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Proc. n.º 40/03
1ª Secção Relatora: Maria Helena Brito
Acordam na 1ª Secção do Tribunal Constitucional:
I
1. Por acórdão de fls. 213 e seguintes, o Tribunal Constitucional decidiu negar provimento ao recurso que havia sido interposto por A..
Notificado deste acórdão, vem agora o recorrente pedir a sua aclaração (fls. 237 e seguintes), sustentando, em síntese, o seguinte:
a) “[...] a decisão em causa não refere concretamente se o art. 82º do EMJ
[trata-se do Estatuto dos Magistrados Judiciais, aprovado pela Lei n.º 21/85, de
30 de Julho], interpretado no sentido de que a divulgação pública de pensamentos e opiniões por Magistrados constitui infracção disciplinar, colide ou não com o art. 37º da CRP”, tendo-se limitado a “considerar que o disposto no art. 37º da Constituição da República Portuguesa não proíbe a imposição de sanções disciplinares em casos de abuso ou exercício ilegítimo do direito à livre expressão e divulgação do pensamento”; b) “Não resulta [...] claro do acórdão recorrido como é que, não tipificando o art. 82º do EMJ qualquer acto ou facto concreto, se pode entender que o preceito contém um grau de precisão tal que permite identificar o tipo de comportamentos a que ele pode aplicar-se”, atendendo a que “há que distinguir entre a existência de uma sanção disciplinar e os critérios ou juízos que podem fundamentar a medida da pena, depois de apurada e comprovada a infracção” e considerando que a doutrina e jurisprudência constitucionais espanholas não têm admitido definições de infracções disciplinares com o recurso a cláusulas vagas e conceitos indeterminados, como é o caso de “actos desonrosos”, “falta de idoneidade moral”, “ética e dignidade profissionais” ou “falta de probidade moral ou material”.
2. Notificado para responder ao pedido de aclaração, o Conselho Superior da Magistratura entendeu nada haver a aclarar (fls. 245 e seguintes).
Cumpre apreciar.
II
3. Diversamente do sustentado pelo recorrente [supra, 1., a)], o acórdão cuja aclaração é pedida pronunciou-se inequivocamente, e em concreto, sobre a questão de saber se era inconstitucional a norma do artigo 82º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, na interpretação segundo a qual “a divulgação pública de pensamentos e opiniões por Magistrados constitui infracção disciplinar”, não se tendo limitado a tratar da admissibilidade, em abstracto, da imposição de sanções disciplinares em casos de abuso ou exercício ilegítimo do direito à livre expressão e divulgação do pensamento.
Na verdade, diz-se nesse acórdão que “está agora em causa a instauração de um processo disciplinar que se fundamenta em declarações proferidas – e nos termos em que o foram – a propósito da solução consagrada no actual artigo 217º da Constituição quanto ao exercício do poder disciplinar relativamente aos magistrados judiciais através de um órgão autónomo (o Conselho Superior da Magistratura)”.
Em consequência, à questão que havia sido colocada pelo recorrente, o Tribunal Constitucional respondeu negativamente, atendendo ao teor das declarações que por si haviam sido proferidas.
Nada há, portanto, a aclarar quanto a este ponto.
4. É igualmente manifesto que não se verifica a segunda ambiguidade alegada pelo recorrente [supra, 1., b)].
Com efeito, no acórdão cuja aclaração se pede explica-se de modo inequívoco (contrariamente ao sustentado pelo recorrente) por que razão o artigo
82º do Estatuto dos Magistrados Judiciais, não tipificando embora qualquer acto ou facto concreto, contém um grau de precisão tal que permite identificar o tipo de comportamentos a que pode aplicar-se. Afirma-se no acórdão que: “o artigo 82º do Estatuto dos Magistrados Judiciais só considera relevantes os actos e omissões da vida pública ou que se repercutam na vida pública do magistrado (de fora ficando, portanto, tudo o que não extravase a vida privada do magistrado) e que, ao mesmo tempo, afectem a imagem digna que a magistratura deve ter”. E reitera-se mais adiante: “Trata-se apenas de factos relacionados com a vida pública do magistrado e que colidem com a imagem de dignidade associada à magistratura”.
Que o recorrente não concorde com a fundamentação seguida no acórdão
é algo que, evidentemente, nada influi na clareza da mesma. Por isso, as referências por si feitas à doutrina e jurisprudência espanholas, bem como à necessidade de distinguir entre a existência de uma sanção disciplinar e os critérios ou juízos que podem fundamentar a medida da pena, não relevam para a decisão do presente pedido de aclaração.
Conclui-se, assim, que também quanto a este segundo ponto nada há a aclarar.
III
5. Nestes termos, e pelos fundamentos expostos, indefere-se o pedido de aclaração do acórdão de fls. 213 e seguintes.
Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em doze (12) unidades de conta.
Lisboa, 28 de Outubro de 2003
Maria Helena Brito Carlos Pamplona de Oliveira Rui Manuel Moura Ramos Artur Maurício Luís Nunes de Almeida