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Proc. nº 303/02
3ª Secção Relator: Cons. Sousa e Brito
Acordam, em Conferência, na 3ª Secção do Tribunal Constitucional:
I – Relatório
1. A. (ora recorrente), Autor na acção declarativa ordinária em que é Ré a B.
(ora recorrida), e que corre os seus termos na 3ª Secção do 5º Juízo do Tribunal de Trabalho de Lisboa, com o nº 40/97, veio deduzir/opor suspeição contra a Ex.ma Juíza de Direito, Dr.ª C, alegando, em síntese, que a referida magistrada, durante o julgamento e discussão da causa, passou a assumir, perante as sucessivas tomadas de posição do A., 'uma postura de crescente e cada vez mais mal escondida animosidade e inimizade para consigo e com o seu mandatário'.
2. A Ex.ma Juíza Recusada veio responder à suspeição, negando haver qualquer inimizade para com o A. ou o seu Mandatário. Acentuou, no que ao presente recurso interessa, que 'relativamente à também invocada inimizade com o Ex.mo Mandatário do A., sempre se dirá que tal não constitui fundamento de suspeição. Conforme se pode ler a pág. 451 do vol. I dos Comentários ao Código de Processo Civil, de Alberto dos Reis, «a jurisprudência exige que a inimizade seja mais do que um simples corte de relações e... se produza entre o juiz e as partes e não entre ele e outras pessoas, embora sejam defensoras daquelas» e mais adiante «é fora de dúvida que não podem ser tomados em consideração os sentimentos do juiz para com os parentes das partes, por mais próximo que seja o grau de parentesco, nem para os advogados ou solicitadores das partes».
3. O Recusante, notificado da resposta apresentada pela Ex.ma Juíza Recusada, veio 'replicar' através do requerimento de fls. 178 a 183, tendo suscitado aí a questão da inconstitucionalidade da interpretação normativa do artigo 127º, nº
1, al. g), do Código de Processo Civil, consistente em excluir dos fundamentos de suspeição as situações de grave inimizade do julgador para com o mandatário da parte.
4. O Tribunal da Relação de Lisboa, por acórdão de 12 de Março de 2002 (fls. 510 a 522), decidiu julgar 'não provada e improcedente a presente oposição de suspeição'. Antes, porém, ordenou o desentranhamento da peça processual de fls.
178 a 183, por considerar não ser legalmente admissível qualquer articulado do Recusante a pronunciar-se sobre a 'contestação' do Recusado.
5. Desta decisão foi interposto, ao abrigo da alínea b) do nº 1 do art. 70º da LTC, o presente recurso, para apreciação da constitucionalidade do artigo 127º, nº 1, al. g), do Código de Processo Civil, quando interpretado em termos de excluir dos fundamentos de suspeição as situações de grave inimizade do julgador para com o mandatário da parte.
6. Na sequência, foi proferida pelo Relator do processo neste Tribunal, em 24 de Setembro de 2002 e ao abrigo do disposto no nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº
28/82, de 15 de Novembro, na redacção que lhe foi dada pela Lei nº 13-A/98, de
26 de Fevereiro, decisão sumária no sentido do não conhecimento do recurso (fls.
539 a 542). É o seguinte, na parte decisória, o seu teor:
'Nos termos do artigo 72º, nº 2, da Lei do Tribunal Constitucional, o recurso previsto na alínea b), do nº 1, do artigo 70º do mesmo diploma - o interposto pelo ora recorrente -, só pode ser interposto 'pela parte que haja suscitado a questão da inconstitucionalidade (...) de modo processualmente adequado perante o tribunal que proferiu a decisão recorrida, em termos de este estar obrigado a dela conhecer'. Importa, por isso, começar por averiguar se o ora recorrente suscitou perante o Tribunal da Relação de Lisboa, de modo processualmente adequado e em termos de este estar obrigado a dela conhecer, a questão de constitucionalidade que agora pretende ver apreciada. Resulta dos autos que apenas no requerimento de fls. 178 a 183 - através do qual o Recusante pretendeu 'replicar' à resposta da Ex.ma Juíza Recusada - o ora recorrente confrontou o Tribunal da Relação de Lisboa com a questão da alegada inconstitucionalidade do artigo 127º, nº 1, al. g), do Código de Processo Civil, se interpretado em termos de excluir dos fundamentos de suspeição as situações de grave inimizade do julgador para com o mandatário da parte. Tal peça processual foi, porém, mandada desentranhar, por o Tribunal da Relação de Lisboa ter considerado ser a mesma legalmente inadmissível (cfr. fls. 510). Nestes termos, não poderá considerar-se que o ora recorrente suscitou perante o Tribunal da Relação de Lisboa, de modo processualmente adequado e em termos de este estar obrigado a dela conhecer, a questão de constitucionalidade que agora pretende ver apreciada (como expressamente exige o artigo 72º, nº 2, da LTC) e, não o tendo feito, não pode conhecer-se do objecto do recurso que interpôs, por falta de um dos seus pressupostos legais de admissibilidade'.
