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Procº nº 344/2003.
3ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Em 28 de Maio de 2003 proferiu o relator decisão com o seguinte teor:-
“1. No Tribunal de comarca de Santa Maria da Feira B... e marido, propuseram acção, seguindo a forma de processo sumário, contra J... e mulher, A
... e mulher, M... e marido, F... e marido, e Z... e marido. Nessa mesma acção veio a ser deferido o pedido de intervenção principal provocada H... e mulher, e P... e, no despacho saneador, foram os réus J...e mulher, e A ... e mulher, absolvidos da instância, por ilegitimidade.
Por sentença proferida na dita acção foi decidido:-
- declarar serem os autores proprietários de um terreno de cultura sito em ..., Caldas de São Jorge, Santa Maria da Feira;
- condenar os réus e os intervenientes a reconhecer os autores como proprietários daquele terreno;
- condenar os réus e os intervenientes a reconhecerem que um seu prédio se encontrava onerado com uma servidão de passagem durante todo o ano, a pé, de carro de bois e de tractor, em benefício do prédio dos autores;
- condenar os réus e os intervenientes a absterem-se de praticar quaisquer actos que perturbassem o exercício daquela servidão
- condenar os réus M... e marido a retirarem um muro de blocos que ergueram junto à via pública e na entrada do caminho, mantendo livre e desimpedida a passagem;
- condenar os réus M... e marido a pagar aos autores, a título de indemnização pelos prejuízos por estes sofridos pela privação do exercício do direito de servidão, a quantia que se viesse a liquidar em execução de sentença;
- condenar os réus M... e marido a pagarem aos autores, a título de sanção pecuniária compulsória, a quantia de € 25 por cada dia de atraso no cumprimento da obrigação de retirarem o muro de blocos que ergueram.
Tendo dessa sentença apelado para o Tribunal da Relação do Porto os réus M...e marido, aquele Tribunal de 2ª instância, por acórdão de 7 de Novembro de 2002, confirmou a sentença apelada, excepto no que diz respeito à condenação dos réus no pagamento da sanção pecuniária compulsória.
Os mesmos réus intentaram interpor recurso para o Supremo Tribunal de Justiça, invocando o disposto no nº 6 do artº 678º do Código de Processo Civil, para tanto tendo invocado que aquele Alto Tribunal, em acórdão de 19 de Julho de
1979, decidira diferentemente e, porque se não conhecia aresto do mesmo Supremo que decidisse em contrário, era de presumir que o dito aresto constituía
‘jurisprudência uniformizada’.
Não tendo o Desembargador Relator do Tribunal da Relação do Porto, por despacho de 5 de Dezembro de 2002, admitido o recurso, reclamaram os réus M... e marido para o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Disseram na peça processual consubstanciadora da reclamação:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................ O recurso em questão não foi admitido e, assim, foi rejeitado no despacho reclamado por 2 fundamentos. Ao contrário do 1.º fundamento, em nosso critério o Acórdão do STJ integra jurisprudência uniformizada por aquele Tribunal Superior visto que presume-se a boa razão tanto nas Instâncias Jurisdicionais como nos Julgadores, o que quer dizer que se há jurisprudência pacífica, se esta é consensual neste Supremo Tribunal, como é o caso, segundo cremos, considera-se uniformizada. Os 'Assentos' , não propriamente para uniformizar a jurisprudência, eram, só para os acórdãos contraditórios, de vinculabilidade obrigatória - quebrada pela jurisprudência constitucional, daí se impôs o princípio da ampla revisibilidade a poder ser requerida também pelas partes em qualquer estado do processo. Pelo que se entendeu desnecessária a complexidade processual de recurso a Pleno e suficiente a força persuasiva de decisão de STJ obtida no julgamento ampliado de revista para obter a desejável unidade de jurisprudência, harmonia de julgados, segurança jurídica, princípio da confiança (artigo 2.º CRP) : transformar a norma geral (1548-2 CC) em norma de decisão com divergências sem recurso como o pretendido permitiria, através de uma destas, dar a tal norma um sentido de violação da protecção da confiança num Estado de Direito (art.2.º CRP) para uma segurança de certeza e calculabilidade, com eficácia ex ante, por parte dos cidadãos, em relação aos efeitos jurídicos dos actos normativos. Com o devido respeito, ao contrário do 1.º fundamento do despacho reclamado, deverá ser aqui enquadrado (art. 678.º n. 6) e admitido o presente recurso de revista ainda que por lacuna processual. Nesta reclamação damos por totalmente reproduzidas as considerações d[e]spendidas no douto parecer que se promete juntar no prazo de dez dias que se requer . O 2.º fundamento refere que o entendimento do acórdão da Relação que confirmou a sentença de 1.ª instância conforma-se inteiramente com o Acórdão do STJ referido no requerimento de recurso quanto à questão suscitada. Baseia esta afirmação nos factos provados ‘caminho de terra batida’, ‘onde sempre foram visíveis, marcados no solo, sulcos característicos de passagem de carros de bois e tractores...’; que estes são sinais visíveis e permanentes; e que é a estes sinais que o Acórdão do STJ de 1979 se refere . Com todo o respeito, cremos que o Acórdão do STJ diz exactamente o contrário. Refere que o simples traçado referente a um caminho de carro não garante que existam sinais visíveis e permanentes que ali tivessem sido postos para assegurar de modo estável, a passagem de carro. Logo, nem as marcas de passagem de carro. Logo, nem as marcas de passagem de roda de tractor poderão revelar serventia de um prédio para com o outro . Neste sentido de que, com aquele com aquele Ac. do STJ, o acórdão recorrido não se conforma vem expresso na pag. 13 deste :
