Imprimir acórdão
Proc. nº 312/2003
2ª Secção Rel.: Consª Maria Fernanda Palma
Acordam em Conferência no Tribunal Constitucional
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Tribunal da Relação de Lisboa, em que figura como recorrente A. e como recorridos o Ministério Público e B., a Relatora proferiu Decisão Sumária com o seguinte teor:
1. A. foi acusado, pelo Ministério Público junto do Distrito Judicial de Lisboa, pela prática de um crime de burla e de seis crimes de falsificação de documentos. O arguido requereu a abertura da instrução, tendo requerido a realização de várias diligências. Tais diligências foram indeferidas, por despacho de 16 de Novembro de 2001 (fls. 70). Na sequência da prolação de despachos relativos a notificações a realizar à assistente (fls. 79 e 80), A. requereu informação sobre a existência de assistentes constituídos no processo (fls. 82), tendo o arguido sido informado que poderá ser esclarecido “através da consulta dos autos, que para o efeito estão ao seu dispor na secretaria” do tribunal (despacho de 4 de Fevereiro de
2002 – fls. 83).
3. A. interpôs recurso do despacho que admitiu a constituição de B., como assistente, afirmando que o despacho recorrido violou vários preceitos do Código de Processo Penal e do Código Penal, bem como o artigo 32º da Constituição (fls.
85 e ss.). O recurso não foi admitido por despacho do seguinte teor:
B. foi por despacho proferido em 8/4/99, que faz fls. 32 dos autos, admitida a intervir nos autos como assistente. O arguido C. e o arguido A. foram constituídos arguidos nos autos em 17/2/2001 - v. fls. 49 e 53 -. Em 27/3/2001 foi deduzida acusação, a qual foi notificada ao Defensor oficioso dos arguidos em 2/4/2001 e a estes em 5/4/2001 e 19/4/2001. Os arguidos vieram em 26/4/2001 e 10/5/2001, requerer a abertura da instrução. O arguido C. juntou aos autos procuração em 26/4/2001 e o arguido A. em
17/5/2001. Tendo em conta o exposto não admito o recurso interposto a fls. 281 pelo arguido A. por ser extemporâneo. Notifique.
4. A. reclamou do despacho de não admissão do recurso, sustentando a tempestividade do recurso interposto. Não suscitou, porém, qualquer questão de constitucionalidade normativa (fls. 2 e ss.). O Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa proferiu a seguinte decisão:
(...) O art. 411º n° 1 do Código de Processo Penal (CPP) contém a regra de que o prazo para a interposição do recurso se conta a partir da notificação da decisão. Se bem se entende a posição do Reclamante, enquanto uma decisão não for notificada não começa a correr o prazo para recorrer. Esta posição nem é incorrecta mas, levada à letra, conduziria a que, mesmo após o trânsito da sentença, o recurso ainda estaria em tempo, a pretexto de uma decisão anterior à constituição de arguido não lhe ter sido notificada. O que manifestamente não é razoável. E no direito, como em tudo, est modus in rebus... O art. 411º n° 1 visa disciplinar a interposição dos recursos, assentando na ideia de as partes só estarem em condições de recorrer quando têm um conhecimento exacto dos termos da decisão em causa. E daí que o início do prazo respectivo só se inicie com a notificação da decisão. Não é objectivo da lei permitir o caos processual, premiar as negligências ou facilitar jogadas destinadas a atrasar os processos. Vejamos: Como se vê dos arts. 119°, 120° e 123° do CPP, a falta de notificação de uma decisão constitui mera irregularidade, a arguir nos três dias seguintes a contar daquele em que tiverem sido notificados para qualquer termo do processo ou intervindo em qualquer acto nele praticado. Não sendo a irregularidade arguida em tempo o acto viciado não pode já ser invalidado, que é como quem diz, torna-se válido. Deste regime das irregularidades extrai-se, antes de mais, a ideia mestra de que a simples intervenção no processo implica que a parte tome conhecimento de todas as peças processuais e das decisões anteriores. Assim é quando v.g. a parte requer a instrução ou junta procuração a favor de advogado. E se porventura a parte, por distracção ou irreflexão, não arguir em tempo a irregularidade da falta de notificação de uma decisão anterior à sua intervenção no processo, não pode prevalecer-se dessa falta de notificação para, mais tarde, recorrer da decisão não notificada. Além disso, em face do mesmo regime, se o ora Reclamante, em vez de recorrer, tivesse arguido a irregularidade da falta de notificação da constituição de assistente, veria essa arguição indeferida por tal falta dever considerar-se sanada e não poderia recorrer. Isto mostra que a lei não tutela situações como a presente, em que a parte tem intervenção no processo e diz que não toma conhecimento das decisões anteriores a essa intervenção com a alegação de que não lhe foram notificadas. Portanto, ao intervir no processo, nele praticando actos, quer pessoalmente, quer pelo defensor oficioso, quer pelo advogado constituído, a parte toma conhecimento de todas as decisões anteriores à sua intervenção, começando então a correr os prazos para requerer o que tiver por conveniente para defesa dos seus interesses. No caso, o arguido, ora Reclamante, pelo menos desde Abril de 2001, ao ser notificado, bem como o seu Defensor Oficioso, da acusação, ou, quando muito, desde 17/5/2001, data em que juntou procuração aos autos, podia e devia razoavelmente ter tido conhecimento da pessoa que já há dois anos havia sido admitida como assistente nos autos. Por isso, ainda que se admita a data mais favorável de 17/5/2001, o recurso interposto em 29/2/2002 é intempestivo, como bem se decidiu.
(...)
Consequentemente, a reclamação foi indeferida. O arguido reclamou e arguiu a nulidade da decisão de 15 de Janeiro de 203, tendo afirmado o seguinte:
1 O processo criminal assegura todas as garantias de defesa incluindo o recurso, artigo 32º, nº 1 CRP.
2 Esta norma foi desrespeitada, segundo cremos, pela decisão reclamada. E pela anterior.
3 O douto despacho ora reclamado e seus fundamentos
– reconhece que o arguido realmente não tinha tomado conhecimento da decisão ou dela sido notificado antes dos 15 dias anteriores à interposição de recurso,
– reconhece, ainda, que o único facto relevante para o início do prazo de recurso é a notificação ou o conhecimento real do despacho recorrido, conforme exige o artigo 411º nº 1 do CPP.
