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Processo n.º 169/13
3.ª Secção
Relator: Conselheira Catarina Sarmento e Castro
Acordam, em Conferência, na 3.ª Secção do Tribunal Constitucional
I - Relatório
1. Os presentes autos tiveram início em processo criminal, no âmbito do qual a aqui requerente A. e B. foi condenada, por acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, datado de 14 de junho de 2012, pela prática de um crime de casamento de conveniência, previsto e punido pelo artigo 186.º, n.º 2, da Lei 23/2007, de 4 de julho, na pena de três anos de prisão suspensa por igual período de tempo.
Notificada de tal acórdão, a requerente apresentou requerimento, arguindo nulidades e peticionando a aclaração. Tal pretensão foi indeferida, por novo acórdão de 11 de julho de 2012.
Igualmente do acórdão datado de 14 de junho de 2012, a requerente interpôs recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, tendo o Tribunal da Relação de Lisboa decidido não admitir o mesmo, por inadmissibilidade legal.
De tal decisão do Tribunal da Relação, a requerente reclamou, nos termos do artigo 405.º do Código de Processo Penal, invocando nomeadamente a respetiva nulidade.
Por decisão de 20 de novembro de 2012, o Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação.
Notificada de tal decisão, a requerente solicitou a respetiva aclaração, que foi indeferida por nova decisão do Vice-Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Após notificação desta nova decisão, a requerente interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, a que foi negado provimento, por decisão sumária de 16 de janeiro de 2013.
Por requerimento de 31 de janeiro de 2013, a requerente interpôs novo recurso para o Tribunal Constitucional, tendo este Tribunal decidido, através de Decisão sumária datada de 15 de março de 2013, não tomar conhecimento do respetivo objeto, por o mesmo ser inidóneo.
A requerente reclamou para a conferência de tal Decisão sumária, tendo tal reclamação sido indeferida por Acórdão datado de 23 de maio de 2013, a que foi atribuído o n.º 289/2013.
Notificada deste último Acórdão, vem agora a requerente solicitar a aclaração do mesmo.
2. Na peça processual apresentada, a requerente refere que a decisão proferida é ininteligível.
Para fundamentar tal afirmação, a requerente alega que o acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa procedeu a uma alteração da matéria de facto contra documentos autênticos, “usando a partir daí as regras da experiência comum”, aspeto que – de acordo com a requerente - consta da formulação genérica que apresentou no requerimento de interposição de recurso. Sobre tal questão, o Tribunal não se pronunciou, circunstância que gera nulidade processual e “determina a ininteligibilidade da decisão”.
Acrescenta a requerente que a matéria de facto não poderia ser alterada sem indicação dos concretos meios de prova e factos provados, “contra factos expressos e com afirmações e imputações genéricas”, sendo que não se compreende “dada a generalidade desta conclusão por que não é ela cindível do caso concreto”, o que motiva pedido de esclarecimento, quanto a este ponto.
Por último, refere a requerente que o Tribunal da Relação de Lisboa distorceu factos bem como a resposta apresentada ao recurso interposto pelo Ministério Público, aspeto que a requerente igualmente pretende ver esclarecido.
3. Notificado o Ministério Público, veio o mesmo propugnar pelo indeferimento do requerimento, alegando que o acórdão posto em crise explica “com absoluta clareza” que a decisão de não conhecimento do recurso se fundou na inidoneidade do respetivo objeto, tal como se considerou na Decisão sumária, acrescentando que “ainda que hipoteticamente se reconhecesse natureza normativa aos enunciados apresentados pelos requerentes no requerimento de interposição de recurso”, ter-se-ia de concluir que a decisão recorrida não aplicou o sentido expresso em tais enunciados. Tal conclusão é explicitada, de forma inequívoca, no ponto 6. do Acórdão.
Nestes termos, termina o Ministério Público referindo que “[a]s persistentes dúvidas da recorrente situam-se ao nível da prova e da sua valoração, matéria insindicável por este Tribunal, como resulta do que se disse na (…) Decisão Sumária, designadamente no seu último parágrafo (fls. 461).”
II - Fundamentos
4. Não obstante a requerente referir pretender a aclaração do acórdão, não especifica qualquer excerto da decisão que, comportando alguma incompreensibilidade ou incongruência, torne objetivamente inteligível o seu pedido.
Na verdade, a pretensão apresentada não traduz a existência de uma verdadeira dúvida ou dificuldade de compreensão, antes correspondendo, substancialmente, a uma manifestação de discordância quantos aos fundamentos da decisão de não conhecimento do objeto do recurso, explicitados na Decisão sumária e no Acórdão agora posto em crise.
Nestes termos, a apresentação do requerimento em análise – pela sua manifesta falta de fundamento e pelo contexto em que surge, caracterizado pela sucessiva utilização de meios de reação às decisões proferidas, nomeadamente sistemáticos pedidos de aclaração, apesar dos sucessivos indeferimentos – revela que a requerente apenas pretende obstar ao trânsito em julgado do Acórdão de 23 de maio de 2013, que julgou improcedente a reclamação deduzida, e à consequente baixa do processo.
Pelo exposto, justifica-se a utilização da faculdade prevista nos artigos 84.º, n.º 8, da LTC e 720.º do Código de Processo Civil, determinando-se a imediata remessa do processo ao tribunal recorrido, precedido de extração de traslado, sem aguardar a decisão que venha a incidir sobre o presente requerimento de aclaração, a qual será proferida no referido traslado, onde igualmente será tramitado qualquer ulterior incidente que sobrevenha.
Mais se consigna que, para todos os efeitos, com a prolação do presente Acórdão se considera, nesta data, transitado em julgado o Acórdão de 23 de maio de 2013, que julgou improcedente a reclamação.
Assim sendo, o processo deverá seguir os seus regulares termos no tribunal recorrido.
III - Decisão
5. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, decide-se determinar que, após extração de traslado dos presentes autos, estes sejam de imediato remetidos ao tribunal recorrido, a fim de prosseguirem os seus termos.
Sem custas.
Lisboa, 8 de outubro de 2013. - Catarina Sarmento e Castro – Maria José Rangel de Mesquita – Maria Lúcia Amaral