‘ . . . pelo facto de aquele prédio. . . ter sido destinado a cultivo ( com a normal lavoura do solo e consequente ‘remexer’ da terra, não obsta, nem sequer por ilação presuntiva, que não possa ali ter surgido, naturalmente, um caminho de terra batida com sulcos e trilhos, na sequência da passagem persistente, entre a via e o prédio dominante ( que, por mera lógica de raciocínio, não foi atingido pela lavra da terra)’. Aqui se vê bem expresso que os trilhos, os sulcos, um caminho de terra batida
‘surgiram naturalmente’. O surgiram naturalmente não é obra do homem não é sinal ali colocado ou trabalhado pelo homem que revele serventia. A terra batida e os sulcos também existem em caminhos públicos nos quais não revelam qualquer permanência de serventia. Com este acórdão da Relação não são consonantes as referências doutrinais subentendidas naquele Acórdão do Supremo de 19.7.79 (BMJ nº 289 pag. 326) no qual consta que a simples referência a um caminho de carro.... não garante que no seu traçado existam obras ou sinais exteriores visíveis e permanentes, que ali tivessem sido postos para assegurar, de modo estável a passagem de carro...». Aliás na pág.328 do BMJ 289, as orientações doutrinárias que se subentendem no concernente ao requisito ( de existência de sinais visíveis e permanentes que não revelem a existência de serventia de uma para outra fracção) fundamentam-se nos Profs. Pires Lima e Antunes Varela: Esses sinais. além de visíveis ou aparentes, devem revelar uma situação estável (não transitória), mostrando que foram postos com a intenção de assegurar a serventia de uma fracção para outra com carácter de permanência» (Cod. Civ. anotado, vol III pag. 582) . Uma coisa é os sinais que têm carácter permanente - outra coisa é os sinais de sulcos das rodas de carro ou de tractor aludidas pelo acórdão em questão. Os sulcos desaparecem no tempo - aqueles são permanentes e estáveis. O acórdão em questão definiu-se pelos sulcos - e o deste Supremo definiu-se pelas marcas permanentes e estáveis. O Acórdão STJ engloba marcas de serventia permanentes- que o acórdão da Relação não contém. Toda esta subentendida orientação doutrinária do Supremo Tribunal está em consonância com a eliminação da servidão descontínua pelo novo código civil. Nos termos expostos, e nos melhores de Direito, deverá ser deferida a presente reclamação de forma ser revogado o despacho dê que se reclama e admitido o recurso de revista interposto pelos réus.
............................................................................................................................................................................................................................................’
O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por despacho de 19 de Fevereiro de 2003, indeferiu a reclamação, para tanto se louvando na seguinte fundamentação:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................
Por despacho do Ex.mo Desembargador Relator, esse recurso não foi admitido, por o acórdão invocado pelos reclamantes - Acórdão de 19.07.79, publicado no BMJ n.º 289, p. 326 - não ter sido proferido sob a forma de Assento e não haver qualquer divergência entre o referido acórdão e o acórdão impugnado.
Desse despacho reclamam os recorrentes, sustentando que, por força do art.º 678 nº 6 do CPC, o recurso é admissível por entenderem que a expressão jurisprudência uniformizada, ali prevista, significa jurisprudência pac[í]fica, consensual no Supremo Tribunal de Justiça. Acrescenta que o acórdão é contrário ao proferido nestes autos.
O despacho reclamado foi mantido.
II Cumpre apreciar e decidir.
Nos termos do art.º 678º n.º 6 do CPC, ‘é sempre admissível recurso das decisões proferidas contra jurisprudência uniformizada pelo Supremo Tribunal de Justiça’.
Donde resulta ser o recurso admissível ‘das decisões da 1ª instância e da Relação que julguem em contrário da jurisprudência estabelecida nos anteriores assentos do S.T.J., nos acórdãos de fixação de jurisprudência proferidos pelo plenário das secções cíveis do S.T.J. a partir de 1 de Janeiro de 1966, em conformidade com o disposto no n.º 3 do art.º 17º do DL n.º 329[]-A
/95, de 12 de Dezembro, e nos acórdãos uniformizadores de jurisprudência emitidos nos julgamentos ampliados da revista (art.ºs 732º-A e 732º-B) e do agravo em 2ª instância, (art.º 762, n.º 3 do CPC)’ (cfr. Amâncio Ferreira, Manual dos Recursos em Processo Civil, 3ª edição, pág. 107).
Não basta assim, como se diz na reclamação que a jurisprudência deste Supremo Tribunal seja pacífica e consensual para se considerar uniformizada, porque, a ser assim, caberia sempre recurso para o S.T.J. nos termos do n.º 6 do citado artigo.
