão de constitucionalidade tem de referir-se 
 a uma norma e não refere. E tem de conter um mínimo de motivação e não contém. E 
 
 é de todo improcedente a alegação do recorrente de que só não levantara a 
 questão anteriormente porque a sentença então objecto de recurso não lhe 
 suscitava “qualquer questão neste âmbito”, visto que o que sempre esteve em 
 causa no recurso foi a escolha e determinação concreta da pena. As normas 
 aplicadas no acórdão foram as mesmas de que a sentença fizeram aplicação para 
 concluir que se tornava necessário aplicar uma pena de prisão efectiva.
 
  
 
             Por outro lado, resulta evidente do teor do requerimento de 
 interposição do recurso e da petição de reclamação que o recorrente não pretende 
 discutir perante o Tribunal Constitucional a constitucionalidade de qualquer 
 norma, mas controverter a escolha e medida da pena a que os tribunais da causa 
 procederam, em função das particularidades do caso concreto. É matéria que não 
 cabe na competência que a Constituição (artigo 280.º da CRP) e a Lei (artigo 
 
 70.º da LTC) atribuem ao Tribunal Constitucional, pelo que também assiste razão 
 ao Ministério Público quando afirma que o recurso não tem objecto idóneo.
 
  
 
 3.      Decisão
 
  
 Pelo exposto, decide-se indeferir a reclamação e condenar o reclamante nas 
 custas, fixando a taxa de justiça em 20 (vinte) UCs.
 
 
 Lisboa, 17/3/2009
 Vítor Gomes
 Ana Maria Guerra Martins
 Gil Galvão