– só aparentemente (vd o item seguinte) faz relevar (como se verá, sem consequência) um conhecimento presumido, que como ficção (que reputa legal) nega a existência do conhecimento real e portanto precisamente não o pode relevar como conhecimento. Ou seja, ao recorrer à falta de conhecimento por exclusivo efeito legal está a confessar que precisamente não houve conhecimento real da decisão recorrida que é o facto que pode ser relevante ao ponto de na tese do despacho, haver necessidade e se justificar ficcionar .
– E confirma a irrelevância do conhecimento presumido, numa matéria gravíssima com fortíssima carga constitucional como a garantia de defesa do arguido imune a qualquer interpretação (maxime restritiva) da lei e à própria lei, confessando conclusivamente o fundamento que aplicou para decidir: “No caso, o arguido,
(....), podia e devia razoavelmente ter tido conhecimento...” Ou seja, confessando a irrelevância, pelo menos para a decisão, do conhecimento ficcionado. O único facto relevante é o conhecimento não a ficção. Como de resto em matéria de direitos fundamentais não poderia deixar de ser.
Daqui resulta que por três fundamentações (e negando a fundamentação do conhecimento presumido) o fundamento da decisão assumido como tal para decidir é o conhecimento da decisão recorrida de admitir o assistente B.. Esse conhecimento como resulta dos autos e sobretudo reconhece o despacho reclamado só se efectivou dentro do prazo de recurso que antecedeu a interposição do recurso. E por muito que “podia ou devia” a decisão não declara que o arguido tivesse o conhecimento “da pessoa que (...) havia sido admitida como assistente”, antes pelo contrário pressupõe que não tinha esse conhecimento antes do prazo legal de recurso subsequente à notificação. Reconhece mesmo “as partes só estarem em condições para recorrer quando têm um conhecimento exacto dos termos da decisão”.
“Podendo ou devendo” o arguido ter o conhecimento, aceita a decisão e seus fundamentos que não tinha conhecimento. O que consequentemente implicava a decisão em sentido contrário ao que dispôs.
4 Os fundamentos do douto despacho estão pois em oposição com a decisão. Artigo
668 nº 1 c) do CPC.
5 Suscita-se com um grito de alma próprio de quem já sofreu uma tremenda inconstitucionalidade com o injusto indeferimento prático da abertura de instrução, a inconstitucionalidade de em matéria de direitos fundamentais com profunda dignidade constitucional se viole as garantias de defesa incluindo o recurso, art. 32 nº 1 da CRP, A) Por se presumir uma ficção de conhecimento como facto que pode iniciar (e portanto afasta para além das possibilidades e controle do arguido) o prazo de recurso de um arguido em matéria de garantia de defesa, alienando a defesa deste de si próprio! B) Por se impedir um recurso legalmente previsto de um arguido (maxime por interpretações restritivas sem correspondência literal que subordinam a defesa de um arguido ao mero risco de “caos processual” ou “de jogadas” não provadas em concreto, tendo por certo que o arguido não tem que responder por isso C) Acresce ainda a inconstitucionalidade que está subjacente e que se alega na motivação do recurso. E que aqui se dá por reproduzida.
6
É ainda contra as garantias constitucionais de defesa não admitir o arguido exercer os seus direitos processuais para anular a constituição de determinado assistente. Como se demonstra na sua reclamação que aqui se dá por reproduzida, o arguido tem direito ao seu recurso como um meio essencial de defesa. Por força da lei e do art. 32 nº 1 da CRP.
Nessa medida também o despacho de que se reclama constitui e produz uma irregularidade e nulidade processual. E produz um vício do processo.
Nestes termos, e com respeito, se reclama a irregularidade e nulidade da decisão notificada.
A arguição foi indeferida por decisão de 14 de Fevereiro de 2003.
5. A. interpôs recurso de constitucionalidade, nos seguintes termos:
A norma do nº 1 do artigo 70º da L 28/82 ao abrigo do qual o recurso é interposto é a b) desse nº 1 do artigo 70º. As normas e princípios constitucionais violados são: a) o artigo 32º nº 1 da CRP: que garante o recurso ao arguido no pressuposto de que este direito só é garantia constitucional de defesa se depender do efectivo conhecimento e portanto consciência da possibilidade real do arguido recorrer, sendo o artigo 411º nº 1 do CPP inconstitucional se se interpretar diferentemente. Esta quantia de inconstitucionalidade foi suscitada no artigo 3º conclusão 4 e 6 da motivação de recurso, no artigo 1º, 5 e 6 da última reclamação do arguido, b) O artigo 32º nº 1 da CRP: na medida em que está excluída a necessidade de defesa do arguido contra o assistente e suas iniciativas processuais, no crime de falsificação não podendo evitar-se que isso suceda quando se constitui o assistente para a acusação da pseudo burla. Suscitou-se esta questão da inconstitucionalidade no artigo 6º da última reclamação do arguido, e nos artigo 3º e conclusão 4 e 6 da motivação de recurso. c) O artigo 32º nº 7 da CRP: ao permitir que o suposto ofendido possa intervir sob o estatuto de assistente fora dos termos da lei. É o que se suscita quando se reclama motiva e de novo reclama ao invocar o desrespeito pelo artigo 68º nº
1 e) e nº 4 do CPP que é constitucionalizado por este nº 7 do artigo 32 (vd artigo 14 e 15 da motivação de recurso) da CRP. O que se traduz também numa garantia de defesa constitucionalmente protegida pelo artigo 32º nº 1 da CRP prevista no artigo 61º b) do CPP.