Quando o legislador quis adoptar o sentido da jurisprudência dominante e pacífica, como o fez no art.º 732-A, n.º 2 do CPC, utilizou a expressão
‘jurisprudência anteriormente firmada’.
Assim sendo, como a acção tem o valor de € 2.543,87 manifestamente inferior à alçada da Relação, não é o recurso admissível, de harmonia com o disposto no artº 678º, n.º 1 do CPC.
............................................................................................................................................................................................................................................’
Notificados do despacho de que parte acima se encontra transcrita, vieram os réus M... e marido reclamar do mesmo, esgrimindo com as seguintes razões:-
‘............................................................................................................................................................................................................................................ O artigo 678.º n. 6 do CPC foi interpretado no sentido de apenas abranger os
‘acórdãos ... proferidos pelo Plenário das secções cíveis do S.T.J. ...’ ‘os ... assentos do S.T.J.’ e excluir a jurisprudência pacífica e consensual no STJ que por isso mesmo nunca poderia ser susceptível de ser proferida pelo Plenário das Secções cíveis em julgamento ampliado pois este tipo de julgamento ampliado pressupõe a controvérsia de opiniões no mesmo Tribunal. Dentro do quadro do princípio do Estado de direito democrático [arts, 2.º e 9.º b) da Constituição] inclui-se o fundamento jurídico da maior razão a qual simplesmente nos diz que se o fundamento menor é causa do recurso, com mais razão será o fundamento maior isto é jurisprudência controvertida embora fixada pelo plenário das secções cíveis é um fundamento menor de recurso do que a jurisprudência pacífica e consensual, que é um fundamento maior e como tal por isso mesmo nunca suscitou julgamento ampliado sobre essa questão do direito já consensual nas respectivas secções cíveis. Com o devido respeito, houve lapso na determinação interpretativa da norma (art.
678.º n.6 CPC) pois adoptou-se uma interpretação restritiva da mesma tornando-a inconstitucional por conter um fundamento menor e excluir um fundamento maior. Se a jurisprudência sofre de julgamento ampliado muito mais a jurisprudência pacífica que nunca poderia dar origem a um julgamento ampliado.
Nesta conformidade
vem reclamar se julgue inconstitucional a referida norma e como tal tire daí as
suas consequências’.
O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por despacho de 31 de Março de 2003, indeferiu o peticionado, já que, segundo disse, em ‘primeiro lugar, por após a prolação do despacho de fls. 44 e 45, se ter esgotado o poder jurisdicional do signatário’ e, em ‘segundo lugar, por a questão ora levantada dever ter sido, à cautela, suscitada na reclamação de fls 3 e ss., para dela se conhecer no despacho de fls. 44 e 45’.
Vieram então os réus M... e marido juntar aos autos requerimento com o seguinte teor:-
‘M... e marido , residentes em ..., comarca de S. Maria da Feira, como vencidos nos presentes autos de reclamação de inconstitucionalidade para o Ex.mo Senhor Presidente do colendíssimo Supremo Tribunal de Justiça, vêm muito respeitosamente recorrer para o Tribunal Constitucional da douta decisão que indefere o pedido de inconstitucionalidade do artigo 678.º n. 6 do CPC interpretado no sentido de que só abrange os acórdãos dos
‘anteriores assentos’ de fixação de jurisprudência, os uniformizadores de jurisprudência emitidos nos julgamentos ampliados de revista (arts. 732°-A e
732°-B) e os de ‘agravo em 2ª instância ( art. 762° n. 3 C PC)’ e de que não abrange a jurisprudência pacífica e consensual das secções cíveis do STJ. O recurso para o Tribunal Constitucional é da douta decisão que indefere e não conhece da inconstitucionalidade suscitada com o simples fundamento de que se esgotou o ‘poder jurisdicional do signatário’ com o despacho de ‘fls. 44 e 45’ ao qual se reclamou inconstitucionalidade sem este transitar em julgado em matéria antes não sujeita a contraditório, o de que a inconstitucionalidade devia ter sido suscitada na reclamação fIs 3 e segs quando o fundamento do despacho a esta na rel. Porto foi diferente - porque não diverge nem contraria
‘mas até se conforma inteiramente’ com o acórdão do STJ (de jurisprudência consensual e pacífica) -, e o de que ‘só outra instância’ não identificada
‘poderia ter sido convocada para conhecer da inconstitucionalidade suscitada . E, porque diferente, a decisão do Ex.mo Senhor Presidente do Supremo Tribunal de conteúdo imprevisível foi uma verdadeira decisão surpresa que os requerentes não podiam prever e razoavelmente antecipar ( cf. BMJ 494 pág. 24) precisamente por ser uma decisão ‘ex improviso’ Pretende-se que o Tribunal Constitucional aprecie a não conformidade da Constituição de uma norma - art. 678° n. 6 do CPC - com a interpretação de que esta norma proíbe o recurso ampliado à jurisprudência pacífica e consensual das secções cíveis do STJ e' restringe o recurso ampliado aos dos assentos, aos uniformizadores de revista dos arts. 732-A e 732-B e aos de agravo do art. 762.º n. 3 CPC . Foram violados os artigos 2.0 e 9.0 alínea b) da Constituição da República Portuguesa isto é o artigo 678° n. 6 CPC foi interpretado com sentido restritivo e deveria ser interpretado com sentido não inconstitucional que só à menor razão permite ser causa do recurso e à maior razão (acórdão da relação do Porto contrário a jurisprudência pacífica e consensual do STJ) proíbe de o ser . Este recurso é interposto ao abrigo do artigo 70° n. 1 alínea b) da Lei sobre Organização Funcionamento e processo do Tribunal Constitucional; para efeitos do artigo 80° n. 3 da mesma Lei . O presente recurso deverá ter subida imediata e nos próprios autos e com efeito suspensivo’.
