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Processo n.º 164/03
2ª Secção Relator - Cons. Paulo Mota Pinto
Acordam em conferência no Tribunal Constitucional:
I. Relatório
1.No presente recurso de constitucionalidade, interposto por A. do despacho do Presidente do Tribunal da Relação do Porto de 4 de Fevereiro de 2003, que indeferiu a reclamação do despacho de 6 de Junho de 2002, do Juiz do Tribunal de Comarca de Vila Nova de Gaia, 1º Juízo, que não admitiu o recurso que o recorrente pretendera interpor da sentença que declarara a sua falência, por não caber legalmente recurso desta decisão (fundamentando-se tal despacho de indeferimento da reclamação no disposto nos artigos 129º, 228º e 229º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência), foi proferida pelo relator, em 14 de Maio de 2003, decisão nos termos do artigo 78º-A, n.º 1, da Lei do Tribunal Constitucional, pela qual se decidiu negar provimento ao recurso e condenar o recorrente em custas, com cinco unidades de conta de taxa de justiça. Esta decisão baseou-se nos seguintes fundamentos:
«Como resulta da transcrição efectuada, o recorrente não satisfez cabalmente o convite para aperfeiçoar o requerimento de recurso, na medida em que não indicou a alínea do artigo 70º, n.º 1 da Lei do Tribunal Constitucional ao abrigo da qual interpunha recurso. A consequência deste omissão poderia ser a impossibilidade de tomar conhecimento do recurso, desde logo, por não se tornar possível aferir o preenchimento dos respectivos pressupostos. Admite-se, porém, ser possível retirar do requerimento de recurso e da resposta ao convite
(designadamente, da referência à suscitação da questão de constitucionalidade e ao artigo 20º da Constituição), que se trata de recurso interposto de decisão que aplicou “norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo”, isto é, do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do citado artigo
70º. E pode também admitir-se que se encontram preenchidos os requisitos para o conhecimento do recurso – embora aqui a questão se não afigure tão líquida, desde logo porque, na reclamação para o Presidente do Tribunal da Relação, o recorrente apenas disse, quanto à questão de constitucionalidade, que “ao interpor recurso da sentença que o declarou falido, agiu dentro de um direito constitucional e dentro das normas reguladoras desse direito, pelo que o recurso lhe deve ser admitido” –, sendo certo que a decisão recorrida negou expressamente existir violação do artigo 20º da Constituição. De qualquer modo, sendo a questão que o recorrente traz à apreciação do Tribunal a da constitucionalidade dos artigos 228º e 229º (“disposição normativa cuja constitucionalidade se pretende ver apreciada”) do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e de Falência, na medida em que delas resulta a inexistência de recurso da sentença que decreta a falência, tal questão é de considerar simples, nos termos do n.º 1 do artigo 78º-A da Lei do Tribunal Constitucional, por já ter sido objecto de decisão anterior deste Tribunal, sendo caso de proferir decisão sumária.
(...) Na verdade, sobre semelhante questão de constitucionalidade, ainda que não reportada em concreto a iguais preceitos do mesmo Código (mas antes aos do artigo 129º, n.º 1, e do artigo 228º), já se pronunciou este Tribunal por diversas vezes, no Acórdão n.º 479/98 (publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 40º vol., pp. 491 e ss), e, designadamente, nos Acórdãos n.ºs
604/98 e 605/98 (publicado o primeiro do Diário da República, II série, de 1 de Março de 1999), nos quais se analisaram alegadas inconstitucionalidades orgânica e material daquela dimensão normativa, designadamente, também em face do artigo
20º da Constituição. E concluiu sempre no sentido da inexistência de inconstitucionalidade, considerando, designadamente, que a decisão que declare a falência pode ser objecto de impugnação, embora não por via de recurso, e sim por intermédio de embargos (como, aliás, o próprio legislador não deixou de salientar, de entre as inovações do novo Código, no n.º 5 do preâmbulo do Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril). Considerando que os argumentos aduzidos pelo ora recorrente nada acrescentam ao que então se disse – sendo esse o caso, designadamente, da referência aos artigos 678º e 679º do Código de Processo Civil, que se não situa sequer no plano da violação da Constituição –, há agora simplesmente que remeter para os fundamentos destes arestos, negando provimento ao presente recurso.»
