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Processo nº 792/2007
 
 3ª Secção
 Relatora: Conselheira Maria Lúcia Amaral
 
 
 Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
 
  
 
  
 I
 Relatório
 
  
 
 1. A. vem, a fls. 1210 e segs., reclamar para a conferência da decisão sumária 
 de fls. 1198 e segs., que decidiu não tomar conhecimento do recurso de 
 constitucionalidade por aquela interposto após ter sido notificada do despacho 
 do Supremo Tribunal de Justiça de fl. 1184. Pode, entre o mais, ler-se na 
 fundamentação da decisão ora reclamada:
 
  
 
 (…)
 
 5.  No presente caso, o recurso de constitucionalidade tem por objecto, nos 
 termos do respectivo requerimento, a “apreciação da inconstitucionalidade da 
 norma contida no Art. 732.º-A do Código de Processo Civil, na vertente que 
 limita o requerimento, pelas partes, do julgamento ampliado da revista, até à 
 prolação do acórdão, por parte do Supremo Tribunal de Justiça”.
 Na verdade, a recorrente jamais suscitou durante o processo a questão da 
 inconstitucionalidade de tal dimensão interpretativa do artigo732.º-A do Código 
 de Processo Civil, só tendo suscitado tal questão no requerimento de fls. 1108 e 
 segs. dos autos de submissão da revista a julgamento ampliado, com o objectivo 
 de assegurar a uniformidade da jurisprudência.
 Ora, à data das suas contra-alegações de recurso (independente) e do seu recurso 
 
 (subordinado) para o Supremo Tribunal de Justiça, não podia deixar de 
 considerar-se exigível, à recorrente, que previsse que o entendimento que veio a 
 fazer vencimento no acórdão de 14 de Dezembro de 2006 do Supremo Tribunal de 
 Justiça (cujo mérito não está em causa para o presente efeito, de verificação 
 dos pressupostos do recurso de constitucionalidade) não era novo na 
 jurisprudência daquele Supremo Tribunal, conforme consta da respectiva (e supra 
 transcrita) fundamentação de direito, em que se remete para o Acórdão do Supremo 
 Tribunal de Justiça, de 19 de Julho de 1979, in BMJ, págs. 289-326.
 
  
 E logo se conclui que à recorrente era exigível que antevisse a possibilidade de 
 aplicação, ao caso concreto, do sentido interpretativo do artigo 732.º-A do 
 Código de Processo Civil que ora pretende impugnar perante este Tribunal 
 Constitucional, desde logo por se encontrar na jurisprudência deste Tribunal o 
 Acórdão n.º 261/2002 (publicado no DR, II Série, de 24 de Julho de 2002, e 
 disponível em www.tribunalconstitucional.pt), no qual se não julgou 
 inconstitucional o disposto no artigo 732.º-A do Código de Processo Civil, 
 interpretado em termos de o requerimento das partes a que se refere o seu n.º 2 
 apenas poder ser apresentado até à prolação do acórdão que julga a revista.
 Pelo que, numa estratégia processual cautelosa, antecipando a eventualidade de o 
 Supremo Tribunal de Justiça vir a optar pela tese mais desfavorável ao seu 
 interesse e considerando o entendimento, que podia conhecer, sobre o artigo 
 
 732.º-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, ou haveria de ter suscitado logo 
 
