Imprimir acórdão
Proc. n.º 671/03
2ª Secção Conselheiro Benjamim Rodrigues
Acordam, em conferência, no Tribunal Constitucional:
A – Relatório
1 - A. e mulher B., com os sinais dos autos, reclamam, nos termos do n.º 3 do art. 78º-A da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, na sua actual versão
(LTC), da decisão sumária proferida pelo relator que decidiu não conhecer do recurso.
2 - Tal decisão sumária é do seguinte teor:
«1 - A. e mulher B., com os sinais dos autos, recorrem para este Tribunal ao abrigo do disposto no artigo 70.º, n.º 1, al. b), da Lei de Organização, Processo e Funcionamento do Tribunal Constitucional (doravante, abreviadamente, LTC), do Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 8 de Julho de 2003, que negou provimento ao agravo interposto pelos ora recorrentes.
2. No respectivo requerimento de interposição, os recorrentes afirmaram que:
“[...]porque não se conformam com o aliás Douto Acórdão de 8-7-2003, dele vêm interpor recurso para o Tribunal Constitucional, nos termos dos artigos 70º, n.º
1, b), 72º, n.º 2, 75º, n.º 1, e 75º-A, n.os 1, e 2, todos da Lei do referido Tribunal.
Efectivamente, e ao julgar como julgou, no caso vertente, o Supremo Tribunal de Justiça fez uma interpretação e aplicação inconstitucionais dos artigos 201º, n.º 1, 668º, n.º 1, b) e 729º, n.º 2, todos do Cód. Proc. Civil, e dos artigos
22º, 27º e 59º, n.º 1, estes do anterior Código das Expropriações (Dec.-Lei n.º
438/91, de 9/11), interpretação essa violadora do disposto no artigo 62º, n.º 2, da Constituição da República. Cabe referir que esta questão da inconstitucionalidade foi suscitada, pelos Recorrentes, quer nas suas Alegações de Recurso de Agravo e de Apelação dirigidas ao Tribunal da Relação do Porto, apresentadas em 11-12-2001 no Tribunal Judicial de Penafiel, quer nas suas Alegações de Recurso de Agravo dirigidas ao Supremo Tribunal de Justiça, apresentadas em 17-5-2002 no Tribunal da Relação do Porto. Pelo exposto, os Requerentes Pedem que o Recurso ora interposto seja admitido para subir imediatamente, nos próprios Autos e com efeito devolutivo (artigos 69º e 78º, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional)”.
3. O recurso foi admitido por despacho de 18 de Setembro de 2003, lavrado a fls.
414., que, como decorre do artigo 76.º, n.º 3, da LTC, não vincula, porém, este Tribunal.
Deste modo e porque se entende não estarem preenchidos os pressupostos processuais determinantes do recurso para que o Tribunal Constitucional possa conhecer do seu objecto, elabora-se, ex vi artigo 78.º - A, da LTC, a presente decisão sumária.
4. O presente recurso de constitucionalidade foi interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional, e, como se sabe, são requisitos para se poder tomar conhecimento deste tipo de recurso, além da aplicação como ratio decidendi, pelo tribunal recorrido, da(s) norma(s) cuja constitucionalidade se impugna e do esgotamento dos recursos ordinários que no caso cabiam, que a inconstitucionalidade normativa tenha sido suscitada durante o processo. O alcance desta última exigência – a suscitação da questão da inconstitucionalidade normativa durante o processo – tem sido, em diversas ocasiões, esclarecido por este Tribunal. Assim, por exemplo, no Acórdão n.º
352/94 (publicado no Diário da República, 2ª Série, de 6 de Setembro de 1994) afirmou-se que esse requisito deve ser entendido “não num sentido meramente formal (tal que a inconstitucionalidade pudesse ser suscitada até à extinção da instância)”, mas “num sentido funcional”, de tal modo que essa invocação haverá de ter sido feita em momento em que o tribunal a quo ainda pudesse conhecer da questão, “antes de esgotado o poder jurisdicional do juiz sobre a matéria a que
(a mesma questão de constitucionalidade) respeita”. Igualmente, no Acórdão n.º
560/94 (publicado no Diário da República, 2ª Série, de 10 de Janeiro de 1995) considerou-se que «a exigência de um cabal cumprimento do ónus de suscitação atempada - e processualmente adequada - da questão de constitucionalidade não é
[...] “uma mera questão de forma secundária”. É uma exigência formal, sim, mas essencial para que o tribunal recorrido deva pronunciar-se sobre a questão de constitucionalidade para o Tribunal Constitucional, ao julgá-la em via de recurso, proceda ao reexame da questão (e não a um primeiro julgamento de tal questão». Neste domínio, há que acentuar que, nos processos de fiscalização concreta, em que se procede a um controlo difuso da constitucionalidade, a intervenção do Tribunal Constitucional se limita ao reexame ou reapreciação da questão de
(in)constitucionalidade que o tribunal a quo apreciou ou devesse ter apreciado
(ainda na mesma linha de pensamento podem ver-se, entre outros, o Acórdão n.º