A Relatora proferiu Despacho ao abrigo do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, tendo o recorrente respondido o seguinte:
A., para cumprir o despacho notificado, vem identificar a norma ou interpretação normativa que tenha constituído fundamento da decisão recorrida e cuja inconstitucionalidade pretende:
1º A fls. 120 decidiu-se não existir nulidade e irregularidade suscitada na decisão de 15-01-2003. Essas nulidades ou irregularidades que compreendiam inconstitucionalidade foram identificadas no requerimento do arguido de 24 de Janeiro de 2003. A decisão que indefere esta reclamação de 24.01.2003 nega que se tenham verificado quaisquer das inconstitucionalidades reclamadas, e reclamadas na primeira oportunidade que houve por ser a oportunidade definitiva natural em que se decidiu que não bastava o que estava escrito na lei: artigo 411º CPC – vd documento nº 1. E por outro lado quando se recorre para o Tribunal Constitucional – e antes não era possível recorrer com base nas inconstitucionalidades acusadas (por não ter havido oportunidade já que só se suscitavam porque o Tribunal da Relação face a uma tese do arguido que era na sua lógica suficiente e objectivamente legítima adoptou uma imprevisível, porque contra a letra da lei, interpretação contra a legalidade – recorre-se de ambas as decisões por uma se conter e encerrar na outra. E recorre-se de ambas as decisões com o entendimento de constituírem afinal uma só (vd interposição de recurso: “douta decisão que antecede e o despacho de 15.01.2003”) por uma se assumir na outra. Vd sumários Ac do TC juntos com documento nº 1 e 2.
2º Identifica-se assim a norma ou interpretação normativa cuja inconstitucionalidade se pretende da seguinte forma, aliás conforme já constava do requerimento de interposição: a) A interposição do artigo 411º nº 1 do CPP, ou seja, o artigo 411º nº 1 do CPP na interpretação (de resto tão inesperada quanto desrespeitadora do princípio da legalidade e CRP por ser interposição extensiva em desfavor do arguido) adoptada de que o prazo para a interposição de recurso em processo penal, não tendo havido notificação da decisão mas intervenções do recorrente do processo posteriores à decisão (que não revelam ou implicam esse conhecimento) começa a decorrer, não desde a data em que o vencido (pela decisão) tenha tido efectivo conhecimento da decisão e consciência da oportunidade ou da possibilidade de recorrer, mas desde a sua intervenção no processo, ainda que por motivos que não lhe sejam imputáveis tenha permanecido sem conhecimento concreto da decisão ou de que fora vencido. Vd ponto II do Ac do TC cujo sumário se reproduz no documento nº 1. Semelhante interpretação subverte em não garantia a garantia constitucional de defesa e recurso do arguido, já que não tem efeito de uma garantia constitucional a garantia que só existe quando é facultado o seu exercício
(quando notificam para recorrer) e não existe, quando por motivos não imputáveis ao arguido, estes permaneceu sem consciência da (decisão) oportunidade de recurso ou não é dada a oportunidade para ser exercida (quando a decisão não é dada a conhecer). Porque para poder recorrer é necessário em termos efectivos saber que há decisão e que se pode recorrer. E para que o recurso seja uma garantia constitucional é necessário garantir efectivamente que se pode recorrer, em concreto! Com tal interpretação o artigo 32º nº 1 da CRP tomava-se inútil. Instituía-se uma ressalva na garantia constitucional não prevista na CRP e contra a CRP. A questão da constitucional idade suscitou-se no artigo 3º e conclusão 4 e 6 da motivação de recurso, no artigo 1, 5 e 6 da reclamação do arguido de Janeiro de
2003. b) A mesma interposição do artigo 411º nº 1 do CPP quando se admite em processo penal uma interpretação desfavorável às garantias constitucionais do arguido fora da letra da lei, do artigo 411º nº 1, não havendo que inventar lacunas para viabilizar interpretações. O artigo 411º nº 1 é claro. Esgota e pretende esgotar em atenção ao artigo 32º nº a CRP [sic] o universo das situações em que começa a correr o prazo de recurso. A questão suscitada é a mesma da anterior e suscitou-se nos locais antes indicados. c) A interpretação adoptada dos artigos 68º e 69º do CPP no sentido de permitirem a constituição e estatuto de assistente e as sujeições do arguido inerentes a esta constituição e estatuto (que tem real eficácia prática) em matéria do crime de falsificação não permitindo este crime por natureza que o arguido se sujeite à acção do assistente. O que necessariamente é desfavorável ao arguido. Por violação dos artigo 32º nº 1 da CRP .
(vd alínea b) do requerimento de interposição de 28.02.2003 onde se especifica onde a questão foi suscitada) d) A interpretação dos artigo 68º em especial dos arts 68º a) e 68º nº 4 do CPP e do artigo 69º do CPP que permite ao (pseudo) ofendido intervir no processo sob o estatuto de assistente fora dos termos da lei. Violando o artigo 32º nº 7 da CRP e por consequência 32º nº 1 da CRP e artigo 61º b) do CPP. Questão foi suscitado nos mesmos locais indicados na alínea anterior (suscitou-se a questão onde se indica na alínea anterior, já que é questão incide sobre a mesma matéria).
3º Uma vez que a presente indicação das normas e interpretações cuja inconstitucionalidade pretende ver apurada já tinha aproximadamente sido efectuada no requerimento de interposição poderá haver uma falta de comunicação ou divergência com o entendimento expresso do Tribunal de que o arguido não se apercebe. E nesse sentido pretendendo adiantar-se não pretende o arguido arriscar os seus direitos: Pedirá subsidiariamente a aclaração do despacho que na verdade pressupondo que na interposição do recurso não foram identificadas as normas não fundamenta porque faz tal juízo. Como o exige o artigo 158º e 668º b), c) e d) do CPC. Não basta a fundamentação jurídica é preciso a fundamentação de facto. Com a falta de fundamentação deixa por esclarecer o próprio conteúdo do despacho. Nem esclarece o que, no teor do seu despacho se traduz por “decisão recorrida”, seja ela qual for, sendo certo que é ambíguo.
