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Proc. n.º 478/04
3ª Secção Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. A. (ora recorrida) instaurou acção ordinária contra B. e Mulher (ora recorrentes), pedindo a sua condenação no pagamento de determinada quantia, acção que foi, em primeira instância, julgada improcedente.
2. Inconformada com esta decisão a Autora apelou para o Tribunal da Relação de Lisboa que, por acórdão de 5 de Junho de 2003, julgou o recurso procedente e, consequentemente, condenou os RR no pedido.
3. Desta decisão recorreram os RR. para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo formulado na respectiva alegação, para o que agora importa, as seguintes conclusões:
“1 )- O regime do direito probatório está contido explícito e expresso em dois códigos fundamentais:
- O Código Civil, do art. 341 ° até ao art. 396°, os quais integram o Capítulo II, do Subtítulo IV, do Livro I, deste Código. O Código do Processo Civil, do art. 513° até ao art. 645° que integram o Capítulo III do Título II do mesmo Código, expressivamente intitulado aliás 'Da Instrução do Processo'.
2)- Tal como melhor foi desenvolvido no contexto destas alegações, o art. 690°-A do C.P.C. não se integra no regime do direito probatório; mas sim está integrado no especial regime regulador dos recursos, até porque está inserto no Capítulo IV do Título II do Cód. Proc. Civil, que regulamenta o processamento dos recursos em geral e, em especial, os de cada espécie.
3)- Por esta circunstância não é de interpretar menos de aplicar o n° 8 do art.
7° do Dec-Lei 183/2000, de 10 de Agosto, ao art. 690°-A do C.P.C.; mas sim o seu art. 8°;
4)- razão pela qual é de aplicação imediata a redacção dada pelo Dec-Lei
183/2000 ao art. 690°-A do C.P.C.
5)- Por conseguinte, na hipótese destes autos, considerada a actual redacção vigente do art. 690°-A do C.P.C., as partes não estão obrigadas a proceder à transcrição escrita dactilografada, como era exigido na sua anterior e primitiva redacção.
6)- O douto Acórdão 'a quo', assim não tendo entendido, violou o actual art.
690°-A do C.P;C., bem como o art. 8° do Dec-Lei 183/2000, de 10 de Agosto. Sem embargo do exposto
7)- O douto Acórdão recorrido, que considerou o contrário, isto é, que entendeu ser de aplicar nestes autos o art. 690°-A do C.P.C. na sua primitiva redacção dada pelo Dec-Lei n° 39/95 de 15 de Fevereiro,
8)- mesmo dentro deste seu entendimento, infringiu o referido art. 690°-A, n°
3do C.P.C. na sua redacção primitiva. Com efeito
9)- se é certo que o n° 3 deste artigo dispõe que o recorrido deva proceder à transcrição dos depoimentos gravados;
10)- todavia, certo é também que a eventual omissão dessa transcrição pelo recorrido, não acarreta nem implica para este qualquer sanção cominatória
(contrariamente ao que sucede no caso de uma omissão igual pelo recorrente);
11 )- assistindo sempre ao Tribunal o direito e os poderes de investigação oficiosa (n° 3, do art. 690°-A do C.P.C., redacção Dec-Lei 39/95). Por conseguinte,
12)- considerando a primitiva redacção do n° 3 referido, em caso de omissão de transcrição pelo recorrido, deveria o douto Tribunal 'a quo' ter procedido, em alternativa: ou notificar o recorrido para proceder à transcrição dos depoimentos das testemunhas não transcritos, ou proceder oficiosamente à sua investigação. Com efeito
13)- Só procedendo deste modo é que era respeitado o n° 3 do art. 690°-A
(primitiva redução) bem como os princípios gerais de economia e celeridades processuais e o de ser feita uma Justiça menos formal e mais próxima da Verdade Material.