O Presidente do Supremo Tribunal de Justiça, por despacho de 24 de Abril de 2003, admitiu o recurso interposto.
2. Não obstante tal despacho, porque o mesmo não vincula o Tribunal Constitucional (cfr. nº 3 do artº 76º da Lei nº 28/82, de 15 de Novembro), e porque se entende que o recurso não deveria ter sido admitido, elabora-se, ex vi do nº 1 do artº 78º-A da mesma Lei, a vertente decisão, por intermédio da qual se não toma conhecimento do objecto da presente impugnação.
Como resulta do relato acima efectuado, o recurso intentado interpor (e não obstante a, no mínimo, pouco inteligível forma como se encontra elaborado o requerimento de interposição) circunscreve-se à apreciação da alegada inconstitucionalidade da norma ínsita no nº 6 do artº 678º do Código de Processo Civil na interpretação segundo a qual a mesma ‘pro[í]be o recurso ampliado à jurisprudência pacífica e consensual das secções cíveis do STJ e restringe o recurso ampliado aos dos assentos, aos uniformizadores de revista dos art.s
732-A e 732-B e aos recursos de agravo do art. 762.º n. 3 CPC’.
Ora, em primeiro lugar, o despacho pretendido recorrer - o prolatado pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça em 31 de Março de 2003 -, de todo em todo, não utilizou a norma constante do nº 6 do artº 678º do diploma adjectivo civil como ratio juris da decisão nele inserta, já que se limitou a indeferir o pedido de reforma do seu anterior despacho de 19 de Fevereiro do mesmo ano.
Em segundo lugar, mesmo que se porventura se entendesse que o recurso ora em apreço se reportava, não à decisão jurisdicional vertida no despacho de
31 de Março de 2003, mas sim ao anterior despacho de 19 de Fevereiro, é por demais certo que este não fez aplicação da aludida norma na dimensão interpretativa segundo a qual é proibido ‘o recurso ampliado à jurisprudência pacífica e consensual das secções cíveis do STJ’ ou é restringido ‘o recurso ampliado aos dos assentos, aos uniformizadores de revista dos art.s 732-A e
732-B e aos recursos de agravo do art. 762.º n. 3 CPC’. Na verdade, o que aquele despacho entendeu foi que o normativo em causa permitia sempre recurso para o Supremo Tribunal de Justiça de decisões dos tribunais pertencentes à ordem dos tribunais judiciais se as mesmas julgarem em contrário da jurisprudência firmada, quer por intermédio de assentos anteriormente proferidos por aquele Alto Tribunal, quer por acórdãos de fixação de jurisprudência proferidos pelo seu plenário das secções cíveis, quer por acórdãos uniformizadores de jurisprudência tirados nos julgamentos ampliados de revista e de agravo em 2ª instância.
E, que, in casu, não estava em causa uma pretensão de recurso visando a emissão de um acórdão de uniformização de jurisprudência a proferir nos termos dos artigos 732º-A e 732º-B do Código de Processo Civil, é questão acerca da qual se não podem levantar dúvidas.
Em terceiro lugar, mesmo admitindo, por um lado, que o recurso querido interpor para o Tribunal Constitucional visava o despacho proferido em 19 de Fevereiro de 2003 pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça e, por outro, que se desejava questionar a conformidade com a Lei Fundamental da norma vertida no nº 6 do artº 678º do Código de Processo Civil, no sentido interpretativo de harmonia com o qual a jurisprudência uniformizada pelo Supremo Tribunal de Justiça só se reportava aos assentos a que aludia o nº 3 do artº 768º do mesmo corpo de leis na versão anterior à conferida pelos Decreto-Lei nº 329-A/95, de
12 de Dezembro, aos acórdãos de fixação de jurisprudência tirados em conformidade com o nº 3 do artº 17º deste último Decreto-Lei e aos acórdãos uniformizadores de jurisprudência proferidos nos termos dos já citados artigos
732º-A e 732º-B da vigente versão do Código de Processo Civil, o que é certo é que, na situação sub specie, essa questão de inconstitucionalidade não foi, atempadamente, suscitada e, consequentemente, não se congrega um dos requisitos previstos na alínea b) do nº 1 do artº 70º da Lei nº 28/82.
Efectivamente, desejando-se interpor recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da última das mencionadas disposições, daquele despacho de 19 de Fevereiro de 2003, mister seria que na reclamação do despacho proferido pelo Desembargador Relator do Tribunal da Relação do Porto que não admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (despacho esse que se esteou no normativo constante do nº 6 do artº 678º do Código de Processo Civil), tivesse sido equacionada a incompatibilidade com o Diploma Básico por banda da interpretação que, neste último despacho, foi dada e que, afinal, em nada diferiu da conferida pelo aludido despacho de 19 de Fevereiro de 2003.
