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Processo n.º 749/2004
3.ª Secção Relatora: Conselheira Maria dos Prazeres Pizarro Beleza
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
1. A ADMINISTRAÇÃO DO CENTRO COMERCIAL A. interpôs recurso para o Tribunal Constitucional do acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 9 de Março de 2004, após ter invocado, sem êxito, a respectiva nulidade. O acórdão recorrido foi proferido no âmbito da acção que a ora recorrente havia proposto contra B., pedindo a sua condenação no pagamento de determinadas contribuições para as despesas comuns, aprovadas em assembleia geral de proprietários das lojas do Centro Comercial, e que fora julgada procedente em primeira instância, em sentença confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa. O Supremo Tribunal de Justiça, porém, julgando a revista interposta pela ré, revogou o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa e julgou a acção apenas parcialmente procedente. Em síntese, o Supremo Tribunal de Justiça considerou que o Regulamento Interno do Centro Comercial em que a autora baseava o dever de a ré pagar as referidas contribuições não se podia considerar um regulamento de condomínio mas antes, apenas, um acordo estabelecido para disciplinar os interesses comuns dos lojistas, com eficácia meramente obrigacional, e do qual os mesmos se podem desvincular, se assim o entenderem, a todo o tempo. O Supremo Tribunal de Justiça considerou ainda que o grupo de interessados que se havia juntado e aprovado o referido Regulamento se devia considerar uma entidade semelhante à de uma associação sem personalidade jurídica, sendo-lhe assim aplicáveis as correspondentes disposições do Código Civil (artigos 195º e segs.). Assim, o Supremo Tribunal de Justiça condenou a ré a pagar, apenas, as contribuições em dívida à data em que a sua desvinculação se tornou eficaz, e absolveu-a do pedido de pagamento das restantes. Rejeitada a arguição de nulidade pelo acórdão de 4 de Maio de 2004, a Administração do Centro Comercial A. veio recorrer para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto nas alíneas c) e f) do nº 1 do artigo 70º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro, “por violação do artº 13º da Constituição da R.P., porque o douto acórdão recorrido (...) aplicou ao caso concreto, as normas das associações, mormente os artºs 181º e 195º, n.º 2, ambos do Código Civil, cuja ilegalidade da sua aplicação ao caso dos autos, foi suscitada pela A./Recorrida e ora recorrente durante o processo (...)”, recusando aplicar “as normas ajustadas à resolução do litígio, que são as da propriedade horizontal”. O recurso não foi admitido, por despacho de 28 de Maio de 2004.
2. Inconformada, a recorrente veio reclamar para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do disposto no nº 4 do artigo 76º da Lei nº 28/82. Em síntese, justifica não lhe ter sido possível invocar qualquer inconstitucionalidade ou ilegalidade das normas cuja apreciação pretende antes de ter sido proferido o acórdão recorrido, concluindo da seguinte forma: “Assim, a presente reclamação deverá ser julgada procedente, porque a ilegalidade e inconstitucionalidade dos artºs
181º e 195º, n.º 3, do Cód. Civil, aplicados em concreto ao caso dos autos, não foi suscitada durante o processo, mas foi-o depois da notificação do acórdão do STJ, com o requerimento de arguição também da nulidade do acórdão, porque foi a primeira e única vez que nos autos são referidos esses normativos, e portanto, só nessa altura foi possível à recorrente tomar conhecimento dos mesmos, suscitando logo a sua inconstitucionalidade e ilegalidade, com referência ao artigo 13º da Constituição”. Notificado para o efeito, o Ministério Público pronunciou-se no sentido da ostensiva falta de fundamento da reclamação, “já que não se mostra delineada pela entidade reclamante qualquer questão de ilegalidade «qualificada», situada no âmbito dos poderes cognitivos do Tribunal Constitucional”.
3. Com efeito, a reclamação não pode proceder, por diversas razões. Basta, todavia, observar que o recurso foi interposto ao abrigo das alíneas c) e f) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, não tendo a reclamação procedido a qualquer alteração destas indicações. Não importa, assim, saber se o vício que pretende que o Tribunal Constitucional conheça foi ou não oportunamente suscitado, uma vez que a reclamante nunca invocou qualquer das ilegalidades que podem ser apreciadas no âmbito do recurso que interpôs: ilegalidade por violação de lei com valor reforçado ou de estatuto de região autónoma.
Nestes termos, indefere-se a reclamação. Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 ucs.
Lisboa, 29 de Setembro de 2004
Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Vítor Gomes Rui Manuel Moura Ramos