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Procº nº 815/2002.
3ª Secção. Relator:- BRAVO SERRA.
1. Por sentença proferida em 3 de Maio de 2000 pelo Juiz do 4º Juízo Cível do Tribunal de comarca do Porto foi deferida a providência de arresto solicitada pela requerente A, contra a requerida B, consequentemente ordenando-se o arresto imediato dos recheios existentes nas habitações correspondentes ao 1º andar, esquerdo, do prédio nº 57 da Rua Cooperativa Piedense, na Cova da Piedade, concelho de Almada, e ao nº 35 da Rua Monte da Luz, no Porto.
Após a apresentação de oposição pela requerida, e após, em 15 de Setembro de 2000, ser proferido despacho que, declarando incompetente o Tribunal Cível do Porto, julgou competente o Tribunal de comarca de Almada, para aí sendo determinada a remessa dos autos, veio, em 17 de Maio de 2001, a ser proferida sentença pelo Juiz do 3º Juízo Cível deste último órgão de administração de justiça, sentença essa na qual se julgou válida a desistência da instância peticionada pela requerente.
Não se conformando com o assim decidido recorreu para o Tribunal da Relação de Lisboa a A, sendo que, na alegação adrede produzida, a impugnante não suscitou, de todo em todo, qualquer questão de inconstitucionalidade, designadamente reportada a norma ou normas constantes do ordenamento jurídico infra-constitucional.
Tendo aquele Tribunal de 2ª instância, por acórdão de 18 de Dezembro de 2001, negado provimento ao agravo, de tal aresto veio a agravante requerer a respectiva aclaração (não tendo, igualmente, no respectivo pedido, suscitado qualquer questão de inconstitucionalidade, mormente normativa), pretensão que foi indeferida por acórdão de 18 de Abril de 2002.
Deste último acórdão recorreu a agravante para o Supremo Tribunal de Justiça, o que fez por intermédio de requerimento apresentado em 2 de Maio de
2002, recurso que, por despacho lavrado em 9 de Maio do mesmo ano, não foi admitido, dados os valores da causa - Esc. 1.100.000$00 - e da alçada dos tribunais da relação.
Em 23 dos mesmos mês e ano, a agravante fez juntar aos autos requerimento, dirigido ao Presidente do Tribunal da Relação de Lisboa, onde disse:-
'A Requerente nos autos [à] margem identificados, vem mui respeitosamente reclamar da não admissão do recurso e esclarecer o seguinte: O recurso, como é óbvio foi interposto para o Tribunal Constitucional. Na verdade, o recurso deve ser admitido para o Tribunal Constitucional, até por se terem levantado questões de Constitucionalidade. Defraudando-se a intenção do recurso'.
A Desembargadora Relatora do Tribunal da Relação de Lisboa, por despacho de 11 de Junho de 2002, indeferiu o solicitado, para tanto tendo dito, de um lado, que 'a reclamação da não admissão do recurso, neste caso concreto, não compete ao Presidente do Tribunal da Relação' e, de outro, que não era possível admitir-se o recurso interposto para o Tribunal Constitucional, porque não estavam 'suscitadas quaisquer questões relativas a constitucionalidade ou inconstitucionalidade'.
Notificada deste despacho, a agravante fez juntar aos autos requerimento, dirigido ao 'Juiz Desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa', no qual manifestava, e tão só, a sua intenção de do mesmo interpor recurso para o Tribunal Constitucional.
Em 27 de Junho de 2002 a Desembargadora Relatora do Tribunal da Relação de Lisboa exarou o seguinte despacho:-
'A requerente veio interpor recurso do despacho de fls. 193, que lhe não admitiu o recurso que interpôs para o Tribunal Constitucional.
Ora, mesmo sendo para o Tribunal Constitucional, do despacho que não admitiu o recurso, reclama-se como dispõe o artº 688º, nº 1, do C.P. Civil.
Não obstante, é possível fazer-se seguir os termos próprios da reclamação por força do preceituado no nº 5 do artº 688º do citado preceito legal.
Assim, desentranhe-se o requerimento de fls. 194 e com cópia deste despacho, autue-se o mesmo como reclamação'.
Os presentes autos vieram a ser remetidos ao Tribunal Constitucional em 16 de Dezembro de 2002.
Ouvido sobre a reclamação, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto em funções junto deste Tribunal pronunciou-se no sentido de a mesma ser verdadeiramente ininteligível.
Cumpre decidir.
2. Admitindo que às reclamações a que alude o artº 77º da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, é aplicável o disposto no nº 5 do artº 688º do Código de Processo Civil curar-se-á, desde já, na sequência desse raciocínio hipotético, da reclamação do despacho de 27 de Junho de 2002 que não admitiu o recurso para ele intentado interpor.
Ora, independentemente de o requerimento que veio a ser entendido como consubstanciando uma reclamação (prevista no aludido artº 77º da Lei nº
28/85) não conter minimamente qualquer indicação das razões que estribam a divergência com o despacho não admissor do recurso e de o mesmo nem sequer vir dirigido a este Tribunal, o que é certo é que, como deflui do relato supra efectuado, a pretendida impugnação não tem a mínima razão de ser.
Na verdade, nenhuma das formas de recurso previstas no nº 1 do artº
70º da indicada Lei se nos depara como aplicável ao caso sub iudicio, sendo que os requerimentos apresentados em 2 e 23 de Maio de 2002 nem sequer indicam qual a alínea ao abrigo da qual era deduzida a impugnação que, por força do último dos citados requerimentos, foi entendida como sendo dirigida ao Tribunal Constitucional (questão que, inclusivamente, poderia levar a que se considerasse que o primeiro daqueles requerimentos nunca pudesse ser perspectivado como expressando a vontade de impugnar a decisão tomada pelo Tribunal da Relação de Lisboa perante o órgão de fiscalização concentrada da constitucionalidade normativa).
É que, na situação em espécie, não se assiste à recusa de aplicação, por banda do acórdão lavrado no Tribunal da Relação de Lisboa, de qualquer normativo por motivos de inconstitucionalidade ou da ilegalidade, prevista nas alíneas c), d) e e) daqueles número e artigo; e, por outro lado, também não se assiste à aplicação de normativos cuja desconformidade com a Lei Fundamental, com uma lei de valor reforçado, com estatuto de Região Autónoma ou com uma lei geral da República, tenha sido, precedentemente à prolação daquele acórdão, suscitada pela ora reclamante.
Em face do exposto, indefere-se a reclamação, condenando-se a reclamante nas custas processuais, fixando a taxa de justiça em quinze unidades de conta. Lisboa, 6 de Fevereiro de 2003 Bravo Serra Gil Galvão Luís Nunes de Almeida