7. Inconformado com esta decisão o recorrente apresentou, em 8 de Outubro de
2002, a presente reclamação para a Conferência (fls. 544 a 549), que fundamenta nos seguintes termos:
'1º - Antes de tudo, importará assinalar e invocar aqui a inconstitucionalidade do preceito (nº 1 do artigo 78º-A da Lei nº 28/82) ao abrigo da qual esta
«decisão sumária» foi tomada. Com efeito,
2º - Tal preceito permite que a apreciação e decisão de uma questão de fiscalização sucessiva concreta de inconstitucionalidade seja objecto de um despacho singular de um só Juiz Conselheiro (o Relator). Ora,
3º - A composição do Tribunal Constitucional é peremptoriamente definida no art.
224º da CRP.
4º - E, no que respeita ao funcionamento do próprio Tribunal Constitucional, a Lei Fundamental, no seu artigo 226º, nº 2 explicitamente estipula que a lei ordinária (in casu, a já citada Lei nº 28/82) o preveja e regule «por secções não especializadas para efeitos de fiscalização concreta da constitucionalidade ou legalidade». Isto é,
5º - Manifestamente a Constituição não admite o funcionamento do Tribunal Constitucional por «relatores», mas apenas e tão só por «secções não especializadas».
6º - E muito menos quando – como sucede aqui – não estão em causa meras questões de mero expediente (como a fixação do prazo para alegações ou do efeito e momento de subida do recurso, por exemplo).
7º - Assim sendo, é manifesto que a admissão de um mero despacho do relator como modo de funcionamento do Tribunal Constitucional para efeitos de fiscalização concreta da constitucionalidade contraria directa e frontalmente o disposto no supra citado art. 226º, nº 2 da CRP.
8º - Inconstitucionalidade essa que fica desde já aqui arguida para todos os devidos e legais efeitos,
9º - E sendo certo que este é o primeiro momento em que ela poderia ter sido suscitada, por só agora o recorrente ter sido confrontado com a aplicação do preceito julgado inconstitucional.
10º - Acresce que o despacho ora reclamado, sobre padecer da indicada inconstitucionalidade, não tem também, salvo melhor opinião, fundamento. Com efeito,
11º - Nem é verdade que a decisão oportunamente recorrida para este Tribunal Constitucional não haja aplicado a norma julgada inconstitucional, nem que o recorrente não a haja suscitado antempadamente.
12º - Como é patente nos autos, o autor do despacho recorrido (o Sr. Presidente do Tribuna da Relação de Lisboa) apreciou mesmo a questão de inconstitucionalidade do art. 127º, nº 1, al. g) do CPC, se interpretado e aplicado no sentido de significar que a grave inimizade do julgador para com o mandatário de uma das partes nunca poderia constituir fundamento de suspeição.
13º - Como ademais resulta do próprio teor do despacho, cujo autor aliás não hesitou, seguramente por isso mesmo, em admitir o recurso interposto, precisamente com aquele fundamento, para este Tribunal Constitucional.
14º - E a inconstitucionalidade aqui em causa foi arguida no primeiro momento processual em que poderia ter sido. Na verdade,
15º - Se tal questão é suscitada pela magistrada requerida na sua, aliás insólita a vários níveis, contestação, das duas, uma: ou é na resposta a tal contestação, se esta for julgada inadmissível, o momento processual adequado; ou se aquela não for julgada admissível, então – não sendo, nessa hipótese, aquele momento processual adequado – teria sempre de sê-lo o próprio requerimento de interposição do recurso.