 (para efeitos de recurso de constitucionalidade) a inconstitucionalidade da 
 norma contida no referido artigo 732.º-A, n.º 2, “na vertente que limita o 
 requerimento, pelas partes, do julgamento ampliado da revista, até à prolação do 
 acórdão, por parte do Supremo Tribunal de Justiça”, ou requeria ela mesma este 
 julgamento ampliado. Em face dos elementos disponíveis, tal não correspondia a 
 qualquer exigência de onerosidade desproporcionada, tratando-se, muito 
 simplesmente, do ónus, que este Tribunal tem afirmado repetidamente na sua 
 jurisprudência e que recai sobre as partes, de estas “analisarem as diversas 
 possibilidades interpretativas susceptíveis de virem a ser seguidas e utilizadas 
 na decisão e utilizarem as necessárias precauções, de modo a poderem, em 
 conformidade com a orientação processual considerada mais adequada, salvaguardar 
 a defesa dos seus direitos” (cfr., nesse sentido, o Acórdão n.º 22/2002). Como 
 se salientou no Acórdão n.º 446/2003 (disponível, tal como o anteriormente 
 citado, em www.tribunalconstitucional.pt), “[c]umpria, pois, [à] recorrente – e 
 independentemente das dúvidas interpretativas legitimamente suscitadas quanto a 
 esta norma [no caso, a norma do artigo 400.º, n.º 1, alínea f), na interpretação 
 segundo a qual é inadmissível o recurso para o Supremo de acórdãos 
 contraditórios, proferidos pelas Relações, confirmatórios do decidido em 1.ª 
 instância, por crimes a que seja aplicável pena de prisão não superior a 8 anos, 
 mesmo em caso de concurso de infracções] –, numa estratégia processual 
 cautelosa, ter antecipado a eventualidade de o Supremo vir a optar pela tese 
 mais desfavorável ao seu interesse, confrontando-o logo com tal questão de 
 inconstitucionalidade, de modo a provocar o exercício sobre ela dos respectivos 
 poderes cognitivos – sendo, deste modo, intempestiva a sua colocação apenas em 
 sede de arguição de nulidades.”
 Não tendo a recorrente suscitado durante o processo a inconstitucionalidade da 
 norma que pretende submeter à apreciação sub specie constitutionis, não pode 
 agora o Tribunal Constitucional tomar conhecimento do presente recurso.
 
  
 
  
 
 2. A reclamante diz o seguinte na sua (extensa) reclamação, na parte relativa ao 
 obstáculo processual ao conhecimento do recurso em que se fundou a decisão 
 reclamada:
 
  
 
 (…)
 C. O MOMENTO OPORTUNO PARA A INTERPOSIÇÃO DO RECURSO 
 
 14. Nos fundamentos da decisão, propriamente dita, diz-se o que, de resto, 
 decorre do n° 1 do citado Art. 732‑A, C. P. Civil, ou seja: a 
 inconstitucionalidade deve ser suscitada durante o processo, o que a reclamante 
 fez, e também, até à prolação do acórdão, o que, realmente, não aconteceu. 
 
 15. Mas a verdade parece ser esta: se a inconstitucionalidade da norma se baseia 
 na violação do princípio da confiança, a exigência, em qualquer caso, de que a 
 questão seja suscitada antes de proferido o acórdão pelo STJ, coloca a tese que 
 queremos demonstrar no lugar da hipótese de que devemos partir. 
 
 16. Ou seja, por exemplo, que, por falta momentânea de outro melhor, aqui se 
 deixa expresso: põe-se o problema de saber se um médico violou o seu dever por 
 se ter recusado a assistir alguém, em perigo de vida, depois do seu horário de 
 trabalho; será lícito e aceitável que ele se defenda dizendo que não assistiu o 
 doente por ter terminado o seu tempo de serviço? 
 
 17. No caso do Art. 732-A, C. P. Civil, se a lei reserva o direito de as partes 
 requererem o julgamento ampliado da revista à possibilidade de vir a ser 
 proferida uma solução jurídica que esteja em oposição com jurisprudência 
 anteriormente firmada, essa possibilidade tem que ser aquilatada pelas próprias 
 partes, em face da sua experiência, dos dados do processo, da prática 
 jurisprudencial, do entendimento da doutrina, etc.. 
 
 18. Isto é, a menos que elas requeiram sempre o julgamento ampliado, o que não 
 corresponde nem à letra, nem, certamente, ao espírito da lei, aquela 
 possibilidade tem que ser aferida por critérios razoável, lógica e racionalmente 
 exigíveis às partes e não a outrem. 
 
 19. Para aquilatar dessa possibilidade elas não podem deixar de contar, 
 fatalmente, com todas as circunstâncias que envolvem o processo, mormente, com 
 as decisões que já nele tenham sido tomadas, como foi o caso. 
 
 20. E isto porque, aqueles dados e aquelas decisões, num estado de direito 
 democrático, têm que inspirar, aos cidadãos, um mínimo de confiança na Justiça 
 do seu país, ainda que eles não ignorem que, as vias de recurso possam ser 
 alteradas, mas não alteradas de qualquer modo, ou, por outras palavras, 
 alteradas mas em face de sérios e ponderados fundamentos. 
 