2.Notificado desta decisão, o recorrente veio reclamar para a conferência ao abrigo do artigo 78º-A, n.º 3, da Lei do Tribunal Constitucional, nos seguintes termos:
“(...) Parece ao requerente que, da sua posição contratual, resulta claro, para além das aferições resultantes do n.º 2 da fls. 2 do despacho em causa, que o recurso foi interposto ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 70º da Lei 28/82. Oportunamente foi suscitada a inconstitucionalidade dos art.ºs 228 e 229 do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência, os quais excluem pura e simplesmente qualquer recurso da sentença declaratória da falência. Os embargos que contra esta possam ser deduzidos não podem conduzir à exclusão do recurso normal. Isto não só contradiz toda a legislação sobre recursos, nomeadamente os art.ºs
676 e seguintes do Código de Processo Civil como os mais elementares princípios constitucionais sobre direitos, liberdades e garantias, e muito especialmente o art.º 20º da Constituição da República Portuguesa. Termos em que a conferência deve decidir a reclamação, ordenando o prosseguimento do recurso ou conhecendo imediatamente do seu objecto.” Cumpre decidir.
II. Fundamentos
3.Como resulta da transcrição efectuada da decisão reclamada, apesar de o recorrente ter omitido a indicação, exigida por lei, da alínea ao abrigo da qual o recurso vinha interposto – e isto por duas vezes, pois foi expressamente convidado a fazê-lo –, admitiu-se nela ser ainda possível retirar do requerimento de recurso, e da resposta ao convite para seu aperfeiçoamento, que se tratava de recurso interposto de decisão que aplicou “norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo”, isto é, do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do citado artigo 70º. E admitiu-se, também, que se encontravam preenchidos os requisitos para o conhecimento do recurso, designadamente, o requisito da suscitação da inconstitucionalidade durante o processo. O reclamante vem reafirmar a inconstitucionalidade dos artigos 228º e 229º do Código dos Processos Especiais de Recuperação da Empresa e da Falência dizendo que estes “excluem pura e simplesmente qualquer recurso da sentença declaratória da falência”, e que os “embargos que contra esta possam ser deduzidos não podem conduzir à exclusão do recurso normal”, já que tal “não só contradiz toda a legislação sobre recursos, nomeadamente os art.ºs 676 e seguintes do Código de Processo Civil como os mais elementares princípios constitucionais sobre direitos, liberdades e garantias, e muito especialmente o art.º 20º da Constituição da República Portuguesa.” Trata-se, porém, como se diz na decisão reclamada, de questão idêntica, ainda que reportada em concreto a outros preceitos do mesmo Código, àquela sobre a qual já se pronunciou este Tribunal por diversas vezes: Acórdão n.º 479/98
(Acórdãos do Tribunal Constitucional, 40º vol., pp. 491 e ss), e, designadamente, Acórdãos n.ºs 604/98 e 605/98 (o primeiro publicado no Diário da República, II série, de 1 de Março de 1999, e o último disponível em
www.tribunalconstitucional.pt). Nestes foi analisado, entre outros, o fundamento de inconstitucionalidade alegado pelo reclamante – o artigo 20º da Constituição
–, concluindo-se sempre no sentido da inexistência de inconstitucionalidade. A presente reclamação nada acrescenta, em argumentação, ao que então se analisou e afirmou, sendo esse o caso, designadamente, da referência aos artigos 678º e
679º do Código de Processo Civil, ou, agora, à alegada contradição com “toda a legislação sobre recursos, nomeadamente os art.ºs 676 e seguintes do Código de Processo Civil”, a qual se não situa sequer no plano da violação da Constituição. A decisão sumária reclamada merece, pois, confirmação.
III. Decisão Pelos fundamentos expostos, decide-se indeferir a presente reclamação, confirmando a decisão reclamada que negou provimento ao recurso, e condenar o reclamante em custas, com 15 (quinze) unidades de conta de taxa de justiça. Lisboa, 15 de Julho de 2003
Paulo Mota Pinto Mário José de Araújo Torres Rui Manuel Moura Ramos