14)- E também só deste modo eram respeitados os arts. 20°, n° 4; 202°, n° 2 e
277°, n° 1 da Constituição da República Portuguesa. Ora,
15)- assim não procedeu o douto Acórdão 'a quo' uma vez que, como se lê das páginas n° 6,6 vº, 7 (linhas 1 a 14) e n° 8 (linhas 1 a 4), do mesmo,
16)- se infere com clareza que o mesmo se fundamentou na omissão de transcrição dos depoimentos gravados das testemunhas dos Réus (ora recorrentes), para decidir contra estes baseado apenas nos transcritos depoimentos das testemunhas da autora.
17)- Porque pertinente e bem claro se transcreve: 'A verdade é que os respectivos depoimentos não se mostram transcritos, circunstância que nos inibe de proceder à conveniente ponderação da sua validade' (sublinhado é nosso, sendo esta transcrição textual das linhas 1 a 4 da página n° 8 do douto Acórdão recorrido).
18)- Trata-se pois de um confesso reconhecimento do que afirmámos em 16).
19)- Donde entendermos que o douto Acórdão 'a quo', ao decidir como decidiu, violou afinal o art. 690°-A, n° 3 do C.P.C. (redacção do Dec-Lei 39/95 que aplicara), como os preceitos constitucionais atrás invocados, por tudo isto merecendo censura.
4. Por acórdão de 18 de Março de 2004, o Supremo Tribunal de Justiça negou provimento à revista. Para tanto, e para o que agora importa, escudou-se na seguinte fundamentação:
“[...] Na revista, os recorrentes impugnam apenas a decisão quanto aos factos uma vez que esta não terá considerado a sua diferente versão apresentada pelas testemunha oferecidas pelos RR os quais, não tendo sido notificados para tal, nada requereram nem a Relação averiguou, oficiosamente, como lhe competia, o sentido de tais depoimentos. No momento da interposição do recurso já estavam em vigor as normas dos nºs 2 e
3 do art. 690°-A do CPC, na redacção introduzida pelo DL 183/00 de 10/08 que, nos casos de impugnação da matéria de facto, impõem - n° 2 do artigo - ao recorrente, sob pena de rejeição do recurso, a indicação dos depoimentos em que se funda por referência ao assinalado na acta nos termos do n° 2 do art. 522°-C do CPC. Por outro lado, na mesma hipótese, impõe ao recorrido indicar na contra alegação os depoimentos gravados que infirmam as conclusões do recorrente também com referência ao assinalado na acta. Pretendem os ora recorrentes que na Relação foram violados normas constitucionais - as dos arts.20° n° 4, 202° n.º2 e 277° n.º1 - bem como a do art. 690°-A do CPC porque, se bem entendemos as suas doutas alegações, embora não sendo obrigatória a transcrição dos depoimentos gravados, o tribunal procedeu como se tal fosse exigido tendo apreciado apenas o ponto de vista da recorrente que, nas alegações transcreveu o depoimento das sua testemunhas não o tendo feito os recorridos ficando, desse modo, prejudicado o ponto de vista destes. A questão respeita apenas aos factos mas, não obstante, dela se conhecerá por estar em causa a observância ou não, pelo tribunal a quo, das normas que disciplinam a sua cognição quanto a tal matéria.
É claro que nenhum passo dos autos revela que tenha sido imposta à recorrente a transcrição dos depoimentos que interessavam à impugnação que fez quanto à decisão de facto. A recorrente é que, sem que tal lhe fosse imposto, transcreveu o que ao recurso interessava e o recorrido, nas contra alegações, teve ocasião de impugnar, ponto por ponto, os depoimentos transcritos pela A com indicação que fez, nos termos do art. 522°-C do CPC, e referência à acta. Não se vê, assim, que tenha sido desrespeitada a norma do art. 720° do CPC nem que de qualquer modo tenham sido postergados os direitos dos recorridos. Daí que tenha de ter-se por fixada a matéria de facto tal como resultou provada na Relação. Perante isso, não podia deixar de julgar-se, pelas razões atrás expostas, procedente a acção.[...]”