O que os ora impugnantes não fizeram.
Nem se diga que a suscitação de inconstitucionalidade ainda era atempada no requerimento de reforma daquele despacho.
É que, como tem sido jurisprudência pacífica deste Tribunal, estando esgotado o poder jurisdicional dos tribunais com a prolação da decisão, a suscitação das questões de inconstitucionalidade, em regra, não é de considerar atempada quando a mesma ocorre em requerimentos de aclaração, arguição de nulidades ou de pedidos de reforma (cfr., por todos, e mesmo quanto ao Código de Processo Civil na versão emergente dos Decretos-Leis números 325-A/95 e 180/96, de 25 de Setembro, o Acórdão deste Tribunal nº 364/2000).
Em face do exposto, não se toma conhecimento do objecto do recurso, condenando-se os impugnantes nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em seis unidades de conta”.
Da transcrita decisão reclamaram, ao abrigo do nº 3 do artº 78º-A da Lei nº 28/82, os réus M... e marido, tendo dito na peça processual consubstanciadora da reclamação:-
“A fls 63 do despacho ora reclamado refere-se que o requerimento do recurso é pouco inteligível.
Não é fácil compreender como não se percebe mediante requerimento de recurso, como não se percebe o objecto de recurso e ainda para mais havendo jurisprudência sobre isso. Ao contrário do despacho reclamado e com todo o respeito, em nosso critério ao expressar-se no requerimento de recurso que o artigo 678° n. 6 C PC «pro[í]be o recurso ampliado à jurisprudência pacífica e consensual das secções do STJ e restringe o recurso ampliado aos acórdãos dos assentos....» não entendemos porque é pouco inteligível uma vez que se expressa a aplicação do 678.º n. 6 com a restrição feita pelo STJ, se diz qual é a restrição (de só abranger os assentos, os acórdã[os] uniformizados...), se diz qual é o sentido amplo do artigo 878-6 que se reclama para ser, aplicado e se diz qual é o artigo da Constituição que não se conforma com tal restrição interpretativa, o que equivale a dizer que só a interpretação ampla descrita de abrangência pelo 678-6 da jurisprudência pacífica e consensual do STJ é conforme com os artigos 2.º e
9.º b) da Constituição. A fls. 63 do douto despacho reclamado,refere-se que o despacho do STJ de
31.3.2003 ‘não utilizou a norma constante do n. 6 do art. 678º’ do CPC ‘como ratio juris da decisão nele inserta, já que se limitou a indeferir o pedido de reforma do seu anterior despacho de 19 de Fevereiro do mesmo ano’. Ora sempre com o respeito devido, e ao contrário: na nossa óptica, no despacho de 31.3.2003 o STJ entendeu que foi requerido se
‘julgue inconstitucional a dimensão interpretativa restritiva da norma do art.
678° n. 6 CPC’ feita pelo STJ. O que quer dizer que nesse momento teve oportunidade de se pronunciar sobre a inconstitucionalidade desta norma anteriormente invocada de forma clara e perceptível isto é na dimensão restritiva. Mas ao decidir, em 31.3.2002, ‘após a prolação do despacho’ de
19.2.2002 ‘se ter esgotado o poder jurisdicional do signatário’, o ST. aplicou implicitamente (cf. Acórdão n° 11/99/T.Const-Proc.271/97 1ª Secção' de 24.3.1999 D.R. II Série pag.4292) a norma 678-6 com a dimensão interpretativa restritiva cuja inconstitucionalidade havia sido suscitada. Refere-se na decisão reclamada a fls. 64 ‘que na situação sub specie essa questão de inconstitucionalidade não foi atempadamente suscitada e consequentemente, não se congrega um dos requisitos previstos na alínea b) do nº l do art. 70º da lei 28/82’ . Ao contrário de fls. 64 do despacho ora reclamado,a reclamação de inconstitucionalidade foi apresentada dentro do prazo legal de 10 dias e o objecto da reclamação era simplesmente adjectivo de admissão ou não admissão de recurso. Ao indeferir o pedido de inconstitucionalidade violou-se o art. 70° alínea b) da lei 28/82 de 15/9 . Depois da arguição da inconstitucionalidade do
679-6 CPC o seu não reconhecimento pelo tribunal recorrido ( o STJ) equivale a implícita aplicação da norma arguida de inconstitucionalidade que é do 678-6 com o sentido restritivo descrito na arguição, é o que se lê no Acórdão n°
11/99/T.Const.-Proc.271/97 de 24.3.1999 D.R II Série de 24.3.1999 1ª secção pag.4292. Ainda a fls 64 do despacho ora reclamado refere-se
‘mister seria que na reclamação do despacho proferido pelo Desembargador Relator do Tribunal da Relação do Porto que não admitiu o recurso para o Supremo Tribunal de Justiça (despacho esse que se esteou no normativo constante do n° 6 do art. 678° do código de processo civil), tivesse sido equacionada a incompatibilidade com o Diploma Básico por banda da interpretação que, neste
último despacho foi dada e que afinal em nada diferiu da conferida pelo aludido despacho de 19 de Fevereiro de 2003’ ‘o que os ora impugnantes não fizeram’. Ao contrário e sempre com o devido respeito: O despacho da Relação do Porto difere do despacho do despacho de 19.2.2003 do STJ. O despacho da Relação não põe em jogo o art. 678.º n. 6 do código de processo civil porque até diz ‘o entendimento seguido no acórdão da Relação (que confirmou a sentença recorrida na parte em que alude à questão ora suscitada) conforma-se inteiramente com o apresentado no apontado Acórdão do STJ’. E o despacho de 19.2.2003 do STJ aplica o artigo 678.º n. 6 com a interpretação restritiva de assentos... e não com a interpretação ampliativa descrita e reclamada como só ela conforme à Constituição. O Tribunal da Relação nunca pôs em jogo que a jurisprudência pacífica e consensual fosse excluída da hipótese do nº 6 do art. 678. Pelo contrário toma-a em boa conta como um corolário que realmente é. Uma vez que a Relação não pôs em jogo a interpretação do 678-6 também os impugnantes não podiam ad[i]vinhar que o STJ o iria fazer posteriormente em
19.2.2003. É o que vem expresso no Acórdão n° 11/99/T .Const-Proc.nº 271/97 lª Secção II Série de 24.3.1999 pag.4292.
