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Processo n.º 584/03
2ª Secção Relator - Cons. Paulo Mota Pinto
Acordam na 2ª Secção do Tribunal Constitucional,
I. Relatório
1.Após ter sido notificado do despacho que lhe aplicou a medida de coacção de prisão preventiva, o arguido A. requereu junto do Tribunal de Instrução Criminal de Lisboa passagem de certidão das peças processuais do inquérito consideradas indispensáveis para fundamentar a impugnação judicial daquele despacho. Perante a decisão de indeferimento desse pedido, o arguido interpôs recurso para o Tribunal da Relação de Lisboa, “a subir imediatamente e em separado, nos termos do disposto no n.º 2 do art. 407º e n.º 2 do art. 406º, ambos do CPP”. Por despacho de 9 de Junho de 2003, este recurso foi admitido, mas foi-lhe fixado um regime de subida diferida, com os seguintes fundamentos:
“O arguido A. veio requerer a admissão de recurso a subir imediatamente e em separado. Que a decisão recorrida é recorrível não se nos suscita qualquer dúvida. O que, com o mais alto e devido respeito, não podemos concordar é com a sua subida imediata ao abrigo do disposto no art.º 407º, n.º 2 do Código do Processo Penal. Na verdade, pressuposto da aplicação de tal norma é que da sua não aplicação o recurso perca todo o seu sentido. Ora, como o recorrente logo refere no intróito da douta peça, este recorre do despacho que negou certas peças processuais cujo impetrou para fazer cabal uso do seu direito ao recurso do despacho que determinou a respectiva sujeição a prisão preventiva (fls. 5372). Ora, tal recurso – da decisão que determinou a prisão preventiva – deu já entrada e foi oportunamente admitido (como aliás é referido pelo recorrente) pelo que a eventual prejudicialidade do recurso em apreço em relação ao outro (o que determinou a prisão preventiva) não se verifica. De um outro prisma, se o recorrente obtiver ganho de causa no recurso já interposto e admitido, surge o ora em apreço destituído de fundamento. Conforme é pacificamente aceite só sobe imediatamente por a retenção o tornar absolutamente inútil o recurso em que, seja qual for a solução que o Tribunal Superior lhe der, ela será sempre completamente inútil no momento de um apreciação diferida, mas não aquele cujo provimento possa conduzir à eventual anulação do processado posterior à sua interposição. Segue-se assim, quanto a nós, que o recurso ora interposto não deve seguir o regime do art.º 407º, n.º 2 do Código do Processo Penal já que a sua não subida imediata não o tornara absolutamente inútil. Pelo exposto, porque em tempo, recorrível e deduzido por quem com legitimidade, admito o recurso interposto a fls. 5372, o qual é para o Venerando Tribunal da Relação de Lisboa, sobe com o recurso da decisão que tiver posto termo à causa e com efeito meramente devolutivo (art.º 399º,401º n.º 1 al. b), 407º n.º 3 e 427º todos do Código do Processo Penal). Cumpra o disposto no art.º 411º, n.º 5 do Código do Processo Penal.”
2.Inconformado com este despacho, o recorrente reclamou para o Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, dizendo a concluir que:
“a retenção deste recurso torna-o apodicticamente inútil, esvazia-o de qualquer sentido, tornando-o destarte absolutamente inadequado. Na verdade, só a subida imediata deste poderá, ainda, dar-lhe algum conteúdo e dimensão operatória, em suma, conferir-lhe adequação, proporcionando-o às finalidades que se visam prosseguir através do respectivo imediato e atempado conhecimento. Nestes termos, o sentido atribuído pelo M.mº Juiz ao n.º 2 do art. 407º do CPP torna tal norma inconstitucional por, na prática, esvaziar de conteúdo o direito consagrado no n.º 1 do art. 32º da Const., quando lidos estes normativos à luz do disposto no art. 18º da norma normarum e, em especial face ao disposto no seu n.º 2. Não se vê, em boa verdade – concretizando a asserção anterior – que o direito consagrado no n.º 4 do art. 20º da Const. e no art. 6º, n.º 1 da Convenção Europeia, perante o acabado de referir, tenha qualquer justificação ou seja subsidiário de qualquer necessidade, à luz do art. 18º, n.º 2, na interpretação assumida pelo Senhor Juiz do disposto no n.º 2 do art. 407º do CPP.” Notificado para responder, o Magistrado do Ministério Público veio dizer que:
“O arguido interpôs recurso do despacho que lhe aplicou a medida de coacção de prisão preventiva, antes de esgotar o prazo que para tal a lei lhe confere e antes de ter acesso aos elementos que requereu, só tendo interposto recurso desta decisão de indeferimento, depois de apresentar aquele primeiro recurso sobre a prisão preventiva. O M.mº Juiz de Instrução recebeu o recurso e fixou que o mesmo subiria a final, uma vez que não se tratava de recurso sobre decisão de aplicação de nenhuma medida de coacção e o seu efeito útil não ficava precludido.
