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Proc. 311/03
1ª Secção Relator: Cons. Carlos Pamplona de Oliveira
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
A. recorreu para o Tribunal Constitucional, ao abrigo do artigo 70º n.º1 alínea b) da LTC, do despacho do Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa que indeferira reclamação de não admissão do recurso interposto pela Recorrente no Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa.
Invocou o seguinte:
Pretende a recorrente que seja apreciada a norma do n.º1 do artigo 307º do C. Proc. Penal na interpretação que foi dada pelo Tribunal de Instrução Criminal no sentido de ter pronunciado a arguida sem terem sido apreciados em audiência contraditória das partes os depoimentos das testemunhas arroladas pela defesa, tendo sido, por outro lado, dado mais relevância jurídica à versão dos factos apresentados pela queixosa, com infracção do princípio in dubio pro reo, problema que só aliás poderia ser levantado se a final houvesse, como houve, despacho de pronúncia, pois é na prolacção deste que se completa o cometimento das inconstitucionalidades, que já foram levantadas no recurso da primeira instância, nomeadamente nos nºs 2, 3, 4 e 5 das suas conclusões, o que não aconteceria se o despacho tivesse sido de não pronúncia.
Todavia, o recurso foi liminarmente rejeitado neste Tribunal, ao abrigo do disposto no artigo 78-A da LTC, com base na seguinte ordem de considerações:
“O presente recurso resulta de um patente equívoco que, aliás, salta à vista logo dos termos em que foi formulado o respectivo requerimento. Apesar disso, foi admitido, mas tal decisão não vincula este Tribunal (artigo 76º, n.º3, da LTC).
O recurso interposto ao abrigo da alínea b) do n.º1 do artigo 70º da LTC – a alínea invocada pela Recorrente – cabe das decisões dos tribunais “que apliquem norma cuja inconstitucionalidade haja sido suscitada durante o processo”.
São, assim, pressupostos de admissibilidade do recurso:
- que o recorrente tenha suscitado, durante o processo, a inconstitucionalidade da norma que pretende que o Tribunal aprecie;
- que essa norma tenha sido efectivamente aplicada pela decisão recorrida como razão de decidir.
A decisão sob recurso é o despacho do Vice-Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa que indeferiu a reclamação da decisão de não admissão do recurso da decisão instrutória que pronunciou a ora Recorrente, como se extrai do requerimento de interposição:
“(...) não se conformando com a douta decisão que indeferiu a sua reclamação, deseja da mesma interpor Recurso para o Tribunal Constitucional(...)”
Ora, o certo é que a norma que, no presente recurso, se pretende submeter à apreciação deste Tribunal – a norma constante do artigo 307º, n.º1 do Código de Processo Penal – não foi manifestamente aplicada, como razão de decidir, no despacho recorrido. Este limitou-se a aplicar a norma reguladora dos recursos da decisão instrutória, o artigo 310º, n.º1 do Código de Processo Penal.
A Recorrente pretende “que seja apreciada a norma do n.º 1do artigo 307º do Código de Processo Penal na interpretação que foi dada pelo Tribunal de Instrução Criminal”. Porém, essa norma, porventura aplicada no Tribunal de Instrução Criminal, não pode ser aqui sindicada pelas razões já expostas, pois em causa está, por expressa opção da Recorrente, apenas o despacho que indeferiu a reclamação sobre a não admissão de recurso.
Neste contexto, é de concluir que o despacho recorrido não fez efectiva aplicação da norma que a Recorrente invoca para fundamentar este recurso, razão pela qual se não mostram preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da LTC.
Pelo exposto e ao abrigo do artigo 78º-A, n.º 1, da LTC decide-se não tomar conhecimento do presente recurso.”
Inconformada, a Recorrente reclama deste despacho para a Conferência, conforme lhe permite o artigo 78-A n. 3 da citada LTC.
No respectivo requerimento, a Reclamante nada mais invoca para além do que inicialmente suscitara ao interpor o recurso para este Tribunal, razão pela qual o representante do Ministério Público neste Tribunal emite parecer no sentido de a presente reclamação estar manifestamente infundada; com efeito, acrescenta,
“nada adita a reclamante que seja susceptível de por em causa os fundamentos da decisão reclamada e a evidente inverificação de um dos pressupostos do recurso interposto: a efectiva aplicação da norma questionada como ratio decidendi da decisão recorrida”.
Não pode deixar de se reconhecer total razão à opinião expressa pelo Ministério Público, pois é patente a improcedência da presente reclamação. Aliás, a circunstância de na reclamação não se ter esboçado a mais leve crítica aos fundamentos do despacho reclamado permite que o Tribunal se limite a expressar a sua concordância quanto às razões invocadas nesse despacho, pois é efectivamente manifesto que não ocorrem os pressupostos de admissibilidade do recurso previsto na alínea b) do n.1 do artigo 70.º da LTC, tal como se afirmou no despacho sob censura.
Dispensada fica, portanto, qualquer outra justificação para decidir pelo indeferimento da reclamação.
Custas pela Reclamante. Taxa de justiça: 15 UC
Lisboa, 15 de Julho de 2003
Carlos Pamplona de Oliveira Maria Helena Brito Rui Manuel Moura Ramos