155/95, publicado no Diário da República, 2ª Série, de 20 de Junho de 1995, e, aceitando os termos dos arestos acabados de citar, o Acórdão n.º 192/2000, publicado no mesmo jornal oficial, de 30 de Outubro de 2000). Como ensina Cardoso da Costa (A jurisdição constitucional em Portugal, in Estudos em homenagem ao Professor Doutor Afonso Rodrigues Queiró, Boletim da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, I, 1984, pp. 210 e ss.),
“quanto ao controlo concreto – ao controlo incidental da constitucionalidade
(…), no decurso de um processo judicial, de uma norma nele aplicável – não cabe o mesmo, em primeira linha, ao Tribunal Constitucional, mas ao tribunal do processo. Na verdade, não obstante a instituição de uma jurisdição constitucional autónoma, manteve-se na Constituição de 1976, mesmo depois de revista, o princípio, vindo das Constituições anteriores (…), segundo o qual todos os tribunais podem e devem, não só verificar a conformidade constitucional das normas aplicáveis aos feitos em juízo, como recusar a aplicação das que considerarem inconstitucionais (…). Este allgemeinen richterlichen Prüfungs- und Verwerfungsrecht encontra-se consagrado expressamente (…), e com o reconhecimento dele a Constituição vigente permanece fiel ao princípio, tradicional e característico do direito constitucional português, do “acesso” directo dos tribunais à Constituição (…). Quando, porém, se trate de recurso de decisão de aplicação de uma norma (…) é ainda necessário que a questão da inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo, em consequência do que o juiz tomou posição sobre ela (…). Compreende-se, na verdade, que a invocação da inconstitucionalidade unicamente ex post factum (depois de proferida a decisão) não seja suficiente para abrir o recurso para o Tribunal Constitucional (sob pena, além do mais, de se converter num mero expediente processual dilatório)”. Tal doutrina, como se salientou naquele Acórdão n.º 354/94, apenas sofre
“restrições” em situações excepcionais ou anómalas, nas quais o interessado não dispôs de oportunidade processual para suscitar a questão de constitucionalidade antes proferida ou não era exigível que o fizesse, designadamente por o tribunal a quo ter efectuado uma aplicação de todo insólita e imprevisível. Usando os termos do recente Acórdão n.º 192/2000, “quem pretenda recorrer para o Tribunal Constitucional com fundamento na aplicação de uma norma que reputa inconstitucional tem, porém, a oportunidade de suscitar a questão de constitucionalidade perante o tribunal recorrido, antes de proferido o acórdão da conferência de que recorre...”. E é claro que não poderá deixar de entender-se que o recorrente tem essa oportunidade quando a apreensão do sentido com que a norma é aplicada numa decisão posteriormente proferida poderá/deverá ser perscrutado no(s) articulado(s) processual(ais) funcionalmente previsto(s) para discretear juridicamente sobre as questões cuja resolução essa decisão tem de ditar, por antecedentemente colocadas, e em que aquele sentido, cuja constitucionalidade se poderá questionar, se apresenta como sendo um dos plausíveis a ser aplicados pelo juiz. Ao encararem ou equacionarem, na defesa das suas posições, a aplicação das normas, as partes não estão dispensadas de entrar em linha de conta com o facto de estas poderem ser entendidas segundo sentidos divergentes e de os considerar na defesa das suas posições, aí prevenindo a possibilidade da “(in)validade” da norma em face da Lei Fundamental.
5. Ora no caso dos presentes autos, é manifesto que os recorrentes não suscitaram adequadamente qualquer problema de inconstitucionalidade normativa que o Tribunal Constitucional devesse conhecer ao abrigo do disposto no art.
280.º, n.º 1, al. b), da Constituição e no art. 70.º, n.º 1, al. b), da LTC.
Segundo afirmaram no requerimento de interposição, “[est]a questão da inconstitucionalidade foi suscitada, pelos Recorrentes, quer nas suas Alegações de Recurso de Agravo e de Apelação dirigidas ao Tribunal da Relação do Porto, apresentadas em 11-12-2001 no Tribunal Judicial de Penafiel, quer nas suas Alegações de Recurso de Agravo dirigidas ao Supremo Tribunal de Justiça, apresentadas em 17-5-2002 no Tribunal da Relação do Porto”. Todavia, em nenhuma destas – ou de outras – peças processuais foi equacionado qualquer problema de inconstitucionalidade normativa. Vejamos. Nas alegações apresentadas ao Tribunal da Relação do Porto, os recorrentes sustentaram que:
“(...) 1. A NULIDADE DA SENTENÇA
Como V. Exas. anotarão o presente processo de expropriação já decorre há quase dez anos, sem contar com a situação anterior que levou à anulação da declaração de expropriação por utilidade pública e demais actos entretanto praticados, o que configura nitidamente uma situação claramente injusta e inconstitucional para o expropriado que vê completamente arredado o direito de obter uma decisão judicial num período de tempo razoável.