5. Desta decisão foi interposto o presente recurso, através de um requerimento que tem o seguinte teor:
“[...], AA. e recorrentes nos autos de recurso de revista à margem indicados, não se conformando com o douto Acórdão agora notificado, dele vêm interpor recurso para o Tribunal Constitucional o que faz indicando de imediato o seguinte:
1 )- O recurso é interposto ao abrigo da alínea B do n° 1 do art. 70° da Lei
28/82, de 15 de Novembro, redacção dada pela Lei 85/89, de 7 de Setembro, e pela Lei n° 13-A!98 de 26 de Fevereiro.
2)- E inconstitucional a interpretação com que foi aplicada pela douta decisão recorrida, que aderiu aliás à decisão imediatamente anterior do Tribunal da Relação de Lisboa, acerca do art. 690°-A do C.P.C., na redacção dada pelo dec-lei n° 39/95, de 15 de Fevereiro, interpretação que, sumariadamente, consistiu em ter o Tribunal da Relação decidido sobre a recorrida matéria de facto exclusivamente baseada na transcrição dos depoimentos das testemunhas da autora A., ignorando portanto os depoimentos prestados pelas testemunhas dos Réus/recorrentes B. e C.. Tão somente porque não transcritos, como tudo explícita e textualmente consta do verso da página 6 e especialmente da 7, como das linhas 1 a 4 da página n° 8 do douto Acórdão da Relação de Lisboa, as quais se transcrevem: ' A verdade é que os respectivos depoimentos ( os das testemunhas dos Réus - ver último § do verso da pág. 7) não se mostram transcritos, circunstância que nos inibe de ponderar à conveniente ponderação da sua validade' (linhas 1 a 4, pág. 8). Por conseguinte, em nosso entender, esta interpretação aplicativa daquele art.
690°-A do C.P.C. violou frontalmente os arts. 20°, n° 1, 4 e 5; 202º, n° 2; 204° e 277°, n° 1, da vigente Constituição da República Portuguesa, porquanto:
- Não ficou devidamente assegurado aos Réus o direito à defesa dos seus interesses e direitos, deste modo, sendo-lhes afinal denegada Justiça;
- Inexistiu por isso um processo equitativo, com igualdade para as duas partes litigantes;
- Foram preteridos os princípios gerais constitucionais da justa composição dos litígios com apuramento da Verdade Material.
3 ) A questão da inconstitucionalidade desta hermenêutica foi levantada nestes autos quando da apresentação em 17/10/2003 das alegações do presente recurso de revista, como consta aliás das páginas 10, 11, 12 e 13 daquelas mesmas alegações.
4 )- O presente recurso sobe nos próprios autos, de imediato e com efeitos suspensivos”.
6. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. É o seguinte, na parte decisória, o seu teor:
“7 Cumpre, antes de mais, decidir se pode conhecer-se do objecto do presente recurso, interposto ao abrigo da alínea b), do n.º 1, do artigo 70º da Lei n.º
28/82, de 15 de Novembro, uma vez que a decisão que o admitiu não vincula o Tribunal Constitucional (cfr. art. 76º, n.º 3 da LTC). O recurso previsto na al. b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, visa submeter à apreciação do Tribunal Constitucional a constitucionalidade de norma(s) aplicada(s) pela decisão recorrida. É, por isso, jurisprudência pacífica e sucessivamente reiterada que, estando em causa a própria decisão em si mesma considerada, não há lugar ao recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade vigente em Portugal. Assim resulta do disposto no artigo 280º da Constituição e no artigo 70º da Lei n.º 28/82, e assim tem sido afirmado pelo Tribunal Constitucional em inúmeras ocasiões. Na verdade, ao contrário dos sistemas em que é admitido recurso de amparo, nomeadamente na modalidade de amparo dirigido contra decisões jurisdicionais que, alegadamente, violam directamente a Constituição, o recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade vigente em Portugal não se destina ao controlo da decisão judicial recorrida, como tal considerada, como sucede quando a discordância se dirige a esta última, mas, pelo contrário, ao controlo normativo de constitucionalidade da norma aplicada. Acresce, que tal recurso pressupõe, igualmente, que o recorrente tenha suscitado, perante o Tribunal que proferiu a decisão recorrida e de forma processualmente adequada, uma questão de constitucionalidade normativa, e que, não obstante, a decisão recorrida a tenha aplicado - a norma ou a dimensão normativa arguida de inconstitucional -, como ratio decidendi, no julgamento do caso. Vejamos, então, se assim terá acontecido.
