Imprimir acórdão
Processo n.º 267/99
2ª Secção Relator: Conselheiro Paulo Mota Pinto
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional: I. Relatório
1. Por acórdão da 10ª Vara Criminal do Círculo de Lisboa, com data do dia 30 de Outubro de 1997, foram os recorrentes, A., B., C., D., E., F., G., H., I. e J. condenados como autores dos crime de desvio e fraude na obtenção de subsídio. Recorreram os arguidos para o Supremo Tribunal de Justiça, que, por acórdão de 4 de Junho de 1998, decidiu rejeitar todos os recursos interpostos. Pode ler-se nessa decisão:
«(...)
2. Começamos pela apreciação dos recursos interpostos das decisões interlocutórias, pois a sua eventual procedência prejudica a apreciação dos recursos da decisão final. A – recurso do arguido A.: Este recurso coloca apenas uma questão de direito, pois o recorrente pretende que seja declarado extinto, por efeito de presunção, o procedimento criminal referente aos crimes que lhe são imputados. Ora, versando matéria de direito, as conclusões têm de indicar, sob pena de rejeição do recurso, os elementos constantes do n.º 2 do art. 412º do C.P.P.. No entanto, essa indicação tem de ser feita igualmente no texto da motivação – cfr. o acórdão deste S.T.J., de 30-01-1997 (processo n.º 1245/96 – 3ª secção), in
“Sumários”, 7-103. Efectivamente, as conclusões servem para resumir as razões do pedido – v. o art.
412º, n.º 1, do C.P.P. – pelo que têm de reflectir a matéria testada no texto da motivação, não podendo, pois, de forma alguma, servir para alargar o objecto do recurso a matérias estranhas àquele texto – v. o acórdão deste S.T.J., de
8-2-1996 (processo n.º 48867 – 3ª secção), in “Sumários”, 0-40. Ora, o recorrente indicou apenas nas conclusões a maioria das normas jurídicas que considerou violadas pelo despacho recorrido. É o caso dos arts. 37º, n.º 1, e 36º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 28/84, de 20-1 e 202º, al. a), do Cód. Penal de
1995 – v. a conclusão X). Portanto, tal indicação feita apenas nas conclusões, é totalmente irrelevante, não podendo, pois, ser considerada. E isto conduz à rejeição do recurso nesta parte, nos termos do art. 412º, n.º 2, al. a), do C.P.P.. No que concerne ao art. 2º, n.º 4 do Cód. Penal, que, no entender do recorrente, a decisão recorrida interpretou inconstitucionalmente, aquele não diz qual foi a norma da C.R.P. ou o princípio constitucional que foi violado. E isto infringe o disposto no art. 412º, n.º 2, al. a), do C.P.P., com a consequente rejeição do recurso nesta parte (v. a conclusão XI). Por outro lado, mesmo que se considerasse relevante a indicação das normas violadas feita na conclusão X, o certo é que o art. 202º, al. a), do Cód. Penal aí mencionado não foi reportado concretamente às conclusões anteriores nem aí se acrescentaram adequadas explicações. E esta actuação também constitui maneira adequada de cumprir o disposto na al. a) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P. – v. o acórdão deste S.T.J., de 12-6-1997 (processo n.º 477/97 – 3ª secção), in
“Sumários”, 12-84. E isto levaria à rejeição do recurso nesta parte. Ainda que não se considerassem pertinentes as razões anteriormente invocadas para a rejeição do recurso, a verdade é que o recorrente não indicou o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou as normas referidas na conclusão X ou com que as aplicou, nem o sentido em que elas deviam ter sido interpretadas ou com que deviam ter sido aplicadas. Esta omissão viola o disposto na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., o que, de igual modo, conduziria à rejeição do recurso nesta parte. Finalmente, ainda se pode dizer que o recurso é manifestamente improcedente. De facto, o recorrente pretende obter a declaração da extinção, por prescrição, do procedimento criminal à custa da requalificação das suas condutas, de forma a serem integradas nas provisões dos arts. 37º, n.º 1, e 36º, n.º 1, do Dec. Lei n.º 28/84 e 23º, n.º 2, e 73º do Cód. Penal de 1995, por, no seu entender, não dever ser tido como valor consideravelmente elevado o montante por ele recebido para a formação de jovens desempregados – 1.500.000$00. Ora, o despacho recorrido, mera decisão interlocutória, não tinha que fazer qualquer requalificação jurídica das condutas do recorrente. Isto é tarefa que só cabe ao acórdão final, sob pena de aquele despacho estar a antecipar o julgamento do caso em apreço. Daí que a prescrição do procedimento criminal tenha a ver com o crime punível em abstracto, tal como é descrito na acusação ou na pronúncia, e não com a sua punição em concreto. Este óbvio entendimento decorre, aliás, do regime fixado pelo Cód. Penal – de
1982 e de 1995 – para a matéria em apreço, nomeadamente, do que nele se estabelece quanto à suspensão e interrupção da prescrição – arts. 119º e 120º do CP de 1982 e 120º e 121º do CP de 1995 – que têm a ver com fases processuais anteriores à definição do enquadramento jurídico-penal da conduta do agente, que só se concretiza com o trânsito em julgado da decisão final. Portanto, os prazos de prescrição iniciam-se, correm e terminam ou não antes da referida definição – v. os arts. 117º e 118º do CP de 1982 e 118º e 119º do CP de 1995. Assim, há que manter “in casu”, a qualificação jurídico-penal da conduta do recorrente feita na pronúncia para efeitos de determinação do prazo de prescrição do procedimento criminal. Ora, o recorrente foi pronunciado pela comissão de um crime de desvio de subsídio p. e p. pelo art. 37º, n.ºs 1 e 3, do Dec. Lei n.º 28/84, de 20-1, punível, em abstracto, com pena de prisão cujo limite máximo é de 6 anos, e de um crime de fraude na obtenção de subsídio, na forma tentada, p. e p. pelos arts. 36º, n.º 1, al. c), n.º 2, n.º 5, al. a), e n.º 8, al. a), do mesmo Dec. Lei, com referência aos arts. 22º, 23º e 74º do Cód. Penal de 1982, punível, em abstracto, com pena de prisão cujo limite máximo é de 5 anos e 4 meses. Assim, para aqueles crimes o prazo de prescrição do procedimento criminal é de
10 anos, face ao disposto no art. 117º, n.º 1, al. b), do Cód. Penal de 1982 – cfr. o art. 118º, n.º 1, al. b), do Cód. Penal de 1995. Sucede que os factos imputados ao recorrente ocorreram em 1987, pelo que, atentas as suspensões e interrupções do procedimento criminal entretanto, obviamente, verificadas num processo tão longo como o presente – aliás, qualificado de excepcional complexidade (v. fls. 1274) – nos termos dos arts.
119º e 120º do Cód. Penal de 1982 (cfr. os arts. 120º e 121º do Cód. Penal de
1995), o referido prazo de 10 anos ainda não se completou, e o mesmo sucede com este prazo acrescido de metade nos termos definidos no n.º 3 do art. 120º do Cód. Penal de 1982 – cfr. o art. 121º, n.º 3, do Cód. Penal revisto. E, como é
óbvio, era esta a situação à data do despacho recorrido. Por conseguinte, não ocorrendo a extinção, por prescrição, do procedimento criminal contra o recorrente, o recurso, como se disse, é manifestamente improcedente, com a sua consequente rejeição nos termos do art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. B – recurso do arguido L.: Este recurso introduz uma questão de direito processual na medida em que imputa ao despacho recorrido a violação do art. 119º, al. d) do C.P.P. ao não declarar a nulidade de falta de fase instrutória decorrente do despacho de fls. 1016. Ora, como já se disse, versando matéria de direito, as conclusões têm de indicar, sob pena de rejeição do recurso, os elementos constantes do n.º 2 do art. 412º do C.P.P.. Neste caso, o recorrente indicou a norma jurídica violada, mas não indicou o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido a interpretou ou com que aplicou nem o sentido em que ela devia ter sido interpretada ou com que devia ter sido aplicada. Isto viola o disposto na al. b) do n.º 2 do citado art.
412º do C.P.P., pelo que o recurso tem de ser rejeitado. Ainda que assim não fosse, o certo é que o recorrente não explica em que é que se traduziu a falta de fase instrutória que constituiria nulidade insanável, pelo que não é possível censurar o acórdão recorrido. De facto, faltam as razões do pedido, o que contraria o disposto no n.º 1 do art. 412º do C.P.P., pelo que as conclusões não podem como tal ser consideradas
– v. em sentido idêntico ou próximo os acórdãos deste S.T.J., de 3-11-1994, in Col. Jur. II-III, 226, de 10-5-1995, in Col. Jur, III-II, 192, de 20-6-1996
(processo n.º 553/96 – 3ª secção), de 18-9-1996 (processo n.º 727/96 – 3ª secção), de 13-11-1996 (processo n.º 1046/96 – 3ª secção) e de 13-3-1997
(processo n.º 12/97 – 3ª secção) , in “Sumários”, 2-54, 3-54, 5-68 e 9-75, respectivamente. Ora, a falta de conclusões por não serem indicadas as razões do pedido equivale
à falta de motivação, o que determinaria a rejeição do recurso, nos termos do art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Finalmente, o recorrente mais não vem fazer agora do que impugnar o despacho de
4-11-1994, exarado a fls. 1016 e 1017 pelo juiz do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa, do qual foi notificado e não recorreu. Assim, a questão posta agora, de novo, já foi decidida por despacho que transitou em julgado – caso julgado formal – pelo que à mesma não há que voltar. Logo, o recurso é também manifestamente improcedente, pelo que seria de rejeitar nos termos do art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. C – recurso da arguida H.: Este recurso põe também uma questão de direito processual consistente na violação pelo despacho recorrido do disposto nos arts. 133º, n.º 2, 105º, n.º 1,
315º, n.º 1, e 316º, n.º 1, do C.P.P., por ter indeferido o requerimento da recorrente no sentido de ser admitido como sua testemunha o co-arguido M., em relação ao qual havia sido ordenada a separação de processos. Sucede que a recorrente indicou apenas nas conclusões – v. conclusão 11ª - as normas jurídicas violadas, não o tendo feito no texto da motivação. E isto era necessário, como já se disse. Tal omissão torna irrelevante a indicação feita nas conclusões, o que conduz à rejeição do recurso, nos termos do art. 412º, n.º 2, al. a), do C.P.P.. Mesmo que assim não fosse, a verdade é que a recorrente não indicou o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal interpretou as normas jurídicas que referiu como violadas ou com que a s aplicou nem o sentido em que elas deviam ter sido interpretadas ou com que deviam ter sido aplicadas. E isto viola o disposto na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., o que levaria igualmente à rejeição do recurso. Por outro lado, de acordo com o preceituado no n.º 2 do art. 133º do C.P.P., em caso de separação de processos, os co-arguidos só podem depor como testemunhas se nisso expressamente consentirem. Logo, este consentimento expresso é condição necessária para que os co-arguidos deponham como testemunhas. Sendo assim, a recorrente devia ter provado a existência de tal consentimento a fim de o co-arguido M. ser admitido como testemunha, mas não o fez. Por conseguinte, aquele não podia ser, como não foi, admitido na pretendida qualidade, pois estava impedido de depor como testemunha, nos termos do art.
133º, n.º 1, al. a), do C.P.P.. D – recurso do arguido G.: Este recurso coloca também uma questão de direito processual na medida em que atribui ao despacho recorrido a violação do disposto nos arts. 133º e 340º do C.P.P., por não ter autorizado o depoimento como testemunha de M.. O caso é idêntico ao da anterior recorrente – está em causa o mesmo co-arguido cujo depoimento se pretende – havendo a apontar a este recurso a violação do disposto no art. 412º, n.º 2, al. b), do C.P.P. em relação às normas jurídicas indicadas como violadas, com a consequente rejeição daquele. Por outro lado, o recurso é manifestamente improcedente pelas razões anteriormente apontadas a respeito do recurso da arguida H., pelo que, ainda por este motivo, teria de ser rejeitado – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Segue-se a apreciação dos recursos interpostos do acórdão final. a) – recurso dos arguidos C., D., E. e F.: Preceitua o n.º 3 do art. 411º do C.P.P. que o “requerimento de interposição do recurso é sempre motivado”. Por sua vez, dispõe o n.º 1 do art. 412º do mesmo Código:
“A motivação enuncia especificamente os fundamentos do recurso e termina pela formulação de conclusões, deduzidas por artigos, em que o recorrente resume as razões do pedido”. Finalmente, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 420º ainda do mesmo diploma, “o recurso é rejeitado sempre que faltar a motivação ou for manifesta a improcedência daquele”. No que concerne à necessidade de formulação de conclusões, o Código de Processo Penal dispõe em sentido semelhante ao que preceitua o Código de Processo Civil, no seu art. 690º. Assim, o que a doutrina e a jurisprudência têm dito a respeito da razão de ser e da finalidade das conclusões da minuta de recurso em processo civil tem plena aplicação em processo penal. Ora, as conclusões são, logicamente, um resumo dos fundamentos por que se pede o provimento do recurso, tendo como finalidade que os mesmos se tornem, fácil rapidamente, apreensíveis pelo tribunal “ad quem” – v., nomeadamente, J. Alberto dos Reis, in “Código de Processo Civil Anotado”, V – 359, Rodrigues Bastos, in
“Notas ao Código de Processo Civil”, III – 299, e os acórdãos deste S.T.J., de
2-2-1984, in B.M.J 334-401, de 4-2-1993, in Col. Jur. I – I – 140 e de
10-7-1996, in B.M.J. 459 – 462. O referido aresto de 4-2-1993 é particularmente incisivo e claro a respeito desta matéria ao fixar os seguintes pontos:
- “as conclusões são proposições sintéticas que emanam do que se expôs e considerou ao longo das alegações;
- sem a indicação concisa e clara dos fundamentos explanados e desenvolvidos nas alegações não há conclusões, o que é motivo para não receber o recurso”. O carácter sintético das conclusões é hoje claramente salientado pelo n.º 1 do art. 690º do Cód. Proc. Civil na redacção que lhe foi dada pelo Dec.- Lei n.º
329-A/95, de 12 de Dezembro. No citado acórdão de 4-2-1993 afirma-se ainda o seguinte, com inteiro cabimento quanto aos recursos em processo penal:
“a razão de ser da lei é, por um lado, apelar para o dever de colaboração das partes e dos seus representantes (arts. 265º) a fim de tornar mais fácil, mais pronta e mais segura a tarefa de administrar a justiça; e, por outro lado, fixar a delimitação objectiva do recurso, indicando concreta e precisamente as questões a decidir (artigo 684º)”. Ora, “in casu”, os recorrentes apresentaram como conclusões um longo texto com
28 artigos, que ocupam quatro folhas. Portanto, os recorrentes não foram capazes de resumir as razões do seu pedido, apresentando para o efeito um texto a que melhor caberia a designação de verdadeira motivação. Daí que tais conclusões não possam como tal ser consideradas, por violação do n.º 1 do art. 412º do C.P.P. – v. em sentido semelhante ou próximo os acórdãos deste S.T.J., de 3-11-1994, in Col. Jur. II – III – 226, de 10-5-1995, in Col. Jur. III – II – 192, de 20-6-1996 (processo n.º 553/96 – 3ª secção), de
13-11-1996 (processo n.º 1046/96 – 3ª secção), in “Sumários”, 2–54 e 5-68, respectivamente, e de 8-1-1998 (processo n.º 1281/97 – 3ª secção). Logo, em rigor, os recorrentes não formularam conclusões. E, obviamente, a falta de conclusões equivale à falta de motivação, o que conduz
à rejeição do recurso – v., entre outros, os acórdãos deste S.T.J., de
21-4-1993, in Col. Jur. I – II – 206 e de 3-11-1994 acima referido e o acórdão da Relação de Coimbra, de 21-12-1994, in BMJ 442-271. Por conseguinte, o presente recurso tem de ser rejeitado, nos termos dos arts.
412º, n.º 1 e 420º, n.º 1 do C.P.P.. Mas, ainda que se entendesse que os recorrentes formularam conclusões, outras razões existem que determinariam igualmente a rejeição do recurso. Assim, este versa unicamente matéria de direito, quer na vertente processual quer na vertente substantiva. Ora, como já frisámos, versando matéria de direito, as conclusões têm de indicar, sob pena de rejeição do recurso, os elementos referidos no n.º 2 do art. 412º do C.P.P.. Vejamos, pois. Nas conclusões 1ª e 2ª, os recorrentes vêm arguir a nulidade insanável prevista no art. 119º, al. d), do C.P.P., por ter sido violado o disposto no art. 48º do mesmo diploma – falta de promoção do processo penal pelo Ministério Público. Sucede que os recorrentes não indicaram a violação da referida norma no texto da motivação. E isto, como já se disse mais que uma vez, era necessário. Portanto, tal indicação, feita apenas nas conclusões, é irrelevante, pelo que não pode ser considerada, o que determinaria, igualmente, a rejeição do recurso nesta parte, nos termos do art. 412º, n.º 2, al. a), do C.P.P.. Por outro lado, os recorrentes não indicaram o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou o citado art. 48º do C.P.P. ou com que o aplicou nem o sentido em que deveria ter sido interpretado ou com que devia ter sido aplicado. E, como também vimos, esta omissão conduziria à rejeição do recurso nesta parte, face ao disposto na al. b) do n.º 2 do art.