E, mais uma vez, parece que novo obstáculo surgiu num caminho espinhoso, em que, como foi reconhecido pelo Douto Acórdão deste mesmo Tribunal de fls. 109 , o expropriado tem autoridade moral, mas infelizmente não consegue extrair quaisquer resultados dessa posição.
Sem prejuízo do oportunamente alegado no agravo interposto do despacho do Mmº Juiz, em que foi entendido não se verificarem as nulidades oportunamente alegadas no recurso de arbitragem, a título de questão prévia,
Pensamos, que a aliás douta sentença de fls. 293 e segts., de que ora se recorre, também enferma de manifesta nulidade.
Na verdade, o actual Sr. Juiz titular do processo deparou-se, como melhor resulta de fls. 281, com uma situação insólita, que tentou remediar, com o seguinte douto despacho: «Constata-se que, na sequência da inquirição de testemunhas documentada pela acta de fls. 262, não foi proferida qualquer decisão quanto à matéria de facto julgada provada, não tendo a prova recolhida sido por qualquer meio registada. Pelo que respeita à prova produzida no âmbito da deprecada expedida, encontra-se a mesma gravada, tendo a Mmª. Juiz que presidiu à produção de prova neste tribunal ouvido a mesma - cfr. fls. 265. Assim, em homenagem ao princípio vertido no art. 654° do Cód. Proc. Civil, deve a decisão da causa, ao menos no que concerne aos seus fundamentos de facto, ser tomada pela Mmª Juiz que presidiu à produção de prova».
E, de facto, veio a ser a Mmª Juiz que presidiu à produção de prova de fls. 262, ocorrida a 8 de Fevereiro de 2000, em que foram inquiridas duas testemunhas, que veio a proferir a decisão sub censura.
Ora, no caso dos autos, tendo especialmente presente a situação que se verificava à data da vistoria ad perpetuam rei memoriam, em que o prédio do expropriado se encontrava já ocupado pelo nó da auto-estrada A---, como expressivamente foi salientado no douto acórdão de fls. 109 deste Colendo Tribunal, haveria que recorrer a outros meios de prova além da pericial, sobretudo prova testemunhal, que o expropriado indicou no seu recurso da arbitragem.
Porém, nem os árbitros, nem os peritos se serviram da mesma, e o Tribunal, apesar de ter à sua disposição, nem sequer chegou a apreciá-la, o que teria obrigatoriamente de fazer.
Desde logo, porque embora não houvesse resposta a quesitos, por não haver lugar
à sua formulação, sempre estaria obrigado o julgador a decidir da matéria de facto, conforme dispõe o art. 653° do Cód. Proc. Civil.
Acresce que, para além desta nítida omissão, de que o Sr . Juiz deu obviamente conta, a Mmª Juiz, na elaboração da sentença, votou ao ostracismo a matéria de facto carreada da prova testemunhal.
Basta atentarmos, a fls. 295, na afirmação que ali se faz: «Na decisão a proferir hão-de ser considerados: o acórdão dos árbitros, o relatório da vistoria ad perpetuam rei memoriam, o laudo dos peritos e as respostas dadas pelos mesmos aos quesitos apresentados».
E os factos resultantes da prova testemunhal, onde estão?
É seguro afirmar-se perante o que consta de fls. 288 e 289, que a Mmª Juiz terá ouvido as cassetes onde se continha o depoimento de duas das testemunhas arroladas pelo expropriado.
Mas, será razoável pensar que a Mmª Juiz, ao elaborar a sentença, em 13 de Outubro de 2001, ainda se recordaria do teor do depoimento das testemunhas inquiridas em 8 de Fevereiro de 2000, do qual não foi lavrado qualquer tipo de registo?
Estamos plenamente persuadidos que tal esforço memónico é impossível, ou pelo menos falho de qualquer fiabilidade, sendo essa, provavelmente, a razão pela qual foi ignorada a matéria de facto produzida em sede de prova testemunhal.
Resulta, por conseguinte, a todas as luzes, que no elenco dos factos dados como provados, e que, como acima se escreveu, apenas se atendeu aos elementos escritos constantes dos autos, pelo que falta a discriminação dos factos provados em consequência da prova testemunhal, como o impõe o art. 659° do Cód. Proc. Civil.
Tal omissão gera a nulidade prevista na alínea b) do art. 668° do mesmo normativo, aqui expressamente invocada, verificando-se insuficiência e deficiência na fixação da matéria de facto, e como dos autos não constam manifestamente todos os elementos probatórios que nos termos da alínea a) do n.º
1 do art. 712° do Cód. P. Civil permitem a modificação da decisão sobre a matéria de facto, impõe-se que esta Relação anule a decisão proferida em 1ª instância, ao abrigo do disposto no n.º 4 da citada norma, para que sejam rectificadas tais deficiências.
