Imprimir acórdão
Processo n.º 839/13
Plenário
Relator: Conselheiro João Cura Mariano
Acordam em Plenário no Tribunal Constitucional
Relatório
António Maria Torres Carneiro Pacheco, na qualidade de mandatário da candidatura do Grupo de Cidadãos Eleitores denominado “SerCascais – Movimento Independente” para as eleições autárquicas de 2013 à Câmara Municipal e Assembleia Municipal de Cascais e a algumas das Assembleias de Freguesia do mesmo Município, apresentou no Tribunal Constitucional, por fax enviado no dia 2 de setembro, pelas 19.20 h., um requerimento com o seguinte conteúdo:
“ANTÓNIO MARIA TORRES CARNEIRO PACHECO…vem:
- nos termos do disposta no nº 2 do artº 94º da Lei Orgânica nº 1/2001 de 14 de agosto, interpor Recurso para o Tribunal Constitucional, da decisão do 2º Juízo Cível da Comarca de Cascais, no processo eleitoral nº 5566/12.2 TBCSC, que alterou o Boletim de Voto;
- bem como por violação do Principio da Igualdade, consagrado no Artº 13º da Constituição da República Portuguesa, que impõe um tratamento igual entre os partidos políticos e os Grupos de Cidadãos Eleitores, quanto à utilização do símbolo próprio, do artº 30º nº 1, in fine da Lei Orgânica nº 1/2001 de 14 de agosto, ao impor apenas aos GCE que abdiquem do seu símbolo e passem a utilizar um número romano aleatoriamente sorteado pelo tribunal de comarca.
RECURSO
1 - SerCascais- Movimento Independente apresentou a sua candidatura no dia 30 de julho de 2013, tendo junto os respetivos elementos de identificação, nomeadamente denominação e símbolo, conforme Doc. 1, de 3 páginas, que junto se anexa, e que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais.
2 - Por decisão do juiz de comarca de 9 de agosto de 2013, Doc. 2, de 4 páginas, que junto se anexa, e que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, na conclusão foi decidido admitir os símbolos apresentados pelas candidaturas de cidadãos, entre elas o do SerCasc:ais-Movimento Independente, à semelhança de numerosas outras decisões dos tribunais de comarca pelo país fora, em obediência ao Princípio da Igualdade com os partidos políticos.
3 - Nos termos do artº 31º nº 1 da lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, as decisões finais relativas a denominações, siglas e símbolos são irrecorríveis, pelo que a referida decisão de 9 de agosto, nesta matéria, transitou em julgado, tomando-se assim definitiva em 11 de agosto de 2013, uma vez que não houve qualquer reclamação sobre símbolos.
4- Seguidamente, as provas tipográficas dos Boletins de Voto devidamente impresso com o símbolo do SerCascais-Movimento Independente foram afixadas no edifício da Câmara, nos termos legais, nos dias 27, 28 e 29 de agosto.
5- No dia 27 de agosto o tribunal de comarca confirmou em despacho manter os símbolos, conforme Doc. 3, de 1 página, que junto se anexa e que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais. Outra coisa não seria admissível, uma vez que como referimos acima, essa decisão já era, nos termos legais, definitiva.
6- Até porque desde o dia 9 de agosto o material de campanha foi encomendando, publicitado e amplamente divulgado como essencial ao reconhecimento da candidatura SerCascais-Movimento Independente.
7 - Pelo que é com total surpresa, hoje dia 30 de agosto, pelas 13horas, a candidatura SerCascais - Movimento Independente, foi convocada telefonicamente para comparecer a um sorteio de símbolos em numeração romana a utilizar em substituição do seu símbolo previamente aceite pelo tribunal, em decisão transitada em julgado!
8- Foi desta forma violado o artº 675º do Código do Processo Civil: 1 - Havendo duas decisões contraditórias sobre a mesma pretensão, cumprir-se-á a que passou em julgado em primeiro lugar. 2 - É aplicável o mesmo princípio à contradição existente entre duas decisões que, dentro do processo, versem sobre a mesma questão concreta da relação processual.
