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Processo n.º 101/04
1ª Secção Relatora: Conselheira Maria Helena Brito
Acordam, em conferência, na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. Após ter sido notificada do Acórdão do Tribunal Constitucional n.º
310/04, de 5 de Maio (fls. 394 a 399), no qual foi decidido, em conferência, indeferir a arguição de nulidade do Acórdão n.º 215/04 – em que este Tribunal indeferira a reclamação por si deduzida do despacho através do qual o Tribunal do Trabalho de Lisboa não admitiu o recurso de constitucionalidade que pretendia interpor –, A. veio, nos termos do artigo 669º, n.º 2, do Código de Processo Civil, requerer a “reforma da douta decisão em causa, que não admitiu o recurso interposto, para correcção do erro manifesto, em que Vossas Excelências incorreram ao terem considerado que a reclamante não havia suscitado no processo a inconstitucionalidade, que pretendia ver apreciada, da norma do artigo 83º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho” (requerimento de fls. 409).
2. A reclamada B., notificada deste requerimento, não respondeu (cota de fls. 411).
Cumpre decidir.
3. Interessa reter os seguintes elementos do presente processo:
a) No Tribunal do Trabalho de Lisboa foi julgada parcialmente procedente a acção declarativa com processo comum intentada por B., tendo sido condenada a Ré A. a pagar à Autora determinadas importâncias a título de remunerações vencidas e de indemnização por despedimento ilícito (sentença de
11 de Abril de 2003, a fls. 250 e seguintes).
b) A. interpôs recurso de apelação e, com o objectivo de obter efeito suspensivo para tal recurso, requereu que lhe fosse admitido
“prestar caução, por depósito ou fiança bancária”, invocando o disposto no artigo 83º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho (requerimento de fls.
270/286).
c) Foi determinada a notificação da Ré “para prestar caução pelo valor em que foi condenada no prazo legal” (despacho de fls. 313, renovado, após diversas vicissitudes processuais, pelo despacho de fls. 331 e seguinte).
d) A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC, para apreciação
“das normas dos n.ºs 1 e 2 do artigo 83° do Código de Processo do Trabalho, na interpretação segundo a qual o despacho de admissão, não admissão ou rejeição do recurso só deve ser proferido depois de se mostrar prestada a caução, por violação do direito de acesso ao direito e aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20° da Constituição da República Portuguesa” e “da norma do artigo 83° n.º 1 do Código de Processo do Trabalho, por violação do princípio da igualdade e (ainda) por violação do direito de acesso ao direito e aos tribunais e a uma tutela jurisdicional efectiva, consagrado no artigo 20° da Constituição da República Portuguesa, na medida em que, se literalmente interpretado, impõe sem qualquer justificação e em absoluto que a caução seja prestada por depósito efectivo na Caixa Geral de Depósitos ou por fiança bancária” (requerimento de fls. 344 e seguinte).
e) Através do despacho de fls. 355 e seguintes, a Juíza do Tribunal do Trabalho de Lisboa decidiu não admitir o recurso para o Tribunal Constitucional pelas razões a seguir indicadas: quanto às normas indicadas em primeiro lugar, porque, “tendo o recurso sido admitido e concedido novo prazo para a R. prestar caução, não tem qualquer fundamento para o recurso”; quanto à norma indicada em segundo lugar, porque, “é a própria R. que vem oferecer a prestação de caução em conformidade com o disposto no art.º 83/1 do CPT, sem suscitar a inconstitucionalidade do mesmo. A R. só depois de ter sido deferido o que ela própria requereu é que veio alegar que, afinal, o art.º 83 era inconstitucional, interpretado no sentido da prestação de caução ser apenas efectuada nos moldes em que ela própria o tinha requerido. Além de manifestamente infundado o recurso interposto pelas razões expostas, sempre seria de rejeitar por extemporâneo, uma vez que a arguição de inconstitucionalidade não foi feita no primeiro momento em que o recorrente poderia ter suscitado a inconstitucionalidade da norma e que era no próprio requerimento em que requer[eu] a prestação de caução”.
f) A. veio deduzir reclamação para o Tribunal Constitucional, nos termos do n.º 4 do artigo 76º da LTC, do despacho de não admissão do recurso, “na parte respeitante à 2ª inconstitucionalidade invocada”
(requerimento de fls. 362 e seguinte).
g) Pelo Acórdão n.º 215/04, de 30 de Março (fls. 373 a 380), o Tribunal Constitucional decidiu indeferir a reclamação, com fundamento em que,
“não tendo sido suscitada de modo processualmente adequado perante o tribunal recorrido a inconstitucionalidade da norma que se pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional, não podem dar-se como verificados no caso os pressupostos processuais do tipo de recurso interposto”. O Tribunal entendeu ser
“manifesto que a ora reclamante não suscitou a questão da inconstitucionalidade em momento adequado, sendo certo que teve oportunidade processual de o fazer, concretamente quando requereu que lhe fosse admitido «prestar caução, por depósito ou fiança bancária», com o objectivo de obter efeito suspensivo para tal recurso, precisamente invocando a norma do artigo 83º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho”.
h) Em 22 de Abril de 2004, A. veio arguir a nulidade do acórdão “por considerar que o mesmo enferma de falta de fundamentação, omissão de pronúncia e erro manifesto” (requerimento de fls. 385 e seguinte). O Tribunal Constitucional indeferiu tal arguição de nulidade, pelo Acórdão n.º 310/04, de 5 de Maio (fls. 394 a 399).
i) Notificada, por meio de carta expedida em 6 de Maio de
2004, do acórdão que indeferiu a arguição de nulidade, A. veio, através de requerimento recebido neste Tribunal em 25 de Maio, requerer que fosse repetida a notificação por alegadamente não lhe ter sido enviada a página 5 do acórdão
(fls. 404).
j) Repetida a notificação, por meio de carta expedida em 27 de Maio de 2004, vem agora A., através do requerimento de fls. 409, apresentado, via fax, em 11 de Junho, requerer a “reforma da douta decisão em causa, que não admitiu o recurso interposto, para correcção do erro manifesto, em que Vossas Excelências incorreram ao terem considerado que a reclamante não havia suscitado no processo a inconstitucionalidade, que pretendia ver apreciada, da norma do artigo 83º, n.º 1, do Código de Processo do Trabalho”.
4. A sequência processual que precedeu este requerimento e as razões invocadas pela reclamante revelam ser manifesto que, com o pedido agora apresentado, se pretende obstar ao cumprimento da decisão proferida no processo.
Há, por isso, que pôr termo a esta actuação processual, como se prevê no artigo 84º, n.º 8, da Lei do Tribunal Constitucional.
5. Assim, ao abrigo do disposto no artigo 84º, n.º 8, da Lei do Tribunal Constitucional, conjugado com o artigo 720º do Código de Processo Civil, decide-se:
a) Ordenar que o pedido agora apresentado seja processado em separado, depois de pagas as custas em que a reclamante foi condenada no Tribunal Constitucional;
b) Ordenar que se extraia traslado das seguintes peças do presente processo:
– dos Acórdãos n.ºs 215/04 (fls. 373 a 380) e 310/04
(fls. 394 a 399);
– do requerimento de fls. 409;
– do presente acórdão.
c) Ordenar que, extraído o traslado, os autos de recurso sejam imediatamente remetidos ao Tribunal do Trabalho de Lisboa, para aí prosseguirem os seus termos.
Lisboa, 13 de Julho de 2004
Maria Helena Brito Carlos Pamplona de Oliveira Rui Manuel Moura Ramos