É deste despacho que agora o arguido vem reclamar alegando que a subida a final do referido recurso o torna completamente inútil. Todavia, cremos que não lhe assiste qualquer razão. Dispõe o art.º 407º, n.º 1, c) do CPP que sobem imediatamente os recursos interpostos de ‘decisões que apliquem ou mantenham medidas de coacção ou de garantia patrimonial, nos termos deste Código’. No caso vertente, o recurso visou uma decisão que não se inclui no âmbito de previsão da norma processual penal invocada pelo arguido para justificar o momento e modo de subida do recurso interposto. De facto, o despacho recorrido não se pronunciou sobre a aplicação ou manutenção de qualquer medida de coacção, tendo-se limitado a apreciar e decidir um requerimento da autoria do arguido, através do qual fora solicitado o acesso a determinados elementos dos autos com o objectivo de impugnar a medida decretada. Sucede que a enumeração constante do art.º 407º, n.º 1 é taxativa, não se afigurando justificada nem necessária uma interpretação da norma que exceda o sentido que resulta da sua letra, a qual traduz, por forma clara e objectiva, aquela que foi a intenção do legislador. Acresce que o presente recurso perdeu a sua utilidade no momento em que o Recorrente, mesmo sem estar na posse dos elementos cujo conhecimento, ab initio, reputou essenciais para o efeito, interpôs um recurso através do qual contestou os fundamentos subjacentes à decisão judicial que aplicou a medida de coacção de prisão preventiva. Nesta ordem de ideias e na perspectiva do consignado no art.º 407º, n.º 2, importa concluir que a subida imediata do presente recurso não determinaria tramitação diversa daquela que os autos, efectivamente, tiveram. A consulta das peças processuais pretendida pelo recorrente foi pedida em nome da preparação de um recurso que, entretanto, já interpôs. Ao que tudo indica, sem necessidade daqueles elementos! Impõe-se, assim, a conclusão de que a utilidade daquela consulta já foi preterida pela própria decisão de interposição do recurso. Isto é, a finalidade imediata do recurso – assegurar a defesa do recorrente em sede de recurso da medida de coacção que lhe foi aplicada – já se esgotou, pelo que não subsiste nenhuma razão válida que justifique a subida imediata do presente recurso – artigo 407º, n.º 2 e 3 do CPP.” Por despacho de 15 de Julho de 2003, o Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa decidiu indeferir a reclamação, fundamentando esta decisão nos seguintes termos:
“A questão a apreciar respeita ao momento da subida do recurso da decisão que indefere a passagem de certidão do processado que se alega ser imprescindível para a defesa do arguido e impugnação da decisão que impõe a medida de coacção da prisão preventiva. A matéria com interesse é a que resulta do que fica descrito. O momento da subida dos recursos em processo penal está regulado no art. 407º do CPP . O n.º 1 do art. 407º enumera ao longo de dez alíneas os casos em que o recurso sobe imediatamente. E o n.º 2 acrescenta que sobem também imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis. Uma vez que o Reclamante implicitamente aceita que a situação em apreço não está contemplada no n.º 1 do art. 407°, o cerne da questão está em saber se a retenção do recurso o torna absolutamente inútil. Assente na palavra absolutamente, no art. 734° n° 2 do Código de Processo Civil, disposição em tudo idêntica à do art. 407° n° 2 do CPP, a jurisprudência tem entendido correntemente que só a inutilidade absoluta, que não a relativa, releva para efeitos de subida imediata dos recursos. O recurso cuja retenção o torna absolutamente inútil é apenas aquele cuja decisão, ainda que favorável ao recorrente, já não lhe pode aproveitar, por não poder produzir quaisquer efeitos dentro do processo, mas não aquele cujo provimento implique a anulação de quaisquer actos, incluindo o do julgamento, por ser esse um risco próprio dos recursos com subida diferida. Em processo civil o exemplo clássico de agravo cuja retenção o tornaria absolutamente inútil é o interposto do despacho que suspende a instância. Se subisse diferidamente, o recurso só subiria quando tivesse cessado a suspensão da instância, e o despacho recorrido produziria um resultado irreversivelmente oposto ao pretendido com a interposição do recurso, pelo que este já não poderia aproveitar ao recorrente, ainda que a decisão lhe fosse favorável. A subida diferida do recurso do despacho que indefere a certidão de parte do processo que o requerente considera imprescindível para a sua defesa e para o recurso da decisão que decretou a prisão preventiva pode aproveitar ao recorrente, se o recurso for provido, maxime se ainda subsistir a medida de prisão preventiva. Na verdade, o eventual provimento do recurso determina a anulação de todo o processado posterior ao despacho recorrido, julgamento inclusive, voltando tudo ao início, o que implica a passagem da pretendida certidão. A subida diferida permitiu todo o processado posterior, que a final, se revelou inútil, mas isso é o risco de todos os recursos com subida diferida. O que releva para a subida imediata, é que a retenção produza um resultado irreversivelmente oposto ao efeito jurídico pretendido com a interposição do recurso e, no caso, isso não acontece. Os preceitos constitucionais invocados não impõem a subida imediata dos recursos de decisões interlocutórias. A Constituição e a Convenção Europeia podem ser observadas à risca e, não obstante isso, os recursos que não visam directamente a decisão final, subirem só com o recurso interposto desta. E o art. 20º, n.