412º do C.P.P.. Finalmente, ainda se pode dizer que os recorrentes não têm razão quanto à invocada nulidade. No presente caso, o inquérito foi feito pela Polícia Judiciária, à qual se presume diferida, em todo o território, a competência exclusiva para a investigação dos crimes de fraude na obtenção ou desvio de subsídio, subvenção ou crédito. É o que resulta do disposto no art. 4º, n.º 1, al. c), do Dec. Lei n.º 295-A/90, de 21-9, com a redacção da Lei n.º 36/94, de 29-9 e do Dec. Lei n.º 392/95, de 2-12. Portanto, só quando, nos termos da sua Lei Orgânica, o Ministério Público avocar expressamente a respectiva investigação é que a presumida competência da Polícia Judiciária nos casos como o dos autos – v. os acórdãos deste S.T.J., de
31-7-1997 (processo n.º 1053/97 – 3ª secção) e de 28-8-1997 (processo n.º
1061/97 – 3ª secção). Ora, não tendo havido, “in casu”, avocação expressa da investigação pelo Ministério Público, existe delegação legal de poderes desta autoridade na Polícia Judiciária. Logo, o recurso seria, quanto a esta matéria, manifestamente improcedente, o que levaria, de igual modo, à sua rejeição, nos termos do art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Na conclusão 3ª, os recorrentes dizem que é inconstitucional o n.º 1 do art.
287º do C.P.P. na sua redacção inicial. No entanto, não indicam a norma da C.R.P. ou o princípio constitucional que foi violado. E isto infringe o disposto no art. 412º, n.º 1, al. a), do C.P.P., com a consequente rejeição do recurso nesta parte. Ainda que assim não fosse, o certo é que os recorrentes não explicam nada acerca da invocada inconstitucionalidade, pelo que faltam as razões do pedido, não havendo, pois, verdadeira conclusão, o que equivale a falta de motivação, como anteriormente já se explicou. Daí que, ainda por esta razão, o recurso teria de ser rejeitado nesta parte, nos termos do art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 4ª a 6ª, os recorrentes impugnam o enquadramento jurídico-penal da sua conduta a respeito do crime de fraude na obtenção de subsídio, na forma tentada, do qual devem ser absolvidos. A propósito, afirmam que foram violados os arts. 36º, n.º 1, al. a), n.º 2, n.º
5, al. a), e n.º 8, al. a), do Dec.-Lei n.º 28/84, de 20-1 e os arts. 22º, 23º e
74º do Cód. Penal. Todavia, a indicação desta violação não foi feita no texto da motivação. E isto tem como consequência, como se frisou anteriormente, a rejeição do recurso nesta parte, nos termos do art. 412º, n.º 2, al. a), do C.P.P.. Por outro lado, os recorrentes também não indicaram o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou as referidas normas ou com que as aplicou nem o sentido em que deviam ser interpretadas ou com que deviam ter sido aplicadas. E isto conduziria, igualmente, à rejeição do recurso – art. 412º, n.º
2, al. b), do C.P.P. – nesta parte. Nas conclusões 7ª a 11ª, os recorrentes impugnam também o enquadramento jurídico-penal da sua conduta no que concerne ao crime de desvio de subsídio, do qual devem ser absolvidos. A este respeito, dizem que foi violado o art. 37º do Dec. Lei n.º 28/84, mas não referem os elementos constantes da al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., o que acarretaria a rejeição do recurso nesta parte. Nas conclusões 12ª a 15ª os recorrentes voltam a impugnar a qualificação jurídico-penal da sua conduta para o caso de se entender que cometeram o crime p. e p. pelo citado art. 37º do Dec. Lei n.º 28/84, pretendendo que ela se insere no n.º 1 e não no n.º 3 deste art. E considerando, mais uma vez, ter havido violação desta norma – v. as conclusões 14ª e 28ª. Só que, mais uma vez, os recorrentes não cumpriram o disposto na al. b) do n.º 2 do referido art. 412º do C.P.P., de onde resultaria a rejeição do recurso nesta parte. As matérias tratadas nas conclusões 16ª, 17ª, 18ª, 19ª e 23ª não foram incluídas no texto da motivação, o que acarretaria, como várias vezes já se frisou, a rejeição do recurso a respeito daquelas – art. 412º, n.º 2, al. a), do C.P.P. quanto às 16ª a 19ª e 412º, n.º 1, e 420º, n.º 1, quanto à 23ª. Por outro lado, as normas apontadas como violadas nas conclusões 16ª e 17ª - art. 16º do Cód. Penal – a respeito do erro sobre os elementos de facto ou de direito, e nas conclusões 18ª e 19ª - art. 17º, n.ºs 1 e 2 do mesmo Código – a respeito do erro sobre a ilicitude do facto, não tiveram a correspondente indicação dos elementos referidos na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., o que levaria também à rejeição do recurso nesta parte. Acresce que, a respeito das matérias tratadas nas conclusões 16ª a 19ª, os recorrentes não indicaram as razões do pedido, o que equivale, como se disse, à falta de motivação e conduziria à rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1 do C.P.P.. A conclusão 20ª nada tem para apreciar. Na conclusão 21ª, os recorrentes pretendem a atenuação especial da pena que eventualmente lhes seja aplicada, referindo como violadas as normas constantes da al. d) do n.º 2 e do n.º 1 do art. 72º do Cód. Penal. Só que, de novo, esta violação não foi indicada no texto da motivação, o que acarretaria a rejeição do recurso nesta parte – art. 412º, n.º 2, al. a), do C.P.P.. E também não foram indicados os elementos referidos na al. b) do n.º 2 do mesmo art., com a consequente rejeição do recurso nesta parte. Finalmente, os recorrentes não concretizaram os pressupostos para a atenuação especial da pena que consideram reunidos, nem as circunstâncias contemporâneas e posteriores ao crime que diminuem de forma acentuada a ilicitude do facto, a culpa do agente e a necessidade da pena. Logo, também aqui faltam as razões do pedido, o que, por igual, conduziria à rejeição do recurso – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Na conclusão 22ª, os recorrentes impugnam a medida da pena quanto ao crime de desvio de subsídio, único em que, em alternativa ao anteriormente pretendido, admitem vir a ser condenados, considerando violado o n.º 71º do Cód. Penal. Todavia, novamente, quanto a esta norma, falta a referência aos elementos constantes do art. 412º, n.º 2, al. b), do C.P.P., o que acarretaria a rejeição do recurso nesta parte. Igualmente, não explicam os recorrentes porque é que a pena a aplicar a cada um pela prática do referido crime (na modalidade) p. e p. pelo art. 37º, n.º 3, do Dec. Lei n.º 28/84, há-de ser até um ano de prisão. Logo, faltam aqui as razões do pedido, com a consequente rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Voltando à conclusão 23ª, há que dizer que os recorrentes omitiram completamente o cumprimento do art. 412º, n.º 2, do C.P.P., não indicando qualquer norma jurídica a respeito da pretendida pena unitária – dois anos de prisão – resultante do cúmulo jurídico das penas parcelares aplicáveis aos dois crimes por que foram condenados, a entender-se que o devem ser. Logo, por esta razão também haveria lugar à rejeição do recurso. E, como faltam as razões explicativas para a aplicação da referida pena unitária, ainda por este motivo seria de rejeitar o recurso – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 24ª a 26ª, os recorrentes censuram o acórdão recorrido por não ter declarado a suspensão da execução das penas que lhes foram aplicadas, entendendo que foi violado o art. 50º do Cód. Penal. No entanto, mais uma vez, trata-se de violação que não foi indicada no texto da motivação, além de que não foram indicados os elementos referidos na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P.. Logo, por violação desta al. e da al. a) dos mesmos n.º e art. o recurso teria de ser rejeitado. Além disso, as penas aplicadas aos recorrentes são superiores a três anos de prisão, pelo que não podiam ser suspensas na sua execução, nos termos do art.
48º, n.º 1, do Cód. Penal de 1982 – cfr. o art. 50º, n.º 1, do Cód. Penal de
1995. E para este efeito releva mesmo a pena aplicada e não a pena residual resultante da aplicação de perdão legal, pois o juízo que leva à aplicação de pena de prisão superior a três anos não se compadece com o juízo de prognose favorável relativamente ao comportamento do arguido que preside à suspensão da execução da pena, o qual não pôde ser feito quando aquela foi aplicada. Logo, a suspensão da pena por virtude de uma medida “a posteriori” – o perdão – sem que aquele juízo de prognose pudesse ser feito antes, não está de acordo com os princípios que regem aquele instituo. Além disso, seria conceder dois benefícios ao arguido – o perdão e a suspensão – sem justificação legal. Assim, estas conclusões são também manifestamente improcedentes, o que determinaria a rejeição do recurso – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Na conclusão 27ª, os recorrentes insistem ainda na suspensão da execução da pena sob a condição do pagamento pelos recorrentes das quantias que indicam, pelo que, não o tendo feito o acórdão recorrido violou o n.º 2 do art. 50º e a al. a) ou c) do n.º 1 do art. 51º do Cód. Penal. Só que ainda aqui os recorrentes não cumpriram o disposto na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P. e não explicaram nada acerca desta sua pretensão pelo que faltam as razões de pedido, e daí que o recurso fosse de rejeitar nesta parte, nos termos daquele normativo e do art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. A conclusão 28ª não contém matéria para apreciar, pois limita-se a indicar como violadas as normas anteriormente mencionadas, sobre o que já foi dito o que havia a dizer. b) – recurso do arguido I.: O presente recurso respeita unicamente a matéria de direito, pelo que, mais uma vez o dizemos, as conclusões têm de indicar, sob pena de rejeição daquele, os elementos constantes do n.º 2 do art. 412º do C.P.P.. Ora, nas conclusões a), b) e c), o recorrente vem impugnar o enquadramento jurídico-penal da sua conduta, ao dizer que foi errada a condenação por dois crimes: fraude na obtenção de subsídio, na forma tentada e desvio de subsídio; pois, no seu entendimento, o primeiro consome o segundo. Sucede que o recorrente não indicou as normas jurídicas violadas; tendo-se limitado a dizer que foi feita errada interpretação do art. 30º, do Cód. Penal, mas sem que tenha indicado o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou aquela norma. Por outro lado, é incompreensível o sentido em que, segundo o recorrente, a mesma norma devia ter sido interpretada, na medida em que usa as palavras do n.º
2 do citado art. 3o, que se reporta ao crime continuado e não à consumação de crimes, caso de concurso aparente, que ele diz ocorrer no presente caso – na conclusão b). E, como é sabido, consumpção criminosa e continuação criminosa são figuras distintas no âmbito do direito criminal – v. Maia Gonçalves, in “ Código Penal Português”, 10ª ed., 181/182. Logo não faz qualquer sentido a forma que, segundo o recorrente, o tribunal recorrido devia ter usado na interpretação do art. 30º, do Cód. Penal. Assim, o recorrente não cumpriu, quanto às conclusões em apreço, o disposto nas al. a) e b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., pelo que o recurso tem de ser rejeitado nesta parte. Na conclusão d), o recorrente reporta-se à medida concreta da pena, que, no seu entender, não deve ser superior a dois anos e meio. No entanto, sobre esta questão de direito o recorrente não indica uma única norma jurídica, pelo que não cumpriu o disposto no n.º 2 do art. 412º do C.P.P., o que determina a rejeição do recurso nesta parte. Ainda que assim não fosse, o certo é que o recorrente também não deu qualquer razão explicativa para a aplicação da pena que indica, pelo que o recurso seria de rejeitar por este motivo, face às razões que já se referiram a respeito de outros recursos – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões e), f), g) e h), o recorrente pretende que seja suspensa a execução da pena. Trata-se também de questão de direito, mas enquanto nas conclusões e), f) e h) o recorrente se refere à suspensão da pena sem condições, na conclusão g) reporta-se à suspensão condicionada do pagamento ao Estado das quantias que indica em alternativa. De qualquer modo, acerca de toda esta matéria, o recorrente não cumpriu, de novo, o disposto no n.º 2 do art. 412º do C.P.P., pois limitou-se a dizer que a sentença fez errada interpretação do que dispõe o art. 48º do Cód. Penal, sem que tenha indicado o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou aquela norma nem aquele em que devia ter sido interpretada. Logo, o recurso tem de ser rejeitado nesta parte. Por outro lado, a pena aplicada ao recorrente é superior a três anos de prisão, pelo que não podia ser suspensa na sua execução, nos termos do art. 48º, n.º 1, do Cód. Penal de 1982 – cfr. e art. 50º, n.º 1, do Cód. Penal de 1995. Portanto, estas conclusões são manifestamente improcedentes, o que determinaria, de igual modo, a rejeição do recurso – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. c) – recurso dos arguidos A. e B.: Antes de mais, há que dizer que os recorrentes apresentaram como conclusões um extenso texto com 47 artigos, que ocupam cinco folhas de escrita densa. Esta extensão torna-se ainda maior com a reprodução feita na conclusão XXXIX dos processos referidos no ponto 68 da motivação. Portanto, os recorrentes não foram capazes de resumir as razões do pedido, apresentando para o efeito um texto a que melhor caberia a designação de verdadeira motivação, que, aliás, já seria longa. Daí que tais conclusões não possam assim ser consideradas, por violação do n.º 1 do art. 412º do C.P.P., remetendo-se para tudo o que a este propósito foi dito a respeito do recurso dos arguidos C., D., E. e F.. Havendo falta de conclusões, há falta de motivação, o que leva à rejeição do recurso, nos termos dos art.s 412º, n.º 1, e 420º, n.º 1, do C.P.P.. Ainda que assim não fosse, outras razões existem que conduziriam, igualmente, à rejeição do recurso. Assim todas as normas jurídicas que os recorrentes indicaram, nas conclusões, como violadas, excepto os art.s 355º do C.P.P. e 32º, n.º 5, da C.R.P., não foram indicadas como tal no texto da motivação, pelo que, como estamos fartos de dizer, esta indicação não pode ser considerada. E isto conduziria à rejeição do recurso nesta parte – art. 412º, n.º2, al. a), do C.P.P.. Por outro lado, há questões de direito em relação às quais os recorrentes não indicaram sequer as normas violadas. É o caso da actuação dos recorrentes sem consciência da ilicitude e sem dolo – v. as conclusões XXI e XXII – do enquadramento jurídico penal da sua conduta – v. as conclusões XXIII a XXIX e XLI. Portanto, quanto a estas matérias, houve violação do disposto na al. a) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P, o que determinaria a rejeição do recurso nesta parte. Finalmente, em relação a todas as normas indicadas como violadas, os recorrentes não cumpriram o preceituado, pela al. b) do n.º 2 do citado art. 412º, pelo que o recurso, ainda por este motivo, teria de ser rejeitado nesta parte. Acresce ainda que os recorrentes vêm colocar nas conclusões I a IV meras questões de prova, que estão subtraídas à apreciação deste Supremo Tribunal, face ao disposto no art. 433º do C.P.P., excepto quanto aos vícios indicados no n.º 2 do art. 410º do mesmo diploma. Mas, estes têm de resultar do texto da decisão recorrida, por si só ou conjugada com as regras da experiência comum. E não é o que sucede “in casu”, nomeadamente quanto ao erro notório na apreciação da prova referida pelos recorrentes, pois apelam para o processado a fls. 2 463 a 2 465, o que é estranho à decisão ora sob recursos – v. conclusão III. Portanto, quanto às matérias acabadas de referir, as conclusões são manifestamente improcedentes, o que levaria à rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. d) – recurso do arguido J.: Antes de mais, também aqui há que dizer que o recorrente apresentou como conclusões um longo texto com 38 artigos e um extenso pedido final, tudo ocupando seis folhas. Portanto, o recorrente não foi capaz de resumir as razões do pedido, apresentando para o efeito um texto a que melhor caberia a designação de verdadeira motivação. Logo, tais conclusões não podem como tal ser consideradas, por violação do n.º 1 do art. 412º do C.P.P., remetendo-se para tudo o que a este respeito foi dito quanto ao recurso dos arguidos C., D., E. e F.. A falta de conclusões é ainda um caso de falta de motivação, o que conduz à rejeição do recurso, nos termos do art.s 412º, n.º 1, e 420º, n.º 1, do C.P.P.. Mesmo que assim não fosse, a verdade é que outras razões existem que levariam também à rejeição do recurso. Assim nas conclusões 1ª a 6ª, o recorrente veio pôr em causa a apreciação que o tribunal recorrido fez da prova produzida em audiência e dos documentos constantes dos apensos e anexos. Ora não se tratando de prova vinculada, não é possível uma impugnação daquele tipo, que apenas vem dar a conhecer que a convicção que o tribunal colectivo adquiriu em julgamento. Por conseguinte, o recorrente veio pôr em causa a regra da livre apreciação da prova inserta no art. 127º do C.P.P., pelo que, saindo do domínio do preceituado no art. 410º, n.º s 2 e 3, do mesmo diploma, traz à colação matéria que este S.T.J. não pode indicar, face ao disposto no art. 433º do citado Código – v. os acórdãos deste S.T.J., de 19-6-1996 (processo n.º 48.628 – 3ª Secção), in