16º - Agora, o que não se pode seguramente admitir é o absurdo, que a lógica não admite e o Direito não pode caucionar: a recorrida na sua resposta suscita uma dada questão (a de que, no caso decidendo, não poderia haver lugar ao deferimento do incidente de suspeição oportunamente deduzido, já que os conflitos e incidentes ocorridos no processo no Tribunal do Trabalho tê-lo-iam sido não com a parte em si mas com o próprio mandatário da parte e o art. 127º, nº 1, al. g) do CPC não admitiria tal situação como fundamento de suspeição); o ora requerente responde-lhe no primeiro momento em que o pode fazer, sem que o Sr. Juiz da 1ª Instância nenhum obstáculo processual visse nisso; o julgador da
2ª Instância dá, nesse aspecto, razão àquele entendimento da requerida mas, ao mandar desentranhar a referida peça de resposta por parte do requerente, conseguiria afinal obstaculizar a apreciação da inconstitucionalidade por este Tribunal (e isto exactamente com o argumento sustentado pelo Sr. Juiz Conselheiro Relator).
17º - O recorrente seria assim como que «apanhado» na inaceitável situação de não poder nunca invocar a inconstitucionalidade de um preceito legal que a parte contrária invocasse em seu abono interpretado e aplicado de certo modo e que o julgador da 2ª instância interpretaria e aplicaria do mesmo modo – se o recorrente só arguisse tal inconstitucionalidade no momento da interposição do recurso, ver-lhe-ia ser oposto o argumento de que não o fizera «no decurso do processo»; se o fizesse no primeiro momento processualmente possível
(requerimento da resposta à contestação), ver-lhe-ia ser arremessado o argumento de que, como tal resposta «desaparecera» entretanto dos autos, não existiria afinal qualquer arguição de inconstitucionalidade !!??
18º - A admissibilidade de semelhante kafkiano resultado violenta por completo os basilares princípios da certeza e segurança jurídicas e da confiança ínsitas na ideia de Estado de direito democrático do processo justo e equitativo, consagrados, respectivamente, no art. 2º da CRP e no art. 6º da C.E.D.H., este vigente na Ordem Jurídica interna «ex vi» do art. 8º, nº 2, da CRP, consubstanciando assim nova (e autónoma) inconstitucionalidade, a qual aqui se deixa igualmente arguida.
19º - Temos assim que, ao invés do sustentado no despacho ora reclamado, o recorrente suscitou a questão de inconstitucionalidade no primeiro momento processual em que o poderia ter feito e que o julgador a quo dela conheceu e decidiu,
20º - Sendo ainda certo que o despacho ora reclamado se fundamenta em dispositivos (respectivamente 78º-A, nº 1 e 72º, nº 2, ambos da Lei nº 28/82), que da forma como foram interpretados e aplicados, se revelam em absoluto inconstitucionais,
21º - Havendo tal questão da inconstitucionalidade sido oportunamente arguida pelo recorrente no primeiro momento processual em que o poderia ter sido (o presente requerimento)'.
8. Notificada para responder, querendo, à presente reclamação, a Ex.ma Juíza Recusada (ora reclamada) pronunciou-se no sentido da sua improcedência (fls. 551 a 554).
Dispensados os vistos legais, cumpre decidir.
III – Fundamentação
9. Com a presente reclamação o Reclamante coloca à consideração do Tribunal três questões que, em seu entender, deverão conduzir à revogação da decisão reclamada. Alega, em primeiro lugar, que o artigo 78º-A, nº 1, da Lei nº 28/82, preceito ao abrigo do qual foi emitida aquela decisão sumária, é inconstitucional, na medida em que permite que 'a apreciação e decisão de uma questão de fiscalização sucessiva concreta de inconstitucionalidade seja objecto de um despacho singular do relator', quando, no seu entender, o artigo 224º, nº 2 da Constituição 'não admite o funcionamento do Tribunal Constitucional por «relatores», mas apenas e tão só por «secções não especializadas»' (artigos 1º a 9º da reclamação). Sustenta, em segundo lugar, que - ao contrário do que se decidiu na decisão reclamada - suscitou tempestivamente a questão de inconstitucionalidade que pretende ver apreciada, na medida em que o fez no primeiro momento processual em que o poderia ter feito (artigos 10º a 17º da reclamação). Argumenta, finalmente, que, caso assim não se entenda, os artigos 78º-A, nº 1 e
72º, nº 2, ambos da Lei nº 28/82, se revelam em absoluto inconstitucionais, agora por violação 'dos princípios da certeza e segurança jurídicas e da confiança ínsitas na ideia de Estado de direito democrático do processo justo e equitativo, consagrados, respectivamente, no art. 2º da CRP e no art. 6º da C.E.D.H.' (artigos 18º e 20º da reclamação). Vejamos, pois, se lhe assiste razão.