‘. .a reclamação da conta constitucionalidade é ainda momento azado para a suscitação da questão da constitucionalidade’. Não se podia arguir o vício da inconstitucionalidade em momento anterior. Não era previsível, foi surpresa que o STJ viesse a fundamentar o indeferimento de
19.2.2003 com a aplicação restritiva ou proibitiva e com a não aplicação ampliativa do 678-6 do código de processo civil. Logo, o recurso de inconstitucionalidade tem por fundamento o pressuposto da alínea b) do art. 70.º da lei 28/82 . Este requisito está preenchido. Refere a ainda a fls 64 e 65 o despacho recorrido que a suscitação de inconstitucionalidade não foi atempada no requerimento de reforma despacho de 19.2.2003, que ‘estando esgotado o poder jurisdicional dos tribunais com a prolação da decisão, a suscitação das questões de inconstitucionalidade, em regra, não é de considerar atempada quando a mesma ocorre em requerimentos de aclaração, nulidades ou pedidos de reforma Ora, os Acórdãos do Tribunal Constitucional dizem precisamente o contrário: Ao reclamar-se a inconstitucionalidade do 678-6 aplicado pelo STJ com sentido restritivo em 19.2.2003, o poder jurisdicional não se esgotou porque o objecto de reclamação de tal inconstitucionalidade é só concernente ao tema aí decidido que é simplesmente adjectivo. Era preciso dar ao STJ oportunidade para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade do decidido restritivo adjectivo. Foi o que se fez. Nisto consiste suscitar a inconstitucionalidade não num sentido meramente formal mas num sentido funcional que melhor se enquadra com os objectivos constitucionais subjacentes a um Estado de Direito democrático e à natureza que o Tribunal Constitucional reveste no controlo concreto da constitucionalidade
(cf Acórdão T.Const. nº 709/98-Proc: n° 605/98 1ª Secção D.R. de 23.3.1999 II Série pag. 4232). O STJ, ao não aplicar o 678-6 interpretado no sentido ampliativo de abranger a jurisprudência pacífica e consensual após a suscitação da inconstitucionalidade aplicou esta norma com sentido restritivo isto é aplicou implicitamente uma norma cuja constitucionalidade foi impugnada, contrariamente ao Acórdão n°
11/99/T.Const.-Proc.nº 271/97 D.R. de 24.3.199 II Série pag 4292 porque não acolheu a inconstitucionalidade suscitada. Compete aos tribunais e mais ao Tribunal Constitucional dizer quais os critérios em abstracto para uns e para outros. Não pode haver distinção. Nas mesmas circunstâncias terá que dizer quem tem razão. Se há vários Acórdãos do Tribunal Constitucional a dizer que a inconstitucionalidade pode ser suscitada através de reclamação e que a arguição de nulidades é o momento oportuno para arguir inconstitucionalidades (cf[r]. acórdãos acima referidos e Acórdão n° 293/1999/T.Const.-Proc. nº103/99 2ª Secção D.R. de 15.7.1999 II Série pag 10.275 que até o Ex.mo Senhor Relator subscreveu)
- e no entretanto vamos fazer uma excepção ou excepções como no caso presente, então o Tribunal Europeu dos Direitos do Homem em Estrasburgo terá que se pronunciar se o princípio da igualdade e do acesso ao direito deve ou não ser igual para todos em circunstâncias iguais segundo a Convenção Europeia dos Direitos do Homem, designadamente art. 14.º. O que fica exposto, tentamos sumariá-lo nas seguintes Ante as contrariedades acabadas de descrever aos vários Acórdãos do Tribunal Constitucional cremos bem que pode determinar-se que o julgamento requerido na presente reclamação se faça com intervenção do plenário, para evitar divergências jurisprudenciais (artigo 79.º-A da lei 28/82). O que fica exposto, tentamos sumariá-lo nas seguintes CONCLUSÕES:
1 )Ao contrário de fls. 63 do despacho recorrido, cremos que no requerimento de recurso de revista para o STJ se entende que se recorre da inconstitucionalidade do artigo 678º nº 6 CPC interpretado no sentido restritivo de só abranger os acs. dos assentos, os uniformizadores da jurisprudência e os de agravo (art.