“Sumários”, 2-50 e de 13-2-1991, citado por Maia Gonçalves, in “Código de Processo Penal”, 7ª ed., 599. Assim, as conclusões 1ª a 6ª são manifestamente improcedentes, pelo que haveria lugar à rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P. Nas conclusões 7ª a 11ª, o recorrente coloca uma questão de direito processual respeitante à nulidade por violação dos art.s 323º, al. f), e 327º, n.º 2, do C.P.P., que resulta de na motivação da decisão constar que as declarações dos co-arguidos contribuíram irrestritamente para a formação da convicção do tribunal. Ora, neste particular, o recorrente não indicou o sentido em que, no seu entendimento, o tribunal recorrido interpretou aquelas normas ou com que as aplicou, nem o sentido em que elas deviam ter sido interpretadas ou com que deviam ter sido aplicadas. E isto viola o disposto no art. 412º, n.º 2, al. b), do C.P.P., o que determinaria a rejeição do recurso. Por outro lado, o princípio fundamental em matéria de prova é o da sua legalidade, consagrado no art. 125º, do C.P.P., segundo o qual são admissíveis as provas que não forem proibidas por lei. Ora, não existe qualquer disposição legal que não admita as declarações do co-arguido como meio de prova, pelo que elas podem ser objecto de valoração pelo tribunal para fundamentar a sua convicção sobre os factos que dá como provados, dentro da regra da livre apreciação da prova – art. 127º do C.P.P. De facto, o art. 133º, n.º 1, al. a), do C.P.P., apenas proíbe que os co-arguidos deponham como testemunhas, mas não proíbe que os arguidos da mesma infracção prestem declarações no exercício do direito que lhes assiste de o poderem fazer em qualquer momento da audiência, desde que elas se refiram ao objecto do processo. É o que dispõe o art. 343º, n.º 1, do C.P.P. – v. neste sentido os acórdãos deste S.T.J., de 17-10-1996 (processo n.º 560/96 – 3ª Secção), de 23-10-1997 (processo n.º 679/97 – 3ª Secção) e de 30-10-1997
(processo n.º 849/97 – 3ª Secção), in “Sumários”, 4-83 e 14-157 e 167, respectivamente. Acresce que não se pode falar em violação do princípio do contraditório, pois o arguido visado pelas declarações de um co-arguido pode contradize-las, quer por estar presente quer, no caso de audição separada, depois de o presidente do tribunal colectivo lhe dar resumidamente conhecimento do que se tiver passado na sua ausência. É o que preceitua o n.º 4 do art. 343º do C.P.P. E esta foi a situação dos autos, pois o recorrente teve oportunidade de contraditar a versão dos factos apresentada pelos co-arguidos, por constar a sua presença nas actas das audiências em que se procedeu ao interrogatório daqueles
– v. aquelas actas a partir de fls. 2.990. E, se tal não fez, tem de assumir as respectivas consequências, isto é, tem de sujeitar-se à livre apreciação que o tribunal recorrido fez das declarações dos co-arguidos conjuntamente com a restante prova não vinculada. O problema que se põe num caso destes é apenas o da possível menor credibilidade que as declarações de um co-arguido apresentam como meio de prova. Mas, isto não
é diferente do que se pode passar, por exemplo, com a prova testemunhal – v. os acórdãos do S.T.J. citados por último. Assim, não se mostram violados os art.s 323º, al. f), e 327º, n.º 2, do C.P.P. De resto, “in casu”, o tribunal recorrido teve em consideração outros meios de prova, que, em conjunto com as referidas declarações dos co-arguidos, serviram para alicerçar a sua convicção – v. fls. 3 184 a 3 186 – sem que, aliás, se possa concluir qual foi o peso que cada um daqueles meios teve para o efeito. Ainda se dirá, por fim, que os art.s 323º, al. f), e 327º, n.º 2, do C.P.P. não consagram qualquer nulidade, pelo que a sua violação constitui mera irregularidade – v. o art. 118º daquele diploma – que tem de ser arguida no próprio acto, como dispõe o art. 123º, n.º 1, do mesmo Código – v. Maia Gonçalves, in obra citada, 494. Ora, esta irregularidade não foi oportunamente arguida pelo recorrente, pelo que não poderia fazê-lo pela via do recurso. Por conseguinte, as conclusões 7ª a 11ª são manifestamente improcedentes, o que acarretaria a rejeição do recurso – art. 420º, n.º 1, do C.P.P. Nas conclusões 12ª a 14ª, o recorrente volta a insistir em matéria de prova, alegando erro notório na apreciação da prova, que constitui um dos vícios da decisão sobre a matéria de facto – art. 410º, n.º 2, al. c), do C.P.P. – de que o S.T.J. pode conhecer, mesmo oficiosamente – art. 433º do mesmo diploma. Todavia, a questão que o recorrente coloca – não pode o tribunal julgar provados os factos que assim considerou com base nas declarações dos arguidos – nada tem a ver com o referido vício, que consiste em se haver dado como provado algo que notoriamente está errado, que não podia ter acontecido, sendo reconhecível por qualquer pessoa minimamente atenta – v. os acórdãos deste S.T.J., de 24-10-1996
(processo n.º 666/96 – 3ª Secção) e de 31-10-1996 (processo n.º 478/96 – 3ª Secção), in “Sumários”, 4-88 e 99, respectivamente. Esta questão prende-se antes com as que já foram tratadas nas conclusões anteriores, ou seja, as declarações dos co-arguidos são meio de prova legal e estão sujeitas à livre apreciação do tribunal colectivo, não podendo esta ser censurada por este S.T.J.. Logo, estas conclusões são manifestamente improcedentes, o que determinaria a rejeição do recurso nesta parte, tal como sucedia quanto à matéria tratada nas conclusões 7ª a 11ª – art. 420º, n.º 1, do C.P.P. Nas conclusões 15ª a 18ª, o recorrente vem alegar novo vício da decisão sobre a matéria de facto, que é a contradição insanável da fundamentação em que o tribunal colectivo baseou a sua convicção – art. 410º, n.º 2, al. b), do C.P.P.
– ao louvar-se nos depoimentos de testemunhas que não as prestaram (4 ao todo). Ora, isto nada tem a ver com o apontado vício. Se, de facto, as ditas testemunhas não depuseram – o que, aliás, não é verdade quanto à testemunha O. que apenas se recusou a depor quanto à sua filha, a arguida P. (v. fls. 2 859) – o certo é que foram muitas, para além daquelas, as testemunhas que depuseram e que serviram para formar a convicção do tribunal colectivo – v. fls. 3 184 a 3 186 – conjuntamente com outros meios de prova. Assim, não tendo sido dado qualquer relevo específico aos depoimentos inexistentes, quanto ao recorrente, irreleva totalmente a apontada irregularidade. Portanto, as conclusões 15ª a 18ª são manifestamente improcedentes, o que levaria, igualmente à rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 19ª a 25ª, o recorrente vem impugnar o enquadramento jurídico-penal da sua conduta. Trata-se de questão de direito, como é óbvio, pelo que o recorrente devia ter indicado os elementos constantes do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., mas não o fez, pelo que o recurso teria de ser rejeitado nesta parte. Nas conclusões 26ª a 30ª, o recorrente volta a alegar vícios da decisão sobre a matéria de facto – contradição entre a matéria julgada provada e insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art. 410º, n.º 2, als. a) e b), do C.P.P.). Todavia, o recorrente nada concretiza acerca de tais vícios, nomeadamente, não especifica os pontos da factualidade provada a que se refere. Portanto, a este respeito, o recorrente omite as razões do pedido, o que equivale, como já se disse mais que uma vez, à falta de motivação e conduziria à rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 31ª a 35ª, o recorrente vem arguir a nulidade do inquérito, nos termos do art. 119º, al. b), do C.P.P., por o mesmo ter tido o seu impulso e terem sido feitas todas as diligências de prova à revelia do Ministério Público. A questão posta é de direito processual, pelo que o recorrente devia ter indicado os elementos, referidos no n.º 2 do art. 412º do C.P.P., mas não o fez, pelo que o recurso teria de ser rejeitado nesta parte. Por outro lado, a questão ora posta já foi tratada a propósito do recurso dos arguidos C. e outros, pelo que, mantendo-se aqui tudo o que ali se escreveu a tal respeito, conclui-se que as conclusões 31ª a 35ª são manifestamente improcedentes, o que acarretaria a rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 36ª e 37ª, o recorrente volta a impugnar a qualificação jurídico
– penal da sua conduta, pretendendo ter cometido um único crime de fraude na obtenção de subsídio de execução continuada. Todavia, mais uma vez, o recorrente não indica os elementos constantes do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., pelo que o recurso teria de ser rejeitado nesta parte. Finalmente, na conclusão 38ª, o recorrente refere os art.s do C.P.P. que considera violados. No entanto, a violação de tais normas não foi referida no texto da motivação, pelo que, como já várias vezes se disse, aquela indicação, feita apenas nas conclusões, irreleva totalmente, não podendo, pois, ser considerada. E isto conduziria à rejeição do recurso nesta parte, nos termos do art. 412º, n.º 2 al. a), do C.P.P.. Idêntica deficiência se nota em relação aos art.s 26º e 30º, nº1 do Cód. Penal e
36º do Dec.- Lei n.º 28/84, só agora indicados, pelo que também, neste particular, o caminho a seguir seria o da rejeição do recurso. Sucede ainda que o recorrente indicou agora, em amontoado, numa única conclusão, as normas jurídicas violadas, sem as reportar concretamente ao que anteriormente disse nas restantes conclusões e sem acrescentar adequadas explicações. E isto também não constitui modo correcto de cumprir o disposto na al. a) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., o que levaria à rejeição do recurso – v. o acórdão deste S.T.J., de 12-6-1997 (processo n.º 477/97 – 3ª Secção), in “Sumários”, 12-84. Finalmente, em relação a todas as normas violadas, o recorrente não cumpriu o disposto na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., o que levaria também à rejeição do recurso. e) – recurso da arguida N.: Nas conclusões 1ª a 3ª, a recorrente, tal como o recorrente anterior, vem arguir nulidade insanável nos termos do art. 119º, al. b), do C.P.P., por falta de promoção do processo pelo Ministério Público. Como se disse anteriormente, a questão em causa é de direito processual, pelo que o recorrente devia ter indicado os elementos constantes do n.º 2 do art.
412º do C.P.P., mas não o fez, pelo que o recurso tem de ser rejeitado nesta parte. Por outro lado, como ali também se disse, a referida questão já foi devidamente tratada a propósito do recurso dos arguidos C. e outros. Assim, dado que se mantém tudo o que ali se escreveu a tal respeito, conclui-se que as conclusões 1ª a 3ª são manifestamente improcedentes, o que conduziria à rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 3ª a 6ª, a recorrente vem arguir a invalidade do julgamento e requerer a respectiva repetição, por ter havido violação do disposto no art.
328º, n.º 6 do C.P.P., que se prende com o facto de terem mediado 128 dias entre
24-6-1997, data da última sessão da audiência de julgamento e 30 de Outubro do mesmo ano, data da leitura do acórdão. De facto, é verdade que decorreram mais de 30 dias entre as audiências referidas pela recorrente, embora não 128 dias úteis. Efectivamente, o prazo referido no n.º 6 do art. 328º do C.P.P. – como, aliás, os outros mencionados nos n.º s 4 e 5 – é um prazo processual, pelo que, não havendo aqui arguidos presos, aplica-se-lhe o disposto no n.º 1 do art. 104º do mesmo Código. De onde decorre que se suspendem durante as férias os prazos judiciais respeitantes aos processos criminais, por força do preceituado no art.
144º, n.º 3, do Cód. Proc. Civil na redacção anterior à que lhe foi dada pelo Dec.- Lei n.º 329-A/95, de 12-12, mantido em vigor pelo art. 6º, n.º 3 deste
último diploma e aplicável “ex vi” do citado n.º 1 do art. 104º do C.P.P.. Assim sendo, a leitura do acórdão recorrido devia ter-se verificado até
03-10-1997, sendo certo que só ocorreu em 30-10-1997 – v. fls. 3 201 a 3 203. No entanto, apesar de se constatar que houve excesso do prazo legal, não se verificou qualquer nulidade, mas sim mera irregularidade processual. Na realidade, para haver nulidade de um acto processual é necessário que a lei a comine de forma expressa, como dispõe o n.º 1 do art. 118º do C.P.P.. E tal não ocorre relativamente ao caso previsto no n.º 6 do art. 328º do C.P.P.. Tratar-se-ia, assim, “in casu”, de mera irregularidade – v. o n.º 2 do citado art. 118º –que deveria ter sido arguida pela recorrente no próprio acto, ou seja, na audiência de 24-6-1997, onde foi proferido o despacho de adiamento daquela para lá dos 30 dias legais, como dispõe o n.º 1 do art. 123º do C.P.P., e sendo certo que se encontravam presentes naquela audiência o legal representante e o mandatário da recorrente – v. fls. 3 113 a 3 118. Não tendo sido feita a referida arguição, a recorrente não pode, fora do prazo legal, vir, em sede de recurso, utilizá-la para provocar a declaração de nulidade do julgamento ou, ao menos, a sua repetição – cfr. o acórdão deste S.T.J., de 31-10-1991, in B.M.J. 410-422. Logo, as conclusões 3ª a 6ª são manifestamente improcedentes, o que determinaria a rejeição do recurso, nos termos do art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. E, diz-se determinaria a rejeição, porque, rigorosamente, antes desse fundamento ocorre o decorrente da falta de indicação dos elementos constantes da al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P. relativamente à norma indicada como violada, ou seja, a do art. 328º, n.º 6, daquele diploma. Nas conclusões 7ª e 8ª, a recorrente vem alegar a inconstitucionalidade do Dec.- Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, porque foi promulgado e referendado para além do prazo de validade da respectiva autorização legislativa e porque viola o objecto, sentido e extensão da referida autorização, havendo, em qualquer caso, inconstitucionalidade orgânica. Trata-se, obviamente, de questões de direito, em relação às quais a recorrente não concretizou, de forma clara, os elementos referidos nas als. a) e b) do n.º
2 do art. 412º do C.P.P.. E isto seria, desde logo, motivo para rejeitar o recurso – art. 420º, n.º 1, do mesmo diploma. Ainda que assim não fosse, a verdade é que tem sido jurisprudência unânime do Tribunal Constitucional a de que “momento relevante para saber se foi utilizada uma autorização legislativa durante o prazo de vigência da mesma é o da aprovação em Conselho de Ministros” (o sublinhado é nosso), como se diz no acórdão n.º 206/94, de 2-3-1994, in “Acórdãos do Tribunal Constitucional”, vol.
27º, 525 – v. também o acórdão do mesmo T. C. n.º 121/93, de 14-1-1993, in B.M.J. 423-93. De facto, parece evidente que o Governo cumpre a sua acção legislativa, devidamente autorizado pela Assembleia da República, nos casos de reserva relativa da competência desta na mesma matéria – v. art. 165º da C.R.P. da 4ª revisão constitucional – quando aprova em Conselho de Ministros o respectivo diploma legal. Portanto, não há que buscar em qualquer acto posterior ao da referida aprovação
– promulgação, referendo ou publicação do diploma – o culminar do processo legislativo. A aprovação do diploma pelo Governo é que releva para o efeito e, se tiver tido lugar dentro do prazo da autorização legislativa, o mesmo não padece de inconstitucionalidade orgânica.