 21. Se não fosse assim, isto é, se não existisse essa confiança relativa, nunca 
 nenhuma parte vencida se conformaria com uma sentença proferida na primeira 
 instância! 
 
 22. No caso que nos ocupa, como é que podia exigir-se à reclamante, que actuou 
 sempre com toda a lisura e boa fé, que viu provada toda a matéria de facto que 
 foi essencial à tese que defende, que juntou dezenas de documentos idóneos e 
 impugnáveis, que viu deferidas duas providências cautelares, que teve como 
 favoráveis três autos de inspecção ao local e que viu proferidas, a seu favor, a 
 sentença do tribunal de comarca e da Relação do Porto, convincentemente 
 fundamentadas, como é que podia exigir-se-lhe – dizia – que tivesse como 
 razoavelmente provável a possibilidade de ser proferido, no STJ, um acórdão 
 desfavorável, caso ele estivesse íntegro e os seus dados fossem equitativamente 
 interpretados. 
 
 23. A violação dos princípios da confiança, da proporcionalidade e do direito a 
 um processo equitativo, só o “a posteriori”, como parece óbvio, podia, e assim 
 foi feito, ser detectada e denunciada. 
 
 24. Estamos, pois, em presença de uma situação excepcional, anómala, referida na 
 fundamentação da decisão e declaradamente extraída do AcTC nº 352/94, 06.09.94, 
 Proc. n° 92/92, onde se lê que “não se pode exigir ao interessado que suscitasse 
 a questão de constitucionalidade antes de proferida a decisão final, 
 designadamente, por o tribunal a quo ter efectuado uma aplicação de todo 
 insólita e imprevisível da norma impugnada” (Salvo menção em contrário, 
 destaques e/ou sublinhados são da responsabilidade da reclamante). 
 
 25. Por sua vez, no AcTC n° 479/89, de 24.04.92 diz-se em que condições pode 
 suscitar-se a inconstitucionalidade a posteriori como sendo aquelas “em que a 
 interpretação judicial seja tão insólita e imprevisível que seria de todo 
 desrazoável dever a parte contar (também) com ela.” 
 
 (…)
 
 35. De tudo o que antecede, só poderá concluir-se que não era razoavelmente 
 exigível, à autora, que pedisse a priori o julgamento ampliado da revista, sob 
 pena de se transformar a “possibilidade” de que fala a lei numa obrigatoriedade 
 não imposta por uma prudência e por uma cautela, também razoáveis, mas em nome 
 do medo e da imprevisibilidade que não assentaria em qualquer fundamento lógico 
 e racional. 
 
 36. Estamos assim, manifestamente, perante uma daquelas situações “excepcionais, 
 anómalas”, nas quais, como se diz na douta decisão, “não se pode exigir ao 
 interessado que suscitasse a questão da constitucionalidade antes de proferida a 
 decisão final, designadamente [este advérbio quer significar que pode haver 
 outras situações em que tal solução pode ser adoptada], por o tribunal a quo ter 
 efectuado uma aplicação de todo em todo insólita e imprevisível da norma 
 impugnada”.
 Através do requerimento de fls. 1238 e 1239, a reclamante veio 
 
 (…) informar esse Venerando Tribunal que o mandato forense outorgado ao 
 signatário, bem como a prova da concessão do apoio judiciário, se encontram 
 juntos ao apenso A, pelo que, também por essa relevante razão, os apensos não 
 poderiam deixar de acompanhar os autos da acção principal. 
 De facto, a falta de prova do mandato forense tornaria a intervenção do 
 signatário ilegítima, enquanto que a falta de prova da concessão do apoio 
 judiciário implicaria o pagamento das respectivas taxas de justiça, o que, 
 obviamente, não se verificou nem, como tal, foi julgado. 
 Nestes termos, reitera o seu requerimento ínsito nos referidos pontos da sua 
 reclamação, no sentido de ser ordenada a junção dos apensos aos autos 
 principais.
 Face à eventualidade de a Conferência vir a indeferir a reclamação com 
 fundamento na não efectiva aplicação por parte do tribunal a quo - e como ratio 
 decidendi - da norma cuja inconstitucionalidade foi alegada, foi a reclamante, 
 por despacho de fl. 1242, notificada para, querendo, se pronunciar quanto a este 
 novo fundamento, tendo “em jeito de conclusões” dito o seguinte na sua resposta:
 
