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Processo n.º 561/2004
3ª Secção Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção
do Tribunal Constitucional:
1. A fls. 4084, foi proferida a seguinte decisão sumária :
«1. A., condenado por acórdão do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Elvas, entre outros arguidos, pela prática de diversos crimes, na pena global única de 21 anos de prisão, recorreu para o Tribunal da Relação de Évora, que manteve a decisão da 1ª instância e, posteriormente, para o Supremo Tribunal de Justiça, que, por acórdão de 1 de Abril de 2004, de fls.4054, rejeitou o recurso, julgando-o manifestamente improcedente. Pelo requerimento de interposição de recurso de fls. 4074, o arguido veio recorrer para o Tribunal Constitucional, explicando que recorria ao abrigo do disposto nas alíneas b), c) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro. Convidado a completar tal requerimento, pelo despacho de fls. 4075, o arguido apresentou o requerimento de fls. 4076, do qual se deduz que pretende que o Tribunal Constitucional aprecie as inconstitucionalidades que atribuir aos artigos 311º, 312º e 321º do Código de Processo Penal, “na medida em que foram a base justificativa da realização do julgamento”, não obstante não ter sido junto um relatório pericial que, em seu entender, era indispensável a tal julgamento, assim violando os artigos 13º, 27º e 32º da Constituição. Diz que aludiu à inconstitucionalidade de tais preceitos por diversas vezes ao longo do processo e, em particular, na resposta ao parecer elaborado pelo Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça. E termina afirmando a inconstitucionalidade do artigo 170º do Código Penal, por violação do artigo 41º da Constituição, porque o preceito com base no qual foi condenado por lenocínio é “essencialmente fundado na religião católica”. A fls. 4080, foi proferido despacho do seguinte teor:
“Não nos parece que o recorrente tenha dado um cumprimento cabal e preciso ao disposto no artº 75-A da Lei nº 28/82, de 15/11 – deficiência que resultará de nunca, verdadeiramente, ter sido levantada qualquer inconstitucionalidade no processo, a não ser a tal alusão feita ao artº 13º da Constituição (princípio da igualdade), na resposta ao parecer do MºPº. No entanto, e por cautela, admito o recurso interposto para o Tribunal Constitucional (...)”. O recurso foi, portanto, admitido, por decisão que não vincula este Tribunal (nº
3 do artigo 76º da Lei nº 28/82).
2. Com efeito, o Tribunal Constitucional não pode conhecer do objecto do recurso. Em primeiro lugar, nem no requerimento de fls. 4076 o recorrente invoca qualquer um dos fundamentos que poderia justificar a interposição de recurso ao abrigo do disposto nas alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, razão pela qual se não pode conhecer de nenhuma questão que lhes pudesse respeitar. Em segundo lugar, porque, independentemente de outros obstáculos que ocorram ao julgamento do recurso interposto ao abrigo do disposto na alínea b) do mesmo nº
1 do artigo 70º, o recorrente nunca suscitou “durante o processo”, como ali se exige, a inconstitucionalidade de nenhuma norma contida nos preceitos que refere no requerimento de interposição de recurso. Nomeadamente, não invocou a inconstitucionalidade de nenhuma dessas normas na resposta ao parecer do Ministério Público no Supremo Tribunal de Justiça, como se pode verificar da respectiva leitura (a fls.4047).
É pressuposto de admissibilidade do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade de normas interposto ao abrigo do disposto na al. b) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, como é o caso, que a inconstitucionalidade haja sido “suscitada durante o processo” (citada al. b) do nº 1 do artigo 70º), ou seja, colocada “de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer” (nº 2 do artigo 72º da Lei nº 28/82). Conforme o Tribunal Constitucional tem repetidamente afirmado, o recorrente só pode ser dispensado do ónus de invocar a inconstitucionalidade ”durante o processo” nos casos excepcionais e anómalos em que não tenha disposto processualmente dessa possibilidade, sendo então admissível a arguição em momento subsequente (cfr., a título de exemplo, os acórdãos deste Tribunal com os nºs 62/85, 90/85 e 160/94, publicados, respectivamente, nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 5º vol., págs. 497 e 663 e no Diário da República, II, de 28 de Maio de 1994). Não é, manifestamente, o caso dos autos.
3. Estão, pois, reunidas as condições para que se proceda à emissão da decisão sumária prevista no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82. Nestes termos, decide-se não conhecer do objecto do recurso. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 8 ucs.»
2. A fls. 4098, veio requerer a aclaração da decisão sumária, em requerimento que foi objecto do seguinte despacho:
«1. Notificado da decisão sumária de fls. 4084, de não conhecimento do recurso que interpôs para este Tribunal, A. veio, ao abrigo do disposto no artigo 669º, n.º 1, a) do Código de Processo Civil, requerer que “fique esclarecido sobre se o recorrente é ou não notificado para ser ouvido em 5 dias”. Segundo afirma, a norma na qual se baseou a referida decisão sumária para decidir não conhecer do objecto do recurso, o n.º 1 do artigo 78º-A da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, prevê que o relator faça “uma sucinta exposição escrita do seu parecer ... e manda ouvir cada uma das partes por 5 dias”; ora, acrescenta, é “certo que o recorrente não foi mandado ouvir no referido prazo”. Notificado deste requerimento, o MINISTÉRIO PÚBLICO pronunciou-se no sentido da manifesta falta de fundamento do pedido de esclarecimento, já que a «“dúvida” suscitada pelo reclamante (...) [é] facilmente removida se curar de consultar o texto actualizado da Lei do Tribunal Constitucional».
2. Com efeito, é manifestamente infundado o pedido de esclarecimento, já que não se funda em qualquer “obscuridade ou ambiguidade” (artigo 669º, n.º 1, a), do Código de Processo Civil) da decisão sumária em causa, antes resulta da não consideração do texto do n.º 1 do artigo 78º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, na redacção em vigor, que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro.
3. Assim indefere-se o pedido de esclarecimento. Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 10 ucs.»
3. Finalmente, a fls. 4115, veio reclamar para a conferência, ao abrigo do disposto no nº 3 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82, dando “por inteiramente reproduzido, para todos os efeitos legais, o conteúdo de todos os seus requerimentos dirigidos ao Venerando Tribunal Constitucional e, especialmente, o que consta do que dirigiu em 3 de maio findo ao Venerando Conselheiro Relator do Supremo Tribunal de Justiça”.
Notificado para o efeito, o Ministério Público pronunciou-se no sentido de que, pelas razões constantes da decisão reclamada, “é manifesto que não se pode conhecer do objecto do recurso”.
4. Verifica-se, assim, que o ora reclamante não apresenta qualquer argumento que possa ser analisado, no sentido de ser revogada a decisão de que reclama.
Assim, não resta senão confirmar a decisão reclamada, pelos fundamentos dela constantes.
5. Nestes termos, indefere-se a reclamação, confirmando-se a decisão de não conhecimento do objecto do recurso.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 18 ucs.
Lisboa, 21 de Junho de 2004
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Vítor Gomes Luís Nunes de Almeida