2. CONCLUINDO
a) Não foi proferida qualquer decisão sobre a matéria de facto obtida através da produção da prova testemunhal documentada nos autos, nem imediatamente após, nem na sentença em crise.
b) Aliás, nesta última, quando foram elencados os elementos a considerar na decisão, omitiu-se objectivamente a prova testemunhal.
c) Verifica-se, por conseguinte, a deficiência ou insuficiência da matéria de facto para aplicação do direito, situação geradora da nulidade prevista no art.
668°, n.º 1, alínea b) do CPC, insusceptível de ser suprida por esta Relação, pelo que se impõe a anulação da decisão, ao abrigo do estatuído no art. 712°, n.º 4, do CPC.
d) Violados foram, pois, os arts. 653° e 659° do C. P. Civil e art. 22° do C. E.
e) Termos em que, no provimento deste recurso, se impõe a anulação da decisão, ordenando-se a repetição da inquirição de testemunhas, por forma a completar a matéria de facto, assim se dando cumprimento à Lei e agindo com JUSTIÇA”.
Por sua vez, nas alegações de recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, consta que:
“1. A NULIDADE DO ACÓRDÃO DE ARBITRAGEM EXISTE E CONTINUA A INQUINAR TODO O PROCESSADO.
Salvo o devido respeito, o Tribunal da Relação ao analisar a nulidade assacada ao Relatório de arbitragem e à decisão arbitral e sobre a qual o Mmº Juiz proferiu decisão de fls. 278-281, em 4.01.2001, da qual foi interposto recurso de agravo, em 18.01.2001, ao invés de se debruçar sobre o despacho recorrido,
Baseou-se apenas na posição tomada pelo recorrente na alegação apresentada nos termos do art. 63° do C.E./91, em que simplesmente se insistiu que a nulidade invocada no recurso da arbitragem não se encontrava sanada, para concluir que a mesma havia sido arguida fora de prazo, pelo que não podia ser apreciada.
Ora, a nulidade da decisão arbitral, foi, desde logo, arguida como «Questão Prévia» no respectivo recurso apresentado em 22.05.1998, e não somente, como entende o Tribunal recorrido, em 5.7.2000, já depois dos esclarecimentos prestados pelos Srs. Peritos, em 19.10.1999.
S.m.o., parece-nos que a Relação confundiu o relatório e decisão dos Srs.
Árbitros, esses sim objecto do despacho de fls. 278-281, com o relatório pericial, aliás já efectuado depois da nulidade dos primeiros ter sido arguida.
É certo que a decisão do Mmº Juiz de fls. 278-281 foi proferida depois da realização da prova pericial, mas, como ressuma com meridiana clareza, versou unicamente sobre a «questão prévia» suscitada pelo recorrente, seja sobre a nulidade da decisão arbitral.
E esse vicio foi invocado tempestivamente no recurso da decisão arbitral.
Significa isto que a nulidade da decisão arbitral sobre a qual incidiu o despacho de fls. 278-281, e à qual a Relação, em sede de agravo, negou provimento, pode e deve ser ainda apreciada por este Colendo Tribunal, a não ser que seja entendido ter aqui aplicação o disposto no art. 762° do C. P. Civil.
Sobre este tema, continuamos a entender que o relatório de arbitragem e a decisão arbitral, ponto de partida de todo o processo (será bom anotar que a vistoria ad perpetuam rei memoriam só se realizou virtualmente, porquanto o prédio expropriado constituía, ao tempo, uma parte do nó de ----------------- da Auto-Estrada A----, ou seja já nada restava a fixar para memória futura), não podem servir de base à atribuição de uma justa indemnização ao recorrente pela qual vem pugnando, desde há longos anos, nas instâncias judiciais.
Efectivamente, se analisarmos o relatório de fls. 79, constatamos que o Sr. Perito não realizou, por manifesta impossibilidade uma vistoria ad perpetuam rei memoriam.
A configuração do prédio do expropriado nada tinha a ver com a situação que se deparou ao perito, pelo que este se socorreu, no seu auto, da vistoria de 1992, a «inicial», que foi anulada, o que colide frontalmente com o disposto no art.
19°, alínea b) do C.E./91, onde se determina que a vistoria tem por fim fixar os elementos de facto susceptíveis de desaparecerem e cujo conhecimento seja de interesse ao julgamento do processo.
É, por conseguinte, indubitável que não se fez qualquer vistoria, nem a que segue os ditames que resultam, em princípio geral, do Cód. Proc. Civil, e muito menos a sujeita ao fim estabelecido pelo art. 19° do Cód. das Expropriações.
Ora, esta situação reflectiu-se de forma óbvia no relatório e decisão arbitral, sendo certo que poderia ter sido ultrapassada se os Srs. Árbitros tivessem usado dos outros meios de prova que o Douto Acórdão da Relação do Porto de 8.5.1996, proferido a fls. dos autos, lhes apontava e que aqui damos por reproduzido. Na verdade, os Srs. Árbitros dizem que o perito, na falta de outros elementos, adoptou as áreas constantes dos artigos matriciais, bem como a área da parcela constante da declaração de utilidade pública e que igual assunção é feita na arbitragem.
