Imprimir acórdão
Processo n.º 649/13 (Preso)
2.ª Secção
Relatora: Conselheira Ana Maria Guerra Martins
Acordam, em conferência, na 2ª Secção do Tribunal Constitucional
I – Relatório
1. Nos presentes autos de fiscalização concreta da constitucionalidade, vindos do Supremo Tribunal de Justiça, a Relatora proferiu a Decisão Sumária n.º 427/2013:
«I – Relatório
1. Nos presentes autos, em que é recorrente A. e recorrido o Ministério Público, foi interposto recurso, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do artigo 70º da Lei do Tribunal Constitucional (LTC), de acórdão proferido, pelo Supremo Tribunal de Justiça, porque aquele “colide frontalmente com os princípios constitucionais da igualdade, previsto no artigo 13.º, n.º 1, da Constituição da República Portuguesa, previsto no artigo 29.º, n.º 4, da C.R.P., da mínima restrição dos direitos liberdades e garantias, previsto no artigo 18.º, n.º 2 e 3 da C.R.P., e com os direitos de defesa do arguido em processo penal, in casu, o recurso consagrado no artigo 32.º, n.º 1 da C.R.P.” (fls. 2302).
Face ao não cumprimento das exigências de indicação resultantes dos n.ºs 1 e 2 do artigo 75º-A da LTC, a Relatora proferiu despacho de convite ao aperfeiçoamento. Notificado para o efeito, o recorrente veio aperfeiçoar o requerimento de interposição de recurso, nos seguintes termos:
«(…) vem, muito respeitosamente indicar, que pretende ver apreciada a constitucionalidade dos artigos 32.º e 205.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa, sendo que a questão da constitucionalidade foi suscitada pelo arguido no seu recurso interposto a fls… para o Supremo Tribunal de Justiça» (fls. 2315)
Tudo visto, importa apreciar e decidir.
II – Fundamentação
2. Mesmo tendo o recurso sido admitido por despacho do tribunal “a quo”, com fundamento no n.º 1 do artigo 76º da LTC, essa decisão não vincula o Tribunal Constitucional, conforme resulta do n.º 3 do mesmo preceito legal, pelo que sempre seria forçoso apreciar o preenchimento de todos os pressupostos de admissibilidade do recurso previstos nos artigos 75º-A e 76º, n.º 2, da LTC.
Sempre que o Relator constate que não foram preenchidos os pressupostos de interposição de recurso, pode proferir decisão sumária de não conhecimento, conforme resulta do n.º 1 do artigo 78º-A da LTC.
3. Após convidado a aperfeiçoar o requerimento de interposição de recurso, veio o recorrente fixar o objeto do recurso na apreciação da constitucionalidade das normas extraídas dos artigos 32º e 205º, n.º 1, ambos da Constituição da República Portuguesa (CRP). Ora, resulta da própria noção de “inconstitucionalidade” que se pressupõe uma relação antinómica entre uma norma ou princípio incluídos no bloco de normatividade constitucionalidade e uma outra norma de fonte infraconstitucional, que mantém como pressuposto normativo aquelas outras. Em suma, ao Tribunal Constitucional apenas cabe fiscalizar a constitucionalidade de “normas jurídicas infraconstitucionais” (cfr. artigo 277º, n.º 1, da CRP), não sendo possível – ou sequer concebível – que normas constitucionais consagrados no texto fundamental possam ser simultaneamente “inconstitucionais”. As normas constitucionais são “parâmetro de validade” e não “objeto” de fiscalização da constitucionalidade.
Assim sendo, visto que o objeto, tal como definido pelo recorrente, não incide sobre quaisquer normas infraconstitucionais, mais não resta que recusar dele conhecer.
III – Decisão
Pelo exposto, ao abrigo do disposto no n.º 1 do artigo 78º-A da LTC, decide-se não conhecer do objeto do presente recurso.
Custas devidas pelo recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 7 UC´s, nos termos do n.º 2 do artigo 6º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.» (fls. 2328 e 2329)
2. Inconformado com a decisão proferida, o recorrente veio deduzir reclamação, cujos termos se sintetizam:
«1. Importa desde já salientar, que no presente recurso estão em causa direitos fundamentais de qualquer cidadão, mormente o direito à liberdade de cidadãos condenados em penas de prisão elevadíssimas
2. Ora, por decisão sumária nº 649/2013 proferida a fls., e da qual ora se reclama, entendeu a Ema. Sr. Relatora dever rejeitar o recurso interposto pelo arguido.