º 4 da Constituição, ao impor a decisão da causa em prazo razoável supõe a existência de uma causa e, no caso, sendo a causa o próprio recurso retido, só pode falar-se de causa quando o recurso subir. Quer dizer, a decisão em prazo razoável é questão a considerar apenas aquando da subida do recurso. De resto, o art. 20º n.º 4 fornece precisamente o argumento contrário. Como se pode ler na obra do Prof. Alberto dos Reis, o regime de subida diferida dos recursos destina-se a dar satisfação ao princípio da celeridade. Escreveu este Autor (in ‘Código de Processo Civil Anotado’, 1953, Vol. VI, pág. 98): … ‘Uma das formas de chicana mais empregada no regime da subida imediata dos agravos era a de recorrer sistematicamente de todos os despachos proferidos no curso do processo. Tivesse ou não razão, fosse ilegal ou legal o despacho do juiz, a parte agravava, única e simplesmente para moer e cansar o seu adversário’… . Por estas razões mutatis mutandis, o legislador, querendo a celeridade processual, actualmente erigida em norma constitucional, optou por um sistema de subida diferida dos recursos, ainda que mitigado com a previsão dos recursos com subida imediata. Portanto, a retenção do recurso interposto da decisão que indefere a certidão de parte do processo requerida com o fundamento de a mesma ser imprescindível para a defesa do arguido e para a interposição do recurso da decisão que impôs a medida de coacção de prisão preventiva, não o torna absolutamente inútil e, assim, o recurso sobe diferidamente, como bem se decidiu.”
3.Inconformado com esta decisão, veio o arguido interpor o presente recurso de constitucionalidade, ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º
28/82, de 15 de Novembro, para apreciação da constitucionalidade
“do artigo 407º, n.º 2, do CP Penal, quando a leitura hermenêutica proposta de tal preceito legal leve a que suba com o recurso interposto da decisão final, aquele interposto de uma decisão que denega ao arguido o acesso aos elementos que lhe dizem respeito e que consubstanciarão os fortes indícios legitimadores da aplicação da prisão preventiva”. Invocou violação dos
“direitos consagrados na CRP nos artigos 32/1 e 20/4, quando lidos à luz da principiologia imanente ao artigo 18/2 do mesmo diploma e, ainda, a disposição constante do n.º 1 do art. 6º da Convenção Europeia.” O recorrente concluiu as suas alegações nos seguintes termos:
“B1: A moderna concepção do direito processual penal, segundo a qual este constitui ‘direito constitucional aplicado’ tem de conduzir à rejeição de qualquer concepção de ‘civil processualização’ do processo penal, mormente para o que aqui agora está em questão, em matéria de recursos. Ora, B2: é sabido que, de acordo com entendimento pacífico, a violação ao nível do direito legislado ou da aplicação dele, de comandos de matriz constitucional, atinentes aos direitos, liberdades e garantias pessoais – como tal, directamente aplicáveis, nos termos do art. 18º, n.º 1 da Constituição – configura mera ‘irregularidade’ processual. Por isso, B3: uma primeira forma de exprobração ou correcção de tal írrito entendimento, constitui, justamente, a interpretação do disposto no n.º 2 do art. 407º do Código de Processo Penal como coenvolvendo uma cláusula geral de segurança do sistema e, nesta medida, impondo a respectiva compreensão como abrangendo, no mínimo, as decisões que possam conflituar com tais direitos constitucionalmente consagrados. Por outro lado, B4: a não consideração deste entendimento, faz com que o processo penal não assegure todas as garantias de defesa, em violação do disposto no n.º 1 do artigo 32º da Constituição da República, designadamente no que toca aos pontos cruciais do mesmo, ou seja, as normas constitucionais directamente aplicáveis. E mais: B5: nos termos do artigo 20º, n.º 5 da norma normarum, a interpretação que se preconiza é a única que permite afirmar que o direito legislado consagrou, para a defesa dos direitos, liberdades e garantias pessoais, um procedimento judicial ainda assim caracterizado pela celeridade e prioridade e que, desta forma permite obter tutela efectiva e em tempo útil para os citados direitos. Com efeito, a interpretação corrente, consagrada na decisão recorrida e confirmada em sede de ‘reclamação’, para além de ser determinada por estiolante concepção meramente verbal, não responde às necessidades práticas com cobertura constitucional, pois o julgamento, a final, de um recurso que verse sobre a violação de um de tais comandos, torna o disposto no n.º 2 do artigo 407º do Código de Processo Penal, isso sim, a todas as luzes e em especial face ao disposto nos artigos 32º, n.º 1 e 20º, n.º 5 da Constituição da República, norma
‘absolutamente inútil’.” O Ministério Público, através do Ex.mº Procurador-Geral Adjunto em funções neste Tribunal, alegou igualmente no sentido da inconstitucionalidade da norma impugnada, concluindo as suas alegações da seguinte forma:
“1º – O direito ao recurso, ínsito no princípio das garantias de defesa, está constitucionalmente consagrado quanto às decisões condenatórias e às respeitantes à situação do arguido face à privação ou restrição de liberdade, incluindo, não apenas as decisões que apliquem directamente medidas de coacção, mas também as que, de um ponto de vista instrumental, incidam sobre matérias ou questões que possam relevar para a fundamentação pelo recorrente da impugnação deduzida contra a decisão que lhe aplicou a medida de prisão preventiva.