7.1. Nos termos do requerimento de interposição do recurso, que supra transcrevemos integralmente, os recorrentes pretendem ver apreciada a inconstitucionalidade da “interpretação aplicativa” do artigo 690º-A do Código de Processo Civil, na redacção dada pelo Decreto-Lei n.º 39/95, de 15 de Fevereiro, efectuada pela douta decisão recorrida, que aderiu aliás à decisão imediatamente anterior do Tribunal da Relação de Lisboa, “interpretação que, sumariadamente, consistiu em ter o Tribunal da Relação decidido sobre a recorrida matéria de facto exclusivamente baseada na transcrição dos depoimentos das testemunhas da autora A., ignorando portanto os depoimentos prestados pelas testemunhas dos Réus/recorrentes B. e C.”. Ora, basta atentar no teor deste requerimento para se concluir que o que os recorrentes pretendem é que o Tribunal Constitucional aprecie a constitucionalidade da própria decisão recorrida. Como isso lhe está vedado, tal implica, por si só, a impossibilidade de conhecimento do objecto do recurso. A pretensão dos recorrentes vem, aliás, na sequência da sua intervenção processual anterior. É que resulta também evidente que os recorrentes não suscitaram perante o Supremo Tribunal de Justiça, em termos processualmente adequados, uma questão de constitucionalidade normativa reportada ao artigo
690º-A do Código de Processo Civil. De facto, se atentarmos no teor da alegação de recurso apresentada naquele Tribunal – designadamente nas suas página 10 a
13, para que os recorrentes remetem no requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional – verificamos que não cuidam aí de imputar, como deviam, a violação da Constituição ao artigo 690º-A, n.º 3, do Código de Processo Civil, mas à própria decisão da Relação de Lisboa na parte em que decidiu não considerar os depoimentos das testemunhas por si arroladas, porque não transcritos. Para o demonstrar basta transcrever as partes daquela peça processual em que os recorrentes se referem à alegada violação:
“[...] aquele douto aresto violou também o mesmo n.º 3 do art. 690º-A do CPC, porque não fez, mas deveria ter procedido oficiosamente à investigação de todos os depoimentos registados, para os ponderar, a todos, só depois é que deveria decidir [página 11].
[...] Por conseguinte, entendemos e concluímos que os Mmos Juizes Desembargadores subscritores do recorrido, violaram não só os atrás invocados princípios gerais fundamentados nos preceitos legais agora referidos, como também infringiram o próprio art. 690º-A do CPC, mesmo na redacção primitiva do Dec-Lei n.º 39/95 de
15 de Fevereiro [página 12].
[...] Será constitucional a interpretação levada a efeito no douto Acórdão recorrido ? Atento ao que explanámos anteriormente, entendemos evidente que é inconstitucional a interpretação e hermenêutica nele desenvolvida. Acreditamos que essa interpretação frontalmente atenta e infringe as disposições constitucionais seguintes: Arts. 20º, n.º 4, 202º, n.º 2 e 277º, n.º 1 [...]”.
[página 13].
