Imprimir acórdão
Proc. n.º 553/04
3ª Secção Relator: Conselheiro Gil Galvão
Acordam, em conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório.
1. Nos presentes autos, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, em que figuram como reclamante A. e como reclamados B. e outros, a ora reclamante pretendeu interpor recurso para o Tribunal Constitucional, “nos termos da a) e b) do n.º 1 e 2 do Artº 70º da Lei n.º 28/82 de 15 de Novembro” (sic), de uma decisão do Vice-Presidente daquele Tribunal que não conheceu de uma reclamação, “aliás de conteúdo ininteligível”, que a mesma interpusera de um despacho do Conselheiro Relator. Fê-lo através de um requerimento, que concluía do seguinte modo:
“I - Ao não tomar-se conhecimento da douta Reclamação recorrida deixou-se de apreciar o cumprimento da norma estabelecida nos artº.s 316º, 315º, 317º, 318º do C.P.C. bem como da Jurisprudência aceita consagrado no (Acórdão de 15.1.1991, Col.Jur.1991, 1º, 46), que regula que o Valor do Incidente tem de ser igual ao valor da causa principal, violou-se aquela norma. II – Não se tomando conhecimento da douta Reclamação recorrida não se apreciou a norma estabelecida no n.º 4 do Artº 377º do C.P.C., violou-se aquela norma e negou-se o direito da recorrente ao Recurso, previsto na Constituição. III - Ao decidir-se não tomar conhecimento da douta Reclamação recorrida, deixou-se de apreciar o cumprimento da norma estabelecida no Artº 205º do C.P.C., o que impediu a recorrente de Arguir a nulidade de todo o processado, violou-se aquela norma IV - decidindo-se não tomar conhecimento da douta Reclamação, não se apreciou o cumprimento da norma estabelecida no Artº 677º do C.P.C., que regula o trânsito em julgado, violando-se, assim, aquela norma. Termos em que se consideram violadas a normas, estabelecidas nos Artºs 315º,
316º, 317º, 318º, e n.º 4 do 377º, 677º e 205º do C.P.C., o que implica a nulidade de todo o processado, devendo este ser remetido, para ser Julgado novamente de acordo pelo respeito e cumprimento daquelas normas; [...]” (sic)
2. No Supremo Tribunal de Justiça, foi a reclamante convidada, nos termos do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, a indicar a “norma cuja inconstitucionalidade ou ilegalidade [] pretende ver apreciada”, bem como a
“norma ou princípio Constitucional ou legal que se considera violado e [] a peça processual em que tal questão foi suscitada.”
3. Em resposta, veio a ora reclamante alegar, nomeadamente que :
“No requerimento de interposição do recurso da Douta decisão do Venerando Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, que não tomou conhecimento da douta Reclamação, pretende ver apreciada a norma que deve ser aplicada ao valor do Incidente de Habilitação, e a norma que regula o direito ao recurso. Tais normas encontra-se estatuídas nos Artºs 313º, 314º, 315º, 316º, a 318º e n.º 4 do Art.º
377º do C.P.C.,
[...] Ao quedar-se o Tribunal e a Decisão recorrida apreciar a norma que regula a fixar o valor do Incidente de Habilitação, estatuída nos artºs 313º a 316º e
316º a 318º, violou aquela norma, Bem como, A Decisão recorrida ao não tomar conhecimento da Reclamação, em que se alega o direito ao recurso, estatuído no n.º 4 do Artº 377ºdo C.P.C. violou aquela norma bem como o estatuído no Artº 204º da Constituição. Pelo Exposto A violação da norma que regula a fixação do valor do Incidente de Habilitação e a norma do direito ao recurso, torna nulas todas as decisões proferidas no Incidente de Habilitação. Termos em que deve ser considerado a violação de tais normas, devolvendo-se os Autos ao Supremo Tribunal de Justiça, com objecto de se juntar aos autos as Certidões de Averbamento no Registo da Aquisição por Sucessão das Fracções A) e B) na Conservatória do Registo Predial de Lamego, e proceder-se à avaliação por peritagem, com o objecto de se fixar o valor do Incidente de Habilitação. [...]”