9 - Ora este sorteio, além de violar uma decisão da mesma instância previamente transitada em julgado, ocorreu fora do prazo legal, definido no artº 30º nº 1 da Lei Eleitoral dos Órgãos das Autarquias Locais, que determina que o sorteio terá que ocorrer até ao dia seguinte ao termo do prazo para a apresentação das candidaturas ou da decisão das reclamações.
10- No presente processo eleitoral a decisão sobre as reclamações foi tomada dia 26 de agosto, Doc. 4, de 9 páginas, que junto se anexa, e que se dá por inteiramente reproduzido para todos os efeitos legais, pelo que o prazo para sorteio terminou a dia 27 de agosto, precisamente o dia em que o tribunal de comarca decidiu a não necessidade de sorteio e confirmou a aceitação dos símbolos!
11- Na diligência de hoje de 'sorteio' tomamos conhecimento de que a e Candidatura CDU - Coligação Democrática Unitária PCP-PEV havia apresentado uma reclamação contra a utilização de símbolos pelos GCE nos Boletins de Voto. Ora tal excede manifestamente o âmbito do art.º 94º da LEOAL, que apenas prevê a qualidade de impressão ou erro tipográfico.
12- Se a candidatura em causa quisesse ter reclamado da admissão do símbolo, e não o recurso, que como vimos não é admissível, devê-lo-ia ter feito no prazo de quarenta e oito horas após a notificação da decisão de aceitação do símbolo proferida a 9 de agosto, nos termos do artº 29º da LEOAL.
13- Ao pretender alterar os Boletins de Voto, através da substituição do símbolo antes aceite por decisão transitada em julgado, o tribunal de comarca, obriga a Candidatura SerCascais- Movimento Independente a interpor o presente recurso, nos termos do artº 94º nº 2.
14- Assim sendo, outra conclusão não resta que seja a nulidade da convocatória do sorteio, bem como do sorteio dos símbolos, ambos realizados hoje dia 30 de agosto, mantendo-se em consequência a decisão anterior do tribunal de comarca já transitada em julgado, bem como a manutenção dos boletins de voto com o símbolo do SerCascais-Movimento Independente.
Termos em que deve ser declarado nulo o sorteio dos símbolos, mantendo-se em consequência a decisão anterior do tribunal de comarca já transitada em julgado, bem como a manutenção dos boletins de voto com o símbolo do SerCascais-Movimento Independente.
O Requerente apresentou requerimento idêntico no Tribunal Judicial de Cascais, por fax enviado no dia 30-8-2013, pelas 18.56 h.
Sobre este requerimento recaiu o seguinte despacho proferido em 2-9-2013:
“Não admito o recurso interposto a fls. 1691 e seguintes, por ser legalmente inadmissível – cfr. artigo 31.º, n.º 1, da Lei Orgânica n.º 1/2001 de 14 de agosto”.
Foi determinado por despacho da Vice-Presidente do Tribunal Constitucional apensação do requerimento de recurso apresentado neste Tribunal ao processo eleitoral que , coincidentemente, deu aqui entrada no dia 3-9-2013.
No Tribunal de Cascais, no dia 30 de agosto de 2013, pelas 15 h., realizou-se o sorteio dos símbolos a utilizar pelos Grupos de Cidadãos Eleitores, tendo estado presente neste ato, em representação do Grupo de Cidadãos Eleitores denominado “SerCascais – Movimento Independente”, Isabel Magalhães, 1.ª candidata às eleições à Câmara Municipal de Cascais.
Fundamentação
O Requerente através do requerimento apresentado neste Tribunal, manifestou a sua vontade de impugnar o ato de sorteio dos símbolos a utilizar pelos Grupos de Cidadãos Eleitores realizado no dia 30 de agosto de 2013, utilizando o meio recursório previsto no artigo 94.º, n.º 2, da LEOAL.