[E, mais à frente, a concluir a sua alegação no que se refere a esta matéria, acrescentaram ainda os recorrentes, no mesmo sentido:] “19) Donde entendemos que o douto acórdão «a quo», ao decidir como decidiu, violou afinal o art. 690º-A, n.º 3 do CPC (....), como os preceitos constitucionais atrás invocados
[...]”(Sublinhados aditados).
É, assim, manifesto que nunca os recorrentes suscitaram, durante o processo e de forma processualmente adequada, qualquer questão de constitucionalidade normativa em termos de permitir que dela se viesse a conhecer no recurso que agora pretenderam interpor. Também por esse motivo, não é possível conhecer do objecto do recurso. Em face do exposto, e sem necessidade de maiores considerações, torna-se evidente que, embora o Tribunal Constitucional já tenha, no Acórdão n.º 122/02
(publicado no Diário da República, II Série, de 29 de Maio de 2002), concluído no sentido da não inconstitucionalidade do artigo 690º-A, n.º 2, do Código de Processo Civil, não pode, no caso dos autos, conhecer-se do objecto do presente recurso, já que não estão presentes os pressupostos da sua admissibilidade.
7.2. Agora apenas se acrescentará que sempre assim aconteceria, uma vez que a decisão recorrida também não aplicou, como ratio decidendi, a norma referida pelos os recorrentes. De facto, estes referem o artigo 690º-A do Código de Processo Civil, “na redacção dada pelo Decreto-Lei n° 39/95, de 15 de Fevereiro”, e a verdade é que resulta da decisão recorrida que a mesma considerou aplicável o artigo 690º-A do Código de Processo Civil, na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 183/2000, de 10 de Agosto. [...]”
7. É desta decisão que vem interposta, ao abrigo do disposto no art. 78º-A, n.º
3 da LTC, a presente reclamação para a Conferência, que os reclamantes fundamentam da seguinte forma:
“[...], face à aliás douta decisão sumária de não tomar conhecimento do recurso interposto, dela se pretende reclamar para a conferência como dispõe o n° 3 do art. 78°-A da Lei n° 28/82, de 15 de Novembro, e da Lei n° 13-A/98, de 26 de Fevereiro, sendo os fundamentos os seguintes: Do ora recorrido despacho sumário de indeferimento, flui que este se fundamentou, basicamente, na circunstância de nunca ter sido suscitada a questão da constitucionalidade normativa reportada ao art. 690°-A do Cód. Proc. Civil, mas sim a constitucionalidade da própria decisão recorrida: É o que se infere da leitura das páginas n° 6, 7 e 8 do mesmo despacho de 26 de Abril de 2004. Porém, e salvo melhor opinião, julgamos que a arguição da inconstitucionalidade normativa foi efectivada de modo cabal, e suficiente, sendo certo que inexiste qualquer modo ou procedimento específico e autónomo para arguir a inconstitucionalidade normativa, a nível das Instâncias anteriores mencionadas.
[...]
- Quanto ao Supremo Tribunal de Justiça: Em recurso da II Instância para o Supremo Tribunal, naturalmente fez-se de novo referência à atrás hermenêutica (inconstitucional) realizada pela II Instância, para além das outras demais questões cíveis pertinentes. Basta ler a página n°
13, conexada com as páginas n.º 10 (último, §) e n° 11 (1º, §), da rubrica encimada pela letra 'C' das alegações presentes no recurso de revista apresentado, para se ver com clareza que, nessas alegações do recurso de revista, foi suscitada a inconstitucionalidade concretamente reportada ao art.
690°-A do C.P.C., tal como, nas conclusões, se arguiu de novo a inconstitucionalidade da mesma referida hermenêutica criada pelo Tribunal da Relação de Lisboa, para além das outras mais questões cíveis ali suscitadas. Basta ler designadamente as alíneas n° 16, 17, 18 e 19 das conclusões finais do recurso de revista, para ser confirmado o que afirmamos.[...]”