Pelo exposto:
1 - R a V. Exa. que julgue cumprido o ónus de identificação das normas ou interpretações cuja inconstitucionalidade se pretende, concedido pelo despacho de 30 de Maio de 2003, dando-o por satisfeito por forma a ser admitido e decidido o recurso.
2 - Subsidiariamente, caso assim não considere em face do que já se adiantou com insegurança neste requerimento: a) reclama-se a nulidade do despacho por não conter os devidos fundamentos em matéria de facto e sua aplicação ao juízo, que pressupõe, de não terem sido identificadas as normas e interposições cuja inconstitucionalidade se pretende. E a sua aclaração por ambiguidade e obscuridade sobre o seu conteúdo, particularmente quanto à parte não fundamentada e consequente obscuridade. b) Reclama-se o esclarecimento do que no despacho se entende por “decisão recorrida” havendo ambiguidade e obscuridade com esse significante. c) Requer-se prazo subsequente ao despacho que decida a nulidade e aclaração, e ao despacho que decida o anterior requerimento de aclaração para se cumprir o
ónus que foi facultado.
Cumpre apreciar e decidir.
6. Sendo o presente recurso interposto ao abrigo dos artigos 280º, nº 1, alínea b), da Constituição e 70º, nº 1, alínea b), da Lei do Tribunal Constitucional, é necessário, para que se possa tomar conhecimento do seu objecto, que a questão de constitucionalidade haja sido suscitada durante o processo. O Tribunal Constitucional tem entendido este requisito num sentido funcional. De acordo com tal entendimento, uma questão de constitucionalidade normativa só se pode considerar suscitada de modo processualmente adequado quando o recorrente identifica a norma que considera inconstitucional, indica o princípio ou a norma constitucional que considera violados e apresenta uma fundamentação, ainda que sucinta, da inconstitucionalidade arguida. Não se considera assim suscitada uma questão de constitucionalidade normativa quando o recorrente se limita a afirmar, em abstracto, que uma dada interpretação é inconstitucional, sem indicar a norma que enferma desse vício, ou quando imputa a inconstitucionalidade a uma decisão ou a um acto administrativo.
Por outro lado, o Tribunal Constitucional tem igualmente entendido que a questão de constitucionalidade tem de ser suscitada antes da prolação da decisão recorrida, de modo a permitir ao juiz a quo pronunciar-se sobre ela. Não se considera assim suscitada durante o processo a questão de constitucionalidade normativa invocada somente no requerimento de aclaração, na arguição de nulidade ou no requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade (cf., entre muitos outros, o Acórdão nº 155/95, D.R., II Série, de 20 de Junho de 1995). Ora, é manifesto que, nos presentes autos, o recorrente não suscitou antes da prolação da decisão recorrida qualquer questão de constitucionalidade normativa. Com efeito, o recorrente apenas afirmou genericamente e somente na arguição de nulidade do despacho que indeferiu a reclamação (o que sempre traduziria uma suscitação tardia) que a decisão recorrida violou o artigo 32º, nº 1, da Constituição, nunca delineando uma verdadeira questão de constitucionalidade normativa susceptível de constituir objecto de um recurso de constitucionalidade a que se reporta a alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional. Tal só veio a acontecer na resposta ao Despacho proferido ao abrigo do artigo 75º-A da Lei do Tribunal Constitucional, o que se afigura manifestamente intempestivo. Por outro lado, não foi proferida qualquer decisão objectivamente inesperada. Na verdade, o despacho do Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa (decisão agora impugnada) confirmou o despacho que não admitiu o recurso da decisão que admitiu a constituição de assistente. Quando o recorrente foi confrontado com este despacho de não admissão do recurso interposto tinha condições, em face do teor do mesmo, para se aperceber de que tinha sido afastada pelo juiz a interpretação do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal, segundo a qual o termo a quo do prazo aí previsto se conta do alegadamente efectivo conhecimento por parte do arguido da decisão de que se recorre. Nessa medida, podia o recorrente suscitar as questões de constitucionalidade que considerasse pertinentes na reclamação que apresentou perante o Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa. Não se verifica, portanto, o pressuposto processual do recurso interposto consistente na suscitação durante o processo da questão de constitucionalidade normativa.
7. Por outro lado, o recorrente pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional o fundamento normativo da decisão que admitiu no processo a constituição como assistente de B.. Ora, tal questão não foi apreciada pela decisão recorrida que apenas se pronunciou sobre a admissibilidade do recurso, tendo concluído no sentido da rejeição da reclamação. A questão relativa à constituição de assistente é objecto do recurso que não foi admitido e cuja não admissão originou a reclamação que subjaz ao presente recurso de constitucionalidade. Assim, a decisão recorrida não fez aplicação das normas relativas à constituição de assistente, pelo que, também com este fundamento, não poderá o Tribunal Constitucional apreciar a questão suscitada.
8. Em face do exposto, decide-se não tomar conhecimento do objecto do presente recurso de constitucionalidade.
2. A. vem agora reclamar para a Conferência, sustentando o seguinte:
1º O recorrente interpôs recurso com fundamento e tendo por objecto três inconstitucionalidades. Vejamos como a Ilustre Relatora decidiu não conhecer qualquer uma delas.
A) I - Interpretação do artigo 411º nº 1 CPP segundo o qual o prazo para a interposição de recurso não começa a correr a partir da data do efectivo conhecimento ou notificação da decisão a recorrer, mas desde a primeira intervenção no processo posterior à decisão.
2º A Ilustre Relatora decidiu não tomar conhecimento deste objecto do recurso com três fundamentos:
3º a) Falta de fundamentação ainda que sucinta da inconstitucionalidade arguida, quando recorrente identifica a interpretação que pretende inconstitucional e a norma constitucional violada.
4º b) Questão não foi suscitada antes da decisão recorrida delineando uma verdadeira questão de constitucionalidade.
5º c) Não existiu a decisão objectivamente inesperada em face do despacho de não admissão do recurso da decisão que admitiu a constituição de assistente.
6º Ora com o devido respeito em rigor estes três fundamentos improcedem.