“In casu”, foi a Lei n.º 12/83, de 24 de Agosto, que concedeu autorização legislativa ao Governo, nomeadamente, em matéria de infracções antieconómicas e contra a saúde pública – v. art. 1º, al. a). Segundo o art. 5º desta Lei, a referida autorização caducava se não fosse utilizada dentro do prazo de 120 dias. Ora, esta Lei entrou em vigor em 25 de Agosto de 1983, como se vê do seu art. 6º e o Dec.-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, que usou a mencionada autorização legislativa, foi aprovado em Conselho de Ministros de 6 de Dezembro de 1983, ou seja, no 103º dia a contar da entrada em vigor da Lei n.º 12/83, pelo que aquela autorização foi exercida dentro do prazo que esta Lei concedeu ao Governo. Por outro lado, o Governo conteve-se dentro dos limites que lhe foram demarcados ao aprovar o Dec.- Lei n.º 28/84. Assim, não obstante a recorrente não concretizar o que alega na conclusão 8ª, o que seria motivo para rejeitar o recurso, neste particular, por não resumir as razões do pedido – como já várias vezes se disse – face ao disposto nos art.s
412º, n.º 1, e 420º, n.º 1, do C.P.P. – o certo é que o que está em causa são os novos tipos de normas criadas pelo Dec.- Lei n.º 28/84 – fraude na obtenção de subsídio ou subvenção e desvio de subvenção, subsídio ou crédito bonificado
(art.s 36º e 37º). Ora, a este respeito dispõe o art. 1º da Lei n.º 12/83, o seguinte:
“É concedida ao Governo autorização legislativa para alterar os regimes em vigor, tipificando novos ilícitos penais e contravencionais, definindo novas penas, ou modificando as actuais, tornando para o efeito, como ponto de referência, a dosimetria do Código Penal, nas seguintes áreas: a) Em matéria de infracções antieconómicas e contra a saúde pública;
......................................................................................................” Ora, ao criar os referidos novos ilícitos criminais – v. os n.º s 3 e 6, al. l), do preâmbulo do Dec.- Lei n.º 28/84 – que são crimes contra a economia – v. a Subsecção II da Secção II do Capítulo II do mesmo diploma – este contém-se totalmente dentro dos limites da respectiva autorização legislativa, não se percebendo como é que se possa afirmar o contrário. Portanto, o Decreto-lei n.º 28/84 não padece de qualquer inconstitucionalidade orgânica, nomeadamente no que se refere aos aspectos acabados de tratar neste acórdão – v. os acórdãos deste S.T.J., de 19-9-1996 (processo n.º 48.891 – 3ª Secção) e de 15-10-1997 (processo n.º 1.316/96 – 3ª Secção), in “Sumários”, 3-56 e 14-142, respectivamente. Assim, as conclusões 7ª e 8ª, são manifestamente improcedentes, o que ainda seria motivo para rejeitar o recurso – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. f) – recurso do arguido L.: Nas conclusões 1ª a 3ª, o recorrente começa por pedir a correcção do acórdão recorrido, nos termos do art. 380º, n.º 2, do C.P.P., por nenhuma referência ser feita à contestação por ele apresentada na parte em que indica sumariamente as conclusões contidas na contestação de cada um dos arguidos. De facto, o recorrente tem razão, pois, como se vê de fls. 3 155 a 3 158, o acórdão recorrido não descreveu no relatório, de forma sumária, as conclusões contidas na contestação daquele. Assim, nos termos da al. a) do n.º 1 do art. 380º do C.P.P., há lugar à correcção do referido acórdão nomeadamente depois de ter subido o recurso, como
é o caso, face ao disposto no n.º 2 daquele artigo. Portanto, corrigindo o acórdão recorrido, na parte respeitante ao relatório – art. 374º, n.º 1, al. d), do C.P.P. – acrescenta-se ao mesmo que o arguido L., na sua contestação de fls. 2 036 a 2 040, negou a prática do crime que lhe é imputado, e, para o caso de ser condenado, terá de o ser apenas como cúmplice, com a atenuação especial prevista no art. 27º, n.º 2, do Cód. Penal. Feita esta correcção, há que dizer que ela é perfeitamente inócua em termos de apreciação do presente recurso. Nas conclusões 4ª a 6ª, o recorrente vem impugnar o enquadramento jurídico-penal da sua conduta, alegando que deveria ter sido absolvido, por a tentativa não ser punível no caso de cumplicidade. Assim, o recorrente coloca uma questão de direito se bem que em termos de total confusão e de nenhuma clareza de exposição. Devia ter cumprido o disposto no art. 412º, n.º 2, do C.P.P., mas não o fez, pelo que o recurso tem de ser rejeitado nesta parte. Mesmo que assim não fosse, a verdade é que não se entende o que o recorrente vem dizer, ao alegar que deveria, teoricamente, ser condenado pela prática de um crime de fraude na obtenção de subsídio na forma tentada e sob a forma de cumplicidade. De facto, o recorrente foi apenas condenado como cúmplice de um único crime de fraude na obtenção de subsídio p. e p. pelos art.s 36º, n.º 1, al. c), n.º 2, n.º 5, al. a), e n.º 8, al. a), todos do Dec.-Lei n.º 28/84, de 20-1, com referência aos art.s 27º e 74º do Cód. Penal (de 1982), pelo que não se percebe, nem o recorrente o explica, porque é que havia de ser condenado nos termos que refere. De resto, ou se é cúmplice de um facto criminoso ou se pratica actos de execução do mesmo facto.
É que o cúmplice é aquele que, dolosamente e por qualquer forma, presta auxílio material à prática por outrem, dizemos, material ou moral à prática por outrem de um facto doloso – v. o art. 27º, n.º 1, dos Cód. Penais de 1982 e de 1995 podendo, portanto, dizer-se que sem aquele auxílio o crime teria sido também cometido, embora, então o fosse por modo, em tempo, lugar ou circunstâncias diversas, como diz Eduardo Correia in “Direito Criminal”, II, ed., de 1965, 251. Por sua vez, na tentativa o agente pratica actos de execução de um crime que decidiu cometer sem que este chegue a consumar-se – v. art. 22º, n.º 1, dos Cód. Penais de 1982 e de 1995. Assim, não faz sentido o que o recorrente alega, pelo que as conclusões 4ª e 6ª são também manifestamente improcedentes, o que determinaria a rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P. Na conclusão 7ª, o recorrente impugna a medida da pena, se bem que, de novo, em termos muito confusos e até em contradição com o que diz nas conclusões 5ª e 6ª quanto à punibilidade, em simultâneo, da tentativa e da cumplicidade. Trata-se, mais uma vez, de questão de direito, em que o recorrente se limita a indicar as normas, violadas, mas não o sentido em que o Tribunal recorrido as interpretou ou com que as aplicou nem o sentido em que elas deviam ter sido interpretadas ou com que deviam ter sido aplicadas. Logo, houve violação do disposto na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., com a consequente rejeição do recurso nesta parte. Ainda se dirá que, como já se salientou, não era possível condenar o recorrente, simultaneamente, como cúmplice e como autor do crime em causa sob a forma de tentativa, para assim proceder a uma dupla atenuação especial – art.s 23º, n.º
2, e 27º, n.º 2, do Cód. Penal. Também não se provou que o recorrente tenha mantido boa conduta. Assim, neste particular, o recurso é igualmente manifestamente improcedente, pelo que teria de ser rejeitado nesta parte – art. 420º, n.º 1 do C.P.P. Na conclusão 8ª, o recorrente volta a falar na medida da pena, ao dizer que ela foi incorrectamente graduada, bem como na suspensão da sua execução, que devia ter sido decretada. Trata-se ainda de questões de direito, em que o recorrente refere ter havido violação do disposto nos art.s 40º e segs. e 50º do Cód. Penal – passando agora, sem explicação, para o diploma de 1995 – sem que concretize os números daqueles normativos que considera concretamente violados, nem os art.s seguintes ao art.
40º nas mesmas condições. E esta especificação era necessária face ao disposto na al. a) do n.º 2 do art.
412º do C.P.P., pelo que, sem ela, o recurso tem de ser rejeitado nesta parte – v. o acórdão deste S.T.J., de 9-10-1996 (processo n.º 736/96 – 3ª Secção) in
“Sumários”, 4-73. Por outro lado, também o recorrente não cumpriu o preceituado na al. b) do n.º 2 do citado art. 412º, pelo que seria, igualmente, rejeitado nesta parte, por este motivo. Finalmente, o recorrente não explica, nesta conclusão, atendendo às violações do direito que indica, porque é que o acórdão recorrido graduou incorrectamente a pena e porque é que devia tê-la declarado suspensa na sua execução. A este propósito, faltam, pois, as razões do pedido, o que ainda seria motivo para rejeitar o recurso nesta parte – art.s 412º, n.º 1, e 420º, n.º 1, do C.P.P.. g) – recurso do arguido G.: As oito primeiras conclusões deste recurso são totalmente iguais, palavra por palavra, às conclusões da recorrente N. – v. a antecedente al. e). Logo, são aqui integralmente pertinentes as razões ali invocadas para a rejeição do recurso. Apenas se esclarece que o recorrente e o seu mandatário se encontravam presentes na audiência de 24-6-1997, altura em que foi proferido o despacho de adiamento daquela para além de 30 dias legais – v. fls. 3 113 a 3
118. Portanto, relativamente às conclusões 1ª a 8ª, o recurso tem de ser rejeitado. Por seu turno, as conclusões 9ª a 11ª são também totalmente iguais às conclusões
1ª a 3ª do recorrente L.. Ora, neste caso, o recorrente tem também inteira razão pois, como se vê de fls.
3 115 a 3 158, o acórdão recorrido não descreveu no relatório, de forma sumária, as conclusões contidas na contestação daquele. Assim, nos termos da al. a) do n.º 1 do art. 380º do C.P.P., há que fazer a correcção do referido acórdão, face ao disposto no n.º 2 daquele art.. Portanto, corrigindo o acórdão recorrido na parte respeitante ao relatório – art. 374º, n.º 1, al. d), do C.P.P. – acrescenta-se ao mesmo que o arguido G., na sua contestação de fls. 2 345 a 2 348, negou a prática do crime que lhe foi imputado, pelo que concluiu pedindo a sua absolvição. Feita esta correcção, há que dizer, aqui também, que ela é perfeitamente inócua quanto à apreciação do presente recurso. Nas conclusões 12ª a 16ª, o recorrente vem invocar a nulidade do acórdão recorrido, nos termos do art. 379º, al. a), do C.P.P., por violação do disposto no art. 374º, n.º 2, do mesmo Código, na medida em que aquele acórdão apenas enumerou os meios de prova que serviram para formar a convicção do tribunal, omitindo, porém, a fundamentação do valor probatório atribuído a cada um daqueles meios e a relação entre cada um destes e os factos dados como provados. Trata-se de uma questão de direito processual pelo que o recorrente devia ter dado integral cumprimento ao disposto na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P. em relação à norma que indicou como violada, ou seja, o art. 374º, n.º 2, do mesmo diploma. No entanto, quanto a este normativo, o recorrente limitou-se a dizer o sentido em que, no seu entendimento, o mesmo devia ter sido interpretado, omitindo, pois, o sentido em que, no seu entender, o tribunal recorrido interpretou o mesmo normativo. Logo, o recurso tem de ser rejeitado quanto às conclusões 12ª a 16ª. Acresce que, na conclusão 15ª, o recorrente vem alegar a inconstitucionalidade do art. 410º, n.º 2, do C.P.P., por violar o art. 32º, n.º 1, da C.R.P., na interpretação de que basta a enumeração dos meios de prova para a fundamentação da decisão de facto, sem que, no entanto, se perceba ao que vem chamado ao caso o referido art. 410º, n.º 2, do C.P.P., que se reporta aos vícios da decisão sobre a matéria de facto. Logo, esta conclusão é incompreensível e, portanto, manifestamente improcedente, o que determinaria a rejeição do recurso nesta parte. Por outro lado, o tribunal colectivo não é obrigado, por força do disposto no art. 374º, n.º 2, do C.P.P., ou em qualquer outro normativo, a fazer uma apreciação crítica das provas, em ordem a permitir a sua apreciação por este S.T.J. – v. o acórdão deste S.T.J., de 20-3-1995, in B.M.J. 445-335. E também nem aquele art. 374º, n.º 2, do C.P.P. nem qualquer outro preceito legal exige que se relacionem os meios de prova com cada um dos factos que o tribunal tenha considerado provados, pois não se pode esquecer que o C.P.P. de 1987 acabou com o anterior sistema de formulação de quesitos sobre a matéria de facto e de necessidade de resposta aos mesmos – v. o acórdão do S.T.J. acima acabado de citar. O art. 374º, n.º 2, do C.P.P. não impõe, pois, mais que uma exposição concisa dos meios de prova que foram relevantes para a formação da convicção do tribunal na decisão sobre a matéria de facto. De facto, tanto basta para se cumprir a razão de ser daquele normativo, ou seja, para haver a certeza de que o tribunal não se socorreu de elementos não permitidos, para que possa ser feito um controlo no sentido do conhecimento dos que foram utilizados pelo tribunal, como se diz no acórdão deste S.T.J., de 7-7-1993, in B.M.J. 429-697 – v. ainda os acórdãos deste S.T.J., de 10-7-1996 (processo n.º 48 280 – 3ª secção) e de
19-9-1996 (processo n.º 651/96 – 3ª secção), in “Sumários”, 3-52 e 59, respectivamente. Ora, “in casu”, o tribunal recorrido cumpriu o que o art. 374º, n.º 2, do C.P.P. determina, indicando os meios de prova em que se fundou a sua convicção – v. fls. 3 184 a 3 186 – pelo que aquele normativo não foi violado. Daí que não ocorra aqui a nulidade do art. 379º, al. a), do C.P.P.. Logo, as conclusões 12ª a 16ª são manifestamente improcedentes, pelo que o recurso teria de ser rejeitado também por este motivo -–art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Finalmente, as conclusões 17ª a 21ª são completamente iguais às conclusões 4ª a
8ª do recorrente L.. Assim, também são aqui integralmente pertinentes as razões que ali se invocaram para a rejeição do recurso nesta parte, não havendo nada mais a acrescentar. Portanto, o recurso, quanto às indicadas conclusões, tem de ser rejeitado. h) – recurso da arguida H.: Antes de mais, esta recorrente apresentou como conclusões um longo texto com 26 artigos, que ocupam mais de três folhas. Portanto, também esta recorrente não foi capaz de resumir as razões do pedido, apresentando para o efeito um texto a que melhor caberia a designação de verdadeira motivação. Logo, as referidas conclusões não podem como tal ser consideradas, por violação do n.º 1 do artigo 412º do C.P.P., remetendo-se para tudo o que a este respeito foi dito quanto ao recurso dos arguidos C. e outros. A falta de conclusões constitui ainda um caso de falta de motivação, o que leva
à rejeição do recurso, nos termos dos art.s 412º, n.º 1, e 420º, n.º 1, do C.P.P.. Mesmo que assim não fosse, o certo é que outras razões existem que conduziriam, igualmente, à rejeição do recurso. A matéria das conclusões 1ª e 2ª, relativa ao indeferimento do requerimento da recorrente no sentido de o co-arguido M. ser admitido a prestar depoimento como testemunha, foi objecto de recurso interlocutório interposto pela recorrente, o qual já foi anteriormente apreciado, pelo que não há que voltar a apreciar esta matéria. Nas conclusões 3ª a 5ª, a recorrente vem arguir a nulidade do acórdão recorrido, prevista no art. 379º, al. a), do C.P.P., por violação do disposto no n.º 2 do art. 374º do mesmo Código. Trata-se de questão de direito processual, pelo que a recorrente devia ter dado cabal cumprimento ao preceituado no art. 412º, n.º 2, do C.P.P.. Todavia, por um lado, a recorrente não especificou a parte do n.º 2 – que contém vários itens – do art. 374º do C.P.P. que considera ter sido violada pela decisão recorrida. É certo que ela fala em meios de defesa, de forma vaga e imprecisa, mas estes não constam daquele normativo e a recorrente não os concretizou, limitando-se a referir factos, mas isto é coisa diversa. Ora, tal especificação era necessária face ao disposto na al. a) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., pelo que, sem ela, o recurso teria de ser rejeitado nesta parte – v. o acórdão citado a este respeito na apreciação do recurso do arguido L.. Por outro lado, a respeito da norma indicada como violada, a recorrente não cumpriu o disposto na al. b) do n.º 2 do citado art. 412º, pelo que teria o recurso de ser rejeitado também por este motivo. Finalmente, dado que não se percebe muito bem o que é que a recorrente pretende acerca da matéria em apreço, e uma vez que o acórdão recorrido até deu a contestação daquela como reproduzida na íntegra – v. fls. 3.158 – as conclusões
3ª a 5ª são manifestamente improcedentes, o que determinaria também a rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Na conclusão 6ª, vem a recorrente invocar a nulidade prevista no art. 379º, al. a), do C.P.P. também por violação do art. 374º, n.º 2, do mesmo diploma, por falta de exposição concisa dos motivos de facto que fundamentam a decisão proferida no acórdão sob recurso. Porém, por um lado, não foi cumprido o que dispõe a al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P. no que concerne à norma indicada como violada. E, por outro lado, como se esclareceu a respeito do recurso do arguido G., o que o art. 374º, n.º 2, do C.P.P. impõe é apenas uma exposição concisa dos meios de prova que foram considerados relevantes para a formação da convicção do tribunal na decisão respeitante à matéria de facto. Remete-se, pois, para o que ali se disse. Logo, o recurso é manifestamente improcedente quanto à conclusão 6ª, pelo que seria de rejeitar nesta parte, caso se não considerasse o motivo resultante da violação do art. 412º, n.º 2, al. b), do C.P.P. para essa mesma rejeição – v. o art. 420º, n.º 1, do mesmo diploma. Nas conclusões 7ª a 9ª, a recorrente vem arguir a nulidade prevista no art.