9.1. Para melhor delimitar o objecto da presente reclamação, cumpre esclarecer - como, bem, faz a Ex.ma Juíza Recusada -, que, in casu, não está sequer em causa a possibilidade - que aquele artigo 78º-A, nº 1 também prevê - de 'a decisão de uma questão de fiscalização sucessiva concreta de inconstitucionalidade ser objecto de um despacho singular do relator', mas a mera possibilidade de ser objecto de uma (primeira) decisão singular a questão da própria admissibilidade do recurso. Ora, desde logo, essa possibilidade em nada contraria o funcionamento do Tribunal Constitucional por secções não especializadas, como prevê o artigo
224º, nº 2 da Constituição. Para o demonstrar bastará notar que da decisão sumária a que se refere o nº 1 do artigo 78º-A, da LTC, cabe sempre reclamação para a conferência (cfr. artigo
78º-A, nº 3), e que mesmo esta só julga definitivamente a questão quando o faça por unanimidade (o que se compreende, já que a mesma é composta pela maioria dos juizes da secção), pois que, caso contrário, da decisão da conferência ainda cabe recurso para o pleno da secção (cfr. o nº 4 do artigo 78º-A). Desta forma, a possibilidade de ser emitida uma primeira decisão sumária, como prevê o nº 1 do artigo 78º-A da LTC, não contradiz o funcionamento do Tribunal Constitucional por secções não especializadas, uma vez que essa possibilidade não retira à secção a competência para proferir a decisão final sobre a questão
(de inconstitucionalidade ou da admissibilidade do recurso) que foi objecto daquela primeira decisão. Improcede, por isso, a primeira questão colocada pelo Reclamante.
9.2. Mas também não tem razão quando afirma que suscitou tempestivamente a questão de inconstitucionalidade, na medida em que o fez no primeiro momento processual em que o poderia ter feito (artigos 10º a 17º da reclamação). Ao contrário do que afirma, o ora reclamante não suscitou a questão de inconstitucionalidade no primeiro momento processual em que o podia - e devia, acrescentamos nós - ter feito. Vejamos. O recurso previsto na alíneas b) do nº 1 do art. 70º da Lei do Tribunal Constitucional pressupõe, além do mais, que o recorrente tenha suscitado, durante o processo, a inconstitucionalidade da norma jurídica que pretende submeter à apreciação do Tribunal Constitucional. E, quanto ao sentido a dar a este pressuposto de admissibilidade do recurso, constitui desde há muito jurisprudência assente neste Tribunal que tal implica, em regra, que a questão de constitucionalidade seja suscitada, de forma processualmente adequada, antes da prolação da decisão recorrida (veja-se, entre muitos nesse sentido, os Acórdãos nºs 62/85, 90/85 e 450/87, in Acórdãos do T.C., 5º vol., p. 497 e 663 e 10º vol., pp. 573, respectivamente). Somente tem este Tribunal admitido que a questão da constitucionalidade de uma norma jurídica - ou de uma sua interpretação normativa - seja suscitada depois de proferida a decisão em hipóteses, excepcionais, em que o poder jurisdicional, por força de norma processual específica, não se tenha esgotado com a prolação da decisão recorrida, ou em que o recorrente não tenha tido oportunidade processual de o fazer antes.