2º – A garantia de tal direito ao recurso envolve a sua apreciação tempestiva pelo tribunal superior, em termos de os efeitos de uma hipotética procedência da impugnação deduzida poderem ainda aproveitar ao arguido-recorrente.
3º – Pretendendo o arguido impugnar a decisão proferida sobre requerimento em que solicitava o acesso aos autos de inquérito, com fundamento na necessidade de obter elementos fácticos e probatórios que permitam sustentar adequadamente a impugnação deduzida quanto à decisão que lhe aplicou a medida de coacção de prisão preventiva, carece de utilidade e efeito prático a dirimição de tal questão apenas no momento em que, no termo do processo, venha a ser proferida e impugnada a decisão condenatória.
4º – Na verdade, nesse momento processual, carece de sentido e utilidade dirimir a questão do acesso a elementos probatórios que – com o termo do inquérito – há muito se tornaram acessíveis ao arguido e estão consumidos pela valoração da prova produzida em audiência.
5º – Sendo certo que uma eventual anulação de todo o processado, consequente ao hipotético provimento do recurso interlocutório retido, não é susceptível de remover adequadamente a pretensa lesão de direitos e o dano decorrente da privação da liberdade sofrida, em termos irremediáveis, pelo arguido recorrente.
6º – Termos em que deverá proceder o presente recurso, em consonância com a inconstitucionalidade material da interpretação normativa realizada pela decisão recorrida.” Importa apreciar e decidir. II. Fundamentos
4.O presente recurso de constitucionalidade tem por objecto a apreciação da conformidade constitucional da norma do artigo 407º, n.º 2, do Código de Processo Penal, na interpretação de que apenas sobe “com o recurso interposto da decisão final, aquele interposto de uma decisão que denega ao arguido o acesso aos elementos que lhe dizem respeito”, acesso, este, requerido com vista a impugnar a verificação dos pressupostos legitimadores da aplicação da prisão preventiva. Preceitua o artigo 407º daquele Código:
“Artigo 407.º
(Momento da subida)
1 – Sobem imediatamente os recursos interpostos: a) De decisões que ponham termo à causa; b) De decisões posteriores às referidas na alínea anterior; c) De decisões que apliquem ou mantenham medidas de coacção ou de garantia patrimonial, nos termos deste Código; d) De decisões que condenem no pagamento de quaisquer importâncias, nos termos deste Código; e) De despacho em que o juiz não reconhecer impedimento contra si deduzido; f) De despacho que recusar ao Ministério Público legitimidade para a prossecução do processo; g) De despacho que não admitir a constituição de assistente ou a intervenção de parte civil; h) De despacho que indeferir o requerimento para a abertura de instrução; i) Da decisão instrutória, sem prejuízo do disposto no artigo 310.º; j) De despacho que indeferir requerimento de submissão de arguido suspeito de anomalia mental à perícia respectiva.
2 – Sobem ainda imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis.