7º Na verdade nada permite assegurar à M.ma Conselheira e ao Tribunal Constitucional, e só essa certeza poderia fechar a porta do recurso, já que estamos em matéria de garantias constitucionais, que o despacho de fls. 299 que não admite o recurso aplicou o artigo 411 nº 1 do CPP. Nada permite assegurar nem nada permite supor .
8º
É para nós claro que jamais o olímpico despacho de fls. 299 não aplicou nem se preocupou com o artigo 411 nº 1 do CPP. Ignorou a sua existência. No reqto subsequente do arguido até se imputa à decisão, dada a irrelevância pelo despropósito da fundamentação, o qualificativo de “inócua fundamentação”. Da leitura desse despacho parece aparentar que a M.ma Juíza entende que como o despacho da constituição de assistente foi anterior à constituição do arguido não se coloca por ser extemporânea a questão da pronúncia pelo arguido ao abrigo do artigo 68º nº 4 CPP. Ou ainda mais, que tendo ocorrido determinados actos objectivos independentemente do conhecimento, em nada relacionáveis com o arguido, como a junção da procuração ou um requerimento se prejudicou o direito ao recurso. E é notório que o despacho não refere em passo algum que é a notificação ou o conhecimento do acto que decide o sentido do despacho. Nem que a decisão relevou o conhecimento ou a notificação exigidos por lei. A fundamentação do despacho é ininteligível para a decisão que conclui.
É, reconhece-se, legitimo para quem como o signatário, lê pela primeira vez um despacho, (aliás já habituado à irracionalidade com o indeferimento rotundo do requerimento de instrução ), que não tenha conseguido encontrar ou vislumbrar no despacho de fls 299 qualquer interpretação do artigo 4112 do CPP. Não só é legítimo como é objectivo. Não havendo lugar a despachos implícitos ou especulação em matéria de defesa em processo penal.
9º Para se suscitar a questão da constitucionalidade é pois necessário que tenha sido aplicado o artigo 411 nº 1. Não o foi expressamente. Nem tacitamente. Era então preciso que tivesse sido aplicada uma interpretação extensiva do artigo 411 nº 1 CPP . Ou seja, não basta a ausência duma referência artigo 411 nº 1 CPP no despacho, como temos a ausência de uma interpretação sem correspondência nos sentidos possíveis da letra da lei ( artigo 411º nº 1 do CPP) do nº 1 do artigo 411 do CPP no despacho. E na verdade não foi nem aplicada, nem alegada, nem construída ou discorrida qualquer interpretação sequer do artigo 4112 nº 1 CPP (como o Tribunal da Relação veio reconhecer mais tarde).
10º Pura e simplesmente ignorou-se a norma (nº 1, 411º do CPP) e dispensou-se qualquer interpretação da mesma. E avançou por uma decisão do tipo “pragmático” com pretensa justificação moral.
11º Com o referido despacho da 1ª Instância não se constituiu a oportunidade e como tal o ónus para o arguido poder suscitar a questão da inconstitucionalidade de interpretação do artigo 411º nº 1 do CPP.
12º Em face do despacho o arguido iria suscitar a inconstitucionalidade de quê concretamente. De que interpretação? De que norma? Como suscitaria a inconstitucionalidade de uma norma a propósito daquilo que consubstanciou uma decisão à margem da lei sem preocupação de a aplicar . Há que distinguir não aplicar a lei sem recurso a qualquer interpretação. E aplicar a lei inconstitucionalmente. Só esta é passível de que se suscita a inconstitucionalidade.
13º Com o despacho do Tribunal da Relação o arguido passou porém a ter uma interpretação da lei cuja inconstitucionalidade poderia suscitar .
14º E então suscitou claramente:
“O processo criminal assegura todas as garantias de defesa concluindo o recurso, artigo 32º nº 1 CRP. Esta norma foi desrespeitada pela decisão reclamada (...)” e explica-se porquê delineando e fundamentado uma questão de inconstitucionalidade”.
“- reconhece que o arguido não tinha tomado conhecimento da decisão ou dela sido notificado antes dos 15 dias anteriores à interposição do recurso.
- reconhece ainda que o único facto relevante é a notificação ou o conhecimento real do despacho recorrido conforme exige o artigo 4112 nº 1 do CPP .
- só aparentemente (...) faz relevar um conhecimento presumido (...) que como ficção (...) nega (...) a existência do conhecimento real e portanto não o pode relevar como conhecimento.
- e confirma a irrelevância do conhecimento presumido, numa matéria gravíssima com fortíssima carga inconstitucional como a garantia de defesa do arguido
(...)” E mais tarde remata-se
“Suscita-se (...) a inconstitucionalidade de em matéria de direitos fundamentais com profunda dignidade constitucional se viole as garantias de defesa incluindo o recurso, artigo 32º nº 1 da CPP, A) por se presumir uma ficção de conhecimento como facto pode iniciar (e portanto afasta para além das possibilidades de controle do arguido) o prazo de recurso de um arguido em matéria de defesa, alienando a defesa deste de si próprio (...)
“o arguido tem direito ao recurso como um meio essencial de defesa. Por força da lei e do artigo 32º nº 1 da CRP”.
15º Ficou assim claramente feita pelo recorrente a “fundamentação ainda que sucinta da inconstitucionalidade arguida” quando se identificou a norma constitucional violada e a interpretação (da norma) violadora que foi inconstitucionalmente adoptada. Antes de esgotado o poder jurisdicional do Tribunal onde se colocou pela 1ª vez a questão, antes da decisão recorrida do Sr. Presidente do Tribunal a quo, foi suscitada a verdadeira questão da constitucionalidade.
16º Ora como se salienta é a decisão do Tribunal da Relação a primeira a invocar e aplicar do artigo 411º nº 1, sujeitando o arguido pela primeira vez no processo,
(pelo menos de forma perceptível e que permita pressupô-lo), a uma interpretação que adoptou de forma inesperada. Tão inesperada quanto confessadamente contra a letra desse artigo 411º nº 1. E por isso só então se constituiu efectivamente a primeira oportunidade processual para suscitar a inconstitucionalidade da sua aplicação e interpretação. Até aí não estava em causa o artigo 411 CPP . Ou sua interpretação.