9. Notificada para responder, a recorrida nada disse.
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
III – Fundamentação
10. Na decisão sumária reclamada considerou-se que não estavam preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, invocada pelos recorrentes, já que estes não suscitam, nem suscitaram, perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida e de forma processualmente adequada, qualquer questão de constitucionalidade normativa. Acresce que igualmente se afirmou que a decisão recorrida não aplicou, como ratio decidendi, a norma referida pelos recorrentes, o que também conduziria ao não conhecimento do recurso.
Os recorrentes vêm reclamar desta decisão. Limitam-se, porém, a discordar, o que
é legítimo, sem adiantar qualquer argumento que possa fazer modificar o decidido. De facto, os ora reclamantes invocam que, na “página n° 13, conexada com as páginas n.º 10 (último, §) e n° 11 (1º, §), da rubrica encimada pela letra 'C' das alegações”, tal como, nas “alíneas n° 16, 17, 18 e 19 das conclusões finais do recurso de revista”, única peça aqui relevante, terão suscitado a questão de inconstitucionalidade que pretendem ver apreciada, concretamente reportada ao art. 690°-A do C.P.C.
Ora, as conclusões 16 a 19 das alegações para o Supremo Tribunal de Justiça já foram transcritas supra. Por outro lado, nos outros parágrafos agora citados pelos recorrentes escreveu-se:
“Ora, lendo as páginas n° 6, 6 v.º, 7° (linhas 1 a 14) e 8 (linhas 1 a 4) do douto Acórdão recorrido, infere-se com suficiente clareza que 'o mesmo se fundamenta na omissão da transcrição dos depoimentos das testemunhas dos RR., para decidir, como decidiu depois, baseado apenas nos depoimentos transcritos das testemunhas da recorrente. Naquele douto Acórdão escreveu-se de modo bem explícito o seguinte: ' A verdade é que os respectivos depoimentos não se mostram transcritos, circunstância que nos inibe de ponderar à conveniente ponderação da sua validade' (sublinhado é nosso, sendo esta transcrição textual das linhas 1 a 4 da página n° 8 do douto Acórdão).
[...] C Será constitucional a interpretação levada a efeito no douto Acórdão recorrido? Atento ao que explanámos anteriormente, entendemos evidente que é inconstitucional a interpretação e a hermenêutica nele desenvolvida. Acreditamos que essa interpretação frontalmente atenta e infringe as disposições constitucionais seguintes: Arts. 20°, n° 4, 202°, n° 2 e 277°, n° 1 Até porque, ao proceder-se como se procedeu, de modo nenhum ficou assegurado a defesa dos direitos dos Réus, muito menos foi o processo equitativo para ambas as partes. Naturalmente damos aqui, como reproduzido, tudo quanto alegámos anteriormente. Naturalmente solicitamos que nos relevem e dispensem de repetir o que já foi escrito.[...].”
Basta, assim, ler os textos invocados pelos recorrentes, que acima se transcreveram integralmente, para verificar que nenhuma questão de constitucionalidade normativa foi suscitada perante o Supremo Tribunal de Justiça, bem como basta ler o teor da reclamação, que acima se igualmente se reproduziu, para constatar que nenhum argumento novo é aduzido que possa infirmar a fundamentada conclusão, a que se chegou na decisão reclamada, de que se não pode conhecer do objecto do recurso, por não estarem presentes os seus pressupostos de admissibilidade e, decisivamente, por não ter a decisão recorrida aplicado, como ratio decidendi, a norma referida pelos recorrentes.
Assim sendo, e pelas razões já constantes da decisão reclamada, que mantém inteira validade e em nada é infirmada pela presente reclamação, é efectivamente de não conhecer do objecto do recurso que a recorrente pretendeu interpor.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. Custas pelos reclamantes, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 3 de Junho de 2004
Gil Galvão Bravo Serra Luís Nunes de Almeida