  
 
 13. No caso presente, acham-se verificados todos os pressupostos da 
 admissibilidade do recurso para o TC, a saber: 
 a.  A inconstitucionalidade foi adequadamente suscitada, perante o tribunal que 
 proferiu a decisão, durante o processo, no momento, e só neste, em que a 
 recorrente pôde fazê-lo e o tribunal dela podia conhecer; 
 b.  A norma impugnada foi aplicada pelo tribunal recorrido como “ratio 
 decidendi”; 
 c.  Da decisão do STJ não era admissível recurso ordinário, mas se a norma fosse 
 julgada inconstitucional, como expressamente foi requerido, o caso seria 
 reapreciado, pelo plenário das secções cíveis; 
 d.  A recorrente esgotou todos os recursos ordinários, pelo que a apreciação da 
 questão objecto desta acção pelo plenário das secções cíveis só ficou a dever-se 
 ao facto de não ter sido julgada inconstitucional a norma contida no Art. 732-A, 
 n° 2, na vertente segundo a qual as partes devem poder pedir a revista ampliada 
 depois de proferido o acórdão do STJ, por estar em oposição com jurisprudência 
 anteriormente firmada, no domínio da mesma legislação; 
 e.  O recurso para o TC deve ser admitido, mormente quando a solução imposta 
 pelo acórdão do STJ, como se vê pelas razões oportunamente apontadas, é de todo, 
 impensável, imprevisível, inesperada, excepcional e, mesmo, insólita e anómala.
 
  
 
  
 Cumpre apreciar e decidir.
 
  
 
  
 II
 Fundamentos
 
  
 
 3.  Adiante-se desde já que a presente reclamação não pode obter provimento.
 Desde logo, em recursos de constitucionalidade interpostos ao abrigo do disposto 
 na alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, as 
 partes não podem requerer qualquer diligência, e as diligências, quando pedidas 
 ou lembradas pelas partes, só se efectuam se o Tribunal Constitucional as julgar 
 necessárias.
 Por outro lado, como tem sido repetidamente afirmado na jurisprudência deste 
 Tribunal (cfr., entre outros, o Acórdão n.º 230/2001 (disponível em 
 
 www.tribunalconstitucional.pt), o benefício do apoio judiciário envolve uma 
 simples dispensa de pagamento, de acordo com o regime que regula a respectiva 
 concessão, mas a fixação das custas, quando devidas, tem de constar da decisão. 
 Assim sendo, o apoio judiciário apenas opera ou releva no momento do pagamento 
 das quantias que vierem a ser fixadas nos autos.
 Depois, como muito bem se sabe – e como inúmeras vezes tem sido repetido por 
 este mesmo Tribunal – através deste tipo de recursos [previstos, antes do mais, 
 pela alínea b) do n.º 1 do artigo 280.º da Constituição] só pode o Tribunal 
 Constitucional conhecer de questões relativas à constitucionalidade de normas. 
 As decisões judiciais, em si mesmas consideradas, não são, em direito português, 
 objecto de controlo de constitucionalidade. Daí que, para o Tribunal 
 Constitucional, surja naturalmente como um dado a norma de direito 
 infraconstitucional que é questionada no recurso. No nosso sistema de 
 fiscalização concentrada e incidental da constitucionalidade, não cabe ao 
 Tribunal Constitucional, nem controlar o modo como a matéria de facto foi 
 apurada pelos tribunais recorridos, nem sequer 
 controlar o mérito da decisão recorrida, em si mesma, ou, sequer, apurar se as 
 normas nela aplicadas correspondem ou não ao melhor direito. Como se disse no 
 Acórdão n.º 44/85, “saber se a norma era ou não aplicável ao caso, ou se foi ou 
 não bem aplicada – isso é da competência dos tribunais comuns, e não do Tribunal 
 Constitucional” (Acórdãos do Tribunal Constitucional, vol. 5, 1985, p. 408).
 A exigência de prévia suscitação da questão de constitucionalidade (prévia em 
 relação à prolação da decisão recorrida) faz, assim, todo o sentido no quadro 
 dos pressupostos do recurso de constitucionalidade. Tratando-se este de um 
 recurso que incide sobre normas e não sobre decisões, lógico é que se 
 pressuponha que o tribunal a quo, de cuja decisão se recorre, tenha nessa mesma 
 decisão aplicado a norma cuja constitucionalidade se questiona, pelo que tal 
 questionamento terá que ter sido feito pelo próprio recorrente durante o 
 processo, isto é, antes da prolação da decisão recorrida.
 O Tribunal Constitucional tem dito, no entanto, e muito compreensivelmente, que 
 esta exigência de prévia suscitação da questão de constitucionalidade se não 
 aplica às situações que sejam de todo excepcionais ou anómalas, por o recorrente 
 não ter tido nelas qualquer oportunidade processual de suscitar a questão de 
 constitucionalidade durante o processo; e que se contam, nestes casos anómalos 
 de inexistência de oportunidade processual, as situações em que a decisão 
 recorrida tenha feito uma interpretação da norma com a qual o recorrente não 
 podia razoavelmente contar. É que, nestes casos, anómalos, não será exigível que 
 se suscite a inconstitucionalidade da norma antes da prolação da decisão. Posto 
 que esta acaba por ter um conteúdo imprevisto, ou surpreendente, nenhum juízo se 
 poderia ter feito, antecipadamente, quanto à sua emissão. (Vejam-se, entre 
 outros, os Acórdãos n.ºs 499/97, 642/99, 124/00, 192/00, 79/02, 120/02 e 669/05, 
 todos disponíveis em www.tribunalconstitucional.pt.)
 
