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Processo n.º 646/01
2ª Secção Relator - Cons. Paulo Mota Pinto Acordam na 2ª secção do Tribunal Constitucional I. Relatório Por sentença de 25 de Junho de 2001, do 2º Juízo do Tribunal Judicial de Seia A, melhor identificado nos autos, foi absolvido do crime de pesca ilegal, previsto e punido pelos artigos 29º, 64º e 67º do Decreto n.º 44 623, de 10 de Outubro de
1962 (Regulamento da Lei da Pesca), e de uma contravenção, prevista e punida pelas disposições conjugadas dos artigos 52º e 72º do Decreto n.º 44623, na redacção do Decreto- Lei n.º 312/70, de 6 de Julho, por terem sido consideradas inconstitucionais, 'por violação dos princípios constitucionais de culpa, da igualdade e da proporcionalidade, ínsitos nos artigos 1º, 13º/1, 18º/2, 25º/1 e
30º/1 da Constituição da República Portuguesa', a norma 'constante da parte final do § único do artigo 67º do Regulamento da Lei da Pesca (Decreto n.º 44
623, de 10 de Outubro de 1962), no segmento que manda aplicar os máximos das penas previstas no artigo 64º do mesmo diploma, para o crime de pesca em época de defeso, quando concorra a agravante de a pesca ter lugar em zona de pesca reservada', e a norma 'constante da 2ª parte do n.º 2 da Base XXII da Lei da Pesca (Lei n.º 2097, de 6 de Junho de 1959), no segmento em que manda aplicar os máximos das penas previstas na Base XX do mesmo diploma, para o crime de pesca em época de defeso, quando concorra a agravante de a pesca ter lugar em zona de pesca reservada.' O Ministério Público interpôs recurso para o Tribunal Constitucional, ao abrigo da alínea a) do n.º 1 do artigo 70º da Lei n.º 28/82, de 15 de Novembro, tendo o Ex.mº Procurador-Geral Adjunto aqui em funções – depois de sublinhar que, sendo o juízo de inconstitucionalidade a proferir um juízo de inconstitucionalidade parcial nunca poderia 'determinar a absolvição do arguido pelo crime que lhe era imputado (cuja tipificação na lei e sancionamento, nos termos gerais, sem o referido agravamento, não são minimamente afectados pela inconstitucionalidade verificada)' – concluído as suas alegações da seguinte forma:
'1. - São inconstitucionais, por violação dos princípios da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, as normas que sancionam com pena fixa – correspondente ao máximo da moldura penal aplicável – o crime de pesca ilegal – em época de defeso – agravado pelo concurso das circunstâncias (agravantes) tipificadas na lei.
2. - Termos em que deverá confirmar-se o juízo de inconstitucionalidade constante da decisão recorrida, determinando-se, porém, a reforma de tal decisão em consonância com a natureza meramente parcial de tal juízo de inconstitucionalidade.' Por sua vez, o arguido concluiu desta forma as suas alegações:
'1º - É inconstitucional o artigo 67º do DL 44 623, uma vez que comina com uma pena fixa a conduta descrita na sua estatuição.
2º - Desta forma há uma clara violação de princípios em matéria penal com referência constitucional, tais como princípio da legalidade, da proporcionalidade e da culpa, este último com fundamento no princípio da inviolabilidade da dignidade humana.
3º - Não podemos a nível penal lidar com ficções. Ao ficcionar uma moldura penal o juiz estaria inevitavelmente a invadir a esfera do legislador.
4º - Em consequência, deverá ser proferido um juízo de inconstitucionalidade parcial, referente ao último segmento da norma, que implicará a absolvição do arguido, já que à sua conduta não corresponde nenhuma consequência jurídica em virtude de grave desconformidade à Constituição.' Cumpre apreciar e decidir. II. Fundamentos Já na pendência do presente recurso, o Tribunal Constitucional veio a pronunciar-se, em Plenário, justamente sobre a questão de constitucionalidade dos autos. Fê-lo no Acórdão n.º 70/02 (publicado no Diário da República, II Série, de 24 de Abril de 2002), e, muito embora as normas aí apreciadas não esgotem as que são aqui trazidas à apreciação deste Tribunal, como notou o Sr. Procurador-Geral-Adjunto, 'o facto de o presente recurso englobar também as normas da Lei n. 2097 (...) nada adita de substancialmente inovatório'. Na verdade, a mais da norma constante da parte final do § único do artigo 67º do Decreto n.º 44 623, de 10 de Outubro de 1962 – que foi julgada inconstitucional no citado Acórdão n.º 70/02 no segmento que manda aplicar o máximo da pena prevista no artigo 64º do mesmo diploma para o crime de pesca em época de defeso, quando concorra a agravante de a pesca ter lugar em zona de pesca reservada –, está agora em causa, também, a norma constante da 2ª parte do n.º 2 da Base XXII da Lei n.º 2097, de 6 de Junho de 1959, na parte em que manda aplicar os máximos das penas previstas na Base XX do mesmo diploma para o crime de pesca em época de defeso, quando concorra a agravante de a pesca ter lugar em zona de pesca reservada. Também a esta norma foi recusada aplicação pela decisão recorrida. Acontece, porém, que não só a formulação da regra regulamentadora – 'Quando concorra qualquer destas agravantes [‘o facto de terem sido praticadas de noite ou em águas onde a pesca for proibida, reservada ou objecto de concessão’] (...)
[n]os casos dos artigos 63º, 64º e 65º serão aplicados os máximos das penas' – reproduz a formulação literal da regra da Lei ('Quando concorra esta agravante
[‘o facto de terem sido cometidas de noite ou em águas onde a pesca for proibida, reservada ou objecto de concessão’] (...) [n]os casos das bases XIX a XXI serão aplicados os máximos das penas') –, estando em causa uma situação igualmente prevista no artigo 64º do Decreto n. 44 623 e na base XX da Lei n.
2097 (a pesca 'nas épocas de defeso'), como a sua intencionalidade normativa é a mesma. Assim, as razões que ditaram o juízo de inconstitucionalidade de uma norma determinam necessariamente a inconstitucionalidade da outra, a qual pode, pois, considerar-se, se não já implícita, pelo menos susceptível de ser fundamentada nos mesmo termos dos constantes dos Acórdão n.º 70/02 (já citado), e, anteriormente, já do Acórdão n.º 95/2001 (também publicado no Diário da República, II Série, de 24 de Abril de 2002). Cumpre aqui apenas reiterar tal juízo de inconstitucionalidade, remetendo para os fundamentos destes arestos.
4. Alcançada esta conclusão, há que negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida, sendo no tribunal a quo, e não no Tribunal Constitucional, que devem ser extraídas consequências deste juízo. III. Decisão Com os fundamentos expostos, o Tribunal Constitucional, decide: a. Julgar inconstitucionais, por violação, dos princípios constitucionais da culpa, da igualdade e da proporcionalidade, a parte final do § único do artigo 67º do Regulamento da Lei da Pesca (Decreto n.º 44 623, de 10 de Outubro de 1962), no segmento que manda aplicar os máximos das penas previstas no artigo
64º do mesmo diploma, para o crime de pesca em época de defeso, quando concorra a agravante de a pesca ter lugar em zona de pesca reservada e, a 2ª parte do n.º
2 da Base XXII da Lei da Pesca (Lei n.º 2097, de 6 de Junho de 1959), no segmento em que manda aplicar os máximos das penas previstas na Base XX do mesmo diploma, para o crime de pesca em época de defeso, quando concorra a agravante de a pesca ter lugar em zona de pesca reservada; b. Negar provimento ao recurso e confirmar a decisão recorrida, no que à questão de constitucionalidade respeita.
Lisboa, 20 de Novembro de 2002. Paulo Mota Pinto Bravo Serra Guilherme da Fonseca Maria Fernanda Palma José Manuel Cardoso da Costa