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Processo n.º 63/02
2ª Secção Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – A., arguido nos autos em epígrafe, reclama para a conferência, ao abrigo do disposto no n.º 2 do art.º 78º-B, da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão (LTC) do despacho proferido pelo relator do seguinte modo:
«1 – [...] vem requerer que os autos baixem ao tribunal recorrido a fim deste apreciar o pedido de declaração de nulidades insanáveis que argui ou, quando assim se não entenda, que seja o Tribunal Constitucional a proceder à declaração de nulidade.
2 – Alega o requerente, em síntese, que a Procuradora-Geral Adjunta em exercício de funções junto do Tribunal da Relação de Lisboa que proferiu o despacho de instauração do processo de inquérito criminal contra o requerente, que procedeu ao seu interrogatório como arguido e que requereu o seu julgamento era incompetente para a prática de tais actos processuais, pelo que tais actos estão feridos de nulidade insanável, nulidade essa que se projecta nos demais actos praticados no processo como a intervenção do Supremo Tribunal de Justiça e o Tribunal da Relação de Lisboa, tribunal este que procedeu ao seu julgamento.
3 – Como resulta claramente do requerimento do recorrente, cujo pedido e fundamentos se acabaram de sintetizar, este não argui qualquer nulidade do acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional nestes autos ou de quaisquer actos processuais praticados perante ele no recurso de constitucionalidade que o mesmo interpôs. Ao invés, o objecto da sua alegação de nulidade respeita a actos processuais praticados pelo Ministério Público junto do Tribunal da Relação de Lisboa, pelo mesmo Tribunal da Relação ou pelo Supremo Tribunal de Justiça
(STJ).
Cingindo-se a competência do Tribunal Constitucional a decidir do recurso interposto pelo recorrente sob a invocação do art.º 70º, n.º 1, alínea b), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro – e naturalmente da validade dos actos processuais praticados na tramitação perante ele do respectivo recurso – não lhe cabe conhecer das nulidades invocadas relativas a actos exteriores ao objecto do recurso de constitucionalidade interposto e à sua tramitação perante o Tribunal Constitucional, praticados pelo Tribunal da Relação de Lisboa, pelo Ministério Público junto dele ou pelo STJ.
Assim sendo, não se conhece do requerido perante o Tribunal Constitucional.
E porque o requerido não interfere com a formação do trânsito em julgado do acórdão proferido pelo Tribunal Constitucional, decide-se que a remessa dos autos para conhecer do requerido seja feita apenas depois de transitado em julgado tal acórdão e efectuada a respectiva conta de custas.».
3 – Como fundamentos da reclamação, o reclamante aduz o seguinte:
«A., arguido nos autos em epígrafe, que lhe move o digno Magistrado do Ministério Público, notificado do «despacho» de fls. vem - sem prejuízo da inexistência da decisão em pauta, arguível a todo o tempo - deduzir reclamação para o relator e, subsidiariamente, para a conferência, o que faz nos seguintes termos:
1º O douto «despacho» em pauta assenta na seguinte premissa: A arguição da nulidade insanável ou inexistência oportunamente deduzida pelo recorrente não afecta o trânsito em julgado do «acórdão» do Tribunal Constitucional.
2º Com base em tal premissa, o Exmo «relator» decidiu que o «acórdão» do Tribunal Constitucional transita em julgado.
3º E que o recorrente deve desde já pagar as custas no Tribunal Constitucional.
4º Todavia, verifica-se não ser exacta a premissa e não ser exacta a conclusão.
5º A premissa não é exacta porque a nulidade invocada «toma inválido o acto em que se verifi[ca] bem como os que dele dependerem e aquel[a] puder afectar» (artigo
122º, nº 2).
6º Por isso, a dedução da nulidade insanável é também dedução consequente dedução do «acórdão» do Tribunal Constitucional.
7º Ao declarar-se incompetente para conhecer da nulidade invocada e ordenar a baixa dos autos, o Tribunal Constitucional bem sabe que o seu acórdão pode ser declarado nulo pelo tribunal de primeira instância.
8º De modo que nem o «acórdão» do Tribunal Constitucional transitou em julgado, nem há lugar à contagem de custas, enquanto se não mostrar decidida a questão da nulidade.
9º Como, de resto, não transitou em julgado o acórdão do STJ.
10º O Tribunal Constitucional, aliás, incumpriu o dever de verificar previamente se existiam nulidades insanáveis.»
4 – O Procurador-Geral Adjunto no Tribunal Constitucional respondeu dizendo que o decidido se deve manter por não terem sido apresentados argumentos novos.
B – Fundamentação
5 – O reclamante fundamenta a sua reclamação no entendimento de que os efeitos jurídicos decorrentes da arguição da alegada nulidade dos actos praticados na fase de inquérito ou na fase judicial do processo não têm autonomia processual relativamente ao objecto do recurso de constitucionalidade e ao processado do mesmo de modo a que se possa constituir o caso julgado sobre o acórdão proferido no Tribunal Constitucional, de não conhecimento do recurso. Mas tal posição não é de acolher, sendo de aceitar a fundamentação do despacho ora impugnado. A tese em que o despacho reclamado se abona é, de resto, a solução que é postulada pela natureza incidental do processo de fiscalização concreta de constitucionalidade. Na verdade, trata-se de uma “espécie de incidente” corporizado em um recurso que tem por objecto imediato a apreciação de (in)constitucionalidade de norma de direito infraconstitucional que tenha constituído fundamento normativo da decisão proferida no acto judicial recorrido e não de recurso tendente a sindicar esse acto judicial em si próprio ou com base em diversos outros fundamentos possíveis em direito.
C – Decisão
6 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação.
Custas pelo reclamante com taxa de justiça de 15 UC, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário se dele gozar o reclamante.
Lisboa, 15 de Julho de 2004
Benjamim Rodrigues Maria Fernanda Palma Rui Manuel Moura Ramos