3. Não obstante, entende o arguido recorrente, salvo melhor opinião, que o acórdão referido, colide frontalmente com os princípios constitucionais da igualdade, previsto no artigo 13, n° 1 da Constituição de Republica Portuguesa, previsto no artigo 29°, nº 4 da C.R.P., da mínima restrição dos direitos liberdades e garantias, previsto no artigo 18.°, nº 2 e 3 da C.R.P., e com os direitos de defesa do arguido em processo penal, in casu, o recurso, consagrado no artigo 32.°, n.º 1 da C.R.P.
4. O arguido, apesar do maior ou menor rigor da motivação e conclusões apresentadas, expressa a sua discordância quanto à pena única aplicada ao arguido pena única essa superior a 8 anos.
5. Pelo, que, é admissível o recurso interposto pelo arguido, conforme disposto no artigo 400º, nº 1, alínea f).
6. Pelos motivos acima explanados, ao não se admitir o recurso em causa foram violados os artigos 13.°, 29,° e 32.° da Constituição da Republica Portuguesa.
7. Pelo que a face ao quanto vem estabelecido nos n°s 2 a 4 do artigo 70° da Lei do Tribunal Constitucional (aprovada pela Lei n° 28/82 de 15 de novembro), encontra-se o recorrente face à situação de que é inequívoco que nos presentes autos se encontram já para si irremediável e completamente esgotados todos os meios ou recursos jurisdicionais ordinários, que lhe possibilite, de acordo com a previsão do artigo 280° da Constituição, reagir contra a decisão de não admissão do recurso com a qual continua a não poder conformar-se.
8. Pelos motivos acima explanados, ao não se admitir o recurso em causa foram violados os artigos 13.°, 29.° e 32.°da Constrição da Republica Portuguesa.» (fls. 2328 e 2329)
3. Notificado para o efeito, o Ministério Público veio responder nos seguintes termos, que ora se resumem:
«(…)
3º
Na sua reclamação para a conferência, o ora reclamante nada aduz em contrário desta argumentação.
Bem pelo contrário, vem agora invocar diversos princípios e preceitos constitucionais, pretensamente violados, designadamente (cfr. fls. 2328 dos autos):
“3. Não obstante, entende o arguido recorrente, salvo melhor opinião, que o acórdão referido, colide frontalmente com os princípios constitucionais da igualdade, previsto no artigo 13º, nº 1 da Constituição da República Portuguesa, previsto no artigo 29º, nº 4 da C.R.P., da mínima restrição dos direitos liberdades e garantias, previsto no artigo 18º, nº 2 e 3 da C.R.P., e com os direitos de defesa do arguido em processo penal, in casu, o recurso, consagrado no artigo 32º, nº 1 da C.R.P.”
4º
Acaba, aliás, por confessar que a sua preocupação é o da medida concreta da pena aplicada ao arguido - matéria, essa, naturalmente, excluída da apreciação deste Tribunal Constitucional -, como resulta do seguinte extrato da sua peça processual (cfr. fls. 2329 dos autos):
“4. O arguido, apesar do maior ou menor rigor da motivação e conclusões apresentadas, expressa a sua discordância quanto à pena única aplicada ao arguido pena única essa superior a 8 anos.
5º
Crê-se, assim, que a presente reclamação para a conferência não deverá merecer acolhimento por parte deste Tribunal Constitucional, não havendo razões para alterar o sentido da Decisão Sumária 427/13, de 26 de julho, que determinou a respetiva apresentação.»
Posto isto, importa apreciar e decidir.
II – FUNDAMENTAÇÃO
4. Apesar de convidado a aperfeiçoar um requerimento de interposição de recurso em que não identificava qualquer norma jurídica infraconstitucional que constituísse objeto do recurso, o recorrente persistiu em não o fazer, tendo-se limitado a afirmar que pretendia que fosse apreciada a constitucionalidade de normas jurídicas incluídas na própria Constituição – a saber, artigos 32º e 205º, n.º 1, da CRP. Como é evidente aquelas normas são antes parâmetro de validade constitucional e não podem constituir objeto de um recurso de constitucionalidade.
O recorrente não invoca qualquer argumento que seja suscetível de contrariar o sentido da decisão reclamada, razão pela qual se indefere a presente reclamação.
III - DECISÃO
Em face do exposto, decide-se indeferir a presente reclamação.
Custas devidas pela recorrente, fixando-se a taxa de justiça em 20 UC´s, nos termos do artigo 7º do Decreto-Lei n.º 303/98, de 07 de outubro.
Lisboa, 20 de agosto de 2013. – Ana Maria Guerra Martins – Fernando Vaz Ventura – Joaquim de Sousa Ribeiro.