3 – Quando não deverem subir imediatamente, os recursos sobem e são instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo
à causa.” Apesar de, como resulta imediatamente da leitura deste preceito, apenas dos seus n.ºs 1 e 2, conjuntamente, decorrer a previsão dos recursos que devem subir imediatamente, no presente caso não está em questão aquele n.º 1, que enuncia os recursos que sobem imediatamente, e que é completado pela fórmula geral do n.º
2. No presente contexto não releva, pois, o argumento, aduzido pelo Ministério Público junto do Tribunal recorrido, da taxatividade do artigo 407º, n.º 1, para contrariar a aplicação ao caso dos autos do artigo 407º, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Penal, pois não está nele em causa um recurso de decisão que tenha aplicado ou mantido a medida de coacção. Nem, inversamente, é decisiva, no plano da questão de constitucionalidade que cumpre decidir, a argumentação que, assumindo uma “perspectiva funcional ou teleológica”, sustenta ainda o enquadramento da hipótese dos autos – recurso de decisão que indeferiu o pedido de acesso a elementos com vista a impugnar a prisão preventiva – na citada alínea c) do n.º 1 do artigo 407º (perspectiva sustentada pelo recorrente e mencionada pelo Ministério Público nas alegações que produziu no Tribunal Constitucional, “atenta a evidente conexão entre a problemática do acesso aos autos e a impugnação da decisão impositiva da medida de coacção”). Na verdade, apenas vem impugnado no requerimento de interposição de recurso o referido n.º 2 do artigo 407º, numa certa interpretação da sua hipótese – isto
é, na parte em que se refere aos “recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis”, interpretada no sentido de não incluir o recurso em causa. Por outro lado, também foi apenas esta a interpretação aplicada, como ratio decidendi, pelo Tribunal recorrido, segundo o qual, efectivamente, “o cerne da questão está em saber se a retenção do recurso o torna absolutamente inútil”. E foi também apenas esta a norma cuja inconstitucionalidade foi suscitada perante o Tribunal da Relação de Lisboa. Verificam-se, pois, os requisitos específicos do recurso, que foi interposto ao abrigo do artigo 70º, n.º 1, alínea b) da Lei de Organização, Funcionamento e Processo no Tribunal Constitucional.
5.Importa ainda, porém, fazer uma referência à utilidade do presente recurso de constitucionalidade, apesar de tal questão prévia não ter sido suscitada no Tribunal Constitucional.
É que o recorrido, na sua resposta à reclamação deduzida para o Tribunal da Relação de Lisboa (na sequência, aliás, da defesa de inexistência de prejudicialidade em relação ao recurso da decisão que aplicou a medida de coacção, contida na decisão de 1ª instância), sustentou que o recurso havia perdido utilidade,
“no momento em que o Recorrente, mesmo sem estar na posse dos elementos cujo conhecimento, ab initio, reputou essenciais para o efeito, interpôs um recurso através do qual contestou os fundamentos subjacentes à decisão judicial que aplicou a medida de coacção de prisão preventiva.” Na verdade, em 3 de Junho deste ano, o recorrente apresentou a motivação do seu recurso do despacho que ordenou a sua prisão preventiva, e apenas dois dias depois, em 5 de Junho, veio interpor recurso do despacho “que lhe denegou o fornecimento de cópia de certas peças processuais cujo impetrou para poder fazer cabal uso do seu direito ao recurso do despacho que determinou a respectiva sujeição a prisão preventiva.” Logo neste segundo requerimento de recurso afirmou, porém, que este
“não tem sentido se julgado independentemente do outro, por, em boa verdade, constituir, em grande parte, embora não na totalidade, pressuposto lógico do primeiro.” (sublinhado no original) Isto, sendo certo, por outro lado, que o recurso do despacho que determinou a prisão preventiva do ora recorrente se fundamentava, além do mais, na falta de explicitação das razões de facto ou dos meios de prova que consubstanciam os
“fortes indícios” legitimadores daquela medida de coacção. Afigura-se, pois, que não pode concluir-se da interposição do recurso do despacho que aplicou a prisão preventiva qualquer renúncia, pelo recorrente, ao seu requerimento para passagem de certidão das peças processuais do inquérito, consideradas indispensáveis para fundamentar essa impugnação. Antes o arguido teve o cuidado de prevenir expressamente esse sentido, no recurso do despacho que indeferiu aquele requerimento, e, por outro lado, fundamentou o recurso do despacho que ordenou a prisão preventiva também na falta de conhecimento dos
“fortes indícios” legitimadores da prisão preventiva. Como se disse, o Ministério Público no Tribunal Constitucional não suscitou, aliás, qualquer questão prévia relativa à utilidade do recurso de constitucionalidade. E este recurso não perdeu utilidade, pois, caso deva merecer provimento, o recurso do despacho que indeferiu a certidão de peças processuais não poderá vir a ser apreciado só a final, e este, a ser igualmente provido, poderá ter consequências sobre o recurso do despacho que aplicou a prisão preventiva – por o primeiro ser instrumental (pelo menos em parte) em relação a este. Importa, pois, tomar conhecimento do recurso, apreciando a constitucionalidade da norma do artigo 407º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de apenas dever subir com o interposto da decisão final o recurso interposto de decisão que indeferiu o pedido de acesso a elementos contidos nos autos com vista a impugnar a decisão que aplicou ao recorrente a medida de coacção de prisão preventiva.