É esta última hipótese factual que o recorrente entende que se encontra retratada nos autos. Porém, como vai ver-se, sem razão. Ao contrário do que alega, o recorrente teve efectivamente oportunidade processual para, antes de proferida a decisão recorrida, ter suscitado, de forma processualmente adequada - e não através de um requerimento processualmente inadmissível, como aconteceu -, a questão de inconstitucionalidade do artigo
127º, nº 1, al. g), do Código de Processo Civil, quando interpretado em termos de excluir dos fundamentos de suspeição as situações de grave inimizade do julgador para com o mandatário da parte. Concretamente poderia tê-lo feito logo quando suscitou, também com esse fundamento, o incidente de suspeição contra a Ex.ma Juíza recusada. Mas, era-lhe exigível que colocasse, logo ali, a questão da inconstitucionalidade ? Como este Tribunal tem afirmado repetidamente recai sobre as partes o ónus de analisarem as diversas possibilidades interpretativas susceptíveis de virem a seguidas e utilizadas na decisão e utilizarem as necessárias precauções, de modo a poderem, em conformidade com a orientação processual considerada mais adequada, salvaguardar a defesa dos seus direitos (cfr., nesse sentido, entre muitos outros, o acórdão nºs 479/89, acórdãos do Tribunal Constitucional, 14º vol., p. 149). Assim, sendo previsível – e, era-o efectivamente, desde logo porque o teor literal do preceito ao referir-se, exclusivamente, a 'inimizade grave com alguma das partes' sugere imediatamente essa interpretação - que a decisão recorrida pudesse dar à norma objecto do recurso a dimensão normativa que o ora reclamante considera inconstitucional, era-lhe efectivamente exigível que tivesse, logo ali
- porque era o (único) momento processual de que dispunha antes de proferida a decisão recorrida -, suscitado essa mesma inconstitucionalidade. Em suma: podia (porque teve oportunidade processual) e devia (porque sobre ele recai esse ónus) o ora reclamante - se entendia que a interpretação normativa do art. 127º, nº 1, al. g) do CPC que excluí dos fundamentos de suspeição as situações de grave inimizade do julgador para com o mandatário da parte era inconstitucional - ter colocado essa questão de inconstitucionalidade, em termos processualmente adequados, antes de ter sido proferida a decisão recorrida.
9.3. Argumenta o Reclamante, finalmente, que, este entendimento dos artigos
78º-A, nº 1 e 72º, nº 2, ambos da Lei nº 28/82, se revela em absoluto inconstitucional, por violação 'dos princípios da certeza e segurança jurídicas e da confiança ínsitas na ideia de Estado de direito democrático do processo justo e equitativo, consagrados, respectivamente, no art. 2º da CRP e no art. 6º da C.E.D.H.' (artigos 18º e 20º da reclamação). Mais uma, vez, porém, sem razão. A interpretação daqueles preceitos em termos de ser exigível ao recorrente que suscite, antes de proferida a decisão recorrida, a questão de inconstitucionalidade - nas hipóteses em que seja previsível que a decisão recorrida venha a aplicar a norma com o sentido que o recorrente considera inconstitucional – em nada afecta os 'princípios da certeza e segurança jurídicas e da confiança ínsitas na ideia de Estado de direito democrático do processo justo e equitativo, consagrados, respectivamente, no art. 2º da CRP e no art. 6º da C.E.D.H'. Para o demonstrar bastará recordar que este entendimento vendo sendo adoptado desde sempre pelo Tribunal Constitucional, no que constitui uma jurisprudência reiterada e uniforme, pelo que não pode considerar-se que constitui uma 'decisão surpresa' em termos de a sua manutenção poder afectar aqueles princípios. E também não se vê em que é que esta interpretação possa pôr em causa a existência de um processo justo e equitativo. Tal conclusão surge, aliás, na argumentação do reclamante, como consequência de um pressuposto cuja falsidade já demonstrámos: o de que, com tal entendimento, se retiraria ao recorrente qualquer oportunidade processual para suscitar, tempestivamente, a questão de inconstitucionalidade, em termos de lhe permitir um posterior recurso para o Tribunal Constitucional.
III - Decisão Por tudo o exposto, decide-se indeferir a presente reclamação e, em consequência, confirmar a decisão reclamada no sentido do não conhecimento do objecto do recurso. Custas pelo reclamante, fixando-se a taxa de justiça em quinze unidades de conta Lisboa, 3 de Dezembro de 2002- José de Sousa e Brito Alberto Tavares da Costa Luís Nunes de Almeida