762° n. 3 C PC) e de que não abrange a jurisprudência pacífica e consensual como corolário.
2)Ao contrário de fls. 63 do despacho recorrido, na nossa óptica o despacho prolatado do STJ de 31.3.2003, ao não acolher a inconstitucionalidade suscitada utilizou o artigo 678-6 CPC como ratio juris com a dimensão restritiva não acolhendo a dimensão ampliativa de recurso de abranger a dimensão ampliativa da jurisprudência pacífica e consensual como sendo um corolário consubstanciado nos artigos 2.º 9° b) da Lei Básica; e, assim aplicou implicitamente o 678-6 com a dimensão cuja constitucionalidade fora suscitada (Acórdão n°
11/99/T.Const.-Proc. 271/97 1ª secção de 24.3.1999 D.R. II Série pag. 4292). ,
3)Ao suscitar a inconstitucionalidade (fls.61) os reclamantes arguiram com clareza que a jurisprudência pacífica e consensual é um fundamento maior e de mais razão de recurso e que a de assentos e de acs. de jurisprudência uniformizada são menor fundamento: em suma, que o fundamento maior se não deve excluir.
4)Ao contrário de fls. 64 do despacho ora reclamado, a ‘constitucionalidade’
‘sub specie’ ‘foi atempadamente suscitada pelo que se congrega o requisito previsto na alínea b) do nº1 do art. 70 da lei 28/82 porque foi apresentada dentro do prazo legal de 10 dias a contar da notificação do despacho de
19.2.2003 e o objecto da reclamação era simplesmente adjectivo de admissão ou não admissão de recurso.
5)Ao contrário ainda de fls 64 do despacho reclamado, o despacho da Relação do Porto difere do despacho de 19.2.2003 do STJ; aquele não pôs em jogo que a jurisprudência pacífica e consensual fosse excluída da hipótese do n. 6 do art.
678 respeitando-a como um corolário; e o STJ exclui-a.
6)Ao contrário de fls 64 e 65 do despacho reclamado, o poder jurisdicional do Exmo Senhor Presidente do STJ não se esgotou com a prolação da decisão de
19.2.2002 porque não se podia adivinhar o fundamento de tal prolação e porque todo o cidadão tem o direito de arguir a inconstitucionalidade mesmo quando ela seja surpresa como é o caso; não pode haver o direito de a invocar nas mesmas circunstâncias surpresa para uns e não a haver para outros já que o acesso ao direito tem de ser igual para todos (art. 20° CRP).
7)Há requisitos para a presente reclamação: foi invocada a inconstitucionalidade oportunamente; a inconstitucionalidade não foi acolhida; os reclamantes recorreram da decisão. Em face do exposto, Reclama-se ao Tribunal Constitucional para que se digne julgar em conferência e em plenário para evitar divergências jurisprudenciais”.
Ouvidos sobre a reclamação ora deduzida, os autores B... e marido nada vieram dizer.
Cumpre decidir.
2. É por demais óbvia a improcedência da vertente reclamação.
Em primeiro lugar, não se vislumbra minimamente qual o motivo da pretensão de julgamento em plenário do Tribunal Constitucional, já que o juízo constante da decisão reclamada em nada contraria a jurisprudência que tem sido seguida por este órgão de administração de justiça.
Efectivamente, tem sido entendimento sufragado, sem divergências, por este Tribunal que, em princípio, a suscitação de uma questão de inconstitucionalidade efectuada em requerimentos de arguição de nulidade, de reforma ou de aclaração das decisões judiciais intentadas impugnar perante o
órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa não é de considerar atempada para efeitos do disposto na alínea b) do nº 1 do artº 70º e do nº 2 do artº 72º, um e outro da Lei nº 28/82.
É que, de acordo com aquele entendimento, como, com a decisão, se encontra esgotado o poder jurisdicional do tribunal a quo, se se deseja colocar em causa a ou as normas que foi ou foram ratio decidendi dela, não serão os requerimentos de arguição de nulidades, pedidos de reforma, aclaração ou esclarecimento que têm a virtualidade de abalar aquela mesma decisão, maxime nas situações em que as pretensões neles ínsitas não são acolhidas.
A jurisprudência deste Tribunal têm, no entanto, admitido situações de todo excepcionais e anómalas em que não houve anteriormente oportunidade processual para, antes de ser tomada a decisão judicial desejada impugnar, equacionar a questão de desconformidade constitucional de uma dada norma (cfr. Acórdão nº 94/88, publicado nos Acórdãos do Tribunal Constitucional, 11º volume, 1089 a 1103).
Não é, porém, este o caso em apreço.