(sic)
4. Em face de semelhante resposta, foi proferida, em 24 de Março de 2004, decisão que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional. É o seguinte o seu teor:
“O Recorrente, mesmo depois de convidado, nos termos do n.º 5 do art.º 75°A da Lei do Tribunal Constitucional, não deu cumprimento ao disposto no n.º 2 desse preceito - indicação no requerimento da norma ou princípio constitucional que considera violado e da peça processual em que suscitou a questão da inconstitucionalidade -. Efectivamente, quanto a este requisito, é completamente omissa a informação prestada, e, quanto ao primeiro apenas se faz a vaga e irrelevante referência a violação do art.º 204° da Constituição. Não se entende o que com isso se quer significar , como, aliás, mal se entende tudo o que atabalhoadamente tem sido alegado em sede de reclamação. Nestes termos, não admito o recurso interposto para o Tribunal Constitucional.
[...]”
5. É desta decisão que vem interposta a presente reclamação, do seguinte teor:
“[...], Notificada do douto Despacho da não admissão do Recurso; vem RECLAMAR para o Exmº. Presidente do Venerando Tribunal Constitucional com a motivação seguinte:
[...]
1º. Na sua douta Contestação à Petição inicial dos autos de Habilitação a Reclamante arguiu a Ilegalidade cometida no valor do Incidente e requereu uma avaliação'
2°. Por Jurisprudência aceite em anotação ao 316°. do C.P.C. ficou estatuído que o valor do Incidente da Habilitação deve ser igual ao da causa principal-
(Acórdão da R.C. de 15.11.1991: Col. Jur., 1991, I.. - 46).
3º. Mas sucede que o Tribunal reclamado, não apreciou e nem fundamentou a motivação em que se alicerçou para não julgar uma questão que lhe fora submetida, cfr. o nº.1 do Artº. 205º. da Constituição; isto é, não apreciou o valor do incidente de Habilitação, não Ordenou proceder a avaliação, não Ordenou juntar aos autos (Certidão Actualizada) da inscrição das Fracções A) e B) na Conservatória do Registo Predial que os Recorridos a Habilitar dizem ter Herdado.
4°. O normativo legal do valor do Incidente de Habilitação que deve ser igual ao da causa principal, tem como efeito do estatuído no Artº.103°. n°.2. e 104°. nº3 da Constituição
5°. Porém a Reclamante, ao verificar que o Tribunal reclamado não apreciou os factos que motivaram Arguida Nulidade, recorreu de acordo com o estatuído no n.º
4 do Artº 377º do C.P.C..
6°. Ao ver ser negado o Direito ao recurso, por não ser apreciada a questão que submeteu ao Tribunal a Reclamante, 'Reclamou, Reclamou, Reclamou e Reclamou”. Pelo Exposto. O Tribunal Reclamado ao decidir não admitir o recurso violou o disposto no nº.2 do Artº 202º e 204 e n.º. 4 do Artº 282°. 103°. e 104° da Constituição. Prejudicou a norma da aplicação das taxas de justiça nos Autos do Incidente de Habilitação. Termos que se requer a Vossa Excelência que se digne Ordenar a subida do Recurso.[...]”
6. Já neste Tribunal foram os autos com vista ao Ministério Público, que se pronunciou no sentido da improcedência da reclamação apresentada, o que fundamentou nos seguintes termos:
“A presente reclamação carece obviamente de fundamento sério, já que se não mostra delineada pelos reclamantes qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, susceptível de integrar objecto idóneo de um recurso de fiscalização concreta.”
Dispensados os vistos, cumpre decidir.
II. Fundamentação.
7. Vem a presente reclamação interposta da decisão do Supremo Tribunal de Justiça, 24 de Março de 2004, que não admitiu o recurso para o Tribunal Constitucional que a ora reclamante pretendeu interpor. Ora, tal decisão, diga-se desde já, em nada deve ser censurada.
De facto, por um lado, a reclamante, na resposta ao convite efectuado ao abrigo do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, não indicou nem a “norma ou princípio constitucional que considera violado – a referência ao artigo 204º da Constituição é, neste contexto, irrelevante -, nem a peça processual em que suscitou a questão da inconstitucionalidade. Tanto basta para que o recurso não possa ser admitido.
Por outro lado, basta ler as peças apresentadas pela reclamante para se concluir que nunca qualquer questão de constitucionalidade normativa foi suscitada, o que sempre impediria o conhecimento de um recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade.
III – Decisão
Nestes termos, decide-se indeferir a presente reclamação. Custas pela reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 20 (vinte) unidades de conta.
Lisboa, 13 de Maio de 2004
Gil Galvão Bravo Serra Luís Nunes de Almeida