E facto por demais notório que as áreas referidas nas matrizes prediais estão sempre incorrectas tanto assim que resulta pacífico que a presunção que advém da inscrição de um prédio no Registo Predial (cf. art. 5º) nem sequer as abrange, ou porque não houve o devido cuidado de proceder à sua exacta medição, ou porque têm origem em declaração do próprio interessado.
Por conseguinte, aqui se reedita que afirmar-se que a parcela expropriada possui a área de 2.297 m2 e a sua parte sobrante a área de 1.073 m2, constitui mera especulação, incompatível com a natureza de um processo de expropriação em que o expropriado tem de ser ressarcido do exacto prejuízo que aquela lhe causa, como aliás se comprova pelos diversos valores achados em vistoria e arbitragem entretanto anuladas e cujas fotocópias foram juntas com o recurso da decisão arbitral e aqui se dão por reproduzidas, em que só à parcela n.º 75 se atribuíam
3.240 m2, tendo mesmo assim sido desprezado, na altura, a existência de terreno pertencente ao expropriado do lado nascente, por problemas de alinhamento de estremas.
Acresce que, no seu Relatório e Acórdão de Arbitragem, os Árbitros não responderam aos quesitos 1° e suas alíneas, 4°, 5° e 6°, escrevendo que as respostas aos demais «constam do presente relatório» .
Os Srs. Árbitros justificam a omissão das respostas aos citados quesitos com o facto de os mesmos se referirem a elementos já demolidos ou alterados, existentes antes da tomada de posse efectiva da parcela, e antes de realizada a vistoria ad perpetuam rei memoriam.
Ficámos, por consequência cientes que, reconhecendo os Srs. Árbitros existirem diversos elementos, mormente benfeitorias, que agora dizem não poder determinar, fica desde logo adulterado à partida o cálculo da justa indemnização.
A falta de rigor de elementos essenciais como os das áreas do prédio expropriado e da sua parte sobrante, bem como a identificação das benfeitorias existentes naquele, vicia decisivamente o cálculo do valor da indemnização a atribuir ao expropriado, o que ofende directamente o direito a uma legítima indemnização pela privação da sua propriedade, conforme expressamente o prevê a Constituição da República no seu art. 62°.
Assim, face ao exposto, continua a entender-se que deve ser reconhecida e decretada, com as inerentes consequências, a nulidade, expressamente invocada, do acórdão de arbitragem, por omissão de elementos essenciais que servem de base ao cálculo da indemnização.
O Mmº Juiz a quo, no citado despacho de fls. 278-281, aliás de forma inteligente, tentou demonstrar que os Srs. Árbitros, porque não estavam habituados ao discurso legitimador, perante a falta de prova, admitiram a existência de benfeitorias, concluindo não se poderem pronunciar sobre as mesmas, quando, se juristas fossem, tê-las-iam considerado inexistentes, por não provadas.
Será caso para dizer que ainda bem que os Srs. Árbitros não são juristas de formação!
Porque, cremos nós, que se impõe o primado da verdade material sobre a forma escrita, sobretudo num instituto tão delicado como o da expropriação.
Os Srs. Árbitros compreenderam a realidade que se lhes deparava e não a conseguiram contrariar.
Mas pecaram por não terem recorrido aos outros meios probatórios e se entendessem que o não podiam fazer, ou que estes não existiam ao seu dispor, outra alternativa não teriam senão escrever no seu relatório e acórdão que não dispunham de elementos para atribuir uma indemnização, em vez de suporem a existência e o rigor de coisas não demonstradas.
Por outro lado, o Mmº Juiz sustentou, no mesmo despacho, que a alegação (não formulada exactamente nestes termos) do expropriado de que os dados de facto que servem de fundamento à decisão estão errados, constitui questão de julgamento de facto a dirimir através de recurso e não de arguição de nulidade.
Contudo, esta situação (área incorrecta, porque puramente especulativa, do prédio expropriado e da parte sobrante), está directamente conexionada com a anterior: se nada existia na parcela à data da vistoria a.p.r.m. e do acórdão de arbitragem, como é possível serem determinados valores daquelas superfícies e fixar a indemnização com base nas mesmas?
Só por pura adivinhação.
A Relação nem chegou, como vimos, a apreciar estes vícios, porque entendeu ser extemporânea a sua arguição.
Impõe-se, portanto, Exmos Conselheiros, que V. Exas. se pronunciem sobre as reais consequências que a falta de tais elementos no Acórdão de Arbitragem acarreta para os autos e que, a nosso ver , não podem ser outras senão o de anular todos os actos que se seguiram à v. a. p. r. m., por violação do disposto nos arts. 201° do C. P. Civil, 345°, 352°, 362°, 392°, do C. Civil e art. 22° do C. E./91 e, acaso seja entendido que tem aqui aplicação o disposto no art. 762° do C. P. Civil, ordenar a que a Relação conheça do objecto do agravo.
SEM CONDESCENDER.
2. A NULIDADE DA SENTENÇA.
Por sua vez, no recurso de apelação oportunamente interposto da sentença final, que não foi prolatada pelo mesmo Sr. Juiz, foi invocada a nulidade desta, por directa violação do disposto nos arts. 653° e 659°, do CPC e do art. 22° do C.E./91.