379º, al. b), do C.P.P. por, no seu entender, o tribunal recorrido lhe ter aplicado uma incriminação mais gravosa, ou seja, a prática de um crime de fraude na obtenção de subsídio na sua forma consumada, quando ela só foi acusada da prática desse crime na forma tentada, sem que lhe tivesse sido dada oportunidade de defesa quanto a essa alteração e violando-se, assim, entre outros, os art.s
1º, al. f), e 359º, n.º s 1 e 2, do C.P.P.. Trata-se de questão que está hoje resolvida, no sentido que a recorrente indica, pelo acórdão do T. Constitucional (n.º 445/97), de 25-6-1997, publicado no D.R., I-A série, de 5-8-1997, cuja doutrina tem força obrigatória geral. No entanto, a recorrente não tem qualquer razão quando pretende a aplicação daquele acórdão do T. C. ao seu caso. De facto, ela foi pronunciada pela prática, em co-autoria, de sete crimes de fraude na obtenção de subsídio na forma tentada e veio a ser condenada pela prática, em co-autoria material, de um único crime daquele tipo legal na forma de cumplicidade – v. fls. 1 024, 3 193 e 3 194.
É óbvio, pois, que esta diferente qualificação jurídica conduziu à condenação da recorrente em pena menos grave – v. os art.s 23º, n.º 2, 27º, n.º 2, e 74º do Cód. Penal de 1982 e 23º, n.º 2, 27º, n.º 2, e 73º do Cód. Penal de 1995 – pelo que não tem aqui aplicação o citado acórdão do T.C.. Logo, as conclusões 7ª a 9ª são manifestamente improcedentes, o que levaria á rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 10ª a 12ª, a recorrente vem alegar a inconstitucionalidade orgânica do Dec.- Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro (e não 26-1 como ela diz) nos mesmos termos da alegação da recorrente N. a este respeito. A questão é, como ali se disse, de direito, mas a recorrente não cumpriu o disposto na al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P. em relação às normas que indicou como violadas – art.s 5º da Lei n.º 12/83, de 24-8 e 168º, n.º 2, da C.R.P., como se vê das conclusões ora sob análise e da 25ª - pelo que o recurso seria de rejeitar nesta parte. Ainda que assim não fosse, pelas razões apontadas na apreciação do recurso da arguida N., as mesmas conclusões, nomeadamente a 12ª que é totalmente incompreensível face ao disposto no art. 1º, al. a), da Lei n.º 12/83, de 24-8, são manifestamente improcedentes, pelo que o recurso seria de rejeitar nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 13ª a 18ª, a recorrente impugna a medida da pena por entender que lhe deve ser aplicada uma tripla atenuação especial, decorrente de cumplicidade, tentativa e decurso de muito tempo sobre a prática do crime. Trata-se, mais uma vez, de questão de direito, em que a recorrente, quanto às normas que indicou como violadas – v. a conclusão 25ª - com correspondência nas presentes conclusões e que, ao fim e ao cabo, é só o art. 73º do Cód. Penal
(presume-se que seja o de 1995), não indicou os elementos constantes da al. b) do n.º 2 do art. 412º do C.P.P., pelo que o recurso é de rejeitar nesta parte. Por outro lado, a matéria das presentes conclusões foi já apreciada a respeito do recurso do arguido L., não se tendo também provado que a recorrente tenha mantido boa conduta – v. as conclusões 4ª a 7ª daquele recurso. Assim, porque são pertinentes, no presente caso, as razões ali invocadas, para as quais remetemos, conclui-se que as conclusões 13ª a 18ª são manifestamente improcedentes, o que determinaria a rejeição do recurso nesta parte – art. 420º, n.º 1, do C.P.P.. Nas conclusões 19ª a 22ª, a recorrente volta a impugnar a medida da pena, agora no que concerne às circunstâncias atenuantes de carácter geral.
É ainda questão de direito, mas a recorrente não cumpriu o disposto no n.º 2 do art. 412º do C.P.P., pelo que o recurso teria ainda de ser rejeitado por este motivo. O mesmo defeito ocorre a respeito das conclusões 23ª e 24ª, em que a recorrente manifesta a pretensão de ser declarada a suspensão da execução da pena que lhe viesse a ser aplicada. Logo, o recurso tem de ser rejeitado no que concerne às conclusões 23ª e 24ª. Na conclusão 25ª, a recorrente volta a referir as normas violadas, que já foram apreciadas anteriormente. Resta só acrescentar que os art.s 22º e 72º do Cód. Penal (este último por falta de especificação de números e alíneas) não foram indicados no texto da motivação como normas violadas e também não foram reportados concretamente às conclusões anteriores. E esta actuação, como já se disse várias vezes, constitui violação do disposto na al. a) do n.º 2 do art.
412º do C.P.P., o que determinaria a rejeição do recurso nesta parte. Quanto ao art. 32º, n.º 1, da C.R.P., que foi mencionado nas conclusões 7ª a 9ª, pelo que aí se disse, não foi violado, pois “in casu”, não foram postas em causa as garantias de defesa da recorrente. Logo, a referida violação está abrangida pela manifesta improcedência das conclusões 7ª a 9ª. E o mesmo se tem de dizer a respeito da interpretação dos art.s 359º, n.º s 1 e
2, e 379º, al. b), do C.P.P. mencionada na conclusão 26ª.
3. Pelo exposto, acorda-se em rejeitar todos os recursos. Condena-se cada um dos recorrentes, individualmente considerados, nas custas, com 2 Ucs de taxa de justiça, e no pagamento de 4Ucs, nos termos do n.º 4 do art. 420º do C.P.P..»
2. Indeferidos, por acórdão de 26 de Novembro de 1998, os pedidos de esclarecimento, de aclaração, de reforma e de correcção feitos por alguns dos arguidos, interpuseram os arguidos indicados o presente recurso para o Tribunal Constitucional. Os recorrentes A. e B., concluem da seguinte forma as suas alegações
(apresentadas conjuntamente) produzidas neste Tribunal:
“a) Da inconstitucionalidade material do art. 420º, n.º l, do CPP, com a interpretação com que foi aplicado na decisão recorrida (6ª questão): i) para rejeitar os recursos interpostos pelos recorrentes o STJ afirmou, sucessivamente, (a) falta de concisão das conclusões, que equiparou a ausência de motivação; (b) falta de indicação no texto da motivação de algumas das normas jurídicas afirmadas violadas; e (c) manifesta improcedência dos fundamentos dos recursos; ii) a interpretação propugnada pelo STJ das causas de rejeição de recurso de que lançou mão constitui limitação desproporcionada das garantias de defesa, restringindo o direito de recurso e nessa medida o direito de acesso à justiça; porquanto. iii) a falta de concisão das conclusões da alegação não deve determinar a rejeição do recurso, mas convite ao aperfeiçoamento da deficiência; iv) a falta de indicação das normas violadas no texto da motivação não está tipificada como causa de rejeição do recurso penal, indo tal interpretação para além do texto; v) inexiste manifesta improcedência quando o STJ se vê na obrigação de fundamentar exaustivamente as razões do seu entendimento (ambos os recursos) ou quando a tese do recurso (interposto da decisão interlocutória), dita manifestamente improcedente, foi, em data posterior à apresentação do recurso e anterior à decisão recorrida, acolhida pelo próprio STJ que declarou a invocada prescrição do procedimento criminal, em caso análogo; vi) pelo que é inconstitucional a norma constante do art. 420º, n.º 1, do Código de Processo Penal quando interpretada no sentido da falta da concisão das conclusões da motivação levar à rejeição imediata do recurso, sem que previamente seja feito convite ao recorrente para aperfeiçoar a deficiência, por violação do art. 32º, n.º 1, da Constituição; vii) como é inconstitucional a norma constante do art. 420º, n.º l, do Código de Processo Penal quando interpretada no sentido de a falta da indicação das normas jurídicas violadas, no texto da motivação, levar à rejeição imediata do recurso, por não comportar qualquer artigo da lei processual penal tal entendimento, por violação das garantias de defesa e do duplo grau de jurisdição consagrados no art. 32º, n.º 1, da Constituição; b) Da inconstitucionalidade material do art. 355º, n.º 1, do CPP, com a interpretação com que foi aplicado no acórdão de 1ª instância e referendado no acórdão recorrido (1ª questão): i) O tribunal de julgamento valorou o depoimento de quatro testemunhas de acusação não inquiridas na fase de julgamento, e sem que se verificasse a hipótese consagrada no art. 356º do CPP, bem como valorou um conjunto de documentos constituído por 8 apensos e 3 anexos, que nunca foram notificados, lidos, referidos ou examinados, em audiência ou fora dela; ii) pelo que efectuou uma interpretação e aplicação da norma do art. 355º, n.º
1, do CPP que exclui qualquer situação de reciprocidade dialéctica do arguido face à acusação, permitindo-se considerar meios e elementos de prova a que estes não acederam, nem puderam contrariar ou contraditar; iii) pelo que é inconstitucional a norma constante do art. 355º, n.º 1, do Código de Processo Penal quando interpretada no sentido de ser admissível a valoração de prova testemunhal ou documental, não produzida, examinada, reexaminada, lida ou referendada em audiência de discussão e julgamento, por violação do princípio do contraditório consagrado no art. 32º, n.º 5, da Constituição da República; c) Da inconstitucionalidade material do art. 374º, n.º 2, do CPP, com a interpretação com que foi aplicado no acórdão de 1ª instância e referendado no acórdão recorrido (2ª questão): i) o acórdão recorrido não procedeu à indicação sumária das conclusões contidas na contestação por forma que permita conhecer, sequer, se foram ponderadas a questão da inconstitucionalidade por força de desnecessidade da pretensão punitiva e própria tese da defesa; ii) o acórdão recorrido não procedeu, sequer, à indicação dos factos não provados da contestação dos recorrentes, garantindo o conhecimento de que no seu processo de decisão o tribunal considerou, deliberando sobre eles, todos os factos relevantes que pelos sujeitos processuais tenham sido colocados à sua apreciação; iii) o acórdão recorrido limitou à simples indicação do nome das testemunhas e conjunto de documentos o cumprimento do dever de fundamentação, não procedendo a qualquer exame crítico das provas ponderadas; iv) a interpretação do n.º 2 do artigo 374º adoptada pelo acórdão recorrido vem na prática inviabilizar o direito ao recurso ou a garantia de duplo grau de jurisdição em matéria de facto, e contradiz as bases em que assenta teleologicamente o dever constitucional de fundamentação das decisões judiciais, o qual representa um verdadeiro factor de legitimação do poder jurisdicional e garantia do respeito pelos princípios da legalidade, da independência do juiz e da imparcialidade das suas decisões e, principalmente, verdadeira garantia fundamental do cidadão no Estado de Direito e no Estado Social de Direito contra o arbítrio do poder judiciário; v) pelo que é inconstitucional a norma do n.º 2 do artigo 374º do Código de Processo Penal de 1987, na interpretação segundo a qual a fundamentação das decisões em matéria de facto se basta com a simples enumeração dos meios de prova utilizados em 1ª instância, não exigindo a explicitação do processo de formação da convicção do tribunal, por violação do dever de fundamentação das decisões dos tribunais previsto no art. 205º da Constituição, bem como, quando conjugado com a norma das alíneas b) e c) do art. 410º do mesmo Código, por violação do direito ao recurso consagrado no n.º 1 do artigo 32º, também da Constituição; d) Da inconstitucionalidade material dos art.s 36º, n.ºs 1, 2, 5 e 8, e 37º, n.ºs 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20-01, com a interpretação com que foi aplicado na decisão de 1ª instância recorrida (3ª questão): i) o acórdão recorrido afirmou preenchidos pelos recorrentes os tipos legais de crimes p.p. nos art.s 36º, n.ºs 1, 2, 5 e 8, e 37º, n.ºs 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20-01, apesar de existirem, à data da prática dos factos, disposições normativas de direito português (despacho do Ministro do Trabalho, de 13 de Maio de 1986) e de direito comunitário (Decisão 83/5l6/CEE, do Conselho, de 12-10-83, Regulamento n.º 2950/83, do Conselho, de 17-10-83, e Decisão 83/673/CEE, da Comissão, relativa à gestão do Fundo), impondo apenas a obrigação de restituir os adiantamentos efectuados; ii) a existência de regulamentação comunitária específica, directamente aplicável, afirmando a suficiência das reacções não penais, constitui verdadeiro ius non puniendi, não podendo o Juiz Criminal condenar por facto lícito segundo o direito comunitário, em obediência a um denominado princípio de interpretação do direito interno em conformidade com o direito comunitário; iii) a interpretação e aplicação das normas indicadas viola os princípios de danosidade social, proporcionalidade, subsidiaridade/ultima ratio e fragmentaridade do direito penal, os quais configuraram verdadeiros imperativos constitucionais a que o legislador terá de submeter-se; iv) pelo que são inconstitucionais as normas dos n.ºs 1, 2, 5 e 8 do artigo 36º, dos n.ºs 1 e 3 do artigo 37º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20-01, na interpretação segundo a qual se preenchem os respectivos tipos de crime quando falte a utilização da contribuição recebida nas condições fixadas pela decisão de aprovação da concessão, a que se apliquem os normativos da (a) Decisão
83/516/CEE, do Conselho, de 12-10-83; (b) do Regulamento n.º 2950/83, do Conselho, de 17-10-83; (c) da Decisão 83/673/CEE, da Comissão; e, (d) do Despacho do Ministro do Trabalho, de 13 de Maio de 1986, por violação dos princípios da legalidade, da necessidade e da subsidariedade da sanção penal, consagrados no art.º 29º, n.º 1, da Constituição. e) Da inconstitucionalidade material dos art.s 70º e 71º, n.ºs 1, 2 e 3, do Código Penal de 1995, com a interpretação com que foi aplicado na decisão de 1ª instância recorrida (4ª questão): i) o acórdão recorrido não considerou individualmente a culpa do arguido, nem as exigências de prevenção, não referindo expressamente quais as circunstâncias que depuseram a favor ou contra os recorrentes e que conduziram à determinação da medida concreta da pena; ii) interpretando e aplicando as disposições citadas como permitindo um tratamento unitário, comum a todos os 18 arguidos e efectuado em 15 singelas linhas, das questões da culpa, da responsabilidade, e dos fins das penas, ignorando que é a ‘culpa concreta, entendida como censura que é possível fazer ao agente por ter agido como agiu, quando podia e devia ter agido de modo diverso, o referencial fundamental para a determinação da medida da pena’; iii) quando deveria ter interpretado e aplicado tais artigos iluminado pela noção de que a raíz comum a todos eles é a dignidade da pessoa humana, verdadeira pedra angular de todo o Estado de Direito e que, por isso mesmo, vem logo à cabeça da Constituição no seu art. 1º porque concebida como referência constitucional unificadora de todos os direitos fundamentais que obriga a uma densificação valorativa que tenha em conta o seu amplo sentido normativo-constitucional. iv) pelo que são inconstitucionais as normas do artigo 70º e dos n.ºs 1, 2 e 3 do art. 71º do Código Penal de 1995, na interpretação segundo a qual a determinação da responsabilidade penal e da medida concreta da pena pode ser feita conjuntamente relativamente a vários arguidos, não exigindo a explicitação das razões atinentes a cada um dos condenados, por violação dos princípios da legalidade, consagrado no n.º 1 do artigo 29º, da pessoalidade da responsabilidade penal, consagrado no n.º 3 do artigo 30º, e da culpa consagrado ao longo de todo o articulado constitucional sobre ‘direitos, liberdades e garantias’. f) Da inconstitucionalidade material do art. 2º, n.º 4, do Código Penal, com a interpretação com que foi aplicado na decisão interlocutória de 1ª instância recorrida (5ª questão): i) o Tribunal recorrido, na decisão interlocutória proferida, afirmou que a norma contida no art. 2º, n.º 4, do Código Penal, só é aplicável em sede de determinação da medida concreta da pena, sendo inaplicável para efeitos de qualificação jurídica e, ou, de conhecimento de questões prévias invocadas; ii) quando deveria ter interpretado e aplicado tal norma como corolário da
‘consciência de que o campo de aplicação dos princípios da irretroactividade da lei penal desfavorável e da retroactividade da lei penal favorável é mais amplo do que o tradicionalmente definido e aumentando as implicações práticas destes princípios na proporção do aprofundamento e reconsciencialização das genuínas e perenes razões de garantia política e de máxima restrição possível da pena’; iii) razões que determinam a consagração daqueles princípios, também aplicáveis
às chamadas normas processuais penais materiais que regulam, v.g., o instituto da prescrição; iv) pelo que é inconstitucional a norma do n.º 4 do artigo 2º do Código Penal de
1995, na interpretação segundo a qual se excluem do seu âmbito de aplicação as normas processuais penais materiais, reservando-se a sua aplicabilidade para a questão de determinação da medida concreta da pena, por violação dos princípios da legalidade e da aplicação retroactiva da lei penal mais favorável, consagrados nos n.º 1 e 4, parte final, do artigo 29º da Constituição.” Por sua vez, os recorrentes C., D., E. e F. remataram as suas alegações do modo que se segue:
“1.
