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Processo n.º 497/04 Plenário Relator: Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam em plenário no Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 – O representante do Ministério Público no Tribunal Constitucional intentou contra a Frente Socialista Popular (FSP), com sede em Avenida
-------------, -------, --- ----, --------, a presente acção de extinção de partido político, com processo comum ordinário, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 18º, n.º 1, alínea e), da Lei n.º 2/2003, de 22 de Agosto, 103º, n.º 3, alínea b), e 103º-F, alínea a), da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na redacção emergente da Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro
(doravante Lei do Tribunal Constitucional), pedindo a sua extinção.
2 – Como fundamentos o autor alega que “quer a lei dos Partidos Políticos actualmente em vigor – Lei Orgânica n.º 2/2003, de 22 de Agosto – quer a própria Lei do Tribunal Constitucional estabelecem que incumbe ao Tribunal Constitucional decretar, a requerimento do Ministério Público, a extinção dos partidos políticos que não apresentem contas em três anos consecutivos”, sendo certo que a norma constante do art.º 18º, n.º 1, alínea c), da referida Lei n.º
2/2003 não se configura como inovatória por se limitar, nesta matéria, a reproduzir o regime que desde 1998 já constava do art.º 103º-F, alínea a) da Lei do Tribunal Constitucional e que este preceito já era plenamente aplicável às contas referentes ao ano em que foi editada a Lei n.º 13-A/98 – ano de 1998 – e anos posteriores, a apresentar no ano seguinte àquele a que dizem respeito.
Mais diz que nos seus Acórdãos n.ºs 444/01, 253/02 e 361/03 “o Tribunal Constitucional condenou o partido requerido pela prática da infracção prevista no art.º 14º, n.º 1, da Lei n.º 56/98, de 18 de Agosto, decorrente da omissão do cumprimento, quanto aos anos de 1998, 1999 e 2000, da obrigação consignada no art.º 13º, n.º 1, da mesma Lei, fixando-lhe, como sanção pela infracção consistente na falta de apresentação de contas, as coimas de, respectivamente, € 9.172,89, € 12.729,32 e € 16.709,73”, e que esses acórdãos transitaram em julgado, pelo que existe caso julgado quanto ao incumprimento culposo da obrigação de apresentação de contas pelo partido requerido naqueles três anos sucessivos e se mostra preenchida a “fattispecie” normativa invocada para justificar a extinção.
3 – O partido requerido foi citado para contestar no prazo de 30 dias mediante entrega de carta registada com aviso de recepção, efectuada em 17 de Maio de 2004, conforme consta do mesmo aviso, havendo essa carta sido enviada em nome de A., Presidente da Comissão Coordenadora Central da Frente Socialista Popular (FSP), para a sede do respectivo partido, de acordo com os respectivos dados constantes do registo existente no Tribunal Constitucional.
O partido requerido não contestou.
4 – Consta dos autos certidão dos acórdãos do Tribunal Constitucional n.ºs 539/99, 370/01 e 319/02, com a nota de que transitaram em julgado, tendo a sua junção ao processo sido ordenada pelo relator nos termos do disposto no n.º 2 do art.º 514º do Código de Processo Civil.
B – Fundamentação
5 – O tribunal é competente [art.ºs 223º, n.º 2, alínea e), da Constituição da República Portuguesa, e 9º, alínea f), e 103º, n.º 3, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional]. O processo é o próprio (art.ºs 2º, 312º e
462º do Código de Processo Civil e 103º, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional) e não enferma de nulidades de que cumpra conhecer. As partes gozam de capacidade judiciária, são legítimas e estão devidamente representadas
(art.ºs 103º-F, da Lei do Tribunal Constitucional, 14º da Lei n.º 2/2003, 160º e
163º do Código Civil e 26º do Código de Processo Civil).
6 – Como decorre do relatado, o partido requerido deve considerar-se como citado pessoalmente, atento o disposto nos art.ºs 233º, n.º 2, alínea a), e
236º, do Código de Processo Civil, dado ter sido citado por meio de carta registada com aviso de recepção endereçada para a sua sede e em nome da pessoa que o representa.
7 – Como já se disse, o partido não contestou.