(Podia dizer o artigo 411 mas nunca esse artigo foi à decisão chamado; e nada de concreto havia para contrariar ou contrargumentar). Como escreve um dos Acórdãos juntos. Até aí não tinha havido oportunidade processual para, antes de proferida a decisão, os interessados equacionarem a questão da constitucionalidade. O artigo 411º do CPP sempre existiu mas jamais com a interpretação que o Tribunal da Relação o vestiu. E sendo subjectiva como interpretação para além da letra da lei, a interpretação só nasce quando é exprimida. Até lá a solução adoptada embora coincidisse não estava associada ao artigo 4112 do CPP nem se assumiu como sua interpretação. Não a expressando e não relacionando o despacho de fls 299 com o artigo 4112 CPP não era legitimo e objectivo assumi-lo como uma interpretação do artigo 411.9. nº 1 CPP. Ainda hoje não se aceita como tal. Até à decisão da Relação era portanto inesperado o objecto da inconstitucionalidade suscitado. Nunca tinha nascido, não existia nos autos uma interpretação do artigo 411º nº 1 do CPP como a que veio a ser objecto deste recurso. E só esta interessa pois só esta foi pretendida pelo recorrente para ser objecto do recurso de inconstitucionalidade.
17º Sublinha-se também que o Juiz a quo (Presidente do Tribunal da Relação) se pôde pronunciar sobre a questão da inconstitucionalidade suscitada quando o recorrente não só arguiu e reclamou a nulidade como se reclamou a irregularidade. Facto que o despacho da Ilustre Juiz Conselheira Relatora subtraiu do seu despacho. Facto que é de relevância maior já que se aplica inteiramente o ensinamento do Acórdão do Tribunal Constitucional de 14.07.1992, processo 91-270-2 (vd documentos juntos pelo recorrente no antecedente requerimento):
“Se o recorrente apenas com a notificação do acórdão recorrido teve conhecimento de que nele se tinha aplicado a norma do artigo 416.9. da CRP “(no nosso caso, do artigo 411 nº 1 do CPP) “com um sentido que considere inconstitucional, o que lhe cumpria era arguir a respectiva irregularidade processual e do acórdão que eventualmente desatendesse essa arguição é que lhe competiria recorrer para o Tribunal Constitucional”.
18º O Acórdão nº 155/95 invocado na douta decisão aqui em reclamação não é aplicável senão quanto à aclaração e vem dar razão ao recorrente “só se suscita durante o processo quando tal se faz a tempo de o Tribunal recorrido poder decidir essa questão” (pg 6753 DR II. Não tenhamos duvidas que o Tribunal recorrido é aqui aquele que introduziu o artigo 411º nº 1 e uma sua interpretação e portanto a questão da inconstitucionalidade, ou melhor, que introduziu nos autos a sua inconstitucionalidade. Mal introduziu o recorrente suscitou a inconstitucionalidade da respectiva interpretação. Só na Relação surgiu a questão. E reforçando o Acórdão 155/95 ainda mais ajuda: “- o que salvo casos excepcionais e anómalos, em que, por o recorrente não ter oportunidade processual de cumprir esse ónus, ele deve ser dispensado do seu cumprimento”. Foi o caso dos autos. Na primeira oportunidade, cometida a inconstitucionalidade, o recorrente suscitou-a: na sua reclamação para a Relação. Porque a inconstitucionalidade pode ser cometida originalmente pelo Tribunal da Relação em sede de reclamação (ou recurso). O recorrente fez tudo “by the book” ainda que o processo tenha decorrido
“outlaw”.
19º O citado Ac 155/95 lembra aliás que para que se possa conhecer de um recurso é necessário “que tais normas tenham sido aplicadas no julgamento do caso”. Ora na
1ª instância dos presentes autos a interpretação do artigo 411º nº 1 e o artigo
411 nº 1 do CPP não foram aplicados no julgamento. Não se pode afirmar o contrário. E não se vislumbra que na reclamação para o Presidente do Tribunal da Relação se pudesse alegar que o, então Tribunal a quo, tivesse feito, uma determinada aplicação de uma interpretação do artigo 411º nº 1 do CPP. De resto se assim fosse especulativamente alegado pelo arguido a Relação logo decidiria que não percebe qual nem que inconstitucionalidade se formou, ou mais simplesmente decidiria que se inventou uma questão porque não aplicou o artigo
411º nº 1 ou sua interpretação, ou que nada autoriza o que não passa de uma especulação. E com toda a razão. O recorrente não teria então que entrar em especulações e fazer os tribunais sofrer ou laborar na suas especulações.
20º Pelo exposto o ponto 6 do despacho aqui reclamado é infundado improcede e não se aplica ao caso vertente. Pelo que a decisão reclamada é ilegal.
21º A primeira inconstitucionalidade acusada pelo recorrente deve pois ser conhecida, uma vez que estão reunidos todos os pressupostos processuais para o efeito.
22º
B)
II – Inconstitucionalidade face ao artigo 32º nº 1 da CRP na interpretação dos artigo 68º e 69º do CPP que sujeitam o arguido à constituição de assistente em crime de falsificação que por natureza não o admitiria. III - Inconstitucionalidade face ao artigo 32º nº 7 da CRP na interpretação do artigo 69º do CPP que permite ao ofendido intervir no processo sob o estatuto de assistente em processo que tinha por objecto crime que por natureza não admitiria tal intervenção, como o de falsificação.
23º A decisão reclamada identifica a decisão recorrida como as do Tribunal da Relação. Na matéria da anterior inconstitucionalidade fá-lo bem, mas nestas a inconstitucionalidade radica em acto anterior, e por isso é suscitada anteriormente.
24º Logo no recurso que interpôs da constituição de assistente (fls. 85) o arguido suscitou a inconstitucionalidade de ter sido violada a garantia de defesa e recurso prevista no artigo 32º nº 1 da CRP com a aplicação do artigo 68º nº 1 a) e b) da forma como o despacho o fez.