  
 
  
 
 4.  A reclamante pretende que o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, de 14 de 
 Dezembro de 2006, se integra precisamente nesse grupo de situações anómalas que 
 justificam a dispensa de suscitação prévia da questão de constitucionalidade. 
 Não pode, porém, concordar-se com a reclamante neste ponto.
 Na verdade, à data das suas contra-alegações de recurso (independente) e do seu 
 recurso (subordinado) para o Supremo Tribunal de Justiça, não podia deixar de 
 considerar-se exigível à recorrente que previsse a eventualidade de o Supremo 
 Tribunal de Justiça, dentro dos seus poderes de cognição em sede de recurso de 
 revista, vir a optar pela tese mais desfavorável ao seu interesse, tese ou 
 entendimento (que exige a alegação fáctica de sinais exteriores, visíveis e 
 permanentes, postos para assegurar a passagem e constitutivos da usucapião) que, 
 como se disse na decisão reclamada, não era inteiramente novo na jurisprudência 
 daquele Supremo Tribunal (veja-se o acórdão de 21 de Abril de 1994, proferido na 
 revista n.º 084380, cujo sumário está acessível em www.dgsi.pt).
 A recorrente sabia, pois, ou podia saber, independentemente da sua expectativa 
 quanto ao conteúdo da decisão a proferir, que a secção no Supremo Tribunal de 
 Justiça sempre poderia decidir no sentido propugnado pelos réus [v. fls. 1021 a 
 
 1023, conclusões III) a VII)], pelo que, considerando o entendimento, que podia 
 conhecer, sobre o artigo 732.º-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, haveria de 
 ter requerido ela própria o julgamento ampliado da revista, aí deduzindo as 
 questões de constitucionalidade que considerasse pertinentes e adequadas. 
 Não o tendo feito, há que concluir que a recorrente não cumpriu o ónus de 
 suscitação da questão de constitucionalidade durante o processo, tal como exigem 
 os artigos 70.º, n.º 1, alínea b), e 72.º, n.º 2, da Lei do Tribunal 
 Constitucional.
 
