Imprimir acórdão
Proc. n.º 591/03 TC - 1ª Secção Rel.: Consº Artur Maurício
(rectificado pelo Acórdão nº 547/03)
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
1 - A., com os sinais dos autos, interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça do acórdão do Tribunal Colectivo da Comarca de Olhão que a condenou pela prática de um crime de homicídio, na forma tentada, na pena de nove anos de prisão.
Em alegações, desde logo a recorrente afrontou a questão da tempestividade do recurso, sustentando, em síntese, que, dado o disposto no artigo 45º n.º 2 da Lei n.º 30-E/2000 de 20 de Dezembro, a introdução em juízo do pedido de escusa por parte do defensor inicialmente nomeado determina 'a interrupção do prazo que estava então em curso para a prática de acto processual, reiniciando-se tal prazo com a operante notificação do novo patrono' sob pena de se violar o disposto no artigo 32º da Constituição.
Sobre este recurso foi proferido, pelo juiz do Tribunal Judicial da Comarca de Olhão da Restauração, em 20/06/03, o seguinte despacho:
'Fls. 382 - A arguida vem em 12 de Junho (data da expedição via CTT) interpor recurso do acórdão proferido em 29 de Abril, lido e depositado em tal data. Pese embora as considerações expendidas para justificar a tempestividade do recurso, as mesmas não colhem porque a arguida esteve sempre assistida por defensor e, como resulta do disposto no artº 45º n.º 2 da Lei n.º 30-E/2000 de
20/12, o defensor enquanto não for substituído mantem-se para todos os actos subsequentes do processo, o que sucedeu in casu.
Assim, o recurso ora apresentado é manifestamente extemporâneo, motivo pelo qual não o admito.
Notifique.'
Desde despacho reclamou a recorrente para o Presidente do STJ, o qual por despacho de 21/07/03, manteve a decisão sob reclamação.
Veio então a recorrente interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70º n.º 1 alínea b) da LTC, dizendo no respectivo requerimento que 'tendo sido oportunamente notificada do douto despacho de 20/06/03, a fls, 387-388, - que, por extemporaneidade, não admitiu o recurso interposto para o Supremo Tribunal de Justiça, do douto acórdão do Tribunal Colectivo, datado de 20/04/2003, a fls. 323-332 (sem pronúncia àcerca da invocada inconstitucionalidade), e tendo sido rejeitada a reclamação apresentada ao presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por decisão datada de
21/07/2003: STJ/5ª Secção, proc. 2876/03, fls. 32-33 - expedida sob registo postal em 21/07/2003 (sem pronúncia àcerca da invocada inconstitucionalidade) ao abrigo do que dispõem, designadamente, o artº 69º e sgs., da Lei 28/82, de 15/11 vem declarar pretender interpor recurso para o Tribunal Constitucional (...)'.
Sobre este requerimento, apresentado no Tribunal de Olhão da Restauração foi proferido pelo Juiz do 1º Juízo deste Tribunal o seguinte despacho:
'Conforme decorre do artigo 76º n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional (Lei n.º 28/82, de 15/11) compete ao Tribunal que tiver proferido a decisão recorrida apreciar a admissão do recurso.
O recurso de fls. 407 só pode ter como objecto a decisão da reclamação, já que o prazo de recurso do acórdão do Tribunal Colectivo há muito que expirou.
Pelo exposto, desentranhe a reclamação, bem como o requerimento de recurso da fls. 407 e envie ao Sr, Presidente do STJ, que é competente para a apreciação do presente recurso (artº 76º n.º 1 da citada Lei)'.
Remetidos os autos ao STJ, pelo Presidente deste Tribunal, o recurso foi admitido.
Neste Tribunal, foi proferido despacho ordenando alegações.
A recorrente apresentou alegações, dizendo, no início do texto e sob a epígrafe 'a decisão recorrida' o seguinte:
'1 - Com a devida vénia, e ao contrário do que foi entendido pelo meritíssimo Juiz a quo (turno) a decisão recorrida não +é o despacho do presidente do STJ, é sim o douto despacho proferido pelo meritíssimo Juiz da comarca de Olhão, 1º Juízo, em 20/06/03, no âmbito do processo crime comum n.º
522/02.9 PAOLH, em que era Autor o MP e Ré a ora recorrente, e que não admitiu recurso para o STJ do acórdão do Tribunal Colectivo, datado de 29/04/2003.
2 - Ainda com a devida vénia, e ao contrário do que entendeu o presidente do STJ, o despacho de admissão (ou não admissão) de recurso deveria ter sido proferido, não por ele, e sim pelo Juiz do Tribunal recorrido (a quo).
.............................................................................................................'