É o que consta do artigo 2º e 3º e da conclusão 4 e 6 da motivação do recurso.
25º E como prescreve o artigo 70º nº 2 da LTC no itinerário processual o recurso para o Tribunal Constitucional só tem lugar quando se trata de decisões que já não admitia recurso ordinário.
26º Os vícios das referidas inconstitucionalidades foram suscitados ab initio e assim sucessivamente em cada impugnação até ao acto da reclamação para o Presidente do Tribunal da Relação. Desde a ultima decisão deste órgão já não se podia recorrer ou reclamar desse vício. E nessa altura recorreu-se ao Tribunal Constitucional. Mais não o arguido poderia ter feito. A mais o arguido e recorrente não era obrigado. Foram esgotados todos os meios processuais para se arguir o vício. Ora é lógico que as referidas inconstitucionalidades estão em causa com a decisão de admissibilidade do recurso. Quando se decide esta está-se a decidir a sorte das referidas inconstitucionalidades. É inegável que não admitindo o recurso se fez uma aplicação (pretendendo excluir da respectiva previsão) pela negativa da lei e consequentemente do artigo 32º nº 1 e 7 da CRP. Ao evitar-se a lei faz-se uma interpretação e aplicação excluidora da aplicação da lei.
27º A todo o direito corresponde uma acção, artigo 2º nº 2 do CPC, e neste caso também artigo 32º nº 1 da CRP , porque a inconstitucionalidade acusada tem que ser julgada sob pena da defesa, nomeadamente por ofensa dos direitos fundamentais constitucionais, ser prejudicada.
28º Como é óbvio se o recurso não for admitido obstaculiza-se a viabilidade desse vício suscitado oportuna e adequadamente. E desse modo o arguido sofrerá os efeitos do que suscitou inconstitucionalidade. Sem que possa defender-se. Já que tudo fez e expressou contra a inconstitucionalidade. Decidiu-se assim por omissão sobre a questão de inconstitucionalidade suscitada. Não admitir o conhecimento recurso é obrigar o recorrente a que tudo se passe como se não fosse inconstitucional e como se não tivesse sido suscitada a inconstitucionalidade. E permitir a inconstucionalidade. E isto não ocorre independente de decisão.
29º Não é nem poderia ser uma omissão de pronúncia ou uma decisão de questão prévia
(a admissibilidade de recurso) que poderia evitar a decisão sobre a inconstitucionalidade que foi suscitada desde a primeira oportunidade processual.
É uma questão autónoma que foi oportunamente colocada e que como tal merece e exige decisão.
30º Visto noutra prespectiva: A decisão recorrida “aplicou as normas relativas à constituição de assistente. Já que a decisão recorrida é nesta matéria porque não pôde processualmente ser a decisão do Presidente do Tribunal da Relação, a decisão da primeira instância. Para a matéria em causa esta é a decisão definitiva até à pronúncia do Tribunal Constitucional. Formalmente á primeira vista pode não aparentar mas a decisão recorrida nesta matéria não é a que cronologicamente foi a ultima decisão.
31º Quer o recurso seja admitido ou não a ultima decisão sobre as matérias referenciadas nesta parte B da reclamação é a decisão recorrida que por vicissitudes processuais só pôde merecer um encaminhamento processual através da decisão expressamente tida por recorrida pela sentença do Tribunal Constitucional agora notificada e de todo o itinerário processual exigido por lei para chegar à apreciação do Tribunal Constitucional.
32º Por força do artigo 70 b) e nº 2 e 3 da L 28/82 o Tribunal Constitucional tem que apreciar a inconstitucionalidade de decisões suscitadas sobre cada matéria que tenha sido levantada e decidida em decisão irreclamável e irrecorrível quanto a essa matéria ,ainda que por forças processuais relativas a outras matérias, possa e tenha havido ulterior tramitação processual. Mais concretamente, quando, apesar da irrecorribilidade ainda era possível (caso o recurso da 1ª instância tivesse sido admitido) que as questões se pudessem resolver de forma às inconstitucionalidades relativas à constituição e intervenção do assistente puderem ser decididas pelo Tribunal da Relação desfazendo a inconstitucionalidade criada na 1ª instância. Porque por vezes, como foi o caso, a decisão só se toma definitiva (em termos de recorribilidade para o Tribunal Constitucional) com outra decisão sobre outra matéria. E até lá a parte processual tem que esperar pela decisão sobre outra matéria que indirectamente toma a inconstitucionalidade apenas reversível por recurso ao Tribunal Constitucional.
É o que acontece nestes autos. Pelo que a decisão recorrida segundo a sentença do TC encerra a decisão de tomar definitivas as inconstitucionalidades que não refere expressamente, e paralelamente torna definitivas (esgota outros meios de recurso que não para o TC ) as inconstitucionalidades que sempre teve o cuidado de sucessivamente em cada passo posterior á respectiva decisão expressa da 1ª instância, invocar e manter recorrível para o TC.
33º O TC tem pois que apreciar a inconstitucionalidade suscitada sobre cada decisão cuja inconstitucionalidade tenha sido oportunamente suscitada, a montante da
última decisão processual irrecorrível e irreclamável sempre que tenha havido mais do que uma (matéria) inconstitucionalidade suscitada e decidida irrecorrivemente, e esta não tenha sido objecto da última decisão mas objecto de decisão anterior que quanto á inconstitucionalidade seria e foi, relativamente à matéria, a última possível.
34º Os pressupostos do ponto 7 da Decisão do TC estão pois equivocados. A questão relativa à constituição e intervenção de assistente foi objecto de adequada invocação das inconstitucionalidades pretendidas e objecto de decisão cuja constitucionalidade, independentemente da admissão do recurso para a Relação tem que ser conhecida pelo TC. É para o respectivo efeito e matéria a própria decisão recorrida. Ainda que quanto a outra matéria processualmente indissociável do processo de recurso para o TC tenha sucedido com necessidade processual posterior decisão. Eis pois porque de facto a decisão realmente recorrida quanto a esta matéria fez uma aplicação das normas relativas á constituição de assistente, contrariamente ao afirmado na Decisão aqui reclamada.