6.Recorrente e recorrido confrontaram a presente norma com a garantia constitucional de “procedimentos judiciais caracterizados pela celeridade e prioridade, de modo a obter tutela efectiva e em tempo útil”, consagrada no artigo 20º, n.º 5 da Constituição da República, e com o direito ao recurso, consagrado como garantia de defesa no processo criminal no artigo 32º, n.º 1, da Constituição. O direito ao recurso em matéria penal está, na verdade, consagrado no artigo
32º, n.º 1, da Constituição, expressamente desde a IV revisão constitucional, mas sendo já antes considerado pela jurisprudência como garantia constitucional de defesa – v., por exemplo, os Acórdãos n.ºs 202/86 (in Diário da República
[DR], II Série, de 26 de Agosto de 1986), 8/87 (in Acórdãos do Tribunal Constitucional, 9º vol., págs. 229 e segs.), e 31/87 (in DR, II Série, de 1 de Abril de 1987). Por outro lado, tal direito ao recurso, ínsito no princípio das garantias de defesa, inclui as decisões respeitantes à situação do arguido face
à privação ou restrição de liberdade, incluindo as decisões que apliquem a prisão preventiva e as que sejam instrumentais desta aplicação. Tal direito ao recurso, conjugado com a garantia de uma tutela judicial efectiva e em tempo útil, consagrado no citado artigo 20º, n.º 5, não pode deixar de envolver a apreciação tempestiva do recurso pelo tribunal superior, de tal forma que os efeitos de uma hipotética procedência da impugnação deduzida possam ainda aproveitar ao arguido. E, nessa medida, o exercício do direito ao recurso, conjuntamente com o direito a tutela judicial em tempo útil, pode ser inviabilizado pelo regime de apreciação do recurso pelo tribunal superior – devendo obviamente ser rejeitado, pela sua circularidade, um argumento de que só existiria “causa” ou “procedimento”, para o efeito dos n.ºs 4 ou 5 do artigo
20º, quando o recurso viesse a subir, pelo que o artigo 20º, n.ºs 4 e 5 não poderia constituir parâmetro de apreciação do regime de subida dos recursos.
7.A norma em apreço dispõe que “sobem ainda imediatamente os recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis”, sendo que os recursos que não forem daqueles que, nos termos dos n.ºs 1 e 2 deste artigo 407º, devem subir e ser apreciados imediatamente, apenas “sobem e são instruídos e julgados conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa”
(n.º 3 do mesmo artigo). A subida e apreciação do recurso é, pois, diferida então para um momento posterior à decisão da causa, posterior ao julgamento. E não se prevê, assim, no processo penal qualquer regime de subida diferida anteriormente ao recurso da decisão final, como acontece em processo civil, para o recurso de agravo – cf. o artigo 735º, n.º 1, do Código de Processo Civil, onde se prevê que os agravos não incluídos no artigo 734º “sobem com o primeiro recurso que, depois de eles serem interpostos, haja de subir imediatamente” (e cf. ainda, para os agravos nos procedimentos cautelares, o regime do artigo 738º do mesmo diploma). O Tribunal Constitucional já apreciou, por mais de uma vez, a constitucionalidade do artigo 407º, nº 2, do Código de Processo Penal, embora nunca na interpretação – ou relativamente ao tipo de recurso – ora em questão. Assim, aquele preceito não foi julgado inconstitucional, designadamente, na interpretação segundo a qual não inclui, como “recursos cuja retenção os tornaria absolutamente inúteis”, os interpostos dos despachos que indeferem diligências probatórias na fase de instrução: Acórdãos n.ºs 474/94 (DR, II Série, de 8 de Novembro de 1994), 964/96 (DR, II Série, de 23 de Dezembro de
1996), 104/98 (DR, II Série, de 20 de Março de 1998), 68/2000 (DR, II Série, de
4 de Outubro de 2000) e Acórdão n.º 103/2002 (inédito), invocando-se, em vários destes arestos (tirados, alguns, com votos de vencido), que a Constituição não estabelece “qualquer direito dos cidadãos a não serem submetidos a julgamento, sem que previamente tenha havido uma completa e exaustiva verificação de existência de razões que indiciem a sua presumível condenação”. Também não foi julgada inconstitucional a exclusão do regime de subida imediata do recurso do despacho que se absteve de apreciar o pedido de restituição de veículo automóvel apreendido nos autos (Acórdão n.º 244/97, inédito), do recurso atinente a questões prévias suscitadas relativamente ao despacho de pronúncia
(Acórdãos n.ºs 46/2001 e n.º 350/2002, inéditos), do recurso do indeferimento da arguição de nulidade de uma diligência de busca (Acórdão n.º 1205/96, in DR, II Série, de 14 de Fevereiro de 1997), e do recurso em que se questiona a validade do acto de notificação edital da acusação à arguida (Acórdão n.º 551/98, inédito). Neste último aresto, por exemplo, pode ler-se que
