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Proc. N.º 236/2004
2ª Secção Rel.: Conselheira Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, em que figura como recorrente A. e como recorrido o Ministério Público, foi proferida Decisão Sumária no sentido do não conhecimento do objecto do recurso (fls. 6867 e ss.) O recorrente vem agora reclamar para a Conferência nos seguintes termos:
O recorrente vem reclamar para a conferência ( artigo 781, n° 3 da LTC), nos termos e pelos fundamentos seguintes.
1) Consta do douto acórdão do S.T.J. e foi transcrito em 1. do douto acórdão do T.C., além de mais, o seguinte.
“Podemos admitir que se tenha decidido contra a lei, mas em face da fundamentação apresentada, não podemos dizer que houve manifesto lapso do Tribunal ao decidir como decidiu”.
(Os sublinhados são nossos ). Ora não podemos crer nem aceitar, pelo respeito que nos merecem os Senhores Juízes que os mesmos possam decidir contra a lei, sem que tal ocorra por mero lapso. Já que decidir contra a lei por forma consciente e determinada não me parece que possa acontecer.
2) A questão objecto deste recurso, é a sua não admissão para o S.T.J.. E os artigos cuja inconstitucionalidade se requereu que fosse declarada, foram aqueles em que se baseou a recusa de admissão desse recurso para o S.T.J.. O que claramente se deduzia do requerimento de interposição do recurso para o Tribunal Constitucional, apesar de se referir aí “o acórdão proferido a
04.02.2004”. Por isso é que os advogados escrevem com frequência e ainda que não o escrevam, sempre esperam e confiam, “no douto e indispensável suprimento de Vas. Exas., Senhores Juizes Conselheiros”.
3) O artigo 32, n° 1, da C.R.P. na sua última versão, fixou expressa e veementemente que o recurso é uma das garantias da defesa. Mais que garantia é a última esperança, a última oportunidade da Justiça. Para o indefeso e débil (perante o poderio do Estado) cidadão comum, tal última esperança é como um último sopro de vida.
4) No caso concreto por sinal, o recurso tinha ainda fundamentos acrescidos em razões de equidade e de igualdade a que a Justiça não pode subtrair-se, sob pena de se desfear e deixar de ser Justiça. Com efeito, era também arguido no mesmo processo e acabou por ser julgado em separado mais tarde, um tal B.. Ora o crime, único por que o aqui recorrente foi condenado, teria sido consumado em co-autoria com o tal B.. Este porém, foi apenas condenado por tal crime em 4 (quatro) anos de prisão e em cúmulo jurídico com outros vários crimes, em apenas cinco anos e seis meses de prisão (Doc. n° 1). Enquanto o recorrente foi condenado a sete anos e meio por aquele só crime de burla por que o B. foi condenado em apenas quatro anos.
5) Se há coisa que a Justiça não pode tolerar é a desigualdade. Chocante, no caso em apreço, pois 7 anos e meio é quase o dobro de 4 anos. E só a via do recurso poderia corrigir tal desigualdade e tal injustiça, tanto mais gritante, quanto o recorrente é já um homem velho, doente e decrépito.
6) As disposições em que se apoiou a recusa do recebimento do recurso para o S.T.J., não podem pois deixar de julgar-se como inconstitucionais e de serem como tais declaradas para todas as consequências legais, nomeadamente, para que seja admitido o recurso interposto para o S.T.Justiça.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido da manifesta improcedência da reclamação.
Cumpre decidir.
2. A Decisão Sumária reclamada, no sentido do não conhecimento do recurso, tem por fundamento a falta de pressuposto processual do recurso da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, consistente na aplicação pela decisão recorrida da norma impugnada. O reclamante afirma que o Supremo Tribunal de Justiça aplicou as normas impugnadas. No entanto, não procede à demonstração de tal asserção, apelando para o “douto e indispensável suprimento de V.Exas., Senhores Juízes Conselheiros”. Ora, como se referiu na Decisão Sumária reclamada, o reclamante interpôs expressamente recurso de constitucionalidade do acórdão de 4 de Fevereiro de
2004. Não cabe evidentemente ao Relator ou ao Tribunal Constitucional reformular o requerimento apresentado pelo recorrente. Importa notar que o recorrente é representado, por imposição legal, por advogado. Por outro lado, as considerações sobre a inconstitucionalidade das normas impugnadas não se revelam pertinentes na presente reclamação, uma vez que nesta fase somente se averigua a admissibilidade do recurso de constitucionalidade. Deste modo, conclui-se que as considerações desenvolvidas pelo reclamante em nada colidem com a Decisão Sumária reclamada. Nessa medida, a presente reclamação será indeferida.
3. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs.
Lisboa, 27 de Abril de 2004
Maria Fernanda Palma Benjamim Rodrigues Rui Manuel Moura Ramos