O recurso que consta deste dispositivo destina-se, porém, a impugnar a decisão do juiz da comarca que decida uma reclamação que incida sobre as provas tipográficas dos boletins de voto, não sendo, por isso, o meio processual adequado para a impugnação de um ato de sorteio dos símbolos a utilizar pelos Grupos de Cidadãos Eleitores.
Tratando-se esse sorteio de um ato de administração eleitoral em que não está previsto um meio específico de impugnação, só pode o mesmo ser questionado através do meio processual genérico previsto no artigo 102.º-B, da LTC, por força do disposto no n.º 7 deste preceito.
Ora, mesmo admitindo a convolação do meio impugnatório utilizado pelo Requerente para o meio adequado à sua pretensão, o recurso não pode ser conhecido, uma vez que não só não foi apresentado no órgão de administração eleitoral em causa – o Tribunal Judicial de Cascais – conforme exige o artigo 102.º - B, n.º 1, da LTC, como também não se revela interposto no prazo fixado no n.º 2, do artigo 102.º-B, da LTC.
Com efeito, este preceito prevê o prazo de um dia para a interposição de recurso a contar da data do conhecimento pelo recorrente do ato impugnado.
O sorteio impugnado realizou-se no dia 30 de agosto, pelas 15 h., e nele esteve presente uma representante do Grupo de Cidadãos Eleitores recorrente, pelo que, não contando o dia em que se realizou o ato impugnado, o prazo terminou no dia útil seguinte, isto é, no dia 2 de setembro, à hora de encerramento das secretarias dos Tribunais (16 h.).
Na verdade, por força do disposto no artigo 229.º, da LEOAL, aplicável aos recursos interpostos previstos no artigo 102.º-B, da LTC, como tem sido entendimento deste Tribunal, “quando o ato processual [...] envolva a intervenção de entidades ou serviços públicos, o termo dos prazos respetivos, considera-se referido ao termo do horário normal dos competentes serviços ou repartições.”
Daí que, tendo o fax através do qual foi interposto o presente recurso sido enviado apenas às 19.20 h. do dia 2 de setembro de 2013, ou seja após o encerramento das secretarias dos Tribunais, o mesmo foi sempre apresentado para além do prazo exigido pelo artigo 102.º-B, n.º 2, da LTC.
E o facto do presente requerimento ter um conteúdo idêntico ao que foi apresentado no Tribunal de Cascais no próprio dia em que se realizou o sorteio que se pretende impugnar não impede este raciocínio.
Na verdade, estamos perante um novo ato de interposição de recurso, uma vez que o Recorrente não questionou o despacho proferido no Tribunal de Cascais que não lhe admitiu o primeiro recurso interposto, não manifestando vontade que o Tribunal Constitucional apreciasse esse recurso, tendo antes optado pela interposição de novo recurso agora apresentado no próprio Tribunal Constitucional. E este, como já se verificou, não foi entregue no local nem no tempo exigidos pelo artigo 102.º-B, da LTC.
Por estas razões não deve ser conhecido o presente recurso.
Decisão
Pelo exposto, não se conhece o recurso interposto para o Tribunal Constitucional no dia 2 de setembro por António Maria Torres Carneiro Pacheco, na qualidade de mandatário do Grupo de Cidadãos Eleitores denominado “SerCascais – Movimento Independente”, do ato de sorteio dos símbolos a utilizar pelos Grupos de Cidadãos Eleitores realizado no dia 30 de agosto de 2013.
Notifique.
Lisboa, 4 de Setembro de 2013. – João Cura Mariano – Pedro Machete – Maria João Antunes – Maria de Fátima Mata-Mouros – Catarina Sarmento e Castro – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral
[ documento impresso do Tribunal Constitucional no endereço URL: http://www.tribunalconstitucional.pt/tc//tc/acordaos/20130477.html ]