1.1 – O processo penal de um Estado de Direito há-de cumprir dois objectivos fundamentais: assegurar ao Estado a possibilidade de realizar o seu ius puniendi e oferecer aos cidadãos as garantias necessárias para os proteger contra os abusos que possam cometer-se no exercício do poder punitivo, designadamente contra a possibilidade de uma sentença injusta.
1.2 – O Acórdão sob recurso deixou de conhecer de uma inconstitucionalidade existente no Acórdão recorrido. E, ainda que oficiosamente (art. 204º da C.R.P.), deveria reparar. De facto,
1.3 – ao condenar os arguidos por dois crimes, um na forma tentada, outro na forma consumada, procedeu à violação constitucional da dupla valoração da alegada conduta criminal. E procedeu a uma interpretação inconstitucional violadora do art. 29º, n.º 5, da C.R.P., por força de uma interpretação desconforme ao constante do art. 30º C.P., que é princípio constitucional.
2 – Deve ser declarada a inconstitucionalidade material do, ao tempo em vigor, art. 287º, n.º 1, do C.P.P., uma vez que o mesmo é violador do art. 32º da Constituição, concretamente do princípio aí consagrado de que o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa e, uma vez que são legítimas as normas processuais que impliquem um encurtamento inadmissível das possibilidades de defesa, e constituam flagrante desigualdade para as partes.
3.
3.1 – A norma do art. 420º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na interpretação que lhe foi dada na decisão recorrida, no sentido de que os recorrentes apresentam como conclusões um longo texto com 28 artigos, que ocupam quatro folhas, não tendo sido capazes de resumir as razões do seu pedido, daí que tais conclusões, antes verdadeiras motivações, não poderem como tal ser consideradas, e a falta de conclusões equivale à falta de motivação, o que conduz à rejeição do recurso, deve ser julgada inconstitucional por violação do art.º 32º, n.º 1,
2ª parte, da Constituição.
4.
4.1 – A norma do art.º 412º, n.º 2, do Código de Processo Penal, com a interpretação com que foi aplicada e referenciada no acórdão recorrido, com a cominação de imediata rejeição do recurso penal quando não cumpridos os requisitos das suas alíneas a), b), e c), pelas conclusões formuladas, contrariamente ao que prevê o art.º 690º, n.º 4, do C.P.C., para o caso análogo
(violação do seu n.º 2), viola o direito de acesso aos Tribunais para defesa dos direitos e interesses legalmente protegidos, previstos no art.º 20º, n.º 1, da Constituição, na medida em que, estando o direito ao recurso previsto na Lei Constitucional (art.º 32º, n.º 1, 2ª parte, da Constituição), o viola a ele,
4.2 – bem como viola o direito ao exercício de todas as garantias de defesa
(art.º 32º, n.º 1, 1ª parte, da Constituição), uma vez que se em direito processual civil, ou mesmo no art.º 75º-A, n.º 5, da Lei do Tribunal Constitucional se permite um meio processual de aperfeiçoamento das conclusões, tal direito não pode ser negado ao arguido em processo crime, mesmo que só em relação à matéria de direito, sob pena de se prejudicar ou, como no caso, precludir o direito ao exercício da defesa do recurso.
4.3 – A interpretação do art.º 412º, n.º 2, do C.P.P efectuada no douto Acórdão
é ainda inconstitucional, já que tal norma deveria ser aplicada proporcionalmente, e através de uma interpretação conforme à Constituição que tem ínsito na ideia de Estado de Direito democrático do seu art.º 2º o princípio da verdade material, que se sobrepõe a uma mera e obsessiva decisão formal como a revelada pelo Acórdão sob recurso,
4.4 – bem como viola o princípio da igualdade (art.º 13º, n.º 1, da Constituição) na medida em que, até por maioria de razão, sempre se teria de conceder ao Arguido, em processo penal, os mesmos meios de defesa que ao litigante cível, em face de os interesses do primeiro serem consideravelmente superiores ao do segundo,
4.5 – e, por último, violou ainda o art.º 18º, n.ºs 1 e 2, da Constituição, na medida em que não aplicou tal preceito com uma interpretação que respeite os preceitos constitucionais respeitantes aos direitos, liberdades e garantias, e, de forma subjectiva e discricionária, restringiu direitos, liberdades e garantias, não previstos na lei e, muito menos, na Constituição.
4.6 – bem como o disposto no art.º 204º da Constituição, uma vez que o tribunal aplicou normas com uma interpretação que infringe o disposto na Constituição bem como os preceitos nela consignados, como sejam todos os acima referidos.
5 – A interpretação do art.º 412º, n.º 2, e do art.º 420º, n.º 1, ambos do C.P.P., e nos termos em que o fez o douto Acórdão sob recurso, é ainda inconstitucional, uma vez que viola claramente o estatuído no art.º 6º, n.º 1, da Convenção Europeia dos Direitos do Homem na parte em que esta impõe que qualquer pessoa tem direito a que a sua causa seja examinada de um modo EQUITATIVO.
6 – Sendo que as normas desta Convenção Europeia devem ser aplicadas no direito interno português (artigo 16º, n.º 1, da Constituição)
7 – A interpretação dada aos artigos referidos na conclusão 5ª, e nos termos em que o faz o douto Acórdão sob recurso, mais não é do que uma interpretação arbitrária, discricionária ou caprichosa, de todo em todo imotivável, e assente em critérios subjectivos, não susceptíveis de qualquer controlo.” Também o recorrente G. apresentou alegações de recurso, as quais concluiu dizendo:
“1) Os artigos 669º, n.º 2º, alínea a), e 690º, n.º 4, do CPC, e artigos 412º e
420º CPP, na interpretação que delas fizeram os doutos Acórdãos em causa ao rejeitar o recurso, ao não convidar o recorrente a aperfeiçoar as suas conclusões, e ao não reformar a decisão ilegal que antes já se pronunciara nesse sentido, são inconstitucionais por violarem o artigo 32º, n.º 1, da Constituição, que determina que o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa, e o artigo 20º, n.º 1, da Constituição, na parte em que determina que a todos é assegurado o acesso ao direito e aos tribunais para defesa dos seus direitos e interesses legalmente protegidos;
2) São inconstitucionais, por violarem o artigo 32º, n.º 1, da Constituição, os artigos 374º, n.º 2, e 410º, n.º 2, do CPP, na interpretação que sustenta bastar a enumeração dos meios de prova para a fundamentação da decisão de facto;
3) O Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, é inconstitucional porque promulgado e referendado para além do prazo de validade da autorização legislativa consubstanciada na Lei n.º 12/83, de 24 de Agosto;
4) É inconstitucional também porquanto viola o objecto, sentido e extensão da autorização legislativa definida na Lei n.º 12/83, de 24 de Agosto, tal como determina o artigo 168º, n.º 2, da Constituição, sendo certo que em qualquer caso deve ser substituído o douto acórdão recorrido por outro que declare o Dec.-Lei n.º 28/84 organicamente inconstitucional.” A recorrente H. defendeu em conclusão:
“1. O artigo 412º, n.º 1, do Código de Processo Penal, se interpretado no sentido de não admitir conclusões que se estendam por um texto de 3 folhas e 28 artigos, ainda que de forma mais ou menos sucinta resumam a motivação, é manifestamente inconstitucional por violar o disposto no art.º 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, quando este dispõe que o processo criminal assegurará todas as garantias de defesa.
2. A alínea b) do n.º 2 do art.º 412º do Código de Processo Penal, se interpretada no sentido que ali se impõe sistematicamente, relativamente a cada conclusão do recurso, a indicação do sentido em que a norma aplicável foi interpretada e aquele em que deveria ter sido e a rejeição das conclusões e da consequente motivação e do próprio recurso em que tal não tiver sido feito, nomeadamente em casos em que na decisão recorrida nenhuma interpretação tiver recaído sobre a norma em causa, viola também as garantias de defesa que devem ser asseguradas pelo processo criminal e, consequentemente, o preceito inserto no art.º 32º, n.º 1, da Constituição.
3. A alínea a) do n.º 2 do mesmo artigo, se interpretada no sentido de que a indicação das normas violadas deve respeitar a cada uma das conclusões do recurso, é inconstitucional, porque, na prática, redundaria na inutilização da quase totalidade dos recursos interpostos nos nossos Tribunais e violaria as garantias de defesa consignadas no já citado art.º 32º, n.º 1, da Constituição.
4. O artigo 374º, n.º 2, do Cód. de Proc. Penal, se interpretado no sentido de que o que nele se impõe é apenas uma exposição concisa dos meios de prova e não os motivos de facto que fundamentam a decisão, deve ser considerado inconstitucional, por violar também as garantias de defesa contidas no art.º
32º, n.º 1, da Constituição.
5. Entre a acusação e o Acórdão da 1ª instância houve, não uma, mas duas qualificações jurídicas distintas – a transformação de sete crimes de fraude na obtenção de subsídio em um e da qualificação de tentativa daquele crime em crime consumado.
6. É inconstitucional, por violação do já citado princípio do art.º 32º, n.º 1, da Constituição, a interpretação feita do artigo 1º, alínea f), do Código de Processo Penal, em conjugação com os artigos 120º, 284º, 303º, n.ºs 2 e 3, 359º, n.ºs 1 e 2, e 379º, alíneas a) e b), do mesmo Código, de que são possíveis diferentes qualificações jurídicas dos factos descritos na acusação ou na pronúncia desde que a uma ou alguma dessas qualificações corresponda pena mais grave e não tenha sido dada ao arguido, quanto a elas, uma oportunidade de defesa, embora a pena global aplicável a todas venha a ser mais leve.
7. O Dec.-Lei n.º 28/84, de 26 de Janeiro, que criou o tipo legal do crime de fraude na obtenção de subsídio, sofre de inconstitucionalidade orgânica por ter sido promulgado, referendado e publicado e consequentemente ter adquirido a existência jurídica, já depois de decorrido o prazo da autorização legislativa contido no art.º 5º da Lei n.º 12/83, de 24 de Agosto.
8. O mesmo Dec.-Lei n.º 28/84 é ainda inconstitucional (inconstitucionalidade orgânica), por violação do art.º 168º, n.º 2, da Constituição então em vigor, porque não se conteve nos limites do âmbito material da própria autorização legislativa contida na Lei n.º 12/83, de 24-8, da Assembleia da República, já que esta autorizou o Governo a alterar o regime que se encontrava em vigor (o Dec.-Lei n.º 41.204, de 24-7-57) dentro do respectivo âmbito, mas não o autorizou a criar crimes completamente novos, que eram ignorados na nossa ordem jurídica, como foram os crimes de fraude na obtenção de subsídio e desvio de subsídio.
9. Ainda que a Assembleia da República tivesse pretendido, com a autorização legislativa contida na Lei n.º 12/83, abranger os crimes de fraude na obtenção de subsídio e desvio de subsídio, ter-se-ia, então, exprimido por forma incorrecta e defeituosa e, nesse caso, teria violado o disposto no art.º 168º, n.º 2 da Constituição, então em vigor, que lhe impunha uma definição concreta do seu objecto e a impedia de o fazer de modo vago, genérico ou flutuante como se teria de considerar ter feito nesse caso.” De igual modo notificado para produzir alegações, concluiu o recorrente I.:
“1 – A sanção ‘rejeição’ expressa no n.º 2 do art.º 412º do C.P.P. é de ‘per si’ inconstitucional.
2 – Já que ela traduz a violação de qualquer cidadão ver a causa analisada em segunda instância.
3 – Ou seja, viola entre outros os artigos 202º e 210º da C.R.P..
4 – Um recurso, em específico, quando versa sobre e tão-só o Direito jamais pode ser rejeitado com o fundamento do n.º 2 do art.º 412º do C.P.P., até porque o Direito é do conhecimento oficioso.
5 – Depois o sentido em que o Tribunal interpretou a norma consta da própria Decisão.
6 – Sempre no mínimo a interpretação desse artigo deve ser feita na seguinte forma: só na ausência do cumprimento de todas as alíneas do n.º 2 do art.º 412º do C.P.P. pode haver rejeição.
7 – Deve assim ser reconhecida a inconstitucionalidade do n.º 2 do art.º 412º do C.P.P..
8 – Ou, pelo menos, declarada inconstitucional a interpretação que o Tribunal fez de tal norma.” O recorrente J. formulou as seguintes conclusões:
“1ª – O artigo 25º, n.º 1, 2ª parte, do D.L. n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, D.L. n.º 180/96, de 25-9, aplicado no douto Ac. do S.T.J., de 28-10-98, ao determinar a inaplicabilidade da figura da Reforma da Sentença, prevista no art.º 669º, n.º 2, do C.P.C. aos recursos (tanto em processo civil como em processo penal) interpostos de decisões proferidas nos processos pendentes após a entrada em vigor do D.L. n.º 329-A/95 (a 1 de Janeiro de 1997), é inconstitucional por violação do art.º 13º, n.º 1, 18º, n.º 1 e n.º 2, 20º, n.º
1 e n.º 5, 29º, n.º 4, e 32º, n.º 1, todos da C.R.P..
2ª – O artigo 380º, n.º 1, alínea b), do C.P.P., na redacção do D.L. n.º 78/87 de 17-02 (aliás, não alterada pela Lei n.º 59/98, de 25-8), aplicado no douto Ac. do S.T.J. de 28-10-98, é inconstitucional, uma vez interpretado no sentido de que – sendo norma típica no processo penal e taxativa para os casos que não importem alteração substancial da decisão – afasta a aplicação subsidiária da reforma da sentença prevista no art.º 669º, n.º 2, do C.P.C. ex vi art.º 4º do C.P.P. em relação aos casos em que o erro manifesto da decisão importe alteração substancial da mesma. O artigo 380º, n.º 1, alínea b), do C.P.P., assim interpretado, é inconstitucional por derrogação dos art.ºs 13º, n.º 1, 18º, n.º 1 e n.º 2 e n.º
3, 20º, n.º 1 e n.º 5, 32º, n.º 1, todos da C.R.P..
3ª – O artigo 380º, n.º 2, do C.P.P é igualmente inconstitucional, quando interpretado no sentido de que – apesar de o erro que não determine ‘per si’ a modificação substancial da decisão recorrida ter sido oportunamente denunciado na motivação do recurso e reconhecido, como tal, pelo tribunal ‘ad quem’, na douta decisão tomada – se o tribunal ‘ad quem’ não proceder, antes de proferir a sua decisão, à respectiva correcção, esta não mais pode ocorrer, por se haver esgotado o seu poder jurisdicional para proceder a tal correcção. Tal norma, assim interpretada, é inconstitucional por violar o art.º 20º, n.º 1 e n.º 5, da C.R.P..
4ª – O artigo 412º, n.º 2, do C.P.P. aplicado nos doutos Acórdãos de 4 de Julho de 1998 e de 26 de Novembro de 1998, na redacção do D.L. n.º 78/87, de 17-2
(aliás mantida com a Lei n.º 59/98, de 25-8), por entender que tal norma é inconstitucional quando interpretada no sentido de que, quando norma típica do processo penal e taxativa neste, afasta o recurso subsidiário à disposição prevista no art.º 690º, n.º 4, do C.P.C., ‘ex vi’ art.º 4º do C.P.P. e, por conseguinte, o dever de o Juiz Relator proceder o convite ao Recorrente para apresentar, completar, esclarecer ou sintetizar as suas conclusões de Recurso. Tal norma, assim, interpretada, viola os artigos 13º, n.º 1, 18º, n.º 1 e n.º 2,
20º, n.º 1 e n.º 5, e 32º, n.º 1, ambos da C.R.P..