O Acórdão sub censura negou provimento à apelação, porque entendeu que sendo o processo de expropriação litigiosa um processo especial, não há lugar à decisão da matéria de facto e à sua fundamentação e que não está demonstrado que os depoimentos prestados pelas testemunhas, oportunamente inquiridas, não tenham sido apreciados e devidamente valorados no cômputo dos factos considerados provados.
Acrescentando, aliás, que embora não seja proibida a prova testemunhal, o julgador terá de ter em atenção que a avaliação é o elemento essencial de prova de que tem de socorrer-se para encontrar o quantum da justa indemnização a atribuir ao expropriado.
Estamos plenamente de acordo, em tese geral, sobre este último ponto, mas há que ter consciência da situação presente, como aliás o fez o citado Acórdão de
8.5.1996, que está bem longe de constituir um paradigma de como deve processar-se um processo de expropriação.
Será que é possível considerar-se no caso sub judice a avaliação como o elemento essencial de prova, quando o prédio expropriado é hoje uma faixa de rodagem de uma auto-estrada e não existem nos autos quaisquer elementos que permitam reconstruir a situação anterior, seja a configuração do prédio, a sua área e confrontações, as construções e demais benfeitorias existentes e entretanto demolidas e desmanteladas?!
A «autoridade moral» que o citado Acórdão de 1996 atribuiu ao expropriado para continuar a terçar armas pela justa indemnização, será totalmente denegada se apenas for tida em conta a avaliação, ou principalmente esta.
Já bastam os longos anos de espera e vicissitudes várias que vêm, inaceitavelmente, afectando o expropriado neste processo, recusando-lhe o direito a uma decisão rápida e justa do litígio.
Refere o Acórdão recorrido que não está demonstrado que os depoimentos testemunhais não tenham sido tomados em conta na decisão.
Mas, de certeza que também não está provado que tais elementos probatórios fossem levados em conta, quando é certo que teriam, em caso afirmativo, de ser especificados, de acordo com o disposto no art. 653°, n.º 2 do C. P. Civil.
Ora, se, por analogia, recorrermos ao disposto no art. 344° do C. Civil, parece que será de considerar que estará provado que tais elementos não foram tidos em consideração
Atente-se, além disso, a fls. 295, na seguinte afirmação: «Na decisão a proferir hão-de ser considerados: o acórdão dos árbitros, o relatório da vistoria ad perpetuam rei memoriam, o laudo dos peritos e as respostas dadas pelos mesmos aos quesitos apresentados».
Mas, além deste argumento de ordem mais literal e processual, não receamos afirmar que, seguramente, pelo menos o depoimento das testemunhas inquiridas em Penafiel, e do qual não foi efectuado qualquer registo magnético, não foi relevado.
Na verdade, veio a ser a Mmª Juiz que presidiu à produção de prova de fls. 262, ocorrida a 8 de Fevereiro de 2000, em que foram inquiridas duas testemunhas, que proferiu a sentença.
Será razoável pensar que a Mmª Juiz, ao elaborar a sentença, em 13 de Outubro de
2001, ainda se recordaria do teor do depoimento das testemunhas inquiridas em 8 de Fevereiro de 2000, do qual não foi lavrado qualquer tipo de registo?
Estamos plenamente persuadidos que tal esforço mnemónico é impossível, ou pelo menos falho de qualquer fiabilidade, sendo essa, provavelmente, a razão pela qual foi ignorada a matéria de facto produzida em sede de prova testemunhal.
Forçoso é admitir, consequentemente, que no elenco dos factos dados como provados, apenas se atendeu aos elementos escritos constantes dos autos, pelo que falta a discriminação dos factos provados em consequência da prova testemunhal, como o impõe o art. 659° do Cód. Proc. Civil.
Tal omissão gera a nulidade prevista na alínea b) do art. 668° do mesmo normativo, que foi expressamente invocada, verificando-se insuficiência e deficiência na fixação da matéria de facto, impõe-se a anulação da decisão proferida em 1ª instância, para que sejam rectificadas tais deficiências.
3. Concluindo
a) O Acórdão recorrido ao entender que a nulidade assacada ao Acórdão de Arbitragem, e objecto do despacho de fls. 278-291, foi arguida fora de prazo, incorreu em manifesto lapso, ao confundir o relatório e decisão dos Srs.