Porque o estado do processo permite, sem necessidade de mais provas, a apreciação do pedido, passa a conhecer-se imediatamente do mérito da causa, ao abrigo do disposto no art.º 510º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.
Porque o Tribunal Constitucional tem conhecimento deles por virtude do exercício das suas funções, mostrando-se, além disso, junta ao processo certidão que os comprova (fls. 39 a 54), dão-se como provados os seguintes factos:
A Frente Socialista Popular (FSP) não apresentou as contas relativas aos anos de
1998, 1999 e 2000 e, relativamente à gerência de cada um desses anos, nenhuma circunstância ocorre que permita antecipadamente excluir o incumprimento ou a irrelevância do incumprimento, relativamente à sua gerência.
Tais factos foram dados como provados nos acórdãos do Tribunal Constitucional nºs 539/99, 370/01 e 319/02, transitados em julgado, proferidos nos autos de apresentação de contas dos partidos políticos, sendo que o juízo feito neles releva igualmente neste processo por força do caso julgado, nos termos do artº
671º, n.º 1, do Código de Processo Civil.
8 – No artigo 18º, n.º 1, alínea e), da Lei Orgânica n.º 2/2003, de
22 de Agosto estipula-se que o Tribunal Constitucional decreta, a requerimento do Ministério Público, a extinção de partidos políticos no caso de não apresentação de contas em três anos consecutivos. Trata-se de um preceito que entrou em vigor em data posterior ao momento da prática dos factos. Todavia, o que é certo é que o mesmo não faz mais do que reproduzir a norma que já constava do art.º 103º-F, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional, introduzido pela Lei n.º 13-A/98, de 26 de Fevereiro, pelo que o critério de decisão normativa (a norma) é exactamente o mesmo que já antes vigorava. O facto de essa norma ter sido introduzida pela referida Lei n.º 13-A/98, no decurso do ano de 1998 (em 26 de Fevereiro), não constitui obstáculo à relevância da falta de apresentação das contas relativas ao ano de 1998 para o efeito previsto no art.º 103º-F, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional. É que, na verdade, muito embora as contas dos partidos relativas ao ano de 1998 continuassem sujeitas ao regime estabelecido na Lei n.º 72/93, de 30 de Novembro, por mor do disposto no art.º
30º, n.º 2, da Lei n.º 56/98, de 18 de Agosto, o certo é que, de acordo com o estipulado no art.º 13º, n.º 1, daquela Lei n.º 72/93, a obrigação de contas relativas ao ano de 1998 tinha de ser cumprida perante o Tribunal Constitucional até ao fim de Março de 1999 ou seja, portanto, já em plena vigência do art.º
103º-F, alínea a), da Lei do Tribunal Constitucional.
A factualidade acima dada como provada preenche todos os requisitos estabelecidos neste preceito, pelo que se impõe a declaração de extinção do partido político requerido.
Por não haver sido requerido (cf. n.º 2 do art.º 18º da Lei Orgânica n.º 2/2003) não há que fixar o destino aos bens que o partido requerido eventualmente tenha.
A declaração de extinção importa o cancelamento da inscrição no registo dos partidos políticos existente no Tribunal Constitucional.
C – Decisão
9 – Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide julgar procedente por provada a acção e, consequentemente:
a) decretar a extinção do partido político Frente Socialista Popular (FSP); b) ordenar o cancelamento da inscrição da Frente Socialista Popular (FSP) no registo dos partidos políticos existente no Tribunal Constitucional.
Lisboa, 7 de Julho de 2004
Benjamim Rodrigues Vítor Gomes Artur Maurício Rui Manuel Moura Ramos Gil Galvão Maria Fernanda Palma Mário José de Araújo Torres Carlos Pamplona de Oliveira Bravo Serra Maria dos Prazeres Pizarro Beleza Maria Helena Brito Paulo Mota Pinto (vencido, por entender que, tendo a norma aplicada pelo Tribunal entrado em vigor já no decurso do ano de 1998, se não deveria conceder relevância, para decretar a extinção que nela veio a ser prevista de forma inovadora, ao não cumprimento da obrigação de apresentação de contas relativas a esse ano) Luís Nunes de Almeida