5ª – Por outro lado, o artigo 412º, n.º 2, do C.P.P. é igual e majoradamente inconstitucional, quando interpretado no sentido de que o afastamento de tal recurso subsidiário à disposição do art.º 690º, n.º 4, do C.P.C. e a exigência dos requisitos formais das suas alíneas a), b) e c) a que obedecem as conclusões sobre matéria de direito é também aplicável aos casos em que as conclusões, versando matéria de direito, são do conhecimento oficioso, como é o caso de nulidade insanável, prevista e invocada nos termos do art.º 119º, al. b), do C.P.P..
6ª – O artigo 420º, n.º 1, do C.P.P., na redacção originária do D.L. n.º 78/87, de 17-2 (hoje alterada pela Lei n.º 59/98, de 25-8), aplicado nos doutos Acórdãos do S.T.J. de 4-7-98 e de 26-11-98, por entender que tal norma é inconstitucional, quando interpretada no sentido de que, conjugada com o disposto no art.º 412º, n.º 2, do C.P.P., determina a rejeição do recurso nos casos em que, versando as conclusões sobre matéria de direito, as mesmas não cumpram as exigências impostas pelo art.º 412º, n.º 2, do C.P.P.. Tal norma, assim interpretada, viola os art.ºs 13º, n.º 1, 18º, n.º 1 e n.º 2,
20º, n.º 1, e 32º, n.º 1, da C.R.P..
7ª – O artigo 420º, n.º 1, do C.P.P. é, igual e majoradamente, inconstitucional quando interpretado no sentido exposto na conclusão anterior em relação a casos em que as conclusões em causa versem sobre matéria de direito que seja de conhecimento oficioso, como no caso da invocação de nulidade insanável nos termos do art.º 119º, n.º 1, alínea b), do C.P.P.. Esta norma, assim interpretada, viola os art.ºs 13º, n.º 1, 18º, n.ºs 1, 2 e 3,
20º, n.º 1 e n.º 5, e 32º, n.º 1, todos da C.R.P..
8ª – Do artigo 379º do C.P.P., na redacção do D.L. n.º 78/87, de 17-2 (aliás, alterado no sentido que ora se defende, pela Lei n.º 59/98, de 25-8), aplicado no douto Acórdão do S.T.J. de 26-11-98, é inconstitucional, quando sujeita à interpretação de que, sendo norma típica do processo penal e taxativa neste, no que se refere aos casos de nulidade da sentença, afasta, assim, o recurso subsidiário à disposição prevista no art.º 668º, n.º 1, alínea d), do C.P.C. ‘ex vi’ art.º 4º do C.P.P., e, por conseguinte, afasta a omissão de pronúncia do elenco dos fundamentos para a interposição de recurso penal. Tal norma, assim interpretada, viola os artigos 13º, n.º 1, 18º, n.º 2 e n.º 3,
20º, n.º 1 e n.º 5, 32º, n.º 1 e n.º 5, da C.R.P.” Notificado para responder, querendo, às alegações apresentadas, veio o Procurador-Geral Adjunto em funções no Tribunal Constitucional concluir do seguinte modo:
“1º – O acórdão recorrido não aplicou a norma constante do artigo 287º, n.º 1, do Código de Processo Penal, na sua redacção originária, não apreciando a questão suscitada – apenas no âmbito do recurso interposto da decisão final – atinente à insuficiência do prazo para requerer a abertura da instrução, por tal questão estar, nesse momento processual, claramente precludida.
2º – Do mesmo modo, a decisão recorrida não aplicou a norma constante das disposições conjugadas do artigo 1º, alínea f), do Código de Processo Penal, em conjugação com as dos artigos 120º, 204º, 303º, n.ºs 2 e 3, 359º, n.ºs 1 e 2, e
379º, alíneas a) e b), do mesmo Código com o sentido, alegadamente inconstitucional, de permitir ao tribunal do julgamento a convolação para crime mais grave – na medida em que se considerou que a última alteração de qualificação jurídica operada, relativamente às formas de um mesmo tipo legal, conduziu à condenação em pena menos grave.
3º – O acórdão proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça não aplicou as normas constantes dos artigos 355º, n.º 1, do Código de Processo Penal, dos artigos 36º e 37º do Decreto-Lei n.º 28/84 e dos artigos 70º e 71º do Código de Processo Penal, já que – por deficiências formais da motivação e conclusões – rejeitou liminarmente o conhecimento de tais questões de direito.
4º – O acórdão recorrido não aplicou o artigo 2º, n.º 4, do Código Penal com o sentido, alegadamente inconstitucional, de não ter cabimento, em sede de prazo de prescrição do procedimento criminal, a requalificação jurídica dos factos, operada pela lei nova – já que se limitou a considerar que, na pendência do processo e antes da prolação da decisão final, se deve manter a qualificação jurídica constante da pronúncia, não cabendo a meros despachos interlocutórios a antecipação do julgamento de tal matéria.
5º – Afirmando explicitamente o acórdão recorrido que foram exaustivamente apreciadas todas as questões suscitadas pelo recorrente, carece de utilidade a apreciação da questão traduzida em saber se tinha aplicação subsidiária, no domínio das nulidades da sentença em processo penal, o regime prescrito no artigo 668º, n.º 1, do Código de Processo Civil, no que toca à nulidade por omissão de pronúncia.
6º – Termos em que, pelas razões apontadas, não se deverá conhecer, nessa parte, dos recursos interpostos pelos arguidos.
7º – O Decreto-Lei n.º 28/84 não padece de inconstitucionalidade orgânica, já que o nele consignado respeitou inteiramente a respectiva autorização legislativa, a qual não tinha caducado à data da aprovação em Conselho de Ministros, pelo que, nesta parte, deverá ser julgado improcedente o recurso de constitucionalidade interposto.
8º – Não traduz violação de qualquer preceito ou princípio da Constituição a não aplicabilidade, no domínio de um processo penal já em curso, do regime de reforma substancial da sentença, inovatoriamente consagrado no processo civil como forma de suprimento de erros notórios de julgamento, num caso em que é patente que o Tribunal ‘a quo’ considera que nenhum lapso ocorreu na apreciação dos recursos, pelo que, nesta medida, deverá improceder o recurso interposto.
9º – Face à jurisprudência definida por este Tribunal no acórdão n.º 680/98, é inconstitucional a interpretação do n.º 2 do artigo 374º do Código de Processo Penal que se basta, em termos de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, com a simples enumeração dos meios de prova produzidos e considerados relevantes, pelo que, nesta parte, deverão proceder os recursos interpostos.
10º – É inconstitucional, por violação dos direitos ao recurso e de acesso aos tribunais a interpretação normativa dos n.ºs 1 e 2 do artigo 412º do Código de Processo Penal, que se traduz em considerar que a falta de concisão das conclusões da motivação do recurso ou a insuficiente ou insatisfatória especificação, no caso de recurso versando sobre matéria de direito, dos elementos constantes do n.º 2, determina a rejeição liminar do recurso, com base em tais deficiências formais, sem que se faculte ao recorrente o suprimento de tais vícios, pelo que, nesta parte, deverão proceder os recursos interpostos.
11º – Não viola qualquer preceito ou princípio da Lei Fundamental o regime constante do n.º 1 do artigo 420º do Código de Processo Penal, na sua redacção originária, enquanto faculta ao Tribunal ‘ad quem’ uma apreciação, procedimentalmente simplificada e célere, do mérito dos recursos que se consideram, perante a inconsistência ou fragilidade de argumentação jurídica do recorrente, como manifestamente improcedentes, pelo que deverão improceder os recursos de constitucionalidade interpostos, enquanto reportados a este concreto segmento normativo.”
3. Tendo os recorrentes sido notificados para responder às questões prévias relativas à delimitação do recurso, suscitadas pelo Ministério Público, fizeram-no os 1ºs, 2ºs, 4º e 6º recorrentes. Os 1ºs recorrentes invocaram que “a falta de interpretação e aplicação das normas arguidas de inconstitucionalidade” – as dos artigos 355º, n.º 1, 70º e
71º do Código de Processo Penal e 36º e 37º do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, bem como a interpretação diversa do artigo 2º, n.º 4, do Código Penal – constitui um desvio ao sentido com que foram interpretadas e aplicadas pelo tribunal de 1ª instância, e que o relevo conferido à invocação da improcedência
“constitui erro silogístico para o qual não há suporte uma vez que em causa está a falta de conhecimento dos recursos ordinários e não a sua improcedência”,
“devendo as questões ser efectivamente conhecidas”. Os 2ºs recorrentes, por sua vez, reconheceram que não se verificava “um pressuposto essencial à admissibilidade do recurso de fiscalização concreta da constitucionalidade” no que à norma do artigo 30º do Código Penal dizia respeito
– certamente por ão lhe terem feito referência no requerimento de interposição de recurso -, mantendo, no mais, mas sem outras razões, “as questões levantadas nas alegações de recurso”. A 4ª recorrente veio introduzir uma distinção na diagnosticada convolação “para incriminação menos gravosa do que a constante do despacho de pronúncia”: segundo ela teria havido uma nova qualificação quando os 7 crimes de fraude na obtenção de subsídio, por que foi pronunciada, se transformaram num único crime de fraude na obtenção de subsídio – e uma outra nova qualificação quando aqueles 7 crimes na forma tentada se volveram num único, consumado na forma de cumplicidade. Assim, embora a pena global resultante das duas novas qualificações fosse menos grave, a consideração de uma delas não o seria, pelo que se manteria a razão de ser da imputação de inconstitucionalidade ao artigo 1º, alínea f), do Código de Processo Penal, em conjugação com os artigos 120º, 284º, 301º, n.ºs 1 e 2, 359º, n.º 1, e 379º, alínea b), do mesmo Código. O 6º recorrente considerou que a aplicação, na decisão recorrida, do artigo
412º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, “ao invés de se aplicar o artigo
690º, n.º 4, do C.P.C., ex vi artigo 4º do C.P.P.”, constitui “lapso manifesto”, acrescentando que “a arguição da inconstitucionalidade do artigo 380º, n.º 1, al. b), do C.P.P., na redacção de D.L. n.º 78/87, de 17-2, foi invocada com fundamento na oposição deste artigo ao “regime de reforma substancial da sentença, inovatoriamente consagrado em processo civil como forma de suprimento de erros notórios na determinação da norma aplicável”, que “no caso “sub judice” foi o artigo 412º, n.º 1 e n.º 2, do C.P.P., ao invés do artigo 690º, n.º 4, do C.P.C. ex vi artigo 4º do C.P.P.” Refira-se que tanto os 1ºs como os 2ºs recorrentes abandonaram a questão da conformidade constitucional da norma da alínea e) do n.º 1 do artigo 214º do Código de Processo Penal, que tinham preventivamente suscitado nos seus requerimentos de interposição de recurso para o caso de este não ser admitido com efeito suspensivo, como veio a ser.
4. Quando o processo se encontrava pronto para julgamento, foi recebida a comunicação do falecimento do 6º recorrente, tendo os autos sido remetidos ao tribunal recorrido, a título devolutivo, para apreciação das consequências do facto. Aí foi julgada extinta a responsabilidade criminal do falecido, nos termos do artigo 127º do Código Penal. II. Fundamentos A) Questões prévias
5. A responsabilidade criminal do 6º recorrente foi julgada extinta pelo falecimento deste. Poderia, assim, questionar-se se perdeu utilidade o presente recurso quanto às questões de constitucionalidade suscitadas apenas por ele, tendo em conta quer, por um lado, essa extinção da responsabilidade criminal do recorrente, quer, por outro lado, que, nos termos do artigo 74º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, o recurso interposto por um interessado ao abrigo do disposto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º deste diploma aproveita aos restantes, “nos termos e limites estabelecidos na lei reguladora do processo em que a decisão tiver sido proferida”, e que, portanto, um eventual juízo de inconstitucionalidade sobre uma norma impugnada apenas por um dos recorrentes poderia eventualmente vir a aproveitar também a outro(s), em relação aos quais a norma tivesse sido aplicada. Seja, porém, como for, quanto a esta questão, é certo que só poderá manter qualquer utilidade no conhecimento da questão de constitucionalidade da norma apenas impugnada pelo 6º recorrente, ora em questão – recorda-se: a segunda parte do n.º 1 do artigo 25º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, combinada com as normas dos artigos 669º, n.º 2, do Código de Processo Civil, e
380º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, “interpretadas como não tendo cabimento no âmbito de processo penal pendente a reforma ‘substancial’ da decisão proferida, inquinada por lapso manifesto” –, se não vier a ser concedido provimento ao recurso relativamente a normas aplicadas no acórdão de 4 de Junho de 1998. É que, caso contrário, este eventual provimento implicará logo a reforma dessa decisão em conformidade com o juízo proferido sobre a questão de constitucionalidade, retirando utilidade ao recurso na parte (como é o caso da relativa à citada norma impugnada apenas pelo recorrente falecido) em que se refere apenas a uma norma aplicada tão-só no acórdão de 26 de Novembro de 1998, o qual se limitou a indeferir pedidos de esclarecimento, de aclaração, de reforma e de correcção daquela decisão de 4 de Junho (a qual, repete-se, se não poderá então manter, devendo ser reformulada).
6. Entendeu o Ministério Público que as normas do artigo 355º, n.º 1, do Código de Processo Penal, dos artigos 36º, n.ºs 1, 2, 5 e 8, e 37º, n.ºs 1 e 3, do Decreto-Lei n.º 28/84, bem como dos artigos 70º e 71º do Código de Processo Penal, indicadas como integrando o objecto do recurso pelos arguidos A. e B., não haviam sido aplicadas na decisão recorrida, na medida em que não se chegou aí a conhecer de mérito: tendo-se diagnosticado deficiências formais na peça processual, não se chegou a tomar conhecimento do recurso, logo não se aplicaram tais normas. Retorquiram os recorrentes que se tratava de impugnar as normas tais como tinham sido aplicadas “com sentido e alcance inconstitucional pelo tribunal de 1ª instância”, implicitamente reconhecendo, assim, que tais normas não tinham sido aplicadas na decisão ora recorrida, que não era a do tribunal de 1ª instância, mas sim a do Supremo Tribunal de Justiça. E responderam a um argumento que não lhes fora oposto pelo Ministério Público (e seria, aliás, contraditório com o utilizado), pretendendo que a invocação da improcedência manifesta constituiria um obiter dictum e uma falácia. Procede, pois, a exclusão das normas referidas, defendida pelo Ministério Público -sem prejuízo de, caso seja deferida a pretensão dos recorrentes de não ver o seu recurso soçobrar por tais razões formais, o Supremo Tribunal de Justiça ser eventualmente chamado a aplicar tais normas relativas ao fundo da questão.
7. Entendeu também o Ministério Público que a interpretação adoptada pelo Supremo Tribunal de Justiça não implicou qualquer questão de aplicação da lei no tempo que pudesse ser sujeita a escrutínio de conformidade constitucional a partir do artigo 2º, n.º 4, do Código Penal: o que se decidiu foi, no seu entender, que “em termos interlocutórios, na pendência do processo e antes da definitiva qualificação jurídica dos factos imputados aos arguidos, é a qualificação que consta da pronúncia que deve relevar para transitoriamente ajuizar de uma invocada prescrição do procedimento criminal”. Sobre este ponto não houve qualquer pronúncia dos recorrentes, e não tendo realmente havido, pelas razões adiantadas pelo Ministério Público, aplicação da norma pela decisão recorrida, não pode obviamente a apreciação desta norma integrar o objecto do presente recurso de constitucionalidade.
8. Entendeu ainda o Ministério Público que a norma do artigo 287º do Código de Processo Penal não podia ser integrada no objecto do recurso, respeitando, como respeitava, a um prazo há muito decorrido quando o recurso foi interposto. Como referiu nas suas contra-alegações, se tal prazo se afigurava exíguo aos recorrentes – e, por isso, ofensivo da Constituição – cumpria-lhes ter confrontado o tribunal com essa questão, reagindo contra o indeferimento da sua prorrogação. Não o tendo feito – e nem sequer tendo tal questão sido retomada pela decisão recorrida, por inevitavelmente prejudicada – não pode também a apreciação de tal norma integrar o objecto do recurso. Na sua resposta, os 2ºs. recorrentes haviam-se, aliás, limitado a reafirmar as suas razões neste ponto
(por remissão).