Em contra-alegações, suscitou o Ministério Público uma questão prévia sobre 'a errada indicação da decisão recorrida', sustentando, em síntese, que, 'tendo a recorrente indicado explicitamente como decisão recorrida uma decisão das instâncias, já precludida e consumida pela ulterior tramitação do processo perante a ordem dos tribunais judiciais, carece de utilidade a dirimição do presente recurso de fiscalização concreta, por o nele decidido se não poder naturalmente repercutir na decisão final que, no âmbito dos tribunais judiciais, foi proferida sobre a questão de constitucionalidade suscitada.'
A recorrente foi ouvida sobre esta questão prévia, dizendo:
'1 - Bem ou mal na perspectiva processual, VVExas virão exprimir o entendimento que fazem desta matéria - a decisão recorrida para este Tribunal Constitucional é e foi sempre o douto despacho, datado de 20/06/2003, proferido pelo meritíssimo Juiz de Direito do 1º Juízo da comarca de Olhão, que, relativamente ao acórdão do Tribunal Colectivo de 29/04/2003, não admitiu o recurso interposto pela Ré (ora recorrente) para o STJ com referência à data de
03/07/2003, e não o admitiu por extemporaneidade.
2 - O presidente do STJ entendeu não atender a reclamação sobre aquela decisão de não admissão do recurso mas, ainda naturalmente no entender da recorrente, isso em nada colidiu, colide ou é susceptível de colidir com o que acima ficou exposto.'
Cumpre decidir.
2 - É ao recorrente - e só a ele - que compete indicar a decisão judicial que pretende impugnar para este Tribunal, como aliás para qualquer outro.
Não pode, pois, o tribunal substituir-se à parte em tal opção, mesmo que entenda errada a escolha feita pelo recorrente.
No caso, o requerimento de interposição de recurso era omisso quanto
à decisão recorrida, muito embora a apresentação desse requerimento no Tribunal Judicial de Olhão pudesse, desde logo, apontar, como decisão impugnada, para aquela que naquele Tribunal não admitira, por extemporaneidade, o recurso interposto do acórdão condenatório do Tribunal Colectivo para o STJ.
A verdade é que o Juiz de 1ª Instância entendeu que o recurso de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional só podia vir interposto do despacho do presidente do STJ que, em reclamação do despacho de não admissão de recurso, o mantivera; remeteu, assim, os autos ao presidente do STJ para proferir despacho de admissão (ou não admissão) do recurso de constitucionalidade nos termos do artigo 76º n.º 1 da LTC.
E é pelo presidente do STJ que vem, de facto, a ser proferido o despacho de admissão de recurso para este Tribunal.
Nesta conformidade, parecendo suprida (?) a omissão da recorrente, se compreende o despacho do relator, ordenando alegações.
Sucede, porém, e como resulta dos textos supra transcritos, que a recorrente, nas suas alegações, veio deixar expressa a sua opção no sentido de querer impugnar, não o despacho do presidente do STJ que mantivera o despacho reclamado, mas esta última decisão proferida em 1ª Instância, salientando mesmo que o Juiz do Tribunal Judicial de Olhão errara ao remeter os autos para o presidente do STJ para se pronunciar sobre a admissibilidade do recurso interposto para o Tribunal Constitucional.
E tal opção é ainda reiterada quando, notificada das contra-alegações do Ministério Público, onde se suscita a aludida questão prévia, mantém que o recurso vem interposto da decisão de 1ª instância.
Face à posição assumida pela recorrente - agora bem expressa - não pode o Tribunal Constitucional emitir o seu juízo sobre a admissibilidade do presente recurso tendo como impugnada outra decisão senão aquela que a recorrente indica.
Mas, sendo assim, manifesto é que o recurso não é admissível.
Na verdade, a decisão de não admissão de recurso, proferida em 1ª instância, era reclamável - e foi reclamada - para o presidente do STJ, constituindo a decisão sobre a reclamação a última palavra, na ordem dos tribunais judiciais, sobre a matéria; significativamente, o artigo 70º n.º 3 da LTC equipara aos recursos ordinários as reclamações para os presidentes dos tribunais superiores nos casos de não admissão dos recursos.
Compreende-se, assim, que se possa sustentar - como o faz o Ministério Público - que as decisões do presidente do STJ consomem os despachos
(reclamados) que confirmam.
Impõe-se, deste modo, reconhecer que é irrecorrível para o Tribunal Constitucional a decisão de 1ª instância confirmada, em reclamação dela interposta, por despacho do presidente do STJ, só podendo constituir objecto da impugnação este último despacho.
Procede, assim, a questão prévia suscitada pelo Ministério Público.
3 - Decisão:
Pelo exposto e em conclusão, decide-se não se conhecer do objecto do recurso.
Custas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em Ucs.
Lisboa, 28 de Outubro de 2003
Artur Maurício Maria Helena Brito Carlos Pamplona de Oliveira Rui Manuel Moura Ramos Luís Nunes de Almeida