“(…) a lei processual penal, ao fazer subir imediatamente apenas os recursos cuja utilidade se perderia em absoluto no caso de a subida ser diferida, tutela a celeridade processual e impede que a tramitação normal do processo seja afectada por sucessivos envios ao tribunal recorrido para apreciação de decisões interlocutórias, do mesmo passo evitando que muitos desses recursos fiquem prejudicados no seu conhecimento face ao sentido da decisão final. Pese, embora, o provimento do recurso poder levar à inutilização dos actos processuais que estejam na dependência do acto ou despacho recorrido. Por outro lado, a ponderação subjacente a cada caso concreto deve atentar ‘se o regime de subida diferida que [se] atribui ao recurso ainda está nos limites da subsistência da afirmação da prova ou se, pelo contrário, o diferimento do controlo em via de recurso de apreciação da prova corresponde à negação da subsistência da mesma prova’ (cfr. Acórdão nº 954/96, publicado no citado jornal oficial, II Série, de 23 de Dezembro de 1996). No caso sub judice, o diferimento da subida não afecta a iniciativa processual da recorrente, que, no caso de eventual procedência, dela aproveitará, a implicar a anulação da notificação edital e dos subsequentes actos processuais
(quando muito ficará defraudado o objectivo de celeridade que a decisão recorrida se propôs alcançar). O núcleo essencial do direito de defesa, com expressão no direito de recorrer, cujo exercício, no caso, é apenas diferido para final, mantém-se intocado, não impedindo a recorrente de ver a sua posição analisada e decidida jurisdicionalmente. Observar-se-á não ter sido possível, à interessada, ao validar-se a notificação da acusação, exercer o direito, que lhe assiste, de requerer instrução, o que consubstanciaria uma forma de não assegurar, de modo efectivo, as garantias de defesa constitucionalmente exigidas.” Independentemente da questão de saber se a orientação de todas as citadas decisões merece ser reiterada – tendo algumas delas sido tiradas com votos de vencido –, pode dizer-se que nelas foi determinante o entendimento de que o interesse do recorrente podia ainda vir a obter certa tutela mediante a
(eventual) anulação posterior do processado, na sequência da apreciação do recurso cuja apreciação se difere (cf. ainda, para o recurso de decisão que indefira o pedido de extinção do procedimento criminal com fundamento na prescrição, o Acórdão n.º 435/2000). Como salienta o Ministério Público nas alegações que produziu neste Tribunal, não resulta certamente desta jurisprudência constitucional que uma interpretação excessivamente “restritiva do conceito de ‘recurso cuja retenção o torne inútil’
” não possa, “em determinadas circunstâncias, implicar violação do princípio das garantias de defesa – nomeadamente, quando a anulação consequente ao provimento do recurso retido e a ‘destruição’ (estritamente ‘jurídico-processual’) dos actos subsequentemente praticados for manifestamente insusceptível de satisfazer o interesse do recorrente.” Importa apreciar se é isto o que se verifica no caso presente, quanto à subida e julgamento, apenas “conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa” (citado artigo 407º, n.º 3 do Código de Processo Penal), do recurso interposto de decisão que indeferiu a passagem de peças dos autos para impugnar a decisão que aplicou ao recorrente a medida de coacção de prisão preventiva.
8.O primeiro aspecto que ressalta da aplicação da norma em questão ao processo penal – evidenciado igualmente pelo Ministério Público no Tribunal Constitucional – é que, dado o diferimento da subida e apreciação do recurso em questão apenas para um momento posterior ao da acusação e do julgamento, a sua apreciação não poderá já revestir-se de qualquer sentido útil para o processo. Na verdade, está em causa um recurso de uma decisão pela qual se negou o acesso a determinados elementos constantes dos autos, para impugnação da prisão preventiva. Ora, nesse momento posterior ao julgamento tais elementos probatórios já há muito se tornaram acessíveis ao arguido e ficaram, mesmo, consumidos pela prova produzida em audiência. A dirimição da questão discutida neste recurso apenas no momento em que, no final do processo, é proferida e impugnada a decisão condenatória carece, pois, de sentido e utilidade. E bem pode dizer-se, assim, que a norma em apreço, ao impor a apreciação do presente recurso apenas após o julgamento, quando os elementos em questão são já conhecidos, vai retirar o sentido à decisão do recurso e impedir a sua apreciação em tempo útil.