Árbitros, sobre o qual incidiu o citado despacho, com o relatório pericial.
b) Por consequência, a nulidade da decisão arbitral sobre a qual incidiu o despacho de fls. 278-281, e à qual a Relação, em sede de agravo, negou provimento, pode e deve ser ainda apreciada por este Colendo Tribunal, a não ser que se entenda ter aqui directa aplicação o disposto no art. 762° do C. P. Civil;
c) Sendo evidente a pertinência da questão prévia suscitada pelo agravante de que o acórdão de arbitragem enferma de manifesta nulidade, em virtude da falta de elementos tão decisivos como a área da parcela expropriada, da parte sobrante e das benfeitorias existentes, a qual inquina decisivamente qualquer cálculo efectuado relativamente ao valor indemnizatório.
d) Sobretudo, porque os árbitros não usaram de nenhum meio de prova adicional ou alternativo como lhes apontava claramente o Ac. da Relação de 8.5.1996.
e) Socorrendo-se apenas de uma diligência - vistoria ad perpetuam rei memoriam - que, por manifesta impossibilidade, não respeitou o disposto art. 19°, n.º 2, alínea a) do Cód. das Expropriações e as áreas constantes das matrizes prediais, sendo certo que a configuração do prédio do expropriado nada tinha a ver com a situação, outra alternativa não teriam os Árbitros senão escrever no seu relatório e acórdão que não dispunham de elementos para atribuir uma indemnização, em vez de especularem sobre a existência e o rigor de coisas não demonstradas.
f) Violados foram, portanto, os arts. 201° do C. P. Civil, 345°, 352°, 362°,
392°, do C. Civil e art. 22° do C. E./91.
g) Por outro lado, na sentença de fls., não foi proferida qualquer decisão sobre a matéria de facto obtida através da produção da prova testemunhal documentada nos autos, como já não havia acontecido imediatamente após.
h) Não é de sufragar o respeitável entendimento do Acórdão recorrido de que não está demonstrado que a prova testemunhal não foi levada em conta na sentença de
1 a instância.
i) Quer a análise literal da decisão, quer a aplicação do estatuído no art. 344º do C. Civil apontam no sentido de que tais elementos não foram sequer valorados e especificados, de acordo com o disposto no art. 653°, n.º 2 do C. P. Civil.
j) Verifica-se, por conseguinte, a deficiência ou insuficiência da matéria de facto para aplicação do direito, situação geradora da nulidade prevista no art.
668°, n.º 1, alínea b) do CPC, insusceptível de ser suprida, pelo que se impõe a anulação da decisão, para correcção de tais deficiências.
l) Também não é nos parece aceitável, no caso dos autos, que o elemento decisivo de fixação da indemnização possa ser a avaliação, quando o prédio expropriado é hoje uma faixa de rodagem de uma auto-estrada e não existem nos autos quaisquer elementos que permitam reconstituir a situação anterior, seja a configuração do prédio, a sua área e confrontações, as construções e demais benfeitorias existentes e entretanto demolidas e desmanteladas.
m) Tanto assim, que o citado Ac. da Rel. do Porto de 1996, já o reconheceu expressamente.
n) Violados foram, pois, os arts. 653° e 659° do C. P. Civil e art. 22° do C. E”.
Como se constata, e à excepção da referência extemporânea constante do requerimento de interposição de recurso para este Tribunal, não foi suscitada a inconstitucionalidade normativa dos artigos 201º, n.º 1, 668º, n.º 1, b) e 729º, n.º 2, todos do Cód. Proc. Civil, e dos artigos 22º, 27º e 59º, n.º 1, estes do anterior Código das Expropriações (Decreto-Lei n.º 438/91, de 9/11). Ao invés, os recorrentes limitaram-se, sucessivamente, a afirmar que as instâncias judiciais, ao decidir como decidiram, violaram tais disposições legais. Esta referência não equivale, como facilmente se compreende, à suscitação de qualquer inconstitucionalidade normativa, pois esta traduz-se, sempre, numa problematização da validade de certa norma jurídica [aplicada ou aplicanda] por ofender normas ou princípios constitucionais.
6. Por outro lado, além do já exposto, importa reter que, no entendimento dos recorrentes, a intervenção do Tribunal Constitucional se justifica porque “ao julgar como julgou, no caso vertente, o Supremo Tribunal de Justiça fez uma interpretação e aplicação inconstitucionais dos artigos 201º, n.º 1, 668º, n.º
1, b), e 729º, n.º 2, todos do Cód. Proc. Civil, e dos Artigos 22º, 27º e 59º, n.º 1, estes do anterior Código das Expropriações (Dec.-Lei n.º 438/91, de
9/11), interpretação essa violadora do disposto no Artigo 62º, n.º 2, da Constituição da República”.
Ora, como é consabido, o Tribunal Constitucional apenas sindica a
(in)conformidade sub specie constitutionis de normas, não lhe cabendo apurar se as concretas decisões judiciais – mais especificamente, a aplicação do direito aí realizada – respeita, ou não, os imperativos constitucionais, pelo que, em todo o caso, “a errada interpretação e aplicação da lei”, à luz dos parâmetros constitucionais, não integra, inexistindo entre nós a figura do amparo ou da queixa constitucional, a competência deste Tribunal.
7. Consequentemente, pelo exposto, decide-se não tomar conhecimento do presente recurso.
Custas pelos recorrentes com 6 (seis) UC de taxa de justiça.».