2.1. De facto, o despacho proferido pelo Desembargador Relator do Tribunal da Relação do Porto, inequivocamente, carreou como um dos fundamentos de não admissão do recurso tentado interpor para o Supremo Tribunal de Justiça ao abrigo do nº 6 do artº 678º do diploma adjectivo civil, a circunstância de, no caso, se não estar perante um acórdão de relação que decidiu contrariamente a um aresto uniformizador de jurisprudência proferido pelo Supremo Tribunal de Justiça, já que o acórdão deste Alto Tribunal então invocado pelos ora reclamantes não revestiu a forma de assento, acórdão de fixação de jurisprudência proferido pelo plenário das secções cíveis ou acórdão uniformizador de jurisprudência tirado em julgamento ampliado de revista ou de agravo em 2ª instância, antes se tratando de um mero acórdão prolatado quanto a um caso concreto e que não revestiu as características de um daqueles arestos. E, depois desse fundamento, ainda se acrescentou que, de todo o modo, o invocado acórdão do Supremo, aliás, não proferiu uma decisão dissemelhante, quanto ao ponto de vista de interpretação e aplicação do direito, à que foi tomada no acórdão lavrado no Tribunal da dita Relação que negou a apelação e que foi querido recorrer perante o Supremo Tribunal de Justiça.
Não se pode, pois, dizer, como o pretendem fazem os reclamantes, que o Desembargador Relator do Tribunal da Relação do Porto, explícita ou implicitamente, tivesse aceitado que, existindo um acórdão do Supremo Tribunal de Justiça que deu determinada solução a uma dada situação
(obviamente por interpretação e aplicação do direito) - e ainda que se não conhecessem outros acórdãos em contrário -, se esse acórdão não revestisse a forma de assento ou a forma de acórdão de fixação ou uniformização de jurisprudência, era possível recorrer-se, ex vi do nº 6 do artº 678º do Código de Processo Civil, para aquele Supremo de decisões judiciais tomadas pelos tribunais de hierarquia inferior que deram solução diversa à que se consagrou naquele acórdão.
Ora, foi justamente também com base nesse fundamento que o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça indeferiu a reclamação do despacho proferido por aquele Desembargador Relator, pelo que era inteiramente previsível ou plausível que o dito fundamento viesse igualmente a ser utilizado em tal despacho.
Neste contexto, impunha-se aos ora reclamantes o ónus de suscitarem a questão da desarmonia constitucional da interpretação daquele normativo aquando da reclamação que deduziram perante o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Dispunham, assim, de um momento processualmente adequado para tanto. E, se o dispunham, não se pode dizer que a situação em análise se poste como uma daquelas situações excepcionais e anómalas em que este Tribunal tem admitido que a suscitação da questão de inconstitucionalidade se possa fazer em requerimentos de arguição de nulidades, de pedidos de reforma ou de aclaração.
Aqui residia, pois, a atempada suscitação da questão de inconstitucionalidade, não se visando, com tal asserção, equacionar o problema de saber a apresentação do pedido de reforma do despacho de 19 de Fevereiro de
2003 foi efectuada em tempo.
Pelo exposto, se concluiu, quer no sentido de não merecer censura a decisão agora impugnada, quer no sentido de não haver qualquer justificação para o requerido julgamento em plenário.
2.2. Aliás, deverá sublinhar-se que os acórdãos deste Tribunal citados pelos reclamantes (Acórdãos número 11/99, 709/98 e 293/99) não versam, minimamente que seja, sobre situações com o perfil da que foi analisada na decisão ora reclamada.
2.3. Por último, uma nota sobre o que, naquela decisão, foi dito a propósito da forma pouco inteligível como se encontrava elaborado o requerimento de interposição de recurso para o Tribunal Constitucional.
É que, nesse requerimento, escreveu-se que tal recurso vinha interposto da decisão que não conhecia da inconstitucionalidade suscitada com o simples fundamento de que se tinha esgotado o poder jurisdicional do Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Ora, a ser assim, então a impugnação tinha por alvo o despacho proferido por aquele Presidente em 31 de Março de 2003 (o qual indeferiu a reclamação do seu anterior despacho de 19 de Fevereiro do mesmo ano); e o mesmo, seguramente, não convocou - e aqui reafirma-se o que foi escrito na decisão em apreço -, como suporte normativo da decisão no mesmo
ínsita, a norma do nº 6 do artº 678º do Código de Processo Civil.
Mas, dada a pouco clareza do aludido requerimento de interposição de recurso, aceitou-se que o despacho pretendido impugnar era, não o prolatado em 31 de Março de 2003, mas sim o em 19 de Fevereiro anterior e, neste particular, ainda que com tal aceitação, foi decidido não tomar conhecimento do objecto do recurso.
2.4. Pelo que ficou dito na «conclusão» 21ª da reclamação agora em análise, parece que, afinal, o despacho pretendido recorrer perante o Tribunal Constitucional era o despacho lavrado em 31 de Março de 2003 pelo Presidente do Supremo Tribunal de Justiça.
Mas, se assim é, haverá, talqualmente se fez na decisão reclamada e acima se reafirmou, que concluir pelo não conhecimento do objecto do recurso, justamente pela razão segundo a qual naquele despacho se não convocou, para a decisão no mesmo inserta, a norma vertida no nº 6 do artº 678º do Código de Processo Civil.
3. Em face do que se deixa dito, indefere-se a presente reclamação, condenando-se os impugnantes nas custas processuais, fixando em quinze unidades de conta a taxa de justiça.
Lisboa, 10 de Julho de 2003 Bravo Serra Gil Galvão Luís Nunes de Almeida