  
 
  
 
 5.  Resulta ainda dos autos, independentemente de considerações sobre o mérito 
 do recurso de constitucionalidade, que “aquilo” que a recorrente pretende, 
 verdadeiramente, impugnar perante este Tribunal não é uma norma que tenha sido 
 aplicada como ratio decidendi pelo tribunal a quo, conclusão que não é posta em 
 causa, antes é confirmada, pela resposta de fls. 1244 e segs.
 No requerimento que consubstancia a presente reclamação, ao demandar, a dado 
 passo (fl. 1229, ponto 34): “De facto, será humana, racional e razoavelmente 
 exigível que a autora/reclamante pudesse prever: a. Que o STJ que, mesmo nestes 
 autos vincou expressamente o seu carácter de tribunal de revista, não acatasse a 
 matéria de direito julgada pelas instâncias e revogasse as suas respectivas 
 decisões por uma questão de facto – a falta de alegação de sinais visíveis e 
 permanentes da servidão?”, a reclamante acaba por denunciar que o que pretende, 
 verdadeiramente, impugnar perante este Tribunal é o resultado decisório a que 
 chegou o Supremo Tribunal de Justiça, tido por desconforme com as suas 
 expectativas subjectivas.
 O que, na perspectiva da reclamante, está em questão não é a norma do artigo 
 
 732.º-A, n.º 2 do Código de Processo Civil, sobre o momento em que a parte deve 
 requerer a submissão da revista a julgamento ampliado para assegurar a 
 uniformidade da jurisprudência, mas a pretensão de uma global reapreciação do 
 mérito da causa por este Tribunal, na perspectiva de uma pretensa violação de 
 direitos fundamentais, constitucionalmente tutelados, pela decisão proferida 
 pelo tribunal a quo acerca da composição do litígio.
 Isso mesmo decorre do que a reclamante afirma no ponto 11 da resposta de fls. 
 
 1244 e segs.:
 
  
 
 11. De facto, bastava que tivesse ficado provado, como efectivamente ficou, que 
 a autora não dispunha de outro caminho, para os seus prédios, para que a 
 JUSTIÇA, o principal fim do DIREITO, impusesse uma especial ponderação na 
 apreciação de toda a abundante matéria por ela carreada para os autos, como, por 
 exemplo: plantas topográficas, plantas aerofotogramétricas, plantas para 
 requisição de licença de construção, pelo menos nove fotografias do caminho, uma 
 fotografia obtida por satélite, autos de três inspecções judiciais ao local, 
 depoimentos de cerca de trinta testemunhas, etc. (Cfr. elucidativa fundamentação 
 da matéria dada como provada), o que manifestamente não aconteceu.
 
  
 Não vem, pois, colocada uma verdadeira questão normativa de constitucionalidade 
 atinente ao artigo 732.º-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, susceptível de 
 servir de base ao recurso de fiscalização concreta interposto, nos termos da 
 alínea b) do n.º 1 do artigo 70.º da Lei do Tribunal Constitucional, pelo que 
 não podia este Tribunal tomar conhecimento do recurso.
 
  
 
  
 
 6. Acresce, por último, que, mesmo que o Tribunal Constitucional viesse a julgar 
 inconstitucional a norma do artigo 732.º-A, n.º 2 do Código de Processo Civil, 
 
 “na vertente que limita o requerimento, pelas partes, do julgamento ampliado da 
 revista, até à prolação do acórdão, por parte do STJ”, determinando, 
 consequentemente, a reforma da decisão recorrida, permanecem dúvidas sobre se o 
 Presidente do Supremo Tribunal de Justiça poderia, em cumprimento desse juízo, 
 provocar, neste momento, a intervenção do Pleno das Secções.
 Para além de não haver hierarquia entre Presidente do Supremo Tribunal de 
 Justiça e o próprio Supremo Tribunal de Justiça quando julga em conferência, não 
 existe no sistema processual civil previsão legal expressa que contemple a 
 possibilidade de a decisão de fundo de fls. 1019 e segs. vir a ser, neste 
 momento, alterada em virtude de uma eventual decisão do Presidente do Supremo 
 Tribunal de Justiça que considere necessária a intervenção do Pleno das Secções, 
 a não ser que também da decisão de fundo tivesse sido interposto recurso de 
 constitucionalidade, o que não sucedeu no caso dos autos.
 Seria, assim, de duvidosa utilidade conhecer do recurso.
 
  
 III
 Decisão
 
  
 Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação e 
 confirmar a decisão sumária de não conhecimento do recurso, bem como condenar a 
 recorrente em custas, com  20  (vinte) unidades de conta de taxa de justiça.
 
  
 
  
 Lisboa, 15 de Julho de 2008
 Maria Lúcia Amaral
 Carlos Fernandes Cadilha
 Gil Galvão