3 - Refutando a decisão sumária, os reclamantes alegam, na reclamação, que
“contrariamente ao que nela se afirma, os recorrentes suscitaram a questão de inconstitucionalidade, quer nas suas Alegações para o Tribunal da Relação, quer naquelas outras dirigidas ao Supremo Tribunal de Justiça”. E concretizando essa sua afirmação dizem:
«[...] Naquelas primeiras alegações, pôs-se em relevo a insuficiência da matéria de facto, indispensável a satisfazer o Princípio Constitucional da Justa Indemnização devida aos expropriados”
Por sua vez, nas segundas daquelas Alegações dirigidas ao STJ referiu-se textualmente que:
A falta de rigor de elementos essenciais como as áreas do prédio expropriado e da sua parte sobrante, bem como a identificação das benfeitorias existentes naquele, vicia decisivamente o cálculo do valor da indemnização a atribuir ao expropriado, o que ofende directamente o direito a uma legítima indemnização pela privação da sua propriedade, conforme expressamente prevê a Constituição da República no seu art.º 62º.
[...]».
4 - A recorrida C., não respondeu.
B – Fundamentação
5 - A reclamação deduzida contra a decisão sumária atrás transcrita não procede. Apesar do que alegam, não é verdade que os recorrentes tenham suscitado, quer nas alegações de recurso da sentença da 1ª instância para o Tribunal da Relação, quer nas alegações desta 2ª instância para o Supremo Tribunal de Justiça, qualquer questão de inconstitucionalidade normativa cujo objecto sejam as normas de direito infraconstitucional que identificam no seu requerimento de interposição de recurso (artigos 201º, n.º 1, 668º, n.º 1, b), e 729º, n.º 2, todos do Cód. Proc. Civil, e artigos 22º, 27º e 59º, n.º 1, estes do anterior Código das Expropriações - Dec.-Lei n.º 438/91, de 9/11). A falta de correspondência à realidade processualmente ocorrida relativamente ao alegado na reclamação sobre essa matéria resulta evidente da simples análise das alegações e respectivas conclusões que os reclamantes apresentaram para ambas as instâncias que atrás se deixaram transcritas.
Mesmo deixando de parte a circunstância de os reclamantes não terem levado à síntese conclusiva das alegações apresentadas nas instâncias as razões a que agora atribuem relevo para os efeitos sub judicio e de essa sua postura poder ser entendida pelos respectivos tribunais como um abandono do interesse no conhecimento dessa matéria, dado serem as conclusões das alegações que delimitam o objecto do recurso, como é por demais consabido, acontece que a improcedência da reclamação é manifesta mesmo quando considerados autonomamente, nesta sede, os fundamentos aduzidos acima transcritos.
Na verdade, - e deixando de lado a questão de apenas importar, no caso, a posição tomada no recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, atento o
ónus de esgotamento dos recursos ordinários, consagrado no n.º 2 do art.º 70º da LTC - não se vê, na posição que os reclamantes dizem ter tomado nas alegações para a Relação, a formulação de qualquer questão de inconstitucionalidade em termos que possam considerar-se perceptíveis (cfr. Acórdão n.º 178/95, Acórdãos do Tribunal Constitucional, 30º volume, pp. 1118). Na verdade, a suscitação de uma questão de inconstitucionalidade há-de evidenciar-se numa problematização da validade constitucional de uma norma de direito ordinário que haja sido aplicada como ratio decidendi perante os preceitos ou princípios constitucionais que se considerem violados. Ora, os reclamantes não referem, em tal articulado, qualquer norma cuja inconformidade constitucional cogitem ou questionem em face do princípio constitucional da justa indemnização e do preceito da Lei Fundamental que o consagra.
Por outro lado, no excerto das alegações para o STJ, que reproduzem, os reclamantes não controvertem ou questionam, igualmente, a conformidade com a Constituição de quaisquer preceitos de direito ordinário, mas antes a postura que dizem que a Relação tomou, de “falta de rigor de elementos essenciais” para o cálculo da indemnização, relativa “às áreas do prédio expropriado”, bem como a
“identificação das benfeitorias existentes”. O que os reclamantes confrontam com o art. 62º da Constituição não é qualquer norma que a Relação tenha aplicado, mas a decisão judicial em si mesma, num certo passo da sua formação e formulação.
Ora, como se diz na decisão reclamada, apenas as normas que hajam sido aplicadas como ratio decidendi da decisão recorrida podem ser, de acordo com o disposto no art. 280º, n.º 1, alínea b), da CRP e 70º, n.º 1, alínea b), da LTC (preceitos ao abrigo dos quais o recurso foi interposto), objecto de recurso de fiscalização concreta de constitucionalidade e não também as decisões judiciais (ou actos administrativos) que, aplicando directamente normas ou princípios constitucionais, acabem por violá-los.
C – Decisão
6 - Destarte, atento tudo o exposto, o Tribunal Constitucional decide indeferir a reclamação.
Custas pelos reclamantes, com taxa de justiça de 15 UC.
Lisboa, 28 de Janeiro de 2004
Benjamim Rodrigues Maria Fernanda Palma Rui Manuel Moura Ramos