9.Para além da circunstância mencionada no número anterior – que se situa ainda no estrito plano da utilidade para fins do processo – importa, porém, atentar em que a dimensão normativa em causa assenta num conceito de utilidade estritamente jurídico-processual: o recurso abrangido pelo artigo 407º, n.º 2 do Código de Processo Penal seria “apenas aquele cuja decisão, ainda que favorável ao recorrente, já não lhe pode aproveitar, por não poder produzir quaisquer efeitos dentro do processo, mas não aquele cujo provimento implique a anulação de quaisquer actos, incluindo o do julgamento, por esse ser um risco próprio dos recursos com subida diferida.” A anulação de todo o processado posterior seria
“o risco de todos os recursos com subida diferida”, e o “que releva para a subida imediata, é que a retenção produza um resultado irreversivelmente oposto ao efeito jurídico pretendido com a interposição do recurso e, no caso, isso não acontece.” A referência, na interpretação normativa em crise, à absoluta inutilidade da retenção do recurso não pode, porém, bastar-se com tal noção de utilidade estritamente processual, designadamente, quando está em causa a impugnação de uma decisão que aplicou ao recorrente uma medida de coacção de prisão preventiva. Pelo menos nesses casos, a “absoluta inutilidade” a que se refere a norma há-de aferir-se também pela circunstância de esse interesse do recorrente poder ainda vir a obter tutela mediante a apreciação do recurso – e, portanto, pela susceptibilidade de a anulação resultante do provimento do recurso retido, com a
“eliminação” jurídico-processual dos actos subsequentemente praticados, satisfazer ainda o interesse do recorrente. Pois é tal noção de utilidade não estritamente processual, mas antes relativa à possibilidade de satisfação do fim visado com o recurso, aquela que dá conta da circunstância de o processo se não dever limitar a servir interesses que ele próprio cria, como “fim em si mesmo”, mas antes de pessoas e entidades que lhe são externos. Ora, é claro que, quanto ao recurso em causa, nem sequer a eventual anulação de todo o processado, decorrente de um hipotético provimento do recurso retido, é susceptível de “apagar” de forma adequada a privação da liberdade sofrida, em termos irremediáveis, pelo arguido, devido à medida de coacção de prisão preventiva, que quis impugnar por via de recurso, para isso justamente pretendendo obter elementos com o recurso retido. Também sob este prisma se revela, pois, que o eventual provimento do recurso a final é insusceptível de aproveitar ao recorrente, cuja situação de prisão preventiva, contra a qual pretendeu reagir, não pode, naturalmente, ser
“apagada” com a anulação do processo. E também por aqui se evidencia a lesão do direito ao recurso, devido à sua falta de apreciação em tempo útil.
10.A subida e apreciação do recurso em questão apenas “conjuntamente com o recurso interposto da decisão que tiver posto termo à causa” não podem, por fim, sequer justificar-se com argumentos, por vezes aduzidos, baseados na necessária celeridade processual, considerada igualmente um valor constitucional. Independentemente da questão da valia de tal argumento em confronto com as garantias de defesa de que o direito ao recurso é expressão, é certo que existem formas alternativas de dar satisfação ao princípio da celeridade, permitindo ainda ao arguido obter tutela efectiva e em tempo útil para os seus direitos. Assim, mesmo para quem atribua relevância decisiva àquele valor, basta recordar
– como fez o Ministério Público nas suas alegações neste Tribunal – que a sua realização pode ser abalada sobretudo se “os recursos interlocutórios, interpostos de decisões atinentes ou incidentes sobre medidas de coacção privativas da liberdade, devessem subir imediatamente e nos próprios autos, paralisando o normal prosseguimento do inquérito”. Mas já o não será se ao recurso for atribuído um efeito meramente devolutivo e com um regime de subida em separado (como é o caso – cfr. os artigos 406º e 408º do Código de Processo Penal). O diferimento da subida e apreciação do recurso resultante da norma em questão não é, pois, sequer justificado com o interesse na celeridade processual, subindo o recurso em separado e com efeito meramente devolutivo.
11.Pode, pois, concluir-se, não só que a norma em apreço, ao impor a subida do presente recurso apenas a final, após o julgamento, retiraria o sentido à sua decisão (pois os elementos em questão já terão nesse momento de ser conhecidos pelo recorrente), como que tal apreciação e eventual provimento do recurso seriam então insusceptíveis de aproveitar ao recorrente, cuja situação de prisão preventiva, contra a qual pretendeu reagir, não é eliminada com a anulação do processo. E, ainda, que um tal diferimento da subida e apreciação do recurso não
é sequer justificado com o interesse na celeridade processual, pois a circunstância de um recurso subir imediatamente não impede que suba em separado e com efeito meramente devolutivo. A norma em questão lesa, pois, sem justificação bastante, o direito ao recurso, ao impossibilitar a sua apreciação em tempo útil, e viola os direitos garantidos pelo artigos 32º, n.º 1 e 20º, n.º 5 da Constituição. E, por conseguinte, o presente recurso de constitucionalidade merece provimento, devendo a decisão recorrida ser reformada em consonância com este juízo de inconstitucionalidade – isto é, de tal forma que o recurso interposto pelo arguido não suba apenas com o interposto da decisão final. III. Decisão Pelos fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional decide: a) Julgar inconstitucional, por violação dos artigos 32º, n.º 1 e 20º, n.º 5 da Constituição da República, a norma do artigo 407º, n.º 2, do Código de Processo Penal, interpretada no sentido de apenas dever subir com o interposto da decisão final o recurso interposto de decisão que indeferiu o pedido de acesso a elementos contidos nos autos com vista a impugnar a decisão que aplicou ao recorrente a medida de coacção de prisão preventiva; b) Em consequência, conceder provimento ao recurso e determinar a reforma da decisão recorrida em conformidade com o presente juízo de inconstitucionalidade.
Lisboa, 24 de Setembro de 2003 Paulo Mota Pinto Maria Fernanda Palma Mário José de Araújo Torres Benjamim Rodrigues Rui Manuel Moura Ramos