9. Face ao entendimento professado pelo Ministério Público, de que a decisão recorrida não aplicava, em sentido inconstitucional, as normas do artigo 1º, alínea f), do Código de Processo Penal, em conjugação com os artigos 120º, 284º,
301º, n.ºs 1 e 2, 359º, n.º 1, e 379º, alínea b), do mesmo diploma, por a convolação aí operada (de sete crimes de fraude na obtenção de subsídio na forma tentada num único crime na forma consumada de cumplicidade) ser para incriminação menos gravosa, a resposta da 4ª recorrente foi, como se referiu, no sentido de que não tinha havido uma convolação, mas sim duas, e que, embora no conjunto o resultado lhe fosse favorável, considerando isoladamente uma delas isso implicaria uma pena mais grave, sem que lhe tivesse sido dada oportunidade de defesa. A decomposição da convolação – operada entre a acusação e a condenação no que respeita à 4ª recorrente – em duas operações distintas, uma das quais implicaria, em abstracto, pena mais grave (mesmo admitindo que é logicamente correcta) não incorre, porém, na censura que o Acórdão n.º 279/95, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 31º vol., págs. 389-398, dirigiu ao mesmo conjunto de normas que a 4ª recorrente impugnou no seu recurso. É que o que aí foi decisivo foi a aplicação de pena mais grave (“A solução está assim na compatibilização da liberdade de qualificação com um mecanismo processual que torne efectivo esse direito a ser ouvido, face a uma convolação que, mantendo os factos descritos na acusação ou pronúncia, naturalisticamente considerados, importe condenação em pena mais grave”), e a alegada dupla convolação removeu, justamente, essa possibilidade. Ora, na medida em que não haja possibilidade de aplicação de pena mais grave desaparece o imperativo constitucional de conceder ao arguido possibilidade de defesa contra a nova incriminação (imperativo esse que o Tribunal Constitucional afirmou, a este propósito, no Acórdão n.º 173/92, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 22º vol., págs. 357-375), e, sobretudo – o que interessa para a questão prévia –, afasta-se, também, o sentido normativo tido como inconstitucional nas alegações de recurso: como salienta o Ministério Público, “a última alteração de qualificação jurídica operada, relativamente às formas de um mesmo tipo legal, conduziu à condenação em pena menos grave”.
10. Finalmente, entendeu o Ministério Público que a razão essencial do indeferimento de nulidade por invocada omissão de pronúncia não radicou na diferença entre o regime dos artigos 379º e 380º do Código de Processo Penal e o artigo 668º, n.º 1, do Código de Processo Civil, diferença essa que o 6º recorrente reputa inconstitucional, mas no juízo “– naturalmente insindicável no
âmbito do presente recurso – de que inexiste qualquer omissão de pronúncia, o que torna naturalmente inútil a apreciação da questão suscitada.” A esta argumentação, fundada, por um lado, na limitação dos poderes do Tribunal Constitucional ao controlo da conformidade constitucional de normas e, por outro, na natureza instrumental do recurso de constitucionalidade (ver, por exemplo, os Acórdãos n.ºs 208/86, 275/86 e 257/92, publicados, respectivamente, em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 7º vol., tomo II, págs. 991-994, 8º vol., págs. 379-382, e 22º vol., págs. 741-764), não foi dada resposta pelo recorrente, que distinguiu, antes, entre “erros notórios de julgamento” e “erros notórios na determinação da norma aplicável”, para concluir que o juízo do tribunal recorrido sobre a inexistência destes últimos “é irrelevante”, porque
“a apreciação desse mesmo erro faz também parte do presente recurso”. Ora, uma vez que não cabe ao Tribunal Constitucional sindicar o modo como os restantes tribunais aplicam o Direito (cfr., por exemplo, os Acórdãos n.ºs
353/86 e 153/90, publicados, respectivamente, no Diário da República, II Série, de 9 de Abril de 1987 e de 7 de Setembro de 1990), improcede a argumentação do recorrente sobre o sentido do recurso de constitucionalidade: neste não cabe o apuramento de um qualquer erro sobre a determinação da norma aplicável. Tal como não cabe o apuramento da existência, ou não, no caso, da omissão de pronúncia, que justificaria, ou não, a convocatória da norma que se pretendia ver aplicada.
11. Conclui-se, portanto, que o objecto do presente recurso de constitucionalidade se circunscreve à apreciação da conformidade constitucional, por um lado, do Decreto-Lei n.º 28/84 (por inconstitucionalidade orgânica), e, por outro lado, das normas dos seguintes artigos: a) artigo 420º, n.º 1, do Código de Processo Penal (norma impugnada por todos os recorrentes à excepção de H. e I.); b) artigo 412º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal (a primeira impugnada por H. e a segunda impugnada por todos os recorrentes excepto A. e B.); c) artigo 410º, n.º 2, do Código de Processo Penal (norma impugnada por G.); d) artigo 374º, n.º 2, do Código de Processo Penal (norma impugnada por A. e B., G. e H.); e e) artigo 25º, n.º 1, 2ª parte, do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro
(norma impugnada por J.). B) Questões de constitucionalidade
12. A questão da inconstitucionalidade orgânica do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, foi suscitada com dois fundamentos: o de ter sido ultrapassado o prazo (de 120 dias) da autorização legislativa concedida pela Lei n.º 12/83, de
24 de Agosto, e o de tal diploma violar o objecto, sentido e extensão dessa autorização legislativa. No entanto, nenhum dos fundamentos é procedente. O primeiro, porque, como constitui jurisprudência pacífica deste Tribunal (cfr. os Acórdãos n.ºs 150/92,
121/93 e 206/94, publicados respectivamente, em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 21º vol., págs. 637-645, 24º vol., págs. 257-268, e 27º vol., págs. 525-536), o momento relevante para aferir o cumprimento do prazo da autorização legislativa é o da aprovação do diploma em Conselho de Ministros, e este teve lugar em 6 de Dezembro de 1983, bem dentro do prazo fixado na Lei n.º
12/83. O segundo, porque o artigo 1º da referida lei baliza o objecto, sentido e extensão da autorização legislativa em termos que em nada são afectados pela regulamentação emanada do decreto-lei autorizado, designadamente em matéria de crimes específicos criados pelos artigos 36º e 37º deste diploma: fraude na obtenção de subsídio ou subvenção e desvio de subvenção ou crédito bonificado. Não procede, pois, o recurso, nesta parte.
13. A questão da inconstitucionalidade das normas dos artigos 412º e 420º do Código de Processo Penal quando interpretadas com uma “rigidez formal que posterga desrazoavelmente as garantias constitucionais consagradas para o processo criminal” (na expressão do Acórdão n.º 661/01, publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 18º vol., págs. 421-430) foi afirmada por diversas vezes na jurisprudência constitucional, aliás a propósito de diversas limitações: falta de concisão das conclusões – Acórdãos n.ºs 193/97, 43/99 e
337/00 (publicados, respectivamente, em Acórdãos do Tribunal Constitucional,
36º vol., págs. 395-406, 42º vol., págs. 171-180, e 47º vol., págs. 47-51); falta de indicação nas conclusões das menções contidas nas alíneas do n.º 2 do artigo 412º – Acórdão n.º 401/01 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 51º vol., págs. 151-164); deficiente cumprimento dos ónus aí previstos, sem ser facultada ao recorrente oportunidade processual para suprir o vício detectado – Acórdão n.º 288/00 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 47º vol., págs. 457-466). Como se escreveu no Acórdão n.º 417/99 (publicado no Diário da República, II Série, de 13 de Maio de 2000), com tal entendimento “tais normas impunham ‘uma limitação desproporcionada das garantias de defesa do arguido em processo penal, restringindo o seu direito ao recurso e, nessa medida, o direito de acesso à justiça.’”. E pelo Acórdão n.º 320/02 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 53º vol., págs. 167-178) veio mesmo a ser declarada, com força obrigatória geral, “a inconstitucionalidade, por violação do artigo 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, da norma constante do artigo 412º, n.º
2, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de que a falta de indicação, nas conclusões da motivação, de qualquer das menções contidas nas suas alíneas a), b) e c) tem como efeito a rejeição liminar do recurso do arguido, sem que ao mesmo seja facultada a oportunidade de suprir tal deficiência”. Os fundamentos invocados pelo acórdão recorrido para rejeitar os diversos recursos que lhe foram apresentados variaram. Assim, para o recurso interposto pelo arguido A. quanto à decisão interlocutória sobre a invocada prescrição do procedimento criminal, foi dito que havia indicações nas conclusões que não constavam da motivação, que não havia ligação dessas indicações às anteriores conclusões e que não tinha sido dado cumprimento ao disposto na alínea b) do n.º 2 do artigo 412º do Código de Processo Penal. Porém, em motivação autónoma, concluiu-se pela manifesta improcedência da questão de direito suscitada, razão suficiente para que não tenha sido o entendimento (porventura inconstitucional) dado às normas do artigo 412º do Código de Processo Penal a, afinal, obstar ao conhecimento da questão que o arguido dirigiu ao tribunal a quo, e para que, portanto, o juízo de inconstitucionalidade que sobre tais normas se reafirmará deixe incólume a decisão recorrida neste ponto. O mesmo se diga em relação ao recurso interposto pelo arguido L. sobre uma decisão interlocutória em que, a mais das insuficiências das conclusões da motivação de recurso que obstariam, no entendimento do tribunal recorrido, ao conhecimento da questão, se invocou o trânsito em julgado do despacho contra que se pretendia, a destempo, dirigir censura. E o mesmo se diga, ainda, dos terceiro e quarto recursos dirigidos a decisões interlocutórias, por também aí se ter abordado o problema que os arguidos H. e G. levantaram perante o Supremo Tribunal de Justiça, afastando-o por falta de verificação de um pressuposto: a prova de que o co-arguido M. tinha consentido expressamente em ser ouvido como testemunha, como exigido pelo n.º 2 do artigo 133º do Código de Processo Penal. Já no que diz respeito aos recursos interpostos da decisão condenatória, o acórdão recorrido segmentou as razões da sua rejeição em função das conclusões apresentadas, razão pela qual o juízo de inconstitucionalidade que se reafirma quanto ao entendimento professado sobre as normas dos artigos 412º e 420º do Código de Processo Penal só inquina aquelas em que exclusivamente razões formais ligadas à insuficiência da motivação e suas conclusões justificaram a rejeição das pretensões dos recorrentes, sem que lhes fosse dada oportunidade de suprir tais insuficiências. Note-se, também, que – como referido pelo Ministério Público nas suas contra-alegações – o que, reafirmando a anterior jurisprudência constitucional, há que considerar inconstitucional não é a exigência de cumprimento de cada uma das indicações do n.º 2 do artigo 412º do Código de Processo Penal, mas antes “o nível de exigência formal” que se lhe aplicou, com a sanção da rejeição do recurso articulada com a omissão de convite ao suprimento das insuficiências detectadas. E ressalva-se ainda que de nenhuma inconstitucionalidade padece a segunda parte do n.º 1 do artigo 420º do Código de Processo Penal ao consentir ao tribunal ad quem “a possibilidade de rejeitar o recurso que considere manifestamente improcedente”, como também sublinhou o Ministério Público nas suas contra-alegações, já que aí “ocorre uma verdadeira apreciação da substância das razões de direito invocadas pelo recorrente, apenas se estabelecendo uma forma procedimentalmente simplificada de decisão, tomada em conferência (e por unanimidade de votos) e não na sequência da audiência a que aludem os artigos
421º e segs. do Código de Processo Penal.” A combinação das exigências de simplificação processual e de celeridade, com a constatação liminar da clara insubsistência das razões de dissídio invocadas, dá origem, em diversos ramos processuais, a formas abreviadas de decisão (v.g. o artigo 705º do Código de Processo Civil e o artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional), as quais são plenamente conformes com a Constituição, relevando, como relevam, da discricionariedade do legislador.
14. A questão da inconstitucionalidade das normas dos artigos 374º, n.º 2, e
410º, n.º 2, do Código de Processo Penal, “na interpretação que sustenta bastar a enumeração dos meios de prova para a fundamentação da decisão de facto”, nas palavras do recurso do 3º recorrente – interpretação que no recurso dos 1ºs e 4º recorrentes vai referida apenas à primeira daquelas normas –, já foi apreciada por este Tribunal no Acórdão n.º 680/98 (publicado em Acórdãos do Tribunal Constitucional, 41º vol., págs. 539-554), tendo-se então julgado inconstitucional “a norma do n.º 2 do artigo 374º do Código de Processo Penal de
1987, na interpretação segundo a qual a fundamentação das decisões em matéria de facto se basta com a simples enumeração dos meios de prova utilizados em 1ª instância, não exigindo a explicitação do processo de formação da convicção do tribunal, por violação do dever de fundamentação das decisões dos tribunais previsto no n.º 1 do artigo 205º da Constituição, bem como, quando conjugada com a norma das alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 410º do mesmo Código, por violação do direito ao recurso consagrado no n.º 1 do artigo 32º, também da Constituição.” De um tal juízo de inconstitucionalidade, para cuja fundamentação se remete para o citado aresto, resulta também a desconformidade constitucional do entendimento acolhido na decisão recorrida, segundo o qual, recorde-se
“o tribunal colectivo não é obrigado, por força do disposto no art. 374º, n.º 2, do C.P.P. ou em qualquer outro normativo, a fazer uma apreciação crítica das provas, em ordem a permitir a sua apreciação por este S.T.J. (...). E também nem aquele art. 374º, n.º 2, do C.P.P. nem qualquer outro preceito legal exige que se relacionem os meios de prova com cada um dos factos que o tribunal tenha considerado provados (...). O artigo 374º, n.º 2, do C.P.P. não impõe, pois, mais do que uma exposição concisa dos meios de prova que foram relevantes para a formação da convicção do tribunal na decisão sobre a matéria de facto (...) tanto basta para se cumprir a razão de ser daquele normativo, ou seja, para haver a certeza de que o tribunal não se serviu de elementos não permitidos
(...)”.
15. Alcançadas as conclusões no sentido da inconstitucionalidade fundamentadas nos números precedentes, conclui-se que, devendo ser, nessa parte, concedido provimento ao recurso, com a consequente reforma do acórdão de 4 de Junho de
1998 (que decidiu rejeitar todos os recursos interpostos pelos arguidos), não há que tratar da questão da constitucionalidade, suscitada pelo 6º recorrente, que só tinha sentido em relação ao acórdão relativo à reforma dessa decisão (pois dizia respeito a alegados vícios de normas aplicadas apenas neste acórdão). Isto
é, a questão da constitucionalidade da norma da segunda parte do n.º 1 do artigo
25º do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, combinada com as normas dos artigos 669º, n.º 2, do Código de Processo Civil, e 380º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Penal, interpretada “como não tendo cabimento no âmbito de processo penal pendente a reforma ‘substancial’ da decisão proferida, inquinada por lapso manifesto”). É que, de todo o modo, a decisão reformanda terá de ser reformulada por força do provimento concedido ao presente recurso de constitucionalidade, não existindo utilidade no conhecimento de questões de constitucionalidade atinentes a normas aplicadas exclusivamente no acórdão que negou a reforma. Não se toma, pois, conhecimento do recurso, também nesta parte. III. Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide: a) Não tomar conhecimento dos recursos de constitucionalidade quanto às normas dos artigos 70º, 71º, 355º, n.º 1, 379º, 380º e 387º do Código de Processo Penal, do artigo 1º, alínea f), em conjugação com os artigos 120º, 284º, 301º, n.ºs 1 e 2, 359º, n.º 1, e 379º, alínea b), do mesmo diploma, do artigo 2º, n.º
4, do Código Penal, bem como dos artigos 36º, n.ºs 1, 2, 5 e 8, e 37º, n.ºs 1 e
3, do Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro, e, ainda, quanto à norma do artigo 25º, n.º 1, 2ª parte, do Decreto-Lei n.º 329-A/95, de 12 de Dezembro, quando entendida no sentido de que o regime de reforma substancial da sentença como forma de suprimento de erros notórios de julgamento, inovatoriamente introduzido pelo referido diploma para o processo civil, não tem aplicação no domínio de um processo penal em curso; b) Não julgar inconstitucional o Decreto-Lei n.º 28/84, de 20 de Janeiro; c) Julgar inconstitucionais as normas dos artigos 412º, n.ºs 1 e 2, e 420º do Código de Processo Penal, na interpretação segundo a qual o deficiente cumprimento dos ónus previstos no primeiro daqueles artigos ou a falta de concisão das conclusões da motivação de recurso levam à rejeição do recurso sem que seja dada oportunidade aos recorrentes para suprir essas deficiências, por violação do disposto no artigo 32º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa; d) Julgar inconstitucional a norma do artigo 374º, n.º 2, do Código de Processo Penal de 1987, na interpretação segundo a qual a fundamentação das decisões em matéria de facto se basta com a simples enumeração dos meios de prova utilizados em 1ª instância, não exigindo a explicitação do processo de formação da convicção do tribunal, por violação do dever de fundamentação das decisões dos tribunais previsto no n.º 1 do artigo 205º da Constituição, bem como, quando conjugada com a norma das alíneas b) e c) do n.º 2 do artigo 410º do mesmo Código, por violação do direito ao recurso consagrado no n.º 1 do artigo 32º da Constituição; e) Consequentemente, determinar a reforma da decisão recorrida em conformidade com os presentes juízos de inconstitucionalidade. Lisboa, 7 de Julho de 2004 Paulo Mota Pinto Benjamim Rodrigues Maria Fernanda Palma Mário José de Araújo Torres Rui Manuel Moura Ramos