35º O TC deve pois por força dos artigos 70 e segs da L 28/82 e 280 da CRP, tomar conhecimento e apreciar as duas questões de inconstitucionalidade objecto da parte B) da presente reclamação.
Pelo exposto e fundamentado, Reclama-se contra a Decisão do TC por ilegal (artigo 70 da L28/82) e inconstitucional (artigo 32 e 280 da CRP) devendo esta ser revogada por decisão que decida admitir e conhecer o objecto do recurso de constitucionalidade, e quanto a todas as referidas questões suscitadas, decidindo as inconstitucionalidades conforme melhor se alegará. Mais se reclama a notória nulidade da Decisão reclamada por omissão de pronuncia
(artigo 668 do CPC ) quanto a tudo quanto requerido pelo arguido a 16-6-2003.
O Ministério Público pronunciou-se no sentido do indeferimento da reclamação, nos seguintes termos:
1° A presente reclamação é manifestamente infundada.
2° Na verdade - e sendo a decisão impugnada a proferida pelo Presidente da Relação, no âmbito de reclamação deduzida - é evidente que nela não se aplicaram quaisquer normas estranhas à única questão dirimida: a de intempestividade do recurso, com base na interpretação do artigo 411° do Código de Processo Penal.
3° Ora, quanto a esta questão, é desde logo manifesto que não foi suscitada, em termos tempestivos e adequados, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa, podendo perfeitamente tê-lo sido, já que o objecto da controvérsia incidia precisamente sobre a matéria da contagem do prazo para recorrer .
4° Acresce que - em reforço da total falta de razão do reclamante - a decisão recorrida não aplicou a norma do artigo 411º, n° 1, do Código de Processo Penal com o sentido que lhe atribui o recorrente, a fls. 132, de ter permanecido, ao longo do processo, sem conhecimento concreto da prolação da decisão questionada
“por motivos que não lhe sejam imputáveis”.
5° Bem pelo contrário, toda a lógica argumentativa expendida naquela decisão é no sentido de que, ao longo das precedentes intervenções processuais, o arguido teve plena oportunidade para tomar conhecimento da decisão não notificada, se tivesse agido com a diligência devida.
Cumpre apreciar.
3. O reclamante pretende que o Tribunal Constitucional aprecie a conformidade à Constituição da norma do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal. Na Decisão Sumária impugnada considerou-se que a questão de constitucionalidade não foi suscitada durante o processo, quando, em face do despacho de fls. 103, podia tê-lo sido. O reclamante afirma que nesse despacho não foi aplicado o artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal. Ora, o referido despacho indeferiu o requerimento de interposição do recurso por extemporaneidade. Tal decisão fundou-se, necessariamente (em face do seu teor e da referência à extemporaneidade), ainda que não expressamente, numa interpretação do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal, preceito que regula a matéria relativa ao prazo de interposição do recurso. O reclamante impugna, precisamente, a dimensão normativa subjacente a essa decisão, afirmando que não teve condições para apreender que aquele despacho fez uma qualquer interpretação do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal. Contudo, como se sublinhou na Decisão Sumária reclamada, verifica-se a existência de condições objectivas para entender que ao despacho de fls. 103 subjaz uma interpretação do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal. Com efeito, uma decisão que, fazendo referência às datas de determinados actos processuais relevantes, não admite um recurso “por ser extemporâneo”, só pode fazer uma dada interpretação do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal, preceito que se refere ao prazo de interposição do recurso. Desse modo, se o reclamante afirma que não podia apreender que aquele despacho fez aplicação do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal, tal não se deve, manifestamente, à falta de condições objectivas ou de elementos claros para tirar aquela conclusão. Na verdade, para um mandatário medianamente diligente é exigível, em face dos elementos dos autos, configurar que o despacho de fls. 103 fez aplicação de uma dada dimensão normativa do artigo 411º, nº 1, do Código de Processo Penal, já que, para tal, dispõe das necessárias condições.
4. O reclamante pretende, por outro lado, submeter à apreciação do Tribunal Constitucional o fundamento normativo da decisão que admitiu nos autos a constituição de assistentes (artigo 69º do Código de Processo Penal), sustentando que suscitou a questão de constitucionalidade normativa durante o processo. No entanto, o fundamento da decisão Decisão Sumária impugnada quanto a esta questão foi a não aplicação pela decisão recorrida (decisão que decidiu a reclamação) da norma impugnada (cf. ponto 7 da Decisão Sumária). O reclamante afirma agora, porém, que o Tribunal Constitucional tem de apreciar a “inconstitucionalidade suscitada sobre cada decisão cuja inconstitucionalidade tenha sido oportunamente suscitada”. Ora, o Tribunal Constitucional, no âmbito da fiscalização concreta da constitucionalidade, aprecia recursos interpostos de decisões proferidas pelas instâncias, recursos esses que têm por objecto questões de constitucionalidade normativa e não questões de constitucionalidade da própria decisão. Por outro lado, nos presentes autos, o reclamante interpôs recurso do despacho de 14 de Fevereiro de 2003 e do despacho de 15 de Janeiro de 2003 (cf. fls.
122). Foram essas as decisões recorridas (identificadas expressamente pelo reclamante no requerimento de interposição de recurso de constitucionalidade). De resto, não faria qualquer sentido interpor recurso de constitucionalidade de todas as decisões proferidas nos autos. Com efeito, o recurso de constitucionalidade previsto na alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional é interposto da decisão que já não admite recurso ordinário. Improcede, portanto, a presente reclamação também quanto a este ponto.
5. Em face do exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a presente reclamação, confirmando consequentemente a Decisão Sumária impugnada.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em 15 UCs.
Lisboa, 19 de Novembro de 2003
Maria Fernanda Palma Benjamim Rodrigues Rui Manuel Moura Ramos