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Processo n.º 943/03
2.ª Secção Relator: Cons. Mário Torres
Acordam, em conferência, na 2.ª Secção do Tribunal Constitucional,
1. O recorrente A. vem requerer a aclaração do Acórdão n.º 30/2004 – que indeferiu reclamação de decisão sumária do relator de não conhecimento do objecto do recurso –, nos seguintes termos:
“I – 1 – O douto acórdão prolatado descreve todo o teor e conteúdo da decisão sumária de que se reclamou e também os fundamentos de direito e de facto da reclamação apresentada.
2 – O que o requerente pretende ver esclarecida é a seguinte questão:
Se foi por não ter indicado no requerimento do recurso que recorria da decisão do Tribunal da Relação de Guimarães que o mesmo foi sumariamente rejeitado.
Com efeito, quer na decisão sumária, quer no acórdão da conferência, parece ao requerente não ter ficado bem esclarecida essa situação.
II – 1 – Também esse tribunal superior se declarou incompetente, pela douta decisão recorrida, para conhecer do requerido apoio judiciário, por parte do requerente.
Pretendia-se que esse Tribunal esclareça se vai remeter, ou não, o requerimento ao Tribunal que julgue competente para conhecer dessa questão.”
O representante do Ministério Público junto deste Tribunal respondeu, propugnando o indeferimento do pedido de aclaração já que
“as «dúvidas» manifestadas pelo recorrente carecem ostensivamente de qualquer fundamento sério, podendo ser facilmente removidas com a simples leitura da decisão que se pretendeu ver «aclarada»”.
2. Na decisão sumária, o não conhecimento do recurso fundou-se em o recorrente não ter suscitado durante o processo qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, imputando a violação da Constituição directamente às decisões judiciais impugnadas, em si mesmas consideradas, e em o recorrente, apesar de expressamente convidado a indicar as normas
(obviamente, normas de direito ordinário) cuja conformidade constitucional pretendia ver apreciada, não ter correspondido satisfatoriamente a esse convite, indicando como objecto da apreciação do Tribunal Constitucional normas e princípios da própria Constituição, o que se reputou manifestamente desadequado. E prosseguiu a mesma decisão sumária:
“Por último, embora o recorrente, no requerimento de interposição de recurso, não tenha indicado expressamente qual a decisão judicial que pretendia impugnar, a admitir-se ser esta o acórdão do Supremo Tribunal de Justiça, então também é óbvio que as normas por este aplicadas para rejeitar o recurso para ele interposto (artigos 400.º, n.º 1, alíneas e) e f), 414.º, n.º
2, e 420.º, n.º 1, do Código de Processo Penal) nada têm a ver com a questão de inconstitucionalidade suscitada pelo recorrente (relativa a pretensa violação, pelas decisões das instâncias, do princípio da presunção de inocência do arguido). Se, porém, se entendesse que o recorrente pretendia interpor recurso do acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, haveria, em rigor, de não apreciar de imediato a sua admissibilidade sem que primeiramente o mesmo fosse
(ou não) admitido pelo Desembargador Relator desse Tribunal, nos termos do artigo 76.º, n.º 1, da LTC («Compete ao tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do respectivo recurso»); no entanto, no presente caso, não se justifica a determinação do rigoroso cumprimento desse ritualismo, uma vez que surge como patente a inadmissibilidade do recurso mesmo tendo por objecto o acórdão da Relação, pois – repete-se – o recorrente nunca suscitou, ao longo dos autos, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa susceptível de constituir objecto de recurso de constitucionalidade.”
O Acórdão n.º 30/2004, ora aclarando, indeferiu a reclamação da aludida decisão sumária – na qual o reclamante explicitara finalmente que o recurso interposto para o Tribunal Constitucional tinha por objecto o acórdão da Relação –, porquanto tal reclamação, em rigor, não punha em causa os fundamentos da decisão sumária reclamada, antes expressamente reconhecia que, nem no requerimento de interposição do recurso de constitucionalidade, nem na resposta ao convite que lhe foi feito para o completar, o requerente indicara as normas de direito ordinário cuja conformidade constitucional pretendia ver apreciada. A isto acrescia que,
“relativamente às normas de direito ordinário cuja conformidade constitucional pretendia ver apreciada, e que só agora veio identificar – a saber: os artigos
127.º do Código de Processo Penal, 21.º, 22.º e 23.º do Código Penal e 21.º do Decreto-Lei n.º 15/93 –, o reclamante, nos locais por ele indicados (agora reduzidos à fl. 34 da motivação do recurso dirigido ao Tribunal da Relação de Guimarães, uma vez que veio esclarecer que a decisão impugnada era tão-só o acórdão por este Tribunal da Relação proferido), não suscitou a questão da respectiva inconstitucionalidade normativa – nem, aliás, qualquer outra questão dessa natureza –, em termos processualmente adequados a que o tribunal em causa ficasse obrigado a dela conhecer, conforme se evidenciou na decisão sumária reclamada”, sendo por estas razões que se considerou que o recurso de constitucionalidade interposto era inadmissível.
Esta fundamentação do acórdão reclamado não padece de qualquer ambiguidade ou obscuridade que cumpra esclarecer, sendo óbvio que não foi “por [o recorrente] não ter identificado no requerimento de interposição de recurso que recorria da decisão do Tribunal da Relação de Guimarães que o mesmo foi sumariamente rejeitado”, mas sim por não ter suscitado, antes da prolação dessa decisão, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa.
3. O acórdão aclarando não contém qualquer decisão sobre o pedido de apoio judiciário. Tal decisão consta de despacho do relator – que considerou competente para apreciar esse pedido o dirigente máximo dos serviços de segurança social da área de residência do requerente (artigo 21.º, n.º 1, da Lei n.º 30-E/2000, de 20 de Dezembro), e não qualquer outro tribunal (cf. fls.
2644 e 2645) –, estando, assim, qualquer dúvida que esse despacho possa suscitar fora do âmbito da aclaração do Acórdão n.º 30/2004.
4. Em face do exposto, acordam em indeferir o presente pedido de esclarecimento.
Custas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em
15 (quinze) unidades de conta.
Lisboa, 4 de Fevereiro de 2004.
Mário José de Araújo Torres
Paulo